Acórdão nº 5509/09.8TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelSERRA BAPTISTA
Data da Resolução26 de Setembro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA instaurou acção declarativa, com processo ordinário, contra BB-..., S.A. (anteriormente CC – .... S.A e antes disso "DD, S.A) pedindo que a ré seja condenada: a) a pagar-lhe a quantia de Esc. 10.318.949$00 acrescida de juros de mora vincendos, à taxa legal de 7% ao ano, até efectivo pagamento, sobre a importância de Esc. 9.185.000$00.

b) a abster-se de publicar a obra intitulada "..." ou "..." ou a mesma sob outro título e de nela fazer figurar o seu nome como autor, colaborador e revisor científico e pedagógico, enquanto não efectuar o pagamento de todas as importâncias em dívida e não estiverem completamente definidos os termos em que lhe cede os seus direitos exclusivos e de edição.

Alegou, para tanto e em síntese, que em 21 de Março de 1994 celebrou com a ré um contrato pelo qual, na qualidade de revisor científico da obra "..." vendeu àquela o trabalho de revisão da mesma obra, contra o pagamento da importância de 1.430.000$00 a pagar em 9 prestações, colaboração que desenvolveu integralmente, sendo que a ré não lhe pagou, da mesma importância, a quantia de 635.000$00; Tendo tido a informação que teria que rever mais páginas em virtude de a obra ir ficando cada vez mais ambiciosa, propôs receber mais 5.400.000$00, correspondentes a 540 horas de trabalho a 10.000$00 à hora, o que a ré aceitou e cumpriu; Em Julho de 1999 concluiu a revisão da obra, na qual acabou por despender 1610 horas, em virtude do acréscimo de número, extensão e refundição das entradas, pelo que solicitou à ré que pagasse mais 1.400.000$00, o que a mesma aceitou, não se tendo, contudo, concretizado o pagamento, uma vez que a demandada pretendeu pagar-lhe em livros, solução que não lhe convinha; Elaborou para a mesma obra um anexo e prefácio, tendo acordado com a ré o pagamento da quantia de 800.000$00; Na análise do texto pronto para publicação verificou a existência de erros, pelo que fez uma revisão total final, na qual despendeu mais 635 horas de trabalho, pelas quais deve ser remunerado à razão de 10.000$00 a hora.

A ré nunca lhe pagou as quantias de 635.000$00, 1.400.000$00, 800.000$00 e 6.350.000$00 atrás referidas, apesar das diligências que fez junto da mesma para esse efeito; O ... acima referido é uma obra em colaboração nos termos da alínea a), do n.° 1, do art. 16.° do Código do Direito de Autor e Direitos Conexos, o que lhe confere o direito de exigir as importâncias acima referidas, de impedir a publicação da obra enquanto aquelas não estiverem pagas e definidos os termos em que cede à autora os seus direitos sobre aquela, bem como de impedir que o seu nome figure no mesmo ....

Citada a ré, veio a mesma contestar, refutando, por impugnação, parte dos factos invocados, mais alegando, também em suma, que nunca aceitou o volume de trabalho que o autor refere, tendo os contactos para o efeito estabelecidos pelo demandante sido efectuados na pessoa de um colaborador externo sem qualquer vínculo laboral à empresa e na pessoa de uma outra pessoa sem qualquer vínculo jurídico à demandada. Ademais o autor limitou-se a intervir na obra como mero revisor científico, nada tendo criado, tendo o seu trabalho se resumido à análise do trabalho de outrem e à apresentação de sugestões de alteração.

Concluiu pela improcedência da acção ou, no caso de assim não se entender, pela definição do valor dos serviços do autor em conformidade com a prova a produzir em audiência de julgamento.

Convocada audiência preliminar, o autor apresentou articulado superveniente, invocando ter tido conhecimento que a demandada publicou a obra em causa sob o título "...", nela incluindo uma "nota de editores" igual à "introdução" que ele tinha elaborado, substituindo o anexo por ele feito por dois apêndices e inscrevendo na ficha técnica a menção de que a obra havia sido revista por equipas de professores, quando o autor foi o único revisor científico e pedagógico da mesma. A ré é, pois, responsável pelos danos que causou aos seus direitos morais, que estimou em € 10.000,00, peticionando, em acréscimo aos pedidos já formulados, a condenação da ré no pagamento dessa quantia e em indemnização a liquidar em execução de sentença pelos danos patrimoniais.

Respondeu a ré, defendendo ser inadmissível o articulado superveniente e, no mais, reputando de falsos os factos articulados naquela peça.

Por despacho de 15 de Dezembro de 2003 o articulado superveniente foi admitido, tendo sido proferido saneador, fixados os factos dados como assentes e elaborada a base instrutória.

Veio, entretanto, a ré interpor recurso do despacho que valorou como recusa a omissão de entrega de documentos para que havia sido notificada, tendo esse recurso sido admitido como agravo com subida diferida e efeito meramente devolutivo, mas que foi depois objecto de desistência.

Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho junto de fls 943 a 953 consta.

Foi proferida a sentença, que expressamente admitiu a ampliação do pedido contida no articulado superveniente, por ser uma consequência do pedido primitivo, e, decidindo de mérito, julgou o pedido formulado pelo autor parcialmente procedente e nessa conformidade condenou a ré a pagar àquele: a) a quantia de € 10.150,53 (dez mil cento e cinquenta euros e cinquenta e três cêntimos) de capital; b) O valor de juros moratórios, vencidos e vincendos, às taxas anuais de 10% até 16 de Abril de 1999, 7% até 30 de Abril de 2003 e 4% desde essa data em diante e outras de juros civis que venham a vigorar, sobre a quantia de Euros 3.167,36 (três mil cento e sessenta e sete euros e trinta e seis cêntimos) desde 3 de Março de 1997 até integral pagamento; c) O valor de juros moratórios, vencidos e vincendos, às mesmas taxas anuais, sobre a quantia de € 6.983,17 (seis mil novecentos e oitenta e três euros e dezassete cêntimos) desde 20 de Setembro de 2000 até integral pagamento.

No mais, foram julgados improcedentes os pedidos formulados pelo autor e dos mesmos a ré absolvida.

Inconformados interpuseram, autor e ré, competentes recursos de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, onde, por acórdão de fls 1174 a 1204, foi julgado improcedente o da ré e parcialmente procedente o do autor, com a revogação parcial da sentença recorrida, acrescendo a condenação da ré a pagar ao autor a quantia que se liquidar em competente incidente correspondente à elaboração do Anexo sobre “Palavras, expressões e frases latinas, gregas e estrangeiras úteis ao falante do português” e ao “Prefácio” do ..., até ao montante de 800 000$00. Bem como a pagar ao autor quantia que se liquidar em competente incidente correspondente ao número de horas gastos na revisão total do ..., à razão de 10 000$00 a hora, e até ao limite de 6 350 000$00.

De novo irresignados, vieram, autor e ré pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça.

Tendo o autor, na sua alegação, formulado as seguintes conclusões: 1ª - O Acórdão recorrido violou o preceituado no art. 519.°, n.º 2 do Cód. Proc. Civil e no art. 344.° nº 2 do Código Civil ao decidir que a recusa da Ré em dar cumprimento ao despacho de f1s. 370, agora já transitado em julgado, que lhe ordenou a junção aos autos das quatro versões do inicialmente designado "..." e que acabou por ser editado sob o título "..." e, bem assim, das correspondentes revisões efectuadas pelo A., para prova dos quesitos n.º 1 a 27, 34, 36 e 37 (30 entre 39), caracteriza uma falta de cooperação que chama a presença de livre apreciação pelo tribunal do valor da recusa e não constitui uma situação de inversão do ónus da prova por não se tratar de um meio de prova especialmente relevante que não possa ser suprido por outros meios de prova.

2ª - Com efeito, além de ser evidente que a recusa respeita a um meio de prova especialmente relevante, bastando para isso atentar na sua natureza intrínseca e na sua extensão, é também certo que os demais meios de prova oferecidos e produzidos não foram suficientes para a prova total dos respectivos quesitos, requisitos estes sufragados pela maioria da doutrina invocada no próprio acórdão recorrido para justificar a inversão do ónus de prova.

3ª - O ... em questão, como está expressamente reconhecido no acórdão recorrido, é uma obra feita em colaboração e não uma obra colectiva, assistindo ao aqui alegante todas as prerrogativas do direito de autor, designada mente as de natureza moral e pessoal: direito ao inédito, direito de retirada, direito à menção do nome do autor, direito de reivindicar a paternidade da obra, direito de assegurar a genuinidade e integridade da obra, direito de efectuar a modificação na obra e direito de acesso à obra.

4ª - Apesar de o acórdão recorrido reconhecer que a Ré praticou um facto ilícito susceptível de gerar a obrigação de indemnizar o lesado, afastou o respectivo pedido com base no facto de a lei exigir um dano e um nexo de causalidade.

5ª - Na petição inicial e no articulado superveniente o A. alegou factos que foram levados à B. I. sob os nºs 34, 35, 36, 13 e 37, para além dos demais relevantes na matéria, os quais se consideram suficientes para preencher os referidos requisitos do dano e do nexo de causalidade entre o facto culposo e aquele, os quais pela sua própria natureza são quase objectivos e resultam do recurso às regras da experiencia comum.

6ª - As questões de facto, em certos casos, também não devem ser quesitadas, como é o caso dos juízos conclusivos e de valor, que cabe ao juiz, na sentença, extrair ou não, dos factos concretos e materiais quesitados e provados, se necessário com recurso às regras da experiência comum.

7ª - É o que se verifica com os factos provados sob os nºs 20, 21, 36, 37, 38, 39 e 40, donde é possível ao tribunal agir em conformidade com o que consta da conclusão anterior, para preenchimento dos requisitos do dano e do nexo de causalidade, devendo o montante daquele, em último caso, ser fixado equitativa mente pelo tribunal.

8ª...

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