Acórdão nº 994/05.0TBCNT.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Junho de 2013

Magistrado ResponsávelFERNANDES DO VALE
Data da Resolução04 de Junho de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. nº 994/05.0TBCNT.C1.S1[1] (Rel. 118)[2] Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça 1 – AA e BB instauraram, em 11.07.05, na comarca de Cantanhede, acção declarativa de condenação, com processo comum e sob a forma ordinária, contra CC e mulher, DD, e EE e (sua, então, mulher) FF (então, M...), pedindo a condenação solidária dos RR. a pagar-lhes a quantia de € 30 192,23, acrescida dos respectivos juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento e, ainda, de uma sobretaxa de 5%, desde o trânsito em julgado da sentença a proferir.

Fundamentando a respectiva pretensão, alegaram, em resumo e essência: / --- Em Novembro de 2000, iniciaram conversações com o R., CC, com o fim de adquirirem a este e ao co-R., EE e (então) mulher, FF (então, M...) um estabelecimento comercial denominado “S...B...”, situado em F..., pelo preço de Esc. 35 000 000$00, valor a ser pago em diversas quantias escalonadas no tempo; --- Não foi outorgado qualquer contrato-promessa ou escritura pública de trespasse respeitante à aquisição do estabelecimento comercial, mas os AA. pagaram logo Esc. 6 000 000$00 e entraram na posse do estabelecimento, pelo que, desde Novembro de 2000 até 27 de Dezembro do mesmo ano, os AA. fizeram trabalhos de melhoramento no bar, abrindo-o ao público, na última das referidas datas; --- Esta quantia foi recebida pelo R., CC; --- Os RR. nunca providenciaram pela realização do contrato de trespasse, não tendo os AA. possibilidades de o outorgar porque o imóvel onde funcionava o estabelecimento não possuía licença de utilização para, aí, ser instalado um estabelecimento de bar e karaoke; --- Gastaram Esc. 53 000$00 com limpezas e envernizamento de madeiras para beneficiarem a imagem do bar.

Sustentam que o contrato de trespasse do estabelecimento comercial deveria ter sido celebrado por escrito, sob pena de nulidade, pelo que o negócio em causa padece de nulidade por inobservância de forma, daí decorrendo a obrigação dos RR. e RR.-mulheres – estas, porque as actividades comerciais exercidas pelos maridos reverteram em proveito comum dos respectivos casais – restituírem aos AA. o mencionado quantitativo de Esc. 6 000 000$00.

Os RR., CC e mulher, contestaram e deduziram reconvenção, tendo esta sido julgada improcedente, no despacho saneador. No essencial, e no que, ora, interessa, pugnaram pela improcedência da acção e pela condenação dos AA. como litigantes de má fé, alegando que: / --- Os AA. sabiam que o estabelecimento não tinha licença e contrataram sabendo disso mesmo; --- Não eram proprietários do imóvel onde estava instalado o estabelecimento, não sendo, por isso, a eles que competia obter a licença, tendo, apesar disso, tentado obtê-la; --- Os RR. obtiveram a licença de utilização do imóvel e reuniram as condições para a celebração da escritura pública de trespasse, mas os AA. foram protelando a sua marcação e, após terem estado mais de seis meses na exploração do estabelecimento, dirigiram-se ao R.-marido e comunicaram-lhe que já não estavam interessados na celebração da escritura; --- Como eram os AA. a não querer cumprir o contrato, acordaram todos em que nada seria exigido, pelo que, devido ao tempo em que usufruíram do estabelecimento e por terem frustrado a confiança dos RR. na realização do negócio, os AA. perderiam o sinal a favor dos RR.

Os co-RR., EE e FF, não contestaram.

Na réplica, reiteraram os AA. o, anteriormente, alegado, aditando que nunca se recusaram a celebrar a escritura, nem acordaram com os RR. que estes fariam seus os Esc. 6 000 000$00, e contrapondo que o estabelecimento foi mandado encerrar pela GNR, em 24.05.01, por não possuir licença de utilização e alvará, nem licença acidental de recinto e de representação, nos termos dos arts. 3º e 26º do DL nº 315/95, de 28.11.

Prosseguindo os autos a sua tramitação, veio, a final, a ser proferida (em 30.08.11) sentença que, arredando qualquer litigância de má fé e julgando a acção improcedente, absolveu os RR. do pedido: os RR. EE e FF por não terem, de qualquer modo, intervindo, no contrato a que se reportam os autos; e os demais RR., por se ter considerado que os AA. actuam com abuso de direito e que tal actuação os impede de invocar a nulidade do negócio em questão por falta de formalização, por escrito, do contrato de trespasse.

Tendo apelado os AA.

, a Relação de Coimbra, por acórdão de 29.05.12, julgando o recurso, parcialmente, procedente: / I – Revogou a sentença na parte em que absolveu os RR., CC e mulher, DD, do pedido de restituição da quantia de € 29 927,87 (vinte e nove mil novecentos e vinte e sete euros e oitenta e sete cêntimos), mantendo-a quanto à absolvição dos mesmos RR. do pedido de juros e quanto à absolvição do pedido dos RR., EE e FF; e II – Declarando a nulidade do contrato de trespasse do questionado estabelecimento, condenou os RR., CC e mulher, DD, a restituir aos AA. a quantia referida em I antecedente e (condenou) os AA. a restituir àqueles RR. o valor relativo à exploração do mesmo estabelecimento comercial, durante o tempo em que o detiveram, a liquidar nos termos do nº2 do art. 661º do CPC.

Interpõem, agora, revista os AA.

e os RR.

, CC e mulher, visando a revogação do acórdão recorrido, conforme alegações culminadas com a formulação das seguintes e relevantes conclusões: / A) – REVISTA dos AA.

: / 1ª – Perante a factualidade provada, que mostra ter havido execução do contrato, pois houve entrega de parte de prestações contratuais previstas, é de concluir que o contrato foi efectivamente celebrado e não se tratou tão-só de uma promessa de contratar; 2ª – Sucede que tal contrato não observou a forma legalmente prescrita, à data, na lei, pois, como se referiu na sentença e é consensual nos autos , no período que decorreu entre Novembro de 2000 e Maio de 2001, a lei exigia, então, ( embora numa lei sobre o arrendamento urbano) no nº 3 do artigo 115º do RAU, que o trespasse fosse celebrado por escrito, sob pena de nulidade (na redacção do Decreto Lei nº 64-A/2000, de 22 de Abril, que entrou em vigor no dia 1 de Maio de 2000 e substitui a anterior exigência da escritura pública, que constava do mesmo artigo e número ). Não há, pois, dúvidas de que o contrato celebrado e parcialmente cumprido estava ferido de nulidade; 3ª – Declarada a nulidade do contrato de trespasse, considerou-se, no douto Acórdão, que o caminho a seguir era o da restituição de tudo o que foi prestado pelas partes, tendo, porém, excluído a quantia a títulos de juros; 4ª – Daí que a questão que, neste recurso, se coloca seja, exclusivamente, a de saber quais as consequências da nulidade do contrato, ou seja, qual a medida da obrigação de restituir consagrada no artigo 289º do Código Civil; 5ª – À luz deste normativo, não sofre dúvidas que, anulado um contrato ou declarada a sua nulidade, as partes devem restituir, em espécie, ou em valor se aquela não for possível, o que lhes tiver sido prestado, constituindo doutrina e jurisprudência maioritárias as de que, no caso de contrato de trespasse, deve ser feita com base, directamente, no estabelecido no artigo 289º do Código Civil; 6ª – Como dispõe o artº 289º nº 3 do Código Civil "é aplicável em qualquer dos casos previstos nos números anteriores, directamente ou por analogia, o disposto nos artigos 1269º e seguintes". Por sua vez, determina o artº 1270º nº 1 do Código Civil que o possuidor de boa fé faz seus os frutos naturais ou civis percebidos até à data em que souber estar a lesar o direito de outrem. E é doutrina do artº 1271º do Código Civil que, estando o possuidor de má fé, deve restituir os frutos que a coisa produziu até ao termo da posse e responde pelo valor daqueles que um proprietário diligente poderia ter obtido. E diz-se posse de boa-fé aquela em que o possuidor, ao adquirir a posse, ignorava lesar o direito de outrem; 7ª –...

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