Acórdão nº 201/1995.2.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelGONÇALVES ROCHA
Data da Resolução22 de Maio de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1--- AA foi vítima dum acidente de trabalho, ocorrido em 16 de Outubro de 1994, em consequência do qual veio a ser instaurado o presente processo especial, por participação da sinistrada ao Tribunal do Trabalho do Funchal efectuada em 29/6/95.

E tendo este processo seguido o seu curso, em tentativa de conciliação realizada em 24 de Março de 1998, a Companhia de Seguros BB, SA, e a entidade empregadora, CC, Ldª, obrigaram-se a pagar à sinistrada uma pensão anual de 185.814$00, sendo 159.429$00 da responsabilidade da Seguradora e 26.386$00 da responsabilidade da entidade patronal, em virtude de ter ficado afectada duma IPP de 40%, desde 11 de Setembro de 1995, vindo a responsabilidade desta última a ser assumida pelo FAT.

. Para tanto, acordaram as entidades responsáveis em que a sinistrada havia sido vítima dum acidente de trabalho, ocorrido no dia 16 de Outubro de 1994, e que consistiu em ter dado uma queda quando se encontrava a limpar o chão sob a autoridade, direcção e fiscalização da sua entidade patronal, ao serviço de quem exercia as funções de ajudante de cozinheira, mediante a remuneração mensal de 52.000$00 x 14 e cuja responsabilidade emergente de acidentes de trabalho se encontrava transferida para a Seguradora limitada à retribuição de 52.000$00 x 12.

Este acordo foi homologado em 23 de Abril de 1998, tendo a aludida pensão sido alvo de actualizações até que foi remida.

Em 7 de Maio de 2010, a sinistrada solicitou a realização de exame de revisão, requerimento que foi indeferido por decisão proferida em 17 de Maio de 2010.

E em 17 de Janeiro de 2012, a sinistrada apresentou novo requerimento de exame de revisão, tendo sobre o mesmo recaído, em 27 de Janeiro de 2012, o seguinte despacho[1]: “ Importa referir que, atenta a data da ocorrência do acidente de trabalho, é aplicável o disposto na Base XXII, nº 2 da Lei nº 2 127, de 03/08/65, que refere “ a revisão só poderá ser requerida dentro dos dez anos posteriores à data da fixação da pensão (...)” Compulsados os autos verifica-se que por sentença homologatória proferida em 23.04.98, foi fixada à sinistrada a pensão que lhe era devida em virtude da IPP que a afectava de 40%.

Pese embora esteja ultrapassado o limite temporal firmado pelo legislador, o certo é que, já na vigência da Lei nº 100/98, de 13/09, que revogou aquela lei mas reproduziu praticamente no seu artº 25º a norma da Base XXII, o Tribunal Constitucional no seu acórdão nº 147/06, foi confrontado directamente com a compatibilidade da referida norma com o direito dos trabalhadores à justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho ou doença profissional, consagrado no artº 59º, 1, al.f), da CRP, tendo julgado inconstitucional. (vide, Ac. da Rel. de Lisboa, de 16/03/2011, em www.dgsi.pt) A doutrina também se pronunciou a propósito deste prazo preclusivo, considerando Carlos Alegre, Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, regime jurídico anotado-2ª ed, p.129 que “ seria de todo justo e vantajoso que, em futura alteração da lei, se eliminasse qualquer prazo limite para a possibilidade de revisão”.

Um outro motivo de ponderação para permitir a reavaliação da incapacidade para as situações anteriores à data da entrada em vigor da Lei 98/09, de 4/09, focado no Ac. da Rel. de Lisboa de 02.02.2011, prende-se com a alteração introduzida nesta última lei, que veio acabar com o limite dos 10 anos para que as vítimas de acidente de trabalho possam requerer e obter as revisões das suas prestações.

Assim, face a esta alteração legislativa e à anterior jurisprudência do tribunal constitucional e aos argumentos doutrinários, subscrevemos o entendimento explanado nos acórdãos citados, e reapreciada a questão, entendemos adoptar entendimento diverso do exarado no despacho de fls.179.

Ao abrigo do disposto no artº 145º, nº2 do Cód. Proc. Trabalho e atendendo aos fundamentos do pedido ora deduzido, admito o incidente de revisão de incapacidade, assim como o(s) quesito(s) que o acompanha. Cfr: artº 25º, nºs 1 e 2 da Lei nº 100/97, de 13/09.

Para a realização de exame médico ao(à) sinistrado(a), designo o próximo dia 9 de Fevereiro, pelas 14h:00m. Cfr: artº 145º, nº1 do Cód. Proc. Trabalho.

Solicite ao Gabinete médico-legal com competência na área desta comarca a indicação de perito para realizar o exame médico, o qual terá lugar nas instalações deste Tribunal, conforme acordado com o Sr. Director daquele gabinete, nos termos do artº 22º, da Lei nº 45/04, de 19/08.

Notifique, sendo a parte contrária para, querendo, pronunciar-se sobre o objecto da perícia, aderindo a este ou propondo a sua ampliação ou restrição”.

Em 9 de Fevereiro de 2012, realizou-se exame médico singular[2] que reputou a sinistrada afectada de IPATH, com uma desvalorização de 40%.

Notificada do respectivo resultado, e inconformada com a supracitada decisão que deferira a realização do exame de revisão da incapacidade da sinistrada, recorreu a seguradora deste despacho, tendo a Relação de Lisboa, através de decisão singular do relator, confirmado o despacho recorrido.

No entanto, vindo a seguradora requerer que, ao abrigo do artigo 700º, nº 3 do CPC, sobre a matéria recaísse acórdão, manteve aquele Tribunal a decisão recorrida, não dando provimento ao recurso.

E não se conformando com este acórdão, dele agravou a Seguradora, tendo rematado a sua alegação com as seguintes conclusões: 1ª) A situação de facto configurada nos autos mostra que a incapacidade foi inicialmente fixada em 23/04/1998, por acidente de trabalho ocorrido em 16/10/1994.

  1. ) Desde então, apenas em 07/05/2010 veio a ser requerido um exame de revisão por alegado agravamento.

  2. ) Nos termos do n° 2 da Base XXII da L 2127, aplicável ao caso dos autos, a revisão só poderá ser requerida dentro dos dez anos posteriores à data da fixação da pensão e poderá ser requerida uma vez em cada semestre, nos dois primeiros anos, e uma vez por ano, nos anos imediatos.

  3. ) O Tribunal Constitucional, pelo Acórdão n° 147/2006, julgou inconstitucional, por violação do direito do trabalhador à justa reparação, consagrada no art. 59°, n°1, al. f) da Constituição, o norma do n°2 da Base XXII da Lei n° 2127, de 3 de Agosto de 1965, interpretada no sentido de consagrar um prazo absolutamente preclusivo de 10 anos, contados a partir da data da fixação inicial da pensão, para a revisão da pensão ao sinistrado por acidente de trabalho, com fundamento em agravamento superveniente das lesões sofridas, nos casos em que desde a fixação inicial da pensão e o termo desse prazo de 10 anos tenham ocorrido actualizações da pensão, por se ter dado como provado o agravamento das lesões sofridas pelo sinistrado.

  4. ) O tribunal a quo, indiferente a este juízo de inconstitucionalidade, veio entender que, na situação dos autos, como que passou a existir um direito constitucional do sinistrado de pedir a revisão independentemente de qualquer prazo, decidindo que a norma da Base XXII (tal como o art° 25° da Lei 100/97) deve ser entendida como se nenhum prazo ali estivesse estabelecido.

  5. ) Tal entendimento, porém, não encontra acolhimento na jurisprudência do Tribunal Constitucional, nem em significativa jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, merecendo até a falta de apoio doutrinário, como se verá. Efectivamente, 7ª) Haverá que distinguir quando o sinistrado requeira diversos exames de revisão nos primeiros 10 anos sobre a data da fixação inicial da incapacidade, e fazendo aplicação da Base XXII, n° 2, de acordo com a interpretação do TC, possa prosseguir, após o termo desses 10 anos, no requerimento de novos exames de revisão (como se não houvesse qualquer prazo), daquelas outras situações em que o sinistrado nunca requereu exame de revisão, no prazo inicial de 10 anos, ou em qualquer caso, esteve depois mais de dez anos (no caso, cerca de 12 anos) sem formular um pedido de revisão.

  6. ) O prazo de 10 anos é suficientemente alargado para que um hipotético agravamento de uma lesão possa manifestar-se, podendo e devendo o interessado exercer os seus direitos sem deixar expirar tal prazo de 10 anos sobre a data da fixação inicial da incapacidade ou, posteriormente, sobre a data em que ocorrer a sua revisão.

  7. ) Se a interessada não exerceu tal direito durante mais de 12 anos, tal inércia só pode, pelo menos, indiciar uma estabilidade e consolidação da sua situação clínica.

  8. ) Tal indício reforça-se com a «verificação da experiência médica quotidiana de que os agravamentos como as melhorias têm uma maior incidência nos primeiros tempos (daí a fixação dos dois anos em que é possível requerer mais revisões), decaindo até decorrer um maior lapso de tempo (que o legislador fixou generosamente em dez anos)» (CARLOS ALEGRE, Regime Jurídico dos Acidentes de Trabalho e das Doenças Profissionais, Coimbra, 2000, pág. 128)».

    Com efeito, 11ª) «A lei fixa um prazo suficientemente dilatado, que, segundo a normalidade das coisas, permitirá considerar como consolidado o juízo sobre o grau de desvalorização funcional do sinistrado, e que, além do mais, se mostra justificado por razões de segurança jurídica, tendo em conta que estamos na presença de um processo especial de efectivação de responsabilidade civil dotado de especiais exigências na protecção dos trabalhadores sinistrados E, nesse condicionalismo, é de entender que essa exigência se não mostra excessiva ou intolerável em termos de poder considerar-se que afronta o princípio...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT