Acórdão nº 7439/10.1T2SNT.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelSÉRGIO POÇAS
Data da Resolução15 de Maio de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. Relatório AA e BB instauraram acção declarativa sob a forma de processo ordinário contra CC Lda e DD, SA pedindo: a) que se declare resolvido o contrato-promessa por incumprimento definitivo imputável à Ia Ré; b) que se reconheça aos AA o direito de retenção sobre o imóvel objecto do contrato-promessa, correspondente à fracção autónoma que iria corresponder ao 2° C, como direito real de garantia e até integral pagamento da indemnização pedida em b) c) que se condene a Ia R. no pagamento de indemnização aos AA, nos termos do n° 2 do art. 442° do Código Civil, no valor total de 53.814,46 €; caso assim não se entenda, d) que se condene a Ia R. no pagamento aos AA do montante de 56.000 € correspondente ao dobro daquilo que por estes foi prestado a título de sinal e reforço de sinal.

Mais pediram a condenação da Ia R. no pagamento das despesas não documentadas e honorários com o patrocínio da presente acção em valor não inferior a 3.500 €. Alegaram, em síntese: - celebraram com a Ia R., em 19/10/2005, um contrato-promessa de compra e venda de uma fracção autónoma de um prédio ainda em construção pelo preço de 230.000 €; - a título de sinal e princípio de pagamento entregaram à Ia R. tendo-lhe entregue a quantia total de 28.000 €; - a Ia R. entregou-lhes a chave; - ficou acordado que o prazo para a outorga da escritura de compra e venda seria no final do mês de Janeiro de 2006; - até à data acordada não foi realizada a escritura de compra e venda em virtude de não estar reunida a documentação necessária para o efeito, nomeadamente a licença de utilização e o título de constituição em propriedade horizontal; - após diversas interpelações para que cumprisse, os AA fixaram à Ia R. um prazo de 8 dias para celebrar a escritura, o que esta não fez, pelo que resolveram o contrato-promessa por carta de 30/10/2007; - à data do incumprimento definitivo (30/10/2007) a fracção prometida vender tinha valor não inferior a 250.000 Euros O R. EE SA, - anteriormente DD, SA - contestou, pugnando pela improcedência da acção, tendo invocado, em resumo: - desconhece se foi celebrado o alegado contrato-promessa, impugnando a autoria das assinaturas que dele constam; - os AA não invocaram a prática de quaisquer actos materiais sobre o imóvel, necessários para a existência do direito de retenção; - a alegada falta de marcação da escritura, pela Ia Ré, não consubstancia, só por si, mora; - o contrato-promessa não está definitivamente incumprido.

A R. CC Lda contestou, pugnando pela improcedência da acção e deduziu reconvenção, alegando, em síntese: - a data para a realização da escritura era uma previsão pois o prédio estava em construção; - houve atraso nos trabalhos de urbanização, os quais eram da responsabilidade de outra sociedade, e a CM da Amadora decidiu não emitir licenças de utilização enquanto não estivessem concluídos; - não incumpriu o contrato-promessa; - a Ia R. possui o alvará de utilização para o prédio em questão desde 21/12/2007; - os AA possuem a chave da fracção há mais de 5 anos e desde a emissão da licença de utilização para a realização da escritura, há quase 3 anos, o que corresponde a um valor anual de 7.800 €, pelo que devem ser condenados a pagar-lhe a quantia de 39.000 € correspondente a cinco anos acrescida do valor correspondente a cada mês vincendo em que retenham a chave do imóvel.

Os AA replicaram contestando a reconvenção e concluindo como na petição inicial.

Realizada audiência de discussão e julgamento e dadas as respostas à base instrutória, foi proferida sentença que julgou improcedentes a acção e a reconvenção.

Inconformados, apelaram os AA para o Tribunal da Relação de Lisboa.

Neste Tribunal foi decidido: Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente a apelação e em consequência: a) declara-se resolvido o contrato-promessa por incumprimento definitivo imputável à recorrida CC Lda; b) condena-se a recorrida CC Lda a pagar aos recorrentes a indemnização no valor total de 48.000 €; c) reconhece-se aos recorrentes o direito de retenção sobre a fracção autónoma a que se refere o contrato-promessa até integral pagamento da indemnização referida em b); d) d) absolve-se a recorrida CC Lda do mais que era pedido.

Inconformados, recorrem agora para o STJ a Ré CC e o EE Sa Conclui a ré CC:

  1. No douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa foram decididas favoravelmente duas questões: -que a 1ª R. incumpriu definitivamente o contrato promessa; -que os AA. procederam validamente à resolução do contrato promessa, têm direito a ser indemnizados e gozam de direito de retenção.

    B)Assim não entende a R., ora Recorrente, como se passa a explicar.

    C)Na cláusula 4ª do contrato-promessa assinado entre as Partes litigantes consta que «A escritura de compra e venda está prevista para o final do mês de Janeiro de 2006, desde que obtida toda a documentação, por parte da Primeira Outorgante, considerada necessária pelo Cartório Notarial», que à Recorrente CC (Primeira Outorgante) «para o efeito, notificará os Segundos Outorgantes com aviso prévio de 8 (oito) dias através de carta registada com aviso de recepção.» D)E ainda que «Se a escritura não se realizar até ao final do mês de Janeiro de 2006 por causa imputável à Primeira Outorgante, os custos em que o banco dos Segundos Outorgantes solicitarem para o prorrogação do empréstimo n° (...) serão suportados pela Segunda Outorgante.» E)Observando os princípios que regem a interpretação da declaração negocial e de acordo com o disposto no n° 1 do art. 236° do Código Civil «A declaração negocial vale com o sentido que um declaratório normal, colocado na posição do real declaratório, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contra com ele».

    F)Conforme se verifica, a escritura de compra e venda ficou prevista para um período temporal (final do mês de Janeiro de 2006) sob condição - desde que obtida toda a documentação por parte da ora Recorrente.

    • Não foi estipulada data certa.

    •A realização da escritura estava sujeita a um facto exterior ao contrato e à vontade das Partes (documentação necessária pelo Cartório Notarial).

    • Cabendo à Primeira Outorgante, ora Recorrente, notificar os AA. para a escritura (quando a documentação estivesse pronta).

    G)Pelo exposto, o prazo estabelecido pelas Partes no contrato promessa de compra e venda para a realização de escritura não é um prazo absoluto. Como bem descreveu a Mma Juiz da 1ª Instância "não é um prazo absoluto no sentido de permitir concluir que, ultrapassado o mesmo, os AA. perderiam o interesse na prestação "(vide douta sentença afls ...).

  2. Aliás, a alinea b) da cláusula 4ª do contrato promessa ainda estipula que se a escritura não se realizar até ao final do mês de Janeiro de 2006, os custos com o banco dos AA. para prorrogação do empréstimo, serão suportados pela então 1ª R. e Recorrida e ora Recorrente: •A não verificação da condição estipulada acarretaria para a ora Recorrente o pagamento das despesas bancárias; •A cláusula penal estabelecida pelas Partes para o atraso na realização da escritura pública foi um pagamento por parte da Recorrente, e não uma indemnização ou o desejo de resolução contratual ou da restituição do sinal em dobro.

  3. No caso concreto, emerge a obrigação para a então 1ª R. e ora Recorrente de vender e a obrigação para os então AA. e ora Recorridos de comprar (obrigações sinalagmáticas). E face à lei, no caso de incumprimento do contrato promessa, é possível ao contraente não faltoso a execução especifica (art. 830° C. Civil), havendo simples mora; ou a resolução contratual, havendo incumprimento definitivo.

  4. Atendendo-se que a mora do devedor é o atraso culposo no cumprimento da obrigação, quando por causa que lhe seja imputável, não realiza a prestação no tempo devido (continuando a prestação a ser possível); e que o incumprimento definitivo verifica-se quando o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação, ou esta não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor e considera-se não cumprida a obrigação.

  5. Pelo exposto, não concorda a Recorrente com a posição defendida no Douto Acórdão proferido a fls..., que "a promitente vendedora constitui-se em mora no final do mês de Janeiro de 2006".

  6. A promitente-vendedora não incorreu nessa data em incumprimento definitivo, isto porque os outorgantes não quiseram atribuir natureza absoluta ao prazo fixado, como decorre claramente do facto de terem estipulado uma penalidade diversa no caso de atraso àquela imputável.

  7. Por outro lado, o contrato-promessa em apreço não contém qualquer cláusula resolutiva e dos factos provados não resulta algum comportamento da promitente-vendedora que possa ser interpretado como recusa de cumprimento, o que, a verificar-se equivaleria a incumprimento definitivo.

  8. No caso concreto, não se pode entender que para os então AA. já não tinha utilidade a celebração do contrato prometido após Janeiro de 2006. Aliás, resulta da sua carta de 20/03/2007 que nessa data ainda tinham interesse no contrato, apesar de terem declarado que «Findo o prazo ora conferido, perderemos qualquer interesse nessa prestação».

  9. Entende-se que a carta de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT