Acórdão nº 226/11.1TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Junho de 2013
Magistrado Responsável | ALVES VELHO |
Data da Resolução | 04 de Junho de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. - AA e BB intentaram acção declarativa contra CC peticionando a condenação deste a repor a quantia de 666.666,00€, equivalente a dois terços do valor debitado na conta bancária que identificam, ou a pagá-la aos AA., acrescida de juros legais a partir da citação.
Fundamentando a pretensão, alegaram que são, conjuntamente com o R., titulares, sem destrinça de partes, de uma conta bancária, que identificam, para a qual convergem valores monetários que se encontram convertidos em aplicações financeiras, conta que pode ser movimentada ou pelas assinaturas conjuntas dos AA. ou pela assinatura do Réu. O valor depositado na referida conta presume-se pertencer conjuntamente a todos os titulares, mas o Réu mandou debitar nela 1 000 000,00€, para uma conta de que nenhum dos AA. é titular, movimento bancário que é abusivo, no que respeita a 2/3, montante pertencente aos AA..
O Réu contestou.
Alegou, ao que importa referir, que todos os valores monetários movimentados na referida conta provêm de rendimentos próprios e exclusivos seus, razão pela qual se estabeleceu que o mesmo tinha o poder de a movimentar apenas com a sua assinatura e os AA. nunca a movimentaram.
Replicaram os AA., esclarecendo que a conta é alimentada por um conjunto de aplicações financeiras especiais, através da subscrição de um produto financeiro estruturado intitulado e do tipo banca-seguros, subscrição essa feita pelos AA. e pelo R., que tem como beneficiários últimos os seis netos do Réu e corresponde a uma verdadeira doação feita por este, em que os juros ou resultados financeiros da aplicação eram creditados regularmente na conta, utilizada pelo R. e também pelo A. BB.
Após completa tramitação do processo, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou o R. a restituir aos AA. a quantia de 500.000,00 euros, acrescida de juros à taxa de 4% e à taxa legal que sucessivamente vigorar, desde a data da citação, até integral e efectivo pagamento.
O R. apelou, com total sucesso, pois o Tribunal da Relação, revogando a decisão recorrida, absolveu-o do pedido formulado pelos AA..
Agora são os Autores que impugnam o acórdão, defendendo que “deve a decisão recorrida ser considerada nula e ilegal e por isso revogada, decidindo-se como na 1ª Instância, condenando-se o Réu nos termos naquela definidos”.
Para tanto, argumentam nas conclusões da respectiva alegação: “1ª. A decisão sob recurso indeferiu a modificabilidade da matéria de facto e decidiu de modo diametralmente oposto à sentença da 1ª Instância; 2ª. A decisão de 1ª Instância era nula, por oposição ou contradição entre a matéria de facto e a decisão, o que a Relação a quo não decidiu Ou, 3ª. A decisão ora sob recurso é nula por contradição entre a matéria de facto e a decisão, o que se tem assim por evidente e por evidenciado; 4ª. Os recorrentes beneficiam a seu favor da presunção do artigo 516° do C. Civil, que o recorrido não logrou afastar; 5ª. O recorrido não provou, como se propunha, que i) a conta foi aberta só por si em momento anterior; ii) os recorrentes só se tornaram co-titulares em momento posterior; iii) o 1 milhão de euros debitados pelo recorrido em Abril de 2009 foi gerado por juros ou rendimentos provenientes de aplicações financeiras feitas em Janeiro de 2005, na conta in casu; iv) o recorrido nada alegou quanto à titularidade ou propriedade sua e exclusiva sobre o valor de 1 milhão de euros debitado em Abril de 2009 e aqui posto em causa.
Consequentemente, 6ª. O recorrido não logrou afastar a presunção legal do artigo 516°, como a decisão de 1ª Instância bem decidiu; 7ª. O Douto Tribunal a quo decidiu de modo inadequado e abusivo estribando-se ilegalmente em matéria avulsa e que não integrou a matéria de facto provada, o que merece forte censura; 8ª. O Douto Tribunal a quo, através da decisão impugnada, desrespeitou o princípio do dispositivo, ex vi do art. 264°, o princípio da estabilidade da instância, ex vi do artigo 268°, o princípio da distribuição do ónus da prova, ex vi dos artigos 516° e 519°, ambos e os anteriores do C.P. Civil, bem como a estatuído no artigo 344° do C. Civil, e o princípio da igualdade das partes consagrado no art. 3°-A, do C.P. Civil; Consequentemente, 9ª. A decisão in casu é manifestamente ilegal; Acresce que, 10ª. Da matéria de facto provada resulta que o recorrente BB movimentava a conta a crédito, o que conduz à aplicação da presunção do artigo 516° do C. Civil; 11ª. A decisão recorrida é por isso ilegal, desrespeitou o estatuído no artigo 516° do C. Civil e está em manifesta contradição com a matéria de facto provada, o que a torna nula, ex vi do disposto no artigo 668°, n° 1, alínea c), do C. Processo Civil”.
O Recorrido defendeu a improcedência do recurso.
2. - Do conteúdo das conclusões transcritas resultam colocadas, para resolução, as seguintes questões: - se o acórdão é nulo, por contradição entre os fundamentos e a decisão; - se o acórdão impugnado utilizou matéria não articulada, tida por assente ou objecto de respostas à base instrutória, extraindo ilações indevidas, violando os princípios do dispositivo, da estabilidade da instância, da distribuição do ónus da prova e da igualdade das partes (arts. 264º, 268º, 516º, 519º e 3º-A, todos do CPC, e art. 344º C. Civil); e, - se, por figurarem como co-titulares, conjuntamente com o Réu, da conta bancária à ordem identificada no processo, os Autores devem ser reconhecidos como titulares de um direito de crédito correspondente a metade do valor do respectivo saldo, ao abrigo da presunção estabelecida pelo art. 516º do código Civil. 3. - Vem assente o quadro factual que segue.
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Está domiciliada no Banco DD, SA, uma conta com o NIB …, com os seguintes titulares: CC, BB e AA. (al. A)).
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A referida conta é movimentada com a assinatura de CC ou com a assinatura, em conjunto, de BB e AA, (al. B) e resp. 1º e 2° da BI).
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A 17 de Abril de 2009, a referida conta foi objecto de um movimento a débito que consistiu na transferência de € 1.000.000,00 para a conta n.º …, também domiciliada no DD, ficando na mesma o saldo de € 188.608,30. (al. C)).
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A ordem de transferência foi assinada pelo Réu. (al. D)).
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A conta n.º … (alínea C)) não tem como titular nenhum dos AA. (al. D)).
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O A. AA nunca movimentou a conta referida em A), a crédito ou a débito. (resp. 3º da BI).
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Os extractos da conta eram recebidos pelo Réu. (resp. 4º).
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A 3 de Janeiro de 2005, CC, na qualidade de “tomador de seguro” e BB, na qualidade de “segurado”, subscreveram o instrumento junto por cópia a fls. 147-151, denominado “Proposta de Subscrição - ES Private Obrigações 2ª Série - Código do produto -87.31 - Contrato n.º … - n.º de conta …”, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido, constando como beneficiários em vida o tomador do seguro e em caso de morte EE, FF. (resp. 6º, 7º e 5º).
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A 3 de Janeiro de 2005, CC, na qualidade de “tomador de seguro” e AA, na qualidade de “segurado”, subscreveram o instrumento junto por cópia a fls. 152-156, denominado “Proposta de Subscrição - ES Private Obrigações 2ª Série - Código do produto -87.31 - Contrato n.º … - n.º de conta ….”, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido, constando como beneficiários em vida o tomador do seguro e em caso de morte GG, HH, II e JJ. (resp. 6º, 7º e 5º da BI).
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As aplicações financeiras...
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