Acórdão nº 5674/05.3TBBCL.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Maio de 2013
Magistrado Responsável | ÁLVARO RODRIGUES |
Data da Resolução | 15 de Maio de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA RELATÓRIO AA, por si e na qualidade de cabeça-de-casal da herança aberta por óbito de BB, veio intentar a presente acção com processo comum, na forma ordinária, contra CC, DD e mulher EE, FF, GG e marido HH, II e marido JJ, KK, LL e mulher MM, NN e mulher OO, PP e QQ, todos em nome próprio e na qualidade de herdeiros e interessados na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de RR, onde conclui pedindo a condenação dos réus a: – Reconhecerem que a autora é herdeira e interessada na herança ilíquida e indivisa por óbito de BB; – Reconhecerem que os prédios identificados no artigo 14.º da petição inicial fazem parte do acervo dessa herança, sendo, por isso, a autora e essa herança legítimas proprietárias desses prédios; – Restituírem os prédios em causa à autora e à citada herança no mesmo estado em que se encontravam antes de serem por eles ocupados; – Absterem-se da prática de qualquer acto lesivo dos direitos de propriedade da autora e da referida herança, nomeadamente abstendo-se de ocupar, fruir ou cultivar tais prédios.
–Pedem ainda se ordene o cancelamento de quaisquer registos efectuados em contrário do peticionado.
A autora fundamenta as suas pretensões no facto de o seu falecido marido, BB, ter adquirido os prédios identificados no artigo 14.º alíneas a) a e) da petição inicial, por compra aos herdeiros de SS, sendo que, de qualquer modo, sempre os teria adquirido por usucapião, sucedendo que o réu CC e a sua falecida esposa, RR, passaram a arrogar-se titulares de 11/40 da propriedade dos prédios em questão e ocupam esses prédios, recusando a sua entrega à autora e à herança que esta representa.
Os Réus contestaram, arguindo a sua ilegitimidade, uma vez que a acção não foi proposta contra todos os herdeiros da falecida RR, tendo sido preterida a sua filha TT, bem como a ilegitimidade passiva das rés FF e KK, defendendo que as mesmas, mulheres dos filhos pré-falecidos do réu CC e de RR, não são herdeiras por direito de representação da herança aberta por óbito da referida RR, invocando a ineficácia jurídica do documento junto com a petição inicial para transmitir a propriedade e posse que o dito SS tivesse tido sobre os bens imóveis situados em Portugal, acrescentado que o casal formado pela autora e pelo seu falecido marido nunca exerceu quaisquer actos de posse sobre o prédio misto constituído pelos prédios identificados nas alíneas a) e c) do artigo 14.º da petição inicial, e por impugnação, negando parcialmente os factos alegados pela autora, e deduziram reconvenção, pedindo:
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A condenação da autora/reconvinda a reconhecer que os réus/reconvintes são donos e legítimos possuidores do prédio misto identificado no artigo 10.º da contestação; b) Para a hipótese de lhes ser reconhecido o direito de propriedade apenas sobre 11/40 indivisos de tal prédio, procedendo a acção quanto aos restantes 29/40 indivisos, a condenação da autora/reconvinda a pagar-lhes a quantia de €14.537,63 pela quota parte (29/40) que lhe cabe nas despesas feitas com as benfeitorias identificadas nos artºs. 38º, 39º, 40º e 42º da contestação, declarando-se, ainda, que gozam de direito de retenção relativamente à dita fracção de 29/40 do dito prédio misto enquanto não lhes for satisfeito esse seu crédito.
Fundamentaram a pretensão referida em a) na aquisição derivada, por via de compra, quanto a 11/40 do referido prédio, encontrando-se essa aquisição registada a favor do réu CC, e na aquisição originária, por usucapião, quanto à totalidade desse mesmo prédio, argumentando, em síntese, que, para além das 11/40 partes indivisas adquiridas por compra, que o réu CC registou a seu favor, a partir de 1964, ou seja, decorridos cerca de 20 anos sobre a data da morte de SS, sem que nunca ninguém se tivesse habilitado como herdeiro ou reclamado a herança dos bens existentes em Portugal, tendo constado que teriam falecido, sem deixar descendência, todos os seus filhos, o réu CC e mulher passaram a comportar-se como se fossem donos de todo o prédio, usando e fruindo os restante 29/40 em nome próprio, em oposição a quaisquer herdeiros do falecido SS, o que foi do conhecimento do público em geral, do genro dele e dos seus sobrinhos, entre eles a autora.
Sustentaram a pretensão referida em b) no facto de o casal formado pelo réu CC e mulher ter efectuado obras de reconstrução da casa existente no prédio misto e ter construído um anexo para vacaria, no que esse casal despendeu a quantia de 4.000.000$00.
A autora replicou, arguindo a prescrição do direito de crédito invocado pelos réus/reconvintes, pugnando pela improcedência da reconvenção e deduzindo o incidente de intervenção principal provocada de TT, filha do réu CC e da falecida RR.
Os réus treplicaram, concluindo como na contestação.
O incidente de intervenção principal provocada deduzido pela autora foi admitido e a interveniente, citada, declarou fazer seus os articulados dos réus/reconvintes.
Foi elaborado despacho saneador, onde se decidiu ser a ré FF parte ilegítima, sendo relegada a apreciação da ilegitimidade da ré KK para sentença final, onde se decidiu ser a mesma parte ilegítima.
Realizou-se julgamento e foi proferida sentença onde se decidiu julgar a acção e a reconvenção parcialmente procedentes e, em consequência, o Tribunal: - declarou que a autora é herdeira e interessada na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de BB, condenando os réus a reconhecerem esse estatuto da autora; - declarou que o casal formado pela autora e pelo referido BB adquiriu o direito de propriedade sobre os prédios rústicos inscritos na respectiva matriz predial sob os artºs.
438º, 2224º e 865º, melhor identificados nas alíneas j), l) e m) dos factos provados, e que, dissolvido esse casamento por óbito do cônjuge marido, a autora tem o direito a participar na metade do activo da comunhão, encontrando-se o direito à restante metade atribuído à herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de BB, condenando os réus a reconhecerem esse direito da autora e da referida herança; - declarou que o casal formado pelo réu CC e por RR adquiriu o direito de propriedade sobre 11/40 dos prédios (o urbano inscrito na respectiva matriz predial sob o art. 130 e o rústico inscrito na respectiva matriz predial sob o art. 839.º, melhor identificados nas alíneas n) e o) dos factos provados) que formam a unidade predial referida na alínea u) dos factos provados e que, dissolvido esse casamento por óbito da cônjuge mulher, o réu CC (entretanto falecido e substituído na causa pelos co-réus e interveniente identificados no apenso A) tem o direito a participar na metade do activo da comunhão, encontrando-se o direito à restante metade atribuído à herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de RR, condenando a autora/reconvinda a reconhecer esse direito do réu e da referida herança; - absolveu os Réus do demais peticionado pela autora; - absolveu a Autora/reconvinda do demais peticionado pelos réus/reconvintes.
Inconformada com a decisão, veio a autora AA interpor, sem sucesso, recurso de Apelação para o Tribunal da Relação de Guimarães que, negando procedência ao mesmo, confirmou integralmente a douta decisão recorrida.
Ainda inconformada, a mesma veio interpor recurso de Revista para este Supremo Tribunal de Justiça, rematando as suas alegações, com as seguintes: CONCLUSÕES
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A Recorrente/Autora entende que a escritura de cessão de direitos hereditários melhor descrita na alínea q.) dos Factos Assentes, lhe permite suceder na posse dos seus anteriores proprietários/possuidores transmitentes, designadamente do falecido SS, também conhecido por SS e respectivos herdeiros, senão vejamos.
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Os prédios aqui em questão encontram-se inscritos na matriz predial sob os artºs. 130° (urbano) e 839° (rústico), nos termos melhor descritos nos itens n) e o), u) e v) dos Factos Provados C) Dos itens u) e v) dos Factos Provados, resulta que os Réus são proprietários de apenas 11/40 dos prédios em questão (artºs. 130°- urbano e 839°- rústico).
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Na presente acção, os Réus invocaram também ter adquirido por usucapião a propriedade sobre as restantes 29/40 partes indivisas desses mesmos prédios aqui em questão, não tendo o Tribunal lhes reconhecido tal direito, por considerar que os mesmos não lograram inverter o título da sua posse, não possibilitando esta a aquisição, por usucapião, da propriedade exclusiva sobre o dito prédio misto.
E) Tal significa, juntamente com as alíneas z) e aa) dos Factos Provados, que os restantes 29/40 desses mesmos prédios (artºs. 130°- urbano e 839°- rústico) eram propriedade do falecido SS. Aliás, são os próprios Réus que reconhecem expressamente isso nos artºs. 10° e 11° da sua Contestação, a fls. ... dos autos, facto que também foi reconhecido pela douta sentença proferida em 1ª Instância quando refere: "(-) Ou seja, nenhuma das partes põe em causa esse direito do falecido SS sobre tais prédios....
Dito isto, resultou provado que a herança de SS era constituída, além do mais, por 29/40 partes indivisas da unidade predial formada pelo prédio urbano inscrito na respectiva matriz predial sob o art. 130 e pelo prédio rústico inscrito na respectiva matriz predial sob o art. 839. (...)" E mais à frente, a mesma sentença conclui "Resulta dos factos provados que, aquando da inscrição no registo da aquisição do direito de propriedade sobre 11/40 do prédio misto em causa a favor do réu CC, o referido SS (ou melhor dizendo a sua herança) era titular de 29/40 do direito de propriedade sobre esse prédio." F) Ora, pela escritura mencionada no item q) dos Factos Provados, outorgada no Brasil e de acordo com a lei brasileira, foi concretizada a habilitação dos herdeiros de SS e, nessa qualidade de seus únicos herdeiros, cederam todos os bens situados em Portugal, transferindo todos os direitos, acção e posse que até essa data tinham e exerciam sobre esses imóveis, a BB (marido da aqui Autora), neles se incluindo obviamente os 29/40 dos prédios aqui em questão.
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