Acórdão nº 5548/09.9TVLSNB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Abril de 2013
Magistrado Responsável | ABRANTES GERALDES |
Data da Resolução | 11 de Abril de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – L.
intentou acção declarativa com processo ordinário contra BANCO E.
e A.
pedindo a sua condenação solidária no pagamento da indemnização de € 274.633,74 por danos materiais, € 100.000,00 por danos morais, juros de mora e sanção pecuniária compulsória no valor de € 50,00 por cada dia de atraso no levantamento das penhoras efectuadas, a partir do dia em que o Tribunal despache esse levantamento.
Alegou que o R. B. lhe moveu uma acção executiva, na qual a R. A. foi nomeada agente de execução. Para suspender os termos desta execução, o A. prestou caução que o Tribunal veio a admitir, sendo por isso ordenada a suspensão da instância executiva.
Por despacho subsequente foi ordenado o prosseguimento da execução, mas tal despacho foi alterado, sendo retomada a suspensão da instância, do que os RR. tiveram conhecimento.
Não obstante essa suspensão, a R. A., sob pressão do R. B. efectuou várias penhoras de bens da sua propriedade, de onde resultou ter-se frustrado a venda de um dos prédios e a impossibilidade de venda de outros, assim como a impossibilidade de utilizar um tractor agrícola e consequente necessidade de recorrer aos serviços de terceiros, com perda de lucros e de rendimentos.
Além disso, o conhecimento das penhoras por terceiros afectou a sua reputação, bom nome e crédito pessoais, tendo sido causa de imenso desgosto e revolta.
A R. A. defendeu-se por impugnação, refutando a existência de uma relação de comissão entre ela e o co-R. e afirmando que nunca recebeu a notificação do despacho que confirmou a suspensão da instância executiva. Acrescentou que, firmada no despacho que ordenara o prosseguimento da execução e na sequência de solicitações insistentes do exequente, retomou as diligências de penhora, sendo que, assim que tomou conhecimento do lapso verificado, requereu de imediato o levantamento das penhoras efectuadas.
Concluiu que o seu comportamento se pautou pela boa fé e que o mesmo não contém os requisitos de ilicitude e culpa necessários à sua responsabilização nos termos do art. 483° do CC.
Por seu turno, o R. B. defendeu-se por impugnação, sustentando que não tem qualquer responsabilidade pelas penhoras efectuadas, refutando a veracidade dos danos alegados.
Efectuado o julgamento, foi proferida sentença que considerando aplicável ao caso o regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado, regulado pelo Dec. Lei n.º 48.051, de 21-11-67, absolveu ambos os RR. do pedido, tendo em conta que apenas existira culpa leve.
O A. apelou da sentença e a Relação, aplicando ao caso o regime geral da responsabilidade civil extracontratual, manteve a absolvição do R. B. e condenou a R. A. no pagamento da quantia de € 30.000,00 por danos patrimoniais e de € 10.000,00 a título de danos não patrimoniais, acrescido de juros à taxa legal, até integral pagamento.
A 1ª R. A. interpôs recurso de revista em que concluiu:
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O solicitador de execução é um agente provido de autoridade pública, de força coerciva que lhe é delegada pelo Estado, sem embargo de manter a sua essência ou natureza primeira de profissional liberal, sendo que a força pública de que é dotado para o exercício das suas funções faz dele algo mais do que um mero mandatário para a prática de actos jurídicos.
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A jurisprudência dos tribunais superiores tem, maioritariamente, vindo a considerar o solicitador de execução como um "auxiliar da justiça", repudiando a atribuição ao mesmo da qualidade de mandatário do exequente (cfr. entre outros, Acs. da Rel. de Lisboa de 20-09-09 e 17-02-11 e Ac. da Rel. do Porto de 25-10-10).
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Aos actos lesivos praticados pelo solicitador de execução é aplicável o regime da responsabilidade extracontratual do Estado (in casu o regime do Dec. Lei n.° 48.051 de 21-11-1967) e não o regime da responsabilidade civil previsto no art. 483° do CC.
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Ao decidir pela aplicação do regime da responsabilidade civil previsto no art. 483° do CC, em detrimento do regime da responsabilidade extracontratual do Estado, o acórdão em crise fez uma errónea interpretação das normas legais aplicáveis.
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Deve ser concedido total provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se o acórdão recorrido, substituindo-o por outro que, ponderadas as normas de direito aplicáveis, absolva a recorrente do pedido.
Houve contra-alegações.
Cumpre decidir.
II – Factos provados: 1. O Autor foi um dos fundadores da Sociedade C, SA, constituída por escritura pública de 23-2-00, outorgada no 21° Cartório Notarial de Lisboa, tendo exercido somente até ao dia 30-6-00, funções remuneradas de Vogal do Conselho de Administração daquela Sociedade -A) e B); 2. Nessa qualidade, em 17-5-00, o Autor assinou, como avalista da C., uma livrança, a que, mais tarde, foi aposto pelo 1º R. o valor de € 323.230,63 – C); 3. No dia 29-4-05, o R. B. apresentou em juízo um requerimento executivo, peticionando o valor constante da livrança, acrescido de juros moratórios e para tal alegou ser dono e legítimo portador de uma livrança subscrita pela C. e avalizada por vários membros daquela, entre os quais o Autor, com vencimento em 31-12-04, acrescentando ainda que “apresentada a pagamento, a referida livrança não foi paga na data do respectivo vencimento (31-12-04), nem posteriormente” pela UIS, nem pelos avalistas, “apesar de diversas vezes instados a fazê-lo” – D), E) e F); 4. O processo foi distribuído à 3ª Secção do 1º Juízo de Execução de Lisboa, sob o n.° 27838/05.OYYLSB, tendo os avalistas, incluindo o A., apresentado oposição à execução e à penhora – G); 5. A R. A foi nomeada no processo executivo em causa pelo Tribunal – BB); 6. O R. B. nomeou bens à penhora no mesmo processo – CC; 7. O Autor foi o único dos diversos executados naquele processo que levou a cabo esforços pessoais e financeiros junto de entidades bancárias para obter, como obteve, a caução que determinou a suspensão da execução – 4º; 8. Com vista à suspensão dos efeitos da execução sobre o seu património, o Autor, apesar de serem vários os executados, prestou caução, nos termos e para os efeitos do disposto nos arts. 818º, nº 1, e 988° do CPC (apenso n.° 27.838/05.00YYLSB-C) – H); 9. O ora R. B. foi notificado do requerimento para prestação de caução pelo Autor, tendo declarado não se opor à mesma – I); 10. No apenso de prestação de caução, foi proferida sentença em 7-9-06, na qual se julgou procedente o incidente de caução e, em consequência, o Tribunal julgou idónea a prestação de caução pelo aqui Autor, mediante garantia bancária do valor em causa – J); 11. Para tal efeito, o Autor juntou àqueles autos, a garantia bancária n.° ..., emitida pelo Millenium BCP, garantindo até ao montante de € 323.230,63, ao qual foi acrescentado o valor de € 3.010,91, passando a garantia a ser do valor global de € 326.241,54 – K) e L); 12. Assim, por a caução ter sido julgada validamente prestada em Outubro de 2006, foi então ditada a suspensão da instância executiva – M); 13. A 19-2-07 foi proferido despacho, onde, nomeadamente, se determina o prosseguimento daqueles autos, o qual foi reformulado em 5-3-07, confirmando-se aí a suspensão dos autos, designadamente em função da caução prestada pelo Autor, ali executado – N) e O); 14. A cópia do despacho referido em 13.
foi enviada pela secretaria do 1º Juízo de Execução de Lisboa, através de ofício datado 6-3-07, cuja cópia consta a fls. 325, sendo para a R. A. por carta simples; tal notificação foi enviada à R. A. e foi recebida por via telemática sem qualquer documento anexo – P), 41º e 42º; 15. O R. B., exequente, foi notificado do despacho que, reformulando o anteriormente proferido, considerou suspensa a instância (fls. 401); 16. Entre os meses de Julho e Outubro de 2007 a instância mantinha-se suspensa ainda por força da caução prestada – Q); 17. Foram realizados vários actos de penhora, nomeadamente sobre bens da propriedade do aqui Autor, ali executado, sendo que os seguintes actos de penhora constam informados no processo: - Prédio urbano, sito na freguesia e concelho de Penacova, descrito sob o n.° 610/19880913, realizada pela ap. 4 de 5-7-07; - Veículo automóvel (tractor agrícola), da marca MASSEY-FERGUSON, com a matrícula ...-FX, realizada no dia 2-7-07 – R) e S); 18. O registo de penhora do tractor referido em 17.
ocorreu no dia 2-7-07 – GG); 19. Também foram efectuadas penhoras sobre 2 bens imóveis, no âmbito daquele processo de execução, sem que dele, sequer, que o aqui Autor saiba, constem informados: - Prédio Urbano designado por "Monte do Matinho", sito na freguesia dos Arcos, concelho de Estremoz, descrito na CRP de Estremoz, sob o n.° 0000, no livro 00, e sob o n.° 000 na Matriz Predial Urbana daquela freguesia, tendo a penhora sido registada pelo 1º R. no dia 12-7-07; - Prédio Rústico designado por "Monte do Matinho", sito na freguesia dos Arcos, concelho de Estremoz, descrito na CRP de Estremoz, sob o n.° 0000, no livro B-55 e sob o n.° 40 da Secção B na Matriz Predial Urbana daquela freguesia, tendo a penhora sido registada pelo 1º R. no dia 12-7-07 – T); 20. O registo da penhora dos imóveis descritos em 19.
foi efectuado em 12-7-07 – HH); 21. A R. A efectuou os actos de penhora referidos em 17.
e 19.
na sequência de solicitações insistentes do exequente - 3º; 22. Em 15-4-09 o Autor requereu nos autos de execução que fosse determinada a suspensão da instância executiva, a declaração da nulidade dos actos de penhora e ainda que a R. A., solicitadora de execução nomeada naqueles autos, fosse notificada a fim de se pronunciar sobre os actos de penhora realizados – U); 23. Quando o Autor tomou conhecimento da realização dos actos de penhora referidos em 17.
, interpôs o requerimento referido em 22.
– 1º; 24. Em resposta, veio a R. A., em 18-5-09, requerer o levantamento das referidas penhoras, referindo que “na posse dos duplicados, foram efectuadas diversas tentativas para dar cumprimento às diversas citações, algumas das quais se tornaram muito complicadas e sob pressão dos...
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