Acórdão nº 712/00.9JFSB-AC.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Junho de 2013

Magistrado ResponsávelARMÉNIO SOTTOMAYOR
Data da Resolução26 de Junho de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1.

O cidadão AA, actualmente preso à ordem do Processo nº 712/00.9JFLSB do 2º Juízo de Competência Criminal do Tribunal Judicial de Oeiras, veio, representado por advogado, requerer a providência excepcional de habeas corpus, invocando disposto no art. 31º da Constituição da República Portuguesa e no art. 222º do Código de Processo Penal.

Alega o seguinte: 1. No dia 24 de Abril passado, o requerente foi preso à ordem do Tribunal de Oeiras, que considerou que o acórdão condenatório do Tribunal da Relação de Lisboa (de 13JUL10) transitara em julgado "em 19.09.2011", em resultado do trânsito em julgado da Decisão Sumária proferida no Tribunal Constitucional sobre conformidade constitucional da norma que vedava a recorribilidade de tal decisão para o Supremo Tribunal de Justiça, conforme o certificado remetido por este último tribunal em 22SET11.

2. Todavia, a ser assim, não podia ter havido decisões de tribunais superiores, transitadas, posteriores a essa data de 19SET11, decidindo que, nas datas em que foram proferidas, a decisão condenatória não tinha transitado em julgado.

3. Claro que, se por hipótese um tribunal superior tivesse decidido (não em obiter dictum, mas no dispositivo) que na data em que proferia acórdão (vamos supor: 14DEZ11) a decisão condenatória, pretensamente transitada em 19SET11, era modificável, não poderia depois o Tribunal de 1.ª instância entender o contrário, ignorando uma decisão superior.

4. É que uma coisa parece certa: não pode dizer a Ia instância que uma decisão condenatória transitou em Setembro de um ano, quando em Dezembro desse ano a 2.a instância decide que nessa data está pendente de apreciação uma questão de prescrição sobre crimes integrados na decisão condenatória, "consignando-se que tal conhecimento não será afectado pelo trânsito de qualquer Acórdão do Tribunal Constitucional incidente sobre normas alheias a tal questão, que foram oportunamente objecto de impugnação." (sendo que, na data em que tal decisão foi proferida, ainda não era definitivo o Acórdão do Tribunal Constitucional de 110UT11 sobre a conformidade com a Lei Fundamental da norma que fora invocada para denegar ao arguido o julgamento por tribunal de júri).

5. Como é doutrinal e jurisprudencialmente aceite que a pendência de um recurso para o Tribunal Constitucional obsta ao trânsito da decisão condenatória, certamente que, estando em 19SET11 pendente no Tribunal Constitucional um dos dois recursos de constitucionalidade que tinham sido anteriormente interpostos - não de quaisquer normas substantivas invocadas na decisão condenatória, mas de uma das duas questões processuais que podiam ter reflexos na sua estabilidade -, a decisão condenatória não estava obviamente transitada.

6. Como não há razão para considerar que o trânsito da Decisão Sumária sobre a conformidade constitucional da norma que obstava à irrecorribilidade (dentro da ordem dos Tribunais judiciais) da decisão condenatória leva ao trânsito desta, mas o Acórdão (posterior) do mesmo tribunal, sobre a composição do tribunal de julgamento, já não.

7. Deste modo, não pode uma decisão que fixa o trânsito preferir arbitrariamente uma em detrimento da outra. (Aliás, se a ordem de decisão do Tribunal Constitucional tivesse sido inversa, estar-se-ia agora a discutir nas instâncias a razão de dar prioridade ao acórdão em detrimento da decisão sumária...).

8. E seguramente que não pode haver uma decisão posterior à suposta data de trânsito -proferida em recurso interposto pelo Ministério Público a reclamar a imediata prisão do arguido - a impor que não se dê exequibilidade à decisão condenatória enquanto estiverem pendentes, como ainda estão[1], questões de prescrição.

9. Portanto, considerando a decisão que ordenou a emissão de mandado de condução à prisão, até parece não existir: a) a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa no apenso Q.Ll-3 dos presentes autos e datada de 14DEZ11 (onde se decidiu como se transcreveu supra, 4.°), determinando que a decisão que recusara conhecer a "prescrição tempestivamente invocada" devia ser substituída por outra que dela conhecesse, com os seguintes fundamentos (destaques aditados): "Assim sendo, salvo o devido respeito por opinião em contrário, falece a razão ao Tribunal a quo quando quer fazer equivaler o trânsito em julgado do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, que não conheceu sequer o recurso penal que incidia sobre o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, ao trânsito em julgado desde último Acórdão, uma vez que o mesmo foi objecto de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, o qual foi admitido, com efeito suspensivo. Contudo, afigura-se-nos que mesmo que ao referido recurso enviado para o Tribunal Constitucional tivesse sido atribuído efeito meramente devolutivo a decisão condenatória não passaria a definitiva sem que o recurso pendente no Tribunal Constitucional fosse julgado, ou sem que fosse conhecida a prescrição invocada antes do esgotamento dos recursos ordinários (ou de constitucionalidade) e das reclamações sobre a decisão condenatória.

Assim, salvo o devido respeito por opinião em contrário, em face das ocorrências acima descritas e do que anteriormente dito fica, o despacho impugnado de 29SET2011 que não conheceu a questão suscitada da prescrição, partiu do pressuposto que a decisão condenatória nessa data já havia transitado em julgado, quando tal não corresponde à verdade, pela singela razão de que a mesma cai em erro quanto a pressuposto de facto, não se verificando, por isso, qualquer omissão da pronúncia prevista no art. 379. °, n." 1, alínea b) do Código de Processo Penal.

Na verdade, em 29SET201I, se bem vemos, a única decisão condenatória penal existente, ê o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido em 13JUL201Q, exactamente o que alterou a condenação do arguido de 7 (sete) para 2 (dois) anos de prisão efectiva. Ora, essa decisão não transitará enquanto estiverem pendentes recursos ordinários, instaurados durante a pendência do processo, que possam contender com a subsistência dessa decisão condenatória. (...) Em face de tudo que até agora dito fica, facilmente se enxerga que a decisão recorrida ao afirmar a existência de caso julgado impeditiva do conhecimento da excepção de prescrição oportunamente deduzida pelo arguido partiu do pressuposto errado de que a decisão condenatória penal (que é a do Tribunal da Relação de Lisboa) havia transitado em julgado. A propósito da suscitação da prescrição do procedimento criminal tendo o seu não conhecimento sido suscitado durante a pendência do processo (isto ê: antes do trânsito e, portanto, da possível entrada em cumprimento de pena), salvo o devido respeito por opinião em contrário, afigura-se-nos que não podia o Tribunal a quo recusar o seu conhecimento — mesmo que isso não lhe tivesse sido expressamente determinado (como foi) pelo Supremo Tribunal de Justiça. Na verdade, se bem vemos, a simples e atempada invocação da prescrição sempre obstaria à exequibilidade da decisão condenatória," ou b) o acórdão do Tribunal Constitucional de 110UT11, que, na sequência das reclamações apresentadas (uma em 250UT11 quanto à tramitação anterior ao mesmo e outra em 270UT11 quanto ao respectivo teor), até fixou o seu trânsito em 310UT11, ainda que tal decisão só tenha sido notificada ao arguido no dia 7NOV11[2]; muito menos c) o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido nos autos em 24ABR12, em que se negou provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público da decisão de não emissão de mandado de detenção para cumprimento de pena e se escreveu: "os princípios da segurança jurídica inerente ao Estado de Direito (art,2, da Constituição da República Portuguesa), da mínima restrição dos direitos, liberdades e garantias (art. 18, n°2, C.R.P) e da dignidade humana do condenado (arts.l e 30, n°5, da C.R.P.), impõem que não seja reconhecida, no caso concreto, exequibilidade à decisão condenatória já transitada, em relação à pena de prisão, enquanto se puder verificar a condição resolutiva do trânsito em julgado, pela eventual procedência da prescrição invocada" E adiante: "pretendendo-se com a execução da pena de prisão a satisfação das necessidades de prevenção e a reintegração do condenado na sociedade, ê importante que este inicie esse cumprimento sem dúvidas sobre a medida exacta e modo de execução da pena que tem a cumprir, o que não acontecerá enquanto tiver a expectativa de obter a declaração de extinção do procedimento criminal, por prescrição, em relação a crimes cujas penas foram integradas no cúmulo jurídico que fixou a sua pena em dois anos de prisão efectiva," 10. Porque se tais decisões existem, então a 1ª instância não podia ter determinado a emissão de mandado de detenção para cumprimento da pena, seja porque não era ainda competente para determinar a prisão que ordenou (essa competência só lhe adviria após se ter encerrado o conhecimento das questões de prescrição todas entregues à apreciação de Tribunais Superiores), seja porque tal prisão foi motivada, na circunstância, por facto que a lei, no seu conjunto e na sua aplicação prática, não permite (nos termos do artigo 675.°, n.° 2, do C. Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 4.° do C. Processo Penal, perante duas decisões contraditórias transitadas em julgado - como as do Tribunal da Relação de Lisboa de 14DEZ11 e de 24ABR12 {a proferida no recurso interposto pelo arguido}, a primeira negando o trânsito da decisão condenatória em 14DEZ11, a segunda afirmando esse trânsito em 19SET11 - tem de se dar preferência à que primeiro transita, uma vez que versam sobre a mesma questão jurídica).

11. Aliás, o próprio prosseguimento dos autos para conhecimento de questões que não fazem parte da decisão condenatória (que só abrange a determinação dos factos, sua imputação e aplicação da correspondente sanção), mas com possível repercussão naquela (como as questões, ainda...

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