Acórdão nº 1738/04.9TBOAZ.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Março de 2013

Magistrado ResponsávelNUNO CAMEIRA
Data da Resolução21 de Março de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.

Síntese dos termos essenciais da causa e dos recursos

  1. AA, BB e CC propuseram uma acção ordinária contra: 1ª) DD, CRL; 2ª) EE - ..., Ldª; e 3ª) FF - ..., Ldª, formulando os seguintes pedidos: 1) – Que se declare e reconheça judicialmente o direito dos autores sobre a sua obra - manuais de ... para os 7º, 8º e 9º anos de escolaridade, bem como os respectivos cadernos de actividade, com os ISBNs …, … e … e ISBNs …, … e …, respectivamente - podendo utilizá-la e dela disporem da forma que entenderem necessária e conveniente; 2) – Que se declare e reconheça judicialmente que das minutas dos contratos de edição subscritas pelos autores não advém para a ré “DD” qualquer título que a legitime a editar, produzir, distribuir, vender ou utilizar de qualquer forma quaisquer obras de ... dos autores para os 7º, 8º e 9º anos de escolaridade; 3) – Que as rés sejam ainda condenadas a abster-se do seguinte: - A “DD”, de editar, produzir e distribuir, por si ou através de terceiro, os manuais de ... para o 7º e 8º anos de escolaridade dos autores, bem como os respectivos cadernos de actividades, com os ISBNs supra identificados; - A mesma ré, de editar, produzir e distribuir, por si ou através de terceiro, o manual de ... para o 9º de escolaridade da autoria dos autores que foi aprovado para o triénio de 2001-2004, com os ISBNs supra identificados; - A ré “EE”, de produzir, por si ou através de terceiro, os manuais de ... para o 7º, 8º e 9º anos de escolaridade da autoria dos autores, bem como os respectivos cadernos de actividades, com os ISBNs supra identificados; - A ré “FF”, de distribuir e comercializar, por si ou através de terceiro, os manuais de ... para o 7º, 8º e 9º anos de escolaridade da autoria dos autores, bem como os respectivos cadernos de actividades, com os ISBNs supra identificados; 4) – De condenação da ré “DD” a pagar aos autores o montante de 204.805,65 € e a ré “FF” 21.450,40 €, com juros legais a partir da citação; 5) - Se assim não se entender, de condenação solidária das rés a indemnizar os autores no montante de 39.198,96 €, também acrescido dos referidos juros de mora; 6) - Em qualquer caso, condenação da 1ª ré a pagar-lhes, a título de danos não patrimoniais, quantia nunca inferior a 30.000 €, igualmente acrescida de juros de mora; 7) - E a restituir o original das minutas subscritas pelos autores para o 7º, 8º e 9º anos de escolaridade.

    Alegaram que são professores e autores de manuais escolares de ... e respectivos cadernos de actividades. Nessa qualidade, tinham celebrado com a editora “Editorial GG” contratos de edição para os seus manuais de ... dos 7º, 8º e 9º anos de escolaridade. Em 24/7/03, quando aquela editora atravessava uma difícil situação financeira, foram confrontados com a necessidade de rescindir os contratos de edição com ela celebrados e de concluir novos contratos de edição com a 1ª ré como única forma de garantir a sobrevivência da referida editora e como condição sem a qual não lhes seriam pagos os montantes que lhes eram devidos a título de direitos de autor pela “Editorial GG”. Foi-lhes ainda afirmado que os seus manuais ficariam sempre ligados a esta editora e que existiria uma associação entre ela e a 1ª ré. Por estas razões rescindiram aqueles contratos de edição e subscreveram minutas de novos contratos com a 1ª ré, os dois primeiros autores em 24/7/03 e o terceiro em 1/8/03. Quando o fizeram, no entanto, as minutas não se encontravam assinadas pela 1ª ré, nem tinham aposta qualquer data. Posteriormente, vieram a saber que esta ré não era editora de manuais escolares e que o seu presidente teria sido constituído arguido em vários processos criminais. Tiveram ainda conhecimento de que não existiu qualquer associação dela com a “Editorial GG”, antes tendo a 1ª ré levado a cabo o desvio de activos daquela editora, que se encontrava em situação pré-falimentar. Temendo ver-se envolvidos em tal desvio e o seu bom-nome e prestígio editorial prejudicado por ligação a processos criminais, os autores solicitaram por várias formas a devolução, no prazo de cinco dias, das minutas que subscreveram e que ainda não tinham sido assinadas e devolvidas pela 1ª ré, manifestando que tinham perdido o interesse em contratar com ela. Perante a falta de resposta da 1ª ré, e porque precisavam de encontrar um editor que editasse de novo o seu manual do 9º ano, a fim de o submeterem à respectiva adopção até Maio de 2004, e produzisse e distribuísse a tempo do início do próximo ano escolar (2004/2005) os manuais já adoptados dos 7º e 8º anos, procederam à notificação judicial avulsa da 1ª ré em 19/11/03, advertindo-a para o facto de não existir qualquer vínculo contratual entre ela e os autores. E tendo tomado conhecimento de que a 1ª ré estaria a produzir os manuais da sua autoria através da 2ª ré, preparando-se para os distribuir no mercado através do habitual distribuidor da “Editorial GG” - a ré FF - lançaram mão da providência cautelar apensa, que veio a ser deferida. Apesar de não possuírem qualquer título que as legitimasse, no ano de 2003 as rés “DD” e “FF” editaram, produziram e distribuíram aos livreiros os manuais de ... para o 8º ano de escolaridade dos autores e respectivos cadernos de actividade sem que tenha havido lugar ao pagamento de quaisquer direitos de autor, tendo auferido um lucro de, respectivamente, 204.805,65 € e 21.450,40 €. Os autores teriam conseguido auferir a importância de 39.198,96 €, correspondente a 10% sobre o preço de venda o público de cada exemplar vendido, caso tivessem concedido a outro editor os direitos de produção e distribuição do manual e caderno de actividades em causa. Por virtude dos factos descritos só em Novembro de 2003 começaram a trabalhar no seu manual de ... para o 9º ano, altura em que conseguiram arranjar um editor, para submetê-lo à adopção no mês de Junho de 2004, tarefa que os obrigou a trabalhar sob elevada pressão e angústia, perdendo várias noites de sono, preterindo as relações familiares e prejudicando as suas obrigações profissionais. Invocam ainda, como prejuízos morais, a ansiedade e o receio de que a 1ª ré produzisse o seu antigo manual do 9º ano, submetendo-o igualmente à adopção e distribuição, gerando dessa forma grande confusão nos professores e nos próprios pais dos alunos ao verem-se confrontados com dois manuais dos mesmos autores.

  2. A 1ª e a 2ª ré contestaram conjuntamente alegando, em resumo, que a “Editorial GG” se encontrava em situação económica difícil, tendo iniciado com a 1ª ré um processo negocial visando a aquisição de 51% do capital desta última. No âmbito desse processo foram propostas as rescisões de contratos de edição outorgados entre a “Editorial GG” e diversos autores que se mostraram interessados, com a celebração de novos contratos de edição entre os mesmos e a 1ª ré. Os autores assinaram os referidos contratos de edição com a 1ª ré mediante a condição de esta lhes garantir e pagar os direitos de autor devidos pela “Editorial GG” e lhes garantir (em Julho de 2003) que os seus manuais seriam produzidos e distribuídos atempadamente, por forma a estarem nas livrarias nos finais de Agosto, princípios de Setembro, o que foi prontamente cumprido. As negociações entre a 1ª ré e a “Editorial GG” não conduziram ao projectado acordo, que não chegou a concretizar-se porquanto todo o material existente na sede da “Editorial GG” foi objecto de arresto requerido por “HH, Ldª”, causando a imediata falência da requerida. No entanto, a validade e eficácia dos contratos de edição celebrados com os autores não ficou dependente da concretização da referida compra de capital da “Editorial GG” pela 1ª ré, mantendo-se os mesmos em vigor e não tendo, por isso, que ser devolvidos aos autores. E tendo estes intentado a providência cautelar apensa, no âmbito da qual a 1ª ré foi impedida de exercer os direitos que lhe advinham desses contratos, causaram-lhe avultados prejuízos, nomeadamente a perda de uma receita líquida de 1.541.969,35 € até ao ano de 2004, e de 3.302.934,42 € até ao final das vigências de cada um dos manuais. Alegaram ainda que, sendo válidos e eficazes os contratos de edição celebrados entre os autores e a 1ª ré, não podiam aqueles outorgar contratos de edição com outros editores, como fizeram, sob pena de nulidade. Com base nisto a 1ª ré deduziu reconvenção, pedindo: 1) - Que sejam declarados válidos e eficazes os contratos de edição e respectivas adendas outorgados entre ela e os autores, e nulos todos os contratos de edição posteriormente outorgados pelos autores (com a interveniente “HH”) tendo por objecto as mesmas obras; 2) - Que os autores sejam condenados a pagar-lhe uma indemnização no valor de 1.541.969,35 €, correspondente ao saldo a seu favor relativo aos anos de 2003 e 2004, por a terem ilicitamente impedido de exercer os direitos decorrentes da outorga dos contratos de edição, relativos à obras ... 7, 8 e 9 e respectivos cadernos de exercícios, com juros de mora desde a citação; 3) - Que os autores sejam condenados a pagar-lhe o valor que se liquidar em execução e considerando a data da sentença condenatória, valor esse correspondente à actualização dos prejuízos e lucros cessantes a determinar em função das vendas efectuadas, acrescido dos respectivos juros de mora legais desde a data da sentença condenatória; 4) - Que os autores sejam condenados a pagar às rés todos os prejuízos que lhes advieram do decretamento da providência cautelar, a liquidar em execução de sentença.

  3. A 3ª ré também contestou, alegando ser totalmente alheia aos factos em que os autores baseiam a sua pretensão, já que nunca teve nem tem quaisquer relações com a 1ª ré e não distribui nem nunca distribuiu livros por ela editados, ou ao abrigo de qualquer relação com ela estabelecida.

  4. Os autores replicaram a ambas as contestações, reafirmando o alegado na petição inicial e concluindo pela improcedência da reconvenção, opondo-se ainda à compensação pretendida pela 1ª...

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