Acórdão nº 08A2953 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Setembro de 2008
Magistrado Responsável | SEBASTIÃO PÓVOAS |
Data da Resolução | 30 de Setembro de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: AA, em representação dos seus filhos menores BB e CC, suscitou, contra o pai das mesmas, DD, incidente de incumprimento da obrigação de alimentos fixada por acordo homologado por sentença.
Foi condenado a pagar a pensão mensal de 200.00 euros.
Verificado o incumprimento, a 1.ª instância decidiu que o encargo devia ser suportado pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos e Menores por, quer o agregado familiar, quer a mãe, não terem rendimentos líquidos superiores ao salário mínimo nacional.
E na sequência da reapreciação da situação dos alimentandos, fixou em 250,00 euros a prestação a ficar a cargo daquele Fundo o qual, por depósito, ou transferência bancária, deveria pagar a partir do trânsito em julgado da decisão.
Recorreu o Ministério Público pedindo a revogação parcial da decisão por entender que o pagamento deve iniciar-se no momento da instauração do incidente de incumprimento, ou seja, em Maio de 2005.
A Relação de Lisboa, por maioria, deu provimento ao recurso.
Agrava, agora, o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores assim concluindo, e no essencial: - O acórdão do tribunal da Relação de Lisboa, de 09/05/2008, com um voto de vencido, concede provimento ao agravo interposto pelo Dmo. M.P., revogando a decisão recorrida e substituindo-a por outra que condena o FGADM a assegurar a prestação de alimentos aos menores em causa nos autos, no valor de € 250,00, desde "o momento da instauração do incidente de incumprimento, in casu, Maio de 2005.".
- Desconhece o FGADM se em Maio de 2005, se encontravam já preenchidos os pressupostos legais para a atribuição de uma prestação a assegurar pelo Fundo aos menores.
- Não obstante, e salvo o devido respeito, ainda que assim fosse e/ou que o Fundo o não desconhecesse, tal entendimento não tem suporte legal porquanto é diferente a natureza das obrigações.
- Com efeito, existe uma manifesta diferenciação jurídico-substantiva entre a obrigação de prestação de alimentos decorrente do vínculo específico de natureza familiar e a obrigação que recai sobre o FGADM por via dos dois diplomas que lhe são específicos.
- As prestações alimentícias a satisfazer pelo Fundo não vêm substituir as prestações que tenham por fundamento uma relação familiar, como configurada pelo artigo 1576. ° do Código Civil, o que é perfeitamente justificável, porquanto o poder/dever de prestar alimentos a filho menor incumbe, antes de mais, aos progenitores, e é, quanto a estes, irrenunciável.
- Acresce que a ratio legis dos diplomas que regulam o FGADM, é a de suprir necessidades de alimentos actuais dos menores.
- A actualidade das prestações não se afere aquando da alegação do incumprimento da obrigação pelo devedor, mas pela verificação judicial da existência cumulativa dos pressupostos e requisitos legais, legitimadores da intervenção do FGADM (arts. 1.º, e 3.°, n.° 4, da Lei n.° 75/98, de 19/11; arts. 2.° e 9.°, do D.L. n.° 164/99).
- A lei acautela a situação do menor face a uma possível demora na tramitação do incidente, ao prever, no n. ° 2, do art. 3. °, da Lei n. ° 75/98, que o juiz pode estabelecer uma prestação de alimentos provisória, se justificada e urgente a pretensão do requerente. E tal acontece em inúmeros processos.
- Não colhe, portanto, qualquer argumento que justifique a imposição ao FGADM do pagamento de prestações vencidas.
- A prestação a assegurar pelo Fundo não tem um carácter incondicional: depende da existência e da manutenção dos pressupostos exigidos por lei para a sua atribuição (art. 3.º, n.° 6 da Lei n.° 75/98; art. 9.º, n.° 1, do DL n.° 164/99).
- Ora, somente a sentença determina que se encontram preenchidos os pressupostos legais condicionantes da atribuição da prestação e fixa o seu valor, pelo que, só a partir da data da mesma se constitui para o Fundo a obrigação de prestar alimentos.
- Não existe, portanto, uma transferência pura e simples para o Fundo da obrigação que recai sobre o obrigado a alimentos, que não se extingue, pelo que não deverão ser imputados ao FGADM 3 anos de prestações em dívida pelo obrigado.
- Em segundo lugar, porque não valem, relativamente ao FGADM, as razões justificativas da previsão do artigo 2006.° do CC, que faz retroagir a obrigação de alimentos à data da propositura da acção.
- O artigo 2006. ° pressupõe que o obrigado a alimentos, uma vez demandado, devia reconhecer e cumprir a obrigação.
- Ora, o FGADM, enquanto interveniente acidental, é chamado aos autos apenas com a notificação da decisão do tribunal. Todo o processado decorre, até então, sem o seu conhecimento e sem qualquer intervenção da sua parte (vide Ac. TRG, proc. n.° 2585/07-1, de 01/02/2008).
- Acresce, por fim, que apenas faz sentido distinguir entre prestações vencidas e vincendas quando se reportem a uma mesma fonte obrigacional. Assim sendo, a norma do artigo 2006. ° do CC apenas releva no confronto do devedor originário de alimentos (Ac. do TRL, n.° 10848/07-2, de 06/02/2008).
- E nem se refira também uma eventual analogia com o artigo 2006. ° do C.C., uma vez que se está em presença de lei geral e lei especial.
- O Decreto-Lei n. ° 164/99, de 13 de Maio, é taxativo quanto ao início da responsabilidade do Fundo pelo pagamento das prestações: O artigo 4.º, n.º 5 desse diploma não é uma norma meramente procedimental, de natureza organizacional do próprio IGFSS,IP.
- Todas as decisões devem ser cumpridas...
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