Acórdão nº 2424/07.3TBVCD.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Abril de 2013

Magistrado ResponsávelSILVA GONÇALVES
Data da Resolução24 de Abril de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, “AA, L.da”, com sede no............, Torre ..., ..., Apartado ......, Vila das Aves, Santo Tirso, instaurou acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra BB e CC, residentes na Rua 00, 00, 000, 0000e, Vila do Conde, “DD, L.da”, com a actual designação de “EE, L.da”, com sede no Armazém ..., EN ...,...., ...., Vila Nova de Gaia, e “FF S.A.”, com sede na Rua ...............,...., ..., Lisboa, pedindo a declaração de nulidade, por simulação, do “contrato de trespasse” referido no artigo 39.º da petição inicial; a declaração de validade do negócio dissimulado por esse contrato, ou seja, a compra e venda referida no artigo 34.º da petição inicial, pelo preço de 623.500,00 euros, e, se assim se não entender, a anulação do contrato de trespasse em virtude de erro na declaração do representante da autora que o firmou, caso desse contrato resulte a responsabilização da autora pela dívida da 2.ª ré para com a 3.ª ré pelo crédito desta, exigido na acção com processo ordinário nº 586/07.9TVLSB, da 3.ª secção da 15.ª Vara Civil de Lisboa. Alegou, em síntese, que o contrato de trespasse celebrado entre a autora e a 2.ª ré se encontra eivado de simulação relativa já que, tendo sido vontade de ambas as partes, respectivamente, comprar e vender o prédio identificado no artigo 19.º da petição inicial, ocultaram esse objectivo com a aparência de uma compra e venda, pelo preço declarado de 125.000,00 euros e, de um trespasse, pelo preço declarado de 400.000,00 euros, ficando o preço efectivamente pago. Nem a autora quis comprar o prédio por 125.000,00, nem a 2.ª ré o quis vender por esse preço, mas sim por 623.500,00 euros; nem a autora quis trespassar o estabelecimento da ré, nem por ele pagou qualquer preço, nem esta lho quis trespassar. Defendeu ainda que, em todo o caso, aquele contrato de trespasse sempre estaria ferido de anulabilidade, se porventura dele resultasse a assunção pela autora da dívida da 2.ª ré para com a 3.ª ré, já que o representante da autora estava convencido que, ao assinar tal contrato, dele não resultava a assunção de qualquer responsabilidade por dívidas da 2.ª ré.

Citada, veio a ré “ - FF, S.A.” contestar, defendendo-se por excepção ao invocar a ineptidão da petição inicial, alegando existir contradição entre o pedido e a causa de pedir. Por impugnação defendeu, em síntese, resultar claramente das cláusulas contratuais acordadas pela autora, que a mesma assumiu a dívida da 2.ª ré para com a 3.ª ré, não sendo crível o desconhecimento da dívida, tendo em conta que a autora é uma parceira privilegiada da Petrogal, sócia maioritária da 3.ª ré. Além de que a presente acção mais não é que uma contestação, dissimulada, da acção que foi instaurada contra a autora pela 3.ª ré, entrando agora em contradição com a posição por si assumida nessa dita acção. Assinalou à autora litigância de má fé, pedindo a sua condenação em indemnização não inferior a 5.000,00 euros. Concluiu pela sua absolvição da instância, por ineptidão da petição inicial e, assim não sendo, pela improcedência da acção.

Contestaram os demais réus, defendendo que celebraram com a autora o contrato de trespasse em causa, com a assunção da parte dela de pagar a dívida à FF, cujo montante foi considerado para fixação do preço do trespasse. Não houve qualquer simulação ou divergência de vontades. Afirmaram que o que pretende a autora é livrar-se do crédito que a ré FF tem sobre ela. Defenderam a sua condenação com litigante de má fé.

Replicou a autora, concluindo como na petição inicial.

Dispensada a realização da audiência preliminar, foi proferido despacho saneador com declaração de improcedência da arguida excepção de ineptidão da petição inicial.

Seleccionada a factualidade assente e elaborada a base instrutória, com reclamação que não foi atendida, teve julgar a audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo. O Tribunal respondeu à matéria de facto vertida na base instrutória, sem reclamação.

A autora e a ré FF produziram alegações sobre o aspecto jurídico da causa.

A “FF” recorreu do despacho que admitiu o depoimento da testemunha GG, arrolada pela autora, e, ainda, agravou do despacho que admitiu o Sr. Dr. HH a depor.

A FF recorreu também do despacho que indeferiu o seu requerimento para que a autora juntasse diversa documentação, mas não manifestou interesse na sua apreciação recursiva.

Decidida a matéria de facto sem reclamação, foi prolatada a sentença com o seguinte dispositivo: “em conformidade com o exposto, decide-se julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, declarar anulado o contrato de trespasse celebrado entre autora e 2.ª ré, aludido na alínea A) dos Factos Provados, caso desse contrato resulte a responsabilização da autora pela dívida da 2.ª ré para com a 3.ª ré pelo crédito desta, exigido na acção com processo ordinário n.º 586/07.9TVLSB, da 3.ª secção da 15.ª Vara Civil de Lisboa. Absolver os réus do demais pedido”.

Inconformada com esta sentença, dela apelou a ré “FF S.A.” para a Relação do Porto que, por acórdão de 23.10.2012 (cfr. fls. 943 a 1000), negou provimento aos dois agravos interpostos pela ré “FF S.A.” e, julgando procedente a apelação, declarou a improcedência da acção com a consequente absolvição do pedido da ré “FF S.A.”.

Irresignada, recorre agora para este Supremo Tribunal a autora “AA, L.da”, apresentando as seguintes conclusões: 1.ª - O único ponto onde há divergência entre as duas instâncias jurisdicionais é no que concerne à possibilidade do tribunal a quo decidir da forma como o fez, ou seja, declarar anulado o trespasse celebrado entre a autora e a 2.ª ré caso desse contrato resulte a responsabilidade da autora pela dívida da 2.ª ré para com a 3a ré pelo crédito desta, exigido na ação com processo ordinário n° 586/07.9TVLSB, da 3.ª secção da 15.ª Vara Civil de Lisboa; 2.ª - Ora, salvaguardando o devido respeito, a recorrente distancia-se, neste aspeto, da interpretação e aplicação legal que o douto acórdão faz desta questão jurídica, entendendo que o pedido por si formulado e a decisão proferida pelo digníssimo tribunal a quo, em conformidade com tal pedido, não ofende qualquer princípio ou norma vigente no direito constituído português, como melhor demonstraremos infra; 3.ª - Resulta, de forma expressa, dos autos que a presente ação ficou a dever-se ao facto de a ré "FF", ora recorrida, ter intentado uma ação judicial contra a aqui autora/recorrente (e também contra a 2.ª ré) exigindo-lhe o pagamento do crédito que entende ter sobre a 2.ª ré, com o argumento de que, ao celebrar o contrato de trespasse de fls. 30 dos autos, a autora assumira a responsabilidade por esse pagamento; 4.ª - Para impedir tal desiderato - e porque nada deve à ré "FF" -, a autora entendeu agir por via da ação (sem prejuízo de contestar veemente a ação contra si intentada pela ré "FF") e deduzir, subsidiariamente, o pedido de que: "seja declarado anulado o referido contrato de trespasse em virtude de erro na declaração do representante da autora que o firmou, caso desse contrato resulte a responsabilização da 2.ª ré para com a 3.ª ré pelo crédito desta exigida na ação com processo ordinário n° 586/07.9JVLSB, da 3.ª secção da 15.ª Vara Civil de Lisboa"; 5.ª - Ambas as instâncias entenderam, e bem, que resultou provado que a autora não quis assumir a dívida da 2.ª ré à 3.ª ré, o que esta sabia, pelo que se se entendesse que do contrato de trespasse celebrado entre a autora e a 2.ª ré poderia resultar tal assunção, encontrar-se-iam verificados os requisitos para funcionamento do erro-vício, anulando-se o negócio; Com efeito, 6.ª - O pedido de anulação in totum do contrato de trespasse, sem a devida salvaguarda da interpretação que viesse a resultar da respetiva cláusula 4.ª, destruiria, de forma injustificada e irreversível, um contrato de assinaláveis reflexos financeiros, com os inconvenientes daí resultantes; 7.ª - Afigura-se-nos, por isso, que o tribunal a quo (de primeira instância) não só decidiu bem, como tal decisão nada tem de ilegal ou de atentatório aos princípios do iure constituto; No entanto, 8.ª - Entendeu-se no douto acórdão de que ora se recorre que se "trata de uma...

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