Acórdão nº 7860/06.0TBCSC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelGREGÓRIO SILVA JESUS
Data da Resolução15 de Maio de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Recurso de revista nº 7860//06.0TBCSC.L1.S1[1] Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I - RELATÓRIO AA, Lda, com sede na Rua …, Bloco … – Loja – ..., intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra BB, Lda, com sede na Avª …, nº …, …, ..., pedindo a declaração de nulidade do contrato de concessão de licença de exploração de marca e de insígnia de estabelecimento, por ser simulado e de nenhum efeito, com fundamento na ocorrência dos vícios da vontade daqueles que então o outorgaram quer em representação da autora, quer em representação da ré.

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Alegou, para tanto e em síntese, que é titular de um estabelecimento de restauração, que já teve o nome de A… Café, e que no dia 28/11/2005 foi celebrado um contrato promessa de cessão da totalidade das quotas da sociedade autora, sendo as promitentes cessionárias suas actuais sócias e, no mesmo dia 28/11/2005, sem o conhecimento dessas promitentes cessionárias, a ré e a sociedade autora, ambas representadas por anteriores sócios da autora, promitentes cedentes das quotas da autora no contrato promessa, celebraram um contrato denominado “concessão de licença de exploração de marca e de insígnia de estabelecimento”, em que a ré declarou ser titular da marca Alkimia e da insígnia de estabelecimento A… Café e concedeu à autora licença para explorá-las, mediante o pagamento de uma retribuição, o que vinculou a autora apenas formalmente, por não ser essa a sua vontade real, em virtude de não ser a vontade das promitentes cessionárias das quotas da autora, a quem foi dito que o nome de A… Café pertencia à ré e que apenas fora assinado um documento para esta dar autorização para a sua utilização, mas nada lhes tendo sido dito sobre as obrigações contraídas nesse contrato pela autora.

Mais alegou que uma das promitentes cessionárias entrou na posse do estabelecimento logo em 1/12/2005 e que a escritura do contrato definitivo de cessão de quotas veio a ser outorgada em 13/01/2006, sem que aí fosse feita qualquer referência ao contrato de concessão de licença de exploração de marca e de insígnia e sem que as cessionárias tivessem consciência de que existia a obrigação de pagar uma contrapartida para além do preço da cessão das quotas e do valor das obras que aí efectuaram, o que aconteceu até Junho de 2006, altura em que a ré os surpreendeu exigindo-lhes o cumprimento do contrato de concessão de licença de exploração da marca e insígnia, tendo então a autora comunicado à ré que não reconhecia este contrato, não o aceitando e alterando o nome do estabelecimento de A… Café para K… Café, mas continuando a ré a exigir-lhes a quantia de 45.384,90€ que não é devida, pois os representantes da autora e da ré agiram de má fé ao celebrar esse contrato, pelo que as circunstâncias que rodearam tal celebração integram a figura do abuso de direito e a tentativa de enriquecimento sem causa.

A ré contestou alegando, em síntese, que as cessionárias promitentes do contrato promessa de cessão das quotas da autora sempre tiveram conhecimento do contrato de concessão de licença de exploração da marca e insígnia de estabelecimento, tal como vem expressamente declarado no artigo 6o do contrato promessa e como demonstra o facto de a autora ter vindo a cumprir outras cláusulas do referido contrato de concessão de licença de exploração.

Em reconvenção, alegou estarem em dívida as prestações relativas a sete meses de contrato, calculadas de acordo com os critérios do mesmo, no valor global de 5.294,90€, bem como a indemnização por não cumprimento também prevista no contrato, no montante de 40.000,00€.

Concluiu pedindo a improcedência da acção com a absolvição do pedido, e a procedência da reconvenção com a condenação da autora a pagar-lhe a quantia de 5.294,90€ acrescida de juros vencidos de 399,30€ e a quantia de 40.090,00€, ambas acrescidas ainda de juros vincendos, e também a pagar multa e indemnização no valor de 2.500,00€ como litigante de má fé.

A autora replicou impugnando os factos alegados na contestação, concluindo pela improcedência dos pedidos reconvencional e de litigância de má fé.

Foi proferido despacho julgando a petição inicial inepta e absolvendo a ré da instância, mas dirimida esta questão pelo Acórdão da Relação de Lisboa de 22/01/08 (fls. 184/195), dando provimento ao agravo interposto e revogando aquela decisão, ordenando se formulasse convite à autora para apresentar nova petição inicial aperfeiçoada, seguiu-se a apresentação de novos articulados após o que foi admitida a reconvenção, saneado e condensado o processo (fls. 305/320).

Realizada audiência de discussão e julgamento (cf. respostas à matéria controvertida a fls. 471/477), foi proferida sentença que julgou improcedente a acção, absolvendo a ré do pedido, e procedente a reconvenção condenando a autora a pagar à ré as quantias de 5.294,90€ e de 40.090,00€, a título de indemnização pelo incumprimento do contrato, acrescidas de juros, sendo a primeira desde Agosto de 2006 e a segunda deste a citação, tudo até integral pagamento, mas absolvendo-a do pedido de litigância de má fé (fls. 478/499).

Inconformada, a autora apelou da sentença, sem êxito, porquanto a Relação de Lisboa, no seu Acórdão de 13/09/12, por unanimidade, confirmou a decisão de mérito da 1.ª Instância (cf. fls. 536/559).

Mantendo a sua discordância, a autora interpõe, agora, recurso de revista, para este Supremo Tribunal, concluindo, assim, as suas alegações: 1ª - Os fundamentos deste recurso radicam no erro de interpretação e aplicação da lei substantiva e de determinação da norma aplicável e na violação e errada aplicação da lei de processo ( art°. 722°, n° 1, ais. a) e b), n° 2 e n° 3 do CPC).

  1. - O presente põe em crise os pontos II (alteração da matéria de facto) III (Validade do contrato ...) e IV ( validade do contrato .... ) do " Enquadramento jurídico " do acórdão recorrido; 3ª - Quanto à 1ª questão, a que respeitam os pontos II, e III do “ Enquadramento Jurídico” do acórdão recorrido, este materializa total omissão de pronúncia porque, a argumentação apresentada na motivação da apelação (na parte que é possível invocar perante esse STJ - a parte documental) está fundamentada nos documentos juntos aos autos ( objecto de minuciosa análise ) e demonstra à exaustão que o contrato de concessão de licença de exploração de marca e de insígnia é totalmente simulado 4ª - A análise aos documentos efectuada nos n°s 8 e 9 do corpo desta revista, maxime a conjugação das datas de elaboração dos mesmos (fls 17, 27 e 29) e a data de constituição da R (v. fls. 422 a 425) conjugados entre si, permitem, sem margem para dúvidas, compreender, o como, quando e porquê da negociação, quem realizou a negociação, a vontade das partes, as circunstâncias que rodearam, incluindo espaciais - casa dos sócios CC e DD - a assinatura dos contratos, etc etc ) 5ª - Outros aspectos caracterizadores da actuação dolosa destes dois indivíduos, ora agindo como representantes da recorrente ora da recorrida nos contratos referidos na conclusão anterior, são os seguintes: a) residem na mesma morada (v. fls. 86), a outra sócia; b) mãe do primeiro, EE, reside com ambos (v. fls 300, 423 e 426); 6ª - O acórdão recorrido estriba-se em argumentos formalistas e não cumpriu com a obrigação de funcionar como 2ª instância de recurso na apreciação das provas indicadas pela recorrente que impunham a alteração à matéria de facto proposta por esta.

  2. - Verificando-se esta circunstância, o acórdão padece do vício de omissão de pronúncia, vício que acarreta a sua nulidade, o que se argui para todos os efeitos legais.

  3. - A Relação de Lisboa, nesta parte, deverá ser convocada a agir na função de garante do duplo grau de jurisdição, analisando de forma critica e relacional todas as provas invocadas pela recorrente no sentido de demonstrar que o contrato de concessão de licença de exploração de marca e de insígnia é totalmente simulado.

  4. - Quanto ao ponto IV do " Enquadramento Jurídico " do acórdão recorrido, as normas convocadas pelo acórdão recorrido e a correspondente interpretação e aplicação das mesmas não têm aplicação no caso concreto.

  5. - A Sentença proferida pelo Tribunal de Cascais, ao julgar procedente o pedido reconvencional deduzido pela recorrida contra a recorrente, assentou num falso pressuposto: o de que o " contrato de concessão de licença de exploração e de insígnia de estabelecimento" de fls. 27 é válido quanto ao seu objecto.

  6. -O pedido reconvencional tem a sua fonte (art°s 41 e ss da Contestação-Reconvenção) exclusivamente no " contrato de concessão de licença de exploração de marca e de insígnia de estabelecimento", de f ls 27 e ss.

  7. - A Relação de Lisboa, ao abrigo dos artigos 713°, n° 2 e 659°, n° 3 do CPC e face aos documentos de fls 398 e 410, considerou como provado que: “a insígnia de estabelecimento n° ... e a marca nacional n° ... estão ambas registadas em nome de CC." 13ª - A recorrida não tem legitimidade para exercitar os direitos versados na Reconvenção porque não é a titular dos direitos identificados no n° 1 do referido contrato (v. fls 398 a 417).

  8. - ao caso dos autos não é de aplicar o “ instituto do levantamento da personalidade jurídica da sociedade” porque a recorrida não alegou qualquer factualidade caracterizadora do mesmo e durante o julgamento nada a este respeito ficou, sequer indiciariamente, provado.

  9. - A teoria defendida na Sentença proferida pelo Tribunal de Cascais e avalizada pelo acórdão recorrido - verdade judicial relativa - pode ter algum cabimento numa situação de tentativa de reconstituição dos factos controvertidos ( embora o esforço do legislador desde o ido ano de 1995 venha sendo no sentido da descoberta da verdade material para a boa decisão da causa ) ... jamais numa situação em que o registo demonstra a verdade sobre a titularidade do direito controvertido.

  10. - Há, pois, óbvio erro de julgamento gerador de nulidade do acórdão recorrido porque se mantém a contradição entre os factos...

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