Acórdão nº 176/03.5TBRSD.P1S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Julho de 2013
Magistrado Responsável | PIRES DA ROSA |
Data da Resolução | 04 de Julho de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: AA intentou ação declarativa, com forma ordinária de processo, contra BB e mulher CC DD e mulher EE pedindo que se declare que os Réus venderam ao Autor, pelo preço de € 79 807,66, uma casa de habitação de cave, rés-do-chão, primeiro andar e águas furtadas, com quintal, sita no lugar da P..., freguesia de S., concelho de Resende, descrita na Conservatória do Registo Predial de Resende e que, para a hipótese de improcedência da execução específica, se condenem os 1ºs Réus a pagar-lhe o dobro da quantia que este lhes entregou e ainda que, para a hipótese dos dois anteriores pedidos improcederem, seja declarada a resolução do contrato de cessão celebrado entre si e os 1ºs Réus, devendo estes restituir-lhe a quantia que lhes foi entregue.
Alega para o efeito, e em resumo: por contrato celebrado em 02.09.98, os 1ºs Réus declararam prometer ceder ao Autor, livre de quaisquer ónus ou encargos, a posição contratual que detinham como promitentes-compradores do identificado prédio urbano dos 2ºs Réus; os 1ºs Réus prometeram comprar aos 2ºs Réus, por contrato celebrado entre ambos em 17 de Julho de 1998, o mencionado prédio, pelo preço de 21 000 000$00, a pagar em 3 prestações; só falta pagar a última das prestações que o Autor se obrigou a pagar aos 1ºs Réus no acto da escritura de compra e venda, que lhe seria directamente outorgada pelos 2ºs Réus; os 1ºs Réus notificaram o Autor da data da escritura, informando que também tinham notificado os 2ºs Réus, e que a data da escritura seria 17 de Outubro de 2002; por motivos alheios ao Autor, não foi celebrada a escritura.
Contestando, os Réus DD e mulher ( 2ºs Réus ), dizem, em resumo: o contrato promessa de cessão da posição contratual é nulo, por vício de forma legal e por falta de reconhecimento presencial das assinaturas; em Agosto de 1998 o Réu BB (1º Réu) declarou prometer vender aos 2ºs Réus uma vivenda sita no Lugar da P..., que seria a edificar num lote do loteamento da P..., cuja construção estaria feita em dois anos, tendo-lhes garantido que o projeto já estava aprovado pela CM; os Réus A... e mulher (2ºs Réus) não leram os documentos que lhes foram dados para assinar, sendo que o Réu A... não sabe ler nem escrever; em Agosto de 1999, estes Réus tiveram conhecimento que a casa que haviam prometido comprar não estava concluída e que, no lote onde a mesma ia ser edificada, se tinha iniciado a construção de um prédio com apartamentos; nessa altura, dirigiram-se a um advogado e então descobriram que tinham assinado dois contratos promessa, com datas diferentes o que nunca lhes fora explicado, bem como tinham assinado um contrato promessa de uma fracção autónoma e não de uma vivenda; também só nessa altura tiveram conhecimento que o prédio só obteve licença de construção da CM em 10 de Dezembro de 1999; os Réus A... e mulher (2ºs Réus), atento o exposto, perderam o interesse em manter a promessa de compra e venda que haviam ajustado e exigiram a devolução do sinal, o que os Réus BB e mulher (1ºs Réus) aceitaram tacitamente; os Réus A... e mulher declararam dar em pagamento, por conta do preço da casa de R…, a sua casa de habitação sita em S….; nenhum dos contratos promessa assinados pelos Réus tem a assinatura reconhecida presencialmente, nem certificação da existência de licença de construção, motivo pelo qual são nulos, tendo sido os Réus BB e mulher (1ºs Réus) que não quiseram ir ao Notário.
Contestando também, dizem os Réus BB e mulher CC (1ºs Réus): os 2ºs Réus prometeram vender aos 1ºs Réus, ou a quem estes indicassem, o prédio identificado (casa de habitação de S.); os 1ºs Réus pagaram integralmente o preço e passaram a usufruir do prédio; acordaram que seriam os 1ºs Réus a marcar a escritura; em 2 de Setembro de 1998 celebraram com o Autor o contrato junto com a contestação, com o qual quiseram transferir definitivamente a sua posição contratual; os 1ºs Réus, ora contestantes, marcaram a escritura e notificaram os 2ºs Réus, os quais não compareceram; os 1ºs Réus cumpriram integralmente com aquilo que contrataram com o Autor.
Na réplica, o Autor referiu que, por lapso, juntou um duplicado que não estava assinado pela cedente e referiu também que os documentos são substancialmente válidos. Pede ainda a condenação dos 2ºs Réus como litigantes de má-fé.
Foi proferida sentença que decidiu julgar a ação parcialmente procedente e, consequentemente: a) - Declarar-se a resolução do contrato de cessão celebrado entre A. e os 1ºs RR (constante do facto provado 3), condenando estes, os RR BB e mulher CC, a restituir ao A. a quantia que este lhes entregou e que consta dos factos provados 16 e 17, ou seja a quantia de 52 373,78€ (cinquenta e dois mil trezentos e setenta e três euros e setenta e oito cêntimos), acrescida de juros desde a data da celebração do contrato de cessão.
-
- Absolver os 1ºs RR do demais pedido; c) - Absolver os RR DD e mulher EE, dos pedidos contra eles formulados.
Inconformados com tal decisão apelaram os 1ºs Réus (BB Inácio e mulher) e o Autor, tendo ambas as apelações sido julgadas procedentes e, em consequência, foi revogada a decisão recorrida que se substitui por outra, declarando-se, nos termos do art.830º do CCivil, em substituição dos Réus DD e EE, que estes vendem a AA, pelo preço de 79 807,66€ (setenta e nove mil oitocentos e sete euros e sessenta e seis cêntimos) uma casa de habitação, constituída por cave, rés-do-chão, 1º andar e águas furtadas, com quintal, sita no Lugar da P..., inscrita na matriz de S., sob o art. …, descrita na CRP de Resende sob o nº … e aí inscrita a favor daqueles sob a cota …, ap. ….
A presente declaração ficará dependente do pagamento por parte do Autor AA do preço ainda não pago de 52 373,78€ (10.500.000$00), a ser comprovado nos autos.
Inconformados com este Aresto, recorreram de revista os Réus EE e DD, apresentando as seguintes conclusões: - A discordância dos recorrentes determinante do recurso insurge-se contra o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, que revogou a decisão proferida em lª instância, julgando procedentes as apelações interpostas pelo A. AA e pelo R. BB, consequentemente, julgou procedente o pedido principal de execução específica formulado na presente acção.
- Esta alteração decisória surgiu na sequência de diferente entendimento quanto à validade dos contratos em mérito na acção, daquele que foi seguido pelo Tribunal de 1ª Instância.
- Centrando-se a questão essencial na apreciação da validade do contrato promessa no caso de falta de reconhecimento presencial das assinaturas, quando o vício resultante da falta de certificação de licença de construção se mostra entretanto sanado.
- Pelo que, o objecto do presente recurso limita-se à reapreciação da validade dos contratos em causa e respectivas consequências.
- No que tange à validade do contrato promessa de compra e venda de 17 de Julho de 1998, pelo qual os primeiros outorgantes (os 1ºs RR.) prometeram comprar a A... e esposa EE (2°s Réus/Recorrentes), uma casa de habitação de cave, rés-do-chão, primeiro andar e águas furtadas, com quintal sita no Lugar da P..., freguesia de S., concelho de Resende, descrita na Conservatória do Registo Predial sob o n°. …, inscrita na respectiva matriz predial urbana sob o artigo … (Ponto 6 dos factos provados), o mesmo foi julgado válido, decisão que deve manter-se, em razão dos RR./Recorrentes figurarem como promitentes vendedores em tal contrato e, como tal, apenas podiam invocar a nulidade no caso de terem sido os 1ºs RR. (promitentes compradores) os culpados pela omissão daqueles mencionados requisitos (nº 3 do art. 410 C.C.).
- Em relação ao contrato promessa de compra e venda, datado de 17 de Agosto de 1998, pelo qual BB e mulher (1ºs RR.) prometem vender aos 2°s RR., uma fracção autónoma destinada a habitação, localizada no lote 9, composta de cave, rés-do-chão, 1 ° andar e sótão, num dos lotes do loteamento da P..., correspondente ao prédio rústico descrito na CRP de Resende sob o n°. … e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo …. (v. Ponto 10 dos factos provados), os 2°s RR., aqui recorrentes, invocaram a nulidade de tal contrato com fundamento na falta de reconhecimento presencial das assinaturas e falta de certificação pelo notário da licença de construção.
- Na apreciação desta situação concreta, o Tribunal de 1ª Instância, chamou à colação, a factualidade dada como provada nos pontos 23 (1 e 2, dada a repetição numérica), 24 e 25, da qual se extrai que o aludido contrato foi elaborado e apresentado pelo 1º R. (construtor civil) e assinado no seu escritório e que o 2° R . marido não o leu, nem sabe ler e a 2° R. mulher não sabe ler correctamente.
- Para tanto, fundou-se o Tribunal de 1ª Instância no regime previsto no n°3 do art.410º do CCivil, segundo o qual, “no caso de promessa relativa à celebração de contrato oneroso de transmissão ou constituição de direito real sobre edifício, ou fracção autónoma dele, já construído, em construção ou a construir, o documento referido no numero anterior deve conter o reconhecimento presencial da assinatura do promitente ou promitentes e a certificação pelo notário, da existência da licença de utilização ou de construção; contudo, o contraente que promete transmitir ou construir só pode invocar a omissão destes requisitos quando a mesma tenha sido culposamente causada pela outra parte.”.
- Neste contrato os 2°s RR. figuram como compradores, motivo pelo qual podem invocar livremente a nulidade deste contrato, uma vez que o mesmo não obedece aos requisitos de forma do art.410 nº3 do CCivil.
- O que os 2°s RR. podiam fazer independentemente de não ter havido culpa do promitente vendedor naquela omissão e mesmo que não tenha existido qualquer responsabilidade por parte do promitente comprador.
- Neste quadro, o Tribunal de 1ª Instância declarou a nulidade do aludido contrato promessa, contudo, tal decisão acabou por ser alterada na sequência dos recursos de apelação entretanto...
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