Acórdão nº 6742/1999.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Setembro de 2013
Magistrado Responsável | OLIVEIRA VASCONCELOS |
Data da Resolução | 26 de Setembro de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Em 1998.12.23, no Tribunal Cível de Lisboa, AA -…, S.A e BB, S.A.
, intentaram a presente ação ordinária contra - CC, …, S.A; - DD, ..., S.A; - EE, S.A: - FF, S.A; - GG, S.A; - HH, S.A; - II, S.A; - JJ-…, S.A; - KK, Lda.; - LL- ..., S.A.
Pediram a condenação solidárias das rés a absterem-se de prática de novos atos de concorrência desleal contra as autoras e a pagar: - à autora AA, quantia de 1.244.704.000$00 e no que se vier a liquidar em execução de sentença; - à autora Regional de Mercadorias, a quantia de 1.674.946.000$00; - a ambas as autoras, os juros de mora contados desde a data da citação e até integral pagamento.
Alegaram em resumo, que - a autora AA tem objeto a distribuição de produtos alimentares e outros de consumo, em grande escala, sendo a impulsionadora e inspiradora de um dos maiores grupos comerciais que nesse ramo operam no mercado português; - sendo uma sociedade anónima de direito português, está a mesma relacionada, atenta a sua estrutura acionista, com o grupo MM, que se dedica à distribuição e comercialização de produtos destinados ao consumo, em vários países europeus; - a autora “Regional” dentro do grupo “MM” tem a seu cargo a compra e venda por grosso, das mercadoria e a gestão e distribuição de stocks; - as sociedades, dentro do grupo, têm como denominador comum o facto de agirem no mercado entre si ligadas por um fator de identificação comercial, como são as insígnias do grupo ("MM" e NN"), sendo, no entanto, independentes entre si; - mediante a celebração de um contrato, usualmente designado de insígnia, ou de "franchising", a autora AA franqueia as suas portas à sociedade de venda a retalho que com ela pretenda associar-se autorizando esta a usar uma das insígnias de que é detentora; - por via de tal contrato, a referida autora põe à disposição da sociedade franqueada todo o seu “know-how”, garantindo o fornecimento através de sociedades suas afiliadas; - por via do contrato de “franchising”, ficavam as sociedades franchisadas obrigadas a abastecerem-se preferencialmente, em caso de igualdade de preços, junto das sociedades de aprovisionamento afiliadas daquela autora, que também se identificam por uma das insígnias do grupo MM, como é o caso da autora “Regional”; - ficavam, ainda, obrigadas a evitar, por todos os modos, as tentativas da concorrência, no sentido de desmantelamento do grupo MM e a dar preferência na alienação dos seus ativos, sejam imobiliários, seja o estabelecimento comercial, ou outros, à autora; - e ficavam ainda obrigadas a pagar-lhe, como contrapartida dos benefícios decorrentes do uso da insígnia, uma prestação pecuniária pela entrada no grupo; - as rés, sob a inspiração do grupo CC, constituem um grupo económico, agindo em conjunto e coordenadamente para um fim comum - a distribuição de produtos alimentares e não alimentar, de consumo, agindo em concorrência com o grupo liderado pela autora AA; - as rés agiram com o manifesto propósito de desorganizar a cadeia de distribuição montada pela autora AA, apropriando-se parcialmente dela e, para à custa disso, obterem para si, enquanto concorrentes diretos desta, ganhos ilegítimos, traduzidos na redução substancial do volume de negócios daquela autora e perda de importante parte da quota de mercado e clientela por esta conquistada; - tudo por recurso a práticas comerciais e de concorrência desonestas, desrespeitadoras da boa-fé e no exercício manifestamente abusivo do direito de concorrência; - da atuação das rés resultaram e resultarão elevadíssimos prejuízos para as autoras, quer de natureza patrimonial, quer não patrimonial, pois estes atingem profundamente a imagem comercial daquela autora; - a autora “Regional” também sofreu prejuízos decorrentes da atuação das rés.
Contestando e também em resumo, as rés alegaram que - na presente ação autoras pedem a condenação das rés no pagamento de uma indemnização pela alegada colaboração na violação, entre outros, dos contratos de uso de insígnia celebrados entre a autora AA e as sociedades OO - Supermercados, Limitada e PP, Limitada; - tais contratos foram rescindidos pela própria autora; - assim, quanto à alegada violação dos contratos de uso de insígnia referidos, verifica-se um facto extintivo do efeito jurídico dos atos alegados pelas autoras; - os contratos de uso de insígnia, franquia ou “franchising”, invocados pelas autoras são nulos; - a celebração de tais contratos foi precedida da celebração de contratos de adesão, os quais, compostos, também eles, na íntegra por cláusulas contratuais gerais, funcionam como verdadeiros contratos-promessa em relação aos primeiros; - a rescisão dos contratos de adesão implica a rescisão dos contratos de uso de insígnia e vice-versa; - de acordo com o contrato de uso de insígnia, a comparação da relação qualidade/preço deve ter em conta o serviço global prestado pelas sociedades afiliadas do agrupamento AA, e por essa razão, o que à partida parecia um simples direito de preferência tende a transformar-se numa verdadeira obrigação de aprovisionamento junto das referidas sociedades afiliadas; - o artigo 6º dos contratos de uso de insígnia estipula para as sociedades exploradoras a obrigação de aceitarem as condições das sociedades afiliadas, quando recorrerem aos respectivos serviços; - uma vez que o pretenso direito de preferência no aprovisionamento consiste numa verdadeira obrigação de aprovisionamento junto dos fornecedores do agrupamento AA e que sempre que recorrerem a estes as sociedades exploradoras estão obrigadas a aceitar as respectivas condições, conclui-se que o artigo 6º dos contratos de uso de insígnia viola o disposto no artigo 2º do DL n° 371/93, de 29 de Outubro, que proíbe todos os acordos ou práticas que impeçam, falseiem ou restrinjam a concorrência, e ainda as normas comunitárias de concorrência; - o artigo 6° dos contratos de uso de insígnia viola o disposto nos artigos 18° alíneas e) e f), e 19°, alínea g), do Decreto-Lei n 446/85, que proíbem, respectivamente, a atribuição da faculdade exclusiva de interpretar qualquer cláusula do contrato à parte que haja elaborado as cláusulas contratuais gerais, a exclusão da faculdade de rescindir o contrato e o estabelecimento de um foro competente que envolva graves inconvenientes para um das partes; - o expediente de camuflar sob a designação de direito de preferência um negócio de natureza inteiramente diferente e de consequências bastante mais gravosas para a parte mais fraca no contrato de uso de insígnia, i. e. a sociedade exploradora, é ofensivo da boa-fé, pelo que se deve entender que as cláusulas contratuais gerais vertidas no artigo10.2 dos contratos de uso de insígnia são nulas; - os prazos previstos nos artigo 10.2 e 10.3 dos contratos de uso de insígnia têm necessária e causalmente o efeito de afastar qualquer interessado na aquisição da empresa às sociedades exploradoras, pelo que tais cláusulas violam o disposto no artigo 19°, alíneas a) e b), do Decreto-Lei 446/85, que proíbem o estabelecimento de prazos excessivos para a aceitação de propostas ou cumprimento de obrigações; - o estabelecimento do foro competente em Paris é claramente violador do disposto no artigo 19°, alínea g), do Decreto-Lei 446/85, o que acarreta a nulidade das correspondentes cláusulas contratuais gerais; - o regime instituído nos contratos de adesão e de uso de insígnia para a transferência de participações sociais no capital da sociedade exploradora e para a transferência desta última, respectivamente, restringe para além do que seria admissível a possibilidade de dispor dos próprios bens, pelo que viola os direitos fundamentais de liberdade e de iniciativa privada; - os contratos de adesão e de uso de insígnia configuram negócios usurários que aproveitaram a situação de dependência em que se encontravam os aderentes à data da respectiva celebração para deles obterem benefícios injustificados, porque impõem aos sócios maioritários das sociedades franchisadas a prestação de...
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