Acórdão nº 1727/07.1TBSTS-L.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Julho de 2013
Magistrado Responsável | MOREIRA ALVES |
Data da Resolução | 04 de Julho de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Relatório * No Tribunal Cível da Comarca de Santo Tirso, por apenso à insolvência da AA-..., Ld.ª, O Partido BB, intentou a presente acção declarativa, ao abrigo do disposto no Art.º 146º, n.º 1 do CIRE com vista à separação de bens, contra a - Massa Insolvente de AA – ..., Ld.ª, - Credores da massa insolvente e - AA- ..., Ld.ª, peticionando que seja declarado que o A. é dono e legítimo proprietário da fracção identificada no art.º 2º da p.i., que os RR. sejam condenados a tal reconhecerem e a absterem-se de praticar qualquer acto que impeça o exercício do referido direito de propriedade, devendo ser ordenado o cancelamento de qualquer registo ou ónus que incida sobre a dita fracção, designadamente o registo de apreensão para a massa insolvente.
Pede, ainda, que seja declarado que tal fracção não é pertença da massa insolvente, e, portanto, seja dela afastada (separada).
* Alega, em resumo, que há mais de 20 anos que o A. detém na sua posse a aludida fracção, com a convicção de que é o seu legítimo dono, tendo-a adquirido por usucapião.
* Apenas a Massa Insolvente contestou.
* Instruídos os autos, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença final que julgou a acção procedente tendo declarado: - o A. Partido BB - Partido Político, dono e legítimo proprietário do prédio urbano, rés-do-chão direito, lado sul, com a área de 148,85 m2, destinado a comércio, descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o n°. … da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o art.. ...; - Condenou-se os RR. a tal reconhecerem; - Condenou-se os RR. a absterem-se de qualquer acto que impeça o exercício da referida propriedade; - Declarou-se que tal bem não é pertença da massa insolvente e dela se determinou a separação; - Ordenou-se o cancelamento de qualquer registo ou ónus que sobre a fracção incida, em específico o registo de apreensão para a massa insolvente.
* Inconformada recorreu a Ré, Massa Insolvente, suscitando na sua apelação duas questões: -Da insuficiência ou irregularidade da procuração forense junta pelo A.
- Impugnação de diversos pontos de facto tidos por incorrectamente julgados.
* Apreciando a questão prévia da irregularidade do mandato, a Relação emitiu o acórdão de fls. 324/333 de 6/11/2012, ordenando, “para já, a notificação do autor/recorrido nos termos e para os efeitos do disposto no art. 40º, n.º 2 do Código do Processo Civil, devendo o mesmo juntar nova procuração aos autos acompanhada da devida ratificação do processado, sob pena da cominação prevista no citado preceito”.
* Em obediência a tal notificação, veio o A. juntar a procuração de fls, 739, subscrita pelo Secretário-Geral do Partido BB e em sua representação.
* Notificada da junção da referida procuração, veio a recorrente alegar que a procuração continua irregular, porquanto consta de documento particular, e devia, segundo a sua opinião, constar de instrumento público ou documento escrito, assinado pelo referido Secretário-Geral, com reconhecimento presencial da letra e assinatura ou por documento autenticado, designadamente, com o selo branco ou equivalente do Partido BB.
Além disso, não está ratificado o processado anterior.
* A Relação proferiu novo acórdão de 29/1/2013 (fls. 755/774), no qual apreciou a nova questão prévia suscitada pelo recorrente, que julgou improcedente, decidindo considerar sanado o vício de irregularidade ou insuficiência do mandato, atenta a intervenção ora efectuada pelo representante legal do A.
* Passou, de seguida, a apreciar a 2ª questão suscitada na apelação, isto é, reapreciou a prova gravada e documental em relação aos pontos de facto impugnados, tendo alterado algumas das respostas dadas pela 1ª instância, o que determinou a modificação da decisão de mérito.
Assim, decidiu a Relação julgar procedente a apelação e improcedente a acção, revogando, por conseguinte, a sentença recorrida.
* É deste segmento do acórdão que recorre o A., agora de revista para este S.T.J..
* * * * Conclusões * Apresentadas tempestivas alegações, formulou o recorrente as seguintes conclusões: * Conclusões da Revista do A.
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Ao presente processo deve ser aplicado o regime do atual C.P.C, pois é posterior à entrada em vigor do DL n° 303/2007.
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Assim, ao mesmo deve ser aplicado o que dispõem os artigos 865° -A e 865- B do C.P.C.
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Estes impõem sob pena de rejeição que das Conclusões conste: - os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada.
- indicar com exatidão, sob pena de rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, as passagens da gravação em que se funda.
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Salvo todo o respeito, olhando para as Doutas Alegações nada de tal foi cumprido.
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LOGO, ESTAVA O TRIBUNAL DA RELAÇÃO OBRIGADO A REJEITAR O RECURSO, OU PELO MENOS A REJEITAR CONHECER DA ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
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Se aplicado o regime anterior à reforma processual, estava obrigado o Tribunal a reconhecer que a interposição do Recurso foi extemporânea.
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A alteração da matéria de facto ocorreu com base no art° 712°, n.º 2 - in fine do C.P.C., mas tal norma foi incorretamente aplicada.
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Os meios de prova utilizados como suporte da alteração da matéria de facto a tal não podem conduzir, ou seja, nem a escritura de compra e venda, nem o pagamento do condomínio e do IMI a tal podem conduzir.
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Em causa estão os factos que podem conduzir à posse, ao tempo em que a mesma perdura e com que "animus".
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Esses elementos quando confrontados com a Confissão (Depoimento de Parte) e com o depoimento do Eng° CC nunca poderiam conduzir à alteração da matéria de facto.
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Quando a Insolvente iniciou o pagamento do IMI e do condomínio já haviam decorrido mais de vinte anos de posse. L) A alteração da matéria de facto quanto ao IMI (vide 31° do Douto Acórdão) não tem qualquer suporte nos meios de prova.
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A alteração do pagamento do condomínio não tem qualquer suporte em qualquer meio de prova.
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Tal constitui nulidade essencial (falta de fundamentação).
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A alteração da matéria de facto nos termos em que o foi é ILEGÍTIMA e ILEGAL -viola o art° 712º-2 do C.P.C. P) Por outro lado, os elementos de prova utilizados para tal não o possibilitam e até esquecem prova essencial como o Depoimento de Parte.
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A audição do Eng° CC como testemunha constitui nulidade.
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Deve ser o mesmo ouvido como parte e ordenada a repetição do Julgamento para tal.
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O Douto Acórdão é nulo por extravasar o objeto do recurso, nem conter suporte para as alterações ocorridas.
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O douto Acórdão fez errada interpretação do conceito de posse expresso no art° 1251° do C.C..
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Sempre é inconstitucional por violar o art° 202° - 2 da CR..
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Deve ser revogado no seu todo e mantida a Sentença de Primeira Instância.
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Ou, no mínimo, ordenada a repetição do Julgamento.
* Contra-alegou a recorrida, suscitando, desde logo questão prévia da inadmissibilidade do recurso.
* * * * Os Factos * Depois de alterados os pontos de facto tidos por incorrectamente julgados, a Relação fixou a seguinte matéria de facto: * 1º. - No passado dia 23 de Novembro de 2009 foram nos autos de insolvência - n°.1727/07.1 TBSTS abertas propostas para aquisição de vários bens.
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- Entre esses bens está o seguinte: " Prédio urbano, rés-do-chão direito, lado sul com a área de 148, 85m2, destinado a Comércio, descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o n° … da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …, com o valor base de €97.000,00.
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- No acto da abertura das proposta, o A. e para além de ter arguido a nulidade da proposta apresentada, lavrou termo de protesto, no sentido de defender que tal fracção é sua propriedade.
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- No ano de 1984 o Eng. CC, enquanto sócio gerente da R. AA, que havia prometido comprar à DD, Lda. a fracção identificada em 2., autorizou que o Autor passasse a ocupar as respectivas instalações.
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- Fê-lo dizendo "Tomem e é vossa".
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- E as chaves da dita fracção foram entregues ao aqui A.
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- Tudo ocorreu pela voz do então gerente da R. AA, de seu nome Eng. CC, (eliminada a expressão "com poderes para o acto") 8º. - Desde então, o A. utiliza a referida fracção.
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- O A. paga a luz e água que aí é consumida.
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-O A. aí faz reuniões de seus militantes.
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- O A. aí faz conferências.
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- O A. aí recebe convidados. 14°. - Tem instalado os seus serviços Administrativos.
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- Tem na fachada da fracção publicitado o seu nome, ou seja está escrito o nome BB.
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