Acórdão nº 08B1926 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelSANTOS BERNARDINO
Data da Resolução09 de Outubro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. AA e mulher BB intentaram, em 14.01.2005, pelo 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial da comarca de Viana do Castelo, contra CC e mulher DD e EE, acção com processo ordinário, pedindo - se declare ter o réu CC denunciado ilegalmente o contrato de cessão de exploração a seguir aludido; - se declare ter o dito réu violado culposa e unilateralmente o mesmo contrato; e, em consequência, se condenem os réus a pagar aos autores as seguintes quantias: - de € 18.578,88, a título de prestações vincendas desde o dia 1 de Janeiro de 2005 até ao termo do dito contrato (31 de Janeiro de 2009), acrescidas essas prestações de juros legais desde a data do respectivo vencimento até integral pagamento; - de € 50.000,00, acrescida de juros legais desde a citação até integral pagamento, a título de prejuízos resultantes da perda total do valor locativo e de trespasse do estabelecimento objecto do contrato, em consequência do desvio ilícito da clientela deste para outro estabelecimento construído e aberto pelo réu CC; - de € 5.000,00, também com juros legais desde a citação, a título de danos morais.

    Alegaram para o efeito, em súmula, que são donos de um estabelecimento comercial, denominado "Talho .....", cuja exploração cederam, por contrato escrito de 15.01.2002, ao primeiro réu, para vigorar entre 01.02.2002 e 31.01.2009. Entre o clausulado do contrato constava que, no caso de o negócio vir a ter problemas de rentabilidade, o cessionário podia entregar a exploração do negócio ao cedente, com pré-aviso não inferior a 60 dias, ficando, todavia, obrigado a pagar as rendas que se vencessem até ao final do ano em que essa entrega se viesse a verificar.

    Mas, apesar dos autores terem cumprido com todas as obrigações contratuais para com o 1º réu, o estabelecimento foi por este encerrado ao público em 06.11.2004, assim permanecendo desde então, sendo certo que, por carta de 08.09.2004, o réu CC comunicou ao autor que "pretendia entregar o estabelecimento comercial em 31 de Dezembro de 2004, cessando assim o contrato de cessão de exploração", vindo mais tarde, em 17.12.2004, a entregar-lhe as chaves do estabelecimento.

    A actuação do réu foi determinada pelo facto de ter passado a explorar um outro estabelecimento de talho, a cerca de 300 metros, para o qual canalizou toda a clientela daquele que vinha explorando, nada tendo a ver, pois, com a rentabilidade deste, sendo, por isso, ilegal a denúncia do contrato.

    Viram, assim, os autores o seu estabelecimento fechado desde a data acima indicada, o que lhes causou aborrecimentos, transtornos e incómodos.

    No contrato de cessão de exploração aludido, o réu EE interveio como fiador do réu CC, "assumindo a obrigação de principal pagador".

    Os primeiros réus contestaram, alegando, em síntese, que o negócio gerou, desde o início, prejuízos, que quantificam, e que foi em consequência dessa falta de rentabilidade que o réu, escudado na cláusula contratual já aludida, denunciou o contrato. Quanto ao novo estabelecimento aberto pelo demandado, trata-se de um supermercado, que nada tem a ver com o talho do autor, não existindo qualquer relação entre a clientela deste e a do supermercado, que tem uma área de 600 m2 e comercializa mais de 4.000 produtos diferentes.

    Acrescentaram que o réu fez, com autorização do autor, várias obras de melhoramento das instalações, que lhe aumentaram o valor em, pelo menos, € 2.340,51.

    Concluíram, assim, pela improcedência da acção, pedindo, em reconvenção, que os autores sejam condenados a pagar-lhes esta mencionada importância.

    Seguiu-se a réplica dos autores - defendendo, além do mais, a improcedência da reconvenção - e os demais trâmites processuais, vindo, a final, a efectuar-se a audiência de julgamento e a ser proferida sentença, que julgou a acção improcedente, absolvendo os réus do pedido, e parcialmente procedente a reconvenção, condenando os autores a pagar aos réus CC e mulher o montante de € 1.690,52, acrescido de juros à taxa legal aplicável às obrigações civis, desde a notificação do pedido reconvencional até integral pagamento.

    Apelaram os autores; e a Relação de Guimarães, em acórdão oportunamente proferido, julgou a apelação parcialmente procedente e, revogando em parte a sentença recorrida, condenou os réus no pagamento aos autores dos montantes de € 18.578,88, referente às prestações devidas e não pagas a partir de Dezembro de 2004 até ao fim do contrato, acrescido de juros legais desde o vencimento de cada prestação e até ao seu integral pagamento, e de € 5.000,00, a título de danos morais, acrescido dos juros legais desde a citação, mantendo, no mais, a sentença recorrida.

    Inconformados ficaram, agora, os réus CC e mulher, que reagiram interpondo, do aludido acórdão, o pertinente recurso de revista.

    Nas respectivas alegações, os recorrentes formulam, em síntese, as seguintes conclusões: 1ª - O acórdão recorrido considerou ilícita a resolução do contrato de cessão de exploração por entender que não foram invocados os factos concretos integradores do fundamento de rescisão previsto na cláusula 8ª do dito contrato: a falta de rentabilidade do estabelecimento; 2ª - Mas esta cláusula, constituindo, fundamentalmente, um direito potestativo do cessionário, uma sua protecção, não exige que este invoque os factos concretos, a concreta motivação que integra tal falta de rentabilidade; 3ª - Se fosse exigível que o réu indicasse todos os factos concretos justificativos da falta de rentabilidade do negócio, como condição do exercício do seu direito de resolução, tal exercício seria praticamente impossível, porque o autor poderia sempre impugnar esses factos; 4ª - A operada declaração de resolução cumpriu a mencionada cláusula 8ª do contrato; 5ª - Os factos alegados, vertidos nos quesitos 15º, 16º, 17º e 22º da base instrutória, e que resultaram provados, constituem demonstração irrefutável de que, quando o recorrente enviou ao autor as declarações de resolução do contrato, a exploração do negócio tinha problemas de falta de rentabilidade; 6ª - A condenação dos réus a pagar aos autores a quantia de € 5.000,00 assentou no pressuposto de ser ilícita a resolução do contrato; todavia, a actuação do recorrente não reveste qualquer ilicitude; 7ª - Basta atentar nas respostas aos quesitos 18º e 19º da base instrutória para se concluir que não se verificam os pressupostos para atribuição da indemnização fixada; 8ª - E não é possível cumular o pedido de indemnização por danos morais com o pedido relativo à resolução do contrato; 9ª - O acórdão recorrido violou, nomeadamente, os arts. 432º/1 e 483º do Cód. Civil.

    Em contra-alegações, o autor pugna pela improcedência do recurso.

    Foram corridos os vistos legais, cumprindo agora decidir.

  2. Vêm, das instâncias, provados os factos seguintes: 1 - Por contrato celebrado em 15.01.2002, os autores cederam ao réu CC a exploração de um estabelecimento comercial de talho, denominado "Talho ....l", de que são donos, situado no r/c do prédio urbano sito no lugar de ------, n.º.. Santa Maria de Geraz do Lima - Viana do Castelo; 2 - A cessão de exploração foi feita por sete anos, com início em 01.02.2002 e termo em 31.01.2009; 3 - A cessão foi feita pelo preço de € 29.240,72, a pagar nas seguintes 84 prestações mensais e sucessivas, cada uma delas acrescida de IVA de 17%: - 12 prestações mensais de € 299,28 no 1º ano do contrato; - 12 prestações mensais de € 314,25 no 2º ano; - 12 prestações mensais de € 329,96 no 3º ano; - 12 prestações mensais de € 346,46 no 4º ano; - 12 prestações mensais de € 363,77 no 5º ano; - 12 prestações mensais de € 381,96 no 6º ano; - 12 prestações mensais de € 401,06 no 7º ano; 4 - Estipulou-se na cláusula 8ª do contrato que, se o negócio viesse a dar problemas de rentabilidade, o réu poderia entregar a exploração do negócio aos autores, ficando obrigado, no entanto, a pagar as rendas que se vencessem até ao final do ano em que essa entrega se viesse a verificar, e a avisar os autores com antecedência mínima de 60 dias; 5 - O réu EE subscreveu o contrato como fiador; 6 - A partir de 01.02.2002 o réu CC passou a explorar o referido estabelecimento de talho, fazendo seus os lucros da exploração; 7 - A pedido do réu CC, os autores requereram na Câmara Municipal de Viana do Castelo um averbamento ao alvará de licenciamento do estabelecimento para autorização de venda de produtos de leite e derivados à base de leite, ovos e ovoprodutos, produtos transformados ou derivados de frutos e hortícolas, condimentos e especiarias; 8 - Por despacho de 12.12.2002, a Câmara Municipal de Viana do Castelo emitiu o referido averbamento ao alvará e, a partir daquela data, o réu CC passou a vender ao público, no estabelecimento, para além de carnes, também os produtos referidos no n.º 7; 9 - Por carta de 08.09.2004, o réu CC comunicou ao autor que pretendia entregar o estabelecimento comercial em 31.12.2004 e que cessava naquela data o contrato de cessão de exploração; 10 - O autor respondeu por carta enviada ao réu CC em 19.10.2004, dizendo que o contrato terminava apenas em 31.01.2009 e que o incumprimento do contrato implicava o pagamento das prestações vincendas até ao final deste e dos prejuízos causados; 11 - Na mesma data, o autor enviou uma carta ao réu EE, na qual lhe dava conhecimento da intenção do réu CC de fazer cessar o contrato; 12 - O réu CC enviou ao autor uma carta datada de 21.10.2004, na qual reiterou a entrega do estabelecimento no final do mês de...

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