Acórdão nº 2024/08.0PAPTM.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Março de 2013
Magistrado Responsável | SANTOS CARVALHO |
Data da Resolução | 21 de Março de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça 1.
“A”, nascido a 12 de fevereiro de 1953, arguido no processo comum n.º 2024/08.0PAPTM do 2.º Juízo de Competência Especializada do Tribunal Judicial de Portimão, foi acusado pelo Ministério Público pela prática de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas h) e j), 22.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), e 23.º, todos do Código Penal e por um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo artigo 86.º, n.º 1, alíneas c) e d), com referência aos artigos 2.º, n.º 1, alínea ax) e n.º 3, alínea a) e 3.º, n.º 3, todos da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro.
“B”, “C” e “D”, este último menor, representado por sua mãe, “E”, constituídos Assistentes nos autos, aderiram à acusação do Ministério Público e formularam pedidos cíveis de indemnização contra o arguido.
“F” também formulou pedido cível de indemnização contra o arguido.
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Realizado o julgamento perante Tribunal Coletivo, o arguido foi condenado, por acórdão de 4-12-2009, relativamente à parte criminal (1), como autor material de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, 22.º e 23.º, todos do Código Penal, na pena de 15 (quinze) anos de prisão e como autor material de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido, à data dos factos, pelo artigo 86.º, n.º 1, alíneas c) e d), com referência aos artigos 2.º, n.º 1, alínea ax), e n.º 3, alínea a), e 3.º, n.º 3, da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, e atualmente pelo artigo 86.º, n.º 1, alíneas c) e d), com referência aos artigos 2.º, n.º 1, alínea aad), e n.º 3, alínea a), e 3.º, n.º 3, da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, na pena de 3 (três) anos de prisão. No cúmulo jurídico destas penas parcelares, foi condenado na pena única de 16 (dezasseis) anos de prisão.
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O arguido interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Évora (2), pedindo que a sua condenação fosse convolada para a de homicídio privilegiado tentado e que a pena conjunta por esse crime e pela detenção de arma proibida fosse fixada, no máximo, em oito anos de prisão.
Por acórdão desse Tribunal da Relação, datado de 8-05-2012, foi concedido provimento parcial ao recurso interposto pelo arguido “A” e, em consequência, foi reduzida para 12 (doze) anos a pena de prisão que lhe foi imposta pela prática do crime de homicídio qualificado, na forma tentada, e para 2 (dois) anos e 6 (seis) meses a pena de prisão que lhe foi imposta pela prática de crime de detenção de arma proibida. Em cúmulo, o arguido foi condenado na pena única de 13 (treze) anos de prisão.
Na sequência de requerimento de um demandante civil, tal acórdão foi retificado por novo acórdão, este datado de 8 de maio de 2012, notificado ao arguido por carta registada remetida em 1-10-2012.
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Por requerimento de 9-10-2012, o arguido interpôs recurso para o STJ e, da sua motivação, extraiu as seguintes conclusões (transcrição): 1. O tribunal de primeira instância não deu como provado que o ora recorrente tenha cometido o crime de homicídio qualificado na forma tentada com frieza de ânimo, nos termos dos artigos 131.º, 132.º, n.º 1 e 132.º, n.º 2, alínea j) do Código Penal; 2. O tribunal de primeira instância não deu como provado que o ora recorrente tenha cometido o crime de homicídio qualificado na forma tentada por ter utilizado meio particularmente perigoso, nos termos dos artigos 131.º, 132.º, n.º 1 e 132.º, n.º 2, alínea h) do Código Penal; 3. O ora recorrente deveria ter sido condenado pelo tribunal de primeira instância pela prática do crime de tentativa de homicídio simples, nos termos dos artigos 131.º, 22.º e 23.º, todos do Código Penal 4. O tribunal de primeira instância deu como provado que o ora recorrente cometeu o crime de homicídio qualificado atípico, na forma tentada, recorrendo apenas à cláusula geral do art.º 132.º, n.º 1 do Código Penal para qualificar o crime; 5. O tribunal de primeira instância não fez passar pelo crivo dos exemplos-padrão previstos no art.º 132.º, n.º 2 do Código Penal a matéria de facto provada de forma a encontrar uma situação valorativamente análoga às previstas nas diversas alíneas (exemplos-padrão) deste artigo; 6. O tribunal de primeira instância fez interpretação analógica proibida nos termos do art.º 9.º, n.º 1 do Código Civil.
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Com a interpretação analógica proibida, o tribunal de primeira instância violou o princípio da legalidade criminal, previsto no art.º 29.º da Constituição da República Portuguesa; 8. O tribunal de primeira instância convolou “ex officio”, o crime de homicídio simples em que o arguido deveria ter sido condenado num crime de homicídio qualificado atípico no acórdão proferido em 4 de dezembro de 2009; 9. O Tribunal da Relação de Évora não alterou a qualificação jurídica do crime de homicídio qualificado atípico, porque não foi posta em causa a subsunção dos factos ao direito.
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O tribunal de primeira instância ao alterar a qualificação jurídica dos factos não deu conhecimento ao ora recorrente como prescreve o art.º 358.º, n.º 3 e n.º 1 do Código de Processo Penal.
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O tribunal de primeira instância ao alterar a qualificação jurídica dos factos sem conhecimento dessa alteração ao ora recorrente violou o princípio do contraditório previsto no art.º 32.º n.º 5 da Constituição da República Portuguesa; 12. A violação do princípio da legalidade criminal, inscrito no art.º 29.º da Constituição da República Portuguesa, importa a inconstitucionalidade e consequente nulidade da sentença proferida pelo tribunal de primeira instância; 13. A violação do previsto no art.º 358.º, n.º 3 e n.º 1 importa a nulidade da sentença, nos termos do art.º 379.º, n.º 1, alínea b), ambos do Código de Processo Penal.
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A violação princípio do contraditório previsto no art.º32.º, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa importa a inconstitucionalidade da sentença proferida pelo tribunal de primeira instância.
Termos em que deve conceder-se inteiro provimento ao presente recurso, julgando-se os acórdãos ora recorridos nulos por violação do princípio da legalidade criminal previsto no art.º 29.º da Constituição da República Portuguesa e ainda por violação do princípio do contraditório previsto no art.º 32.º, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa.
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O Assistente “D”, representado pela sua mãe E, respondeu ao recurso e concluiu assim (transcrição): A. O presente Recurso é extemporâneo, porque viola o disposto no art.º 411.º do Código do Processo Penal.
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O presente recurso interposto do Acórdão do Tribunal da Relação proferido em recurso, é IRRECORRÍVEL, porque viola o art.º 432.º, alínea b) do Código do Processo Penal "Recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça...b) das decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pela relações, em recurso, nos termos do art.º 400.º". Dispõe o art.º 400.º, n.º 1, alínea d) do CPP "Não é admissível recurso: De acórdãos absolutórios proferidos, em recurso, pejas relações, que confirmem decisões de 1ª instância;".
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O Tribunal da Relação Évora confirmou "in melius" a condenação pela prática dos crimes de homicídio qualificado na forma tentada e crime de detenção de arma proibida, manteve toda a matéria de facto relativamente a estes crimes e alterou as medidas das penas de 15 anos para 12 anos pelo crime de homicídio qualificado, na forma tentada e de 3 anos de prisão para 2 anos pelo crime de detenção de arma proibida, em cúmulo foi o arguido condenado na pena única de 13 anos de prisão.
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A consagração da dupla conforme admite uma redução das penas, conforme abundante jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça "a decisão da relação que confirma o cometimento dos crimes e diminuiu só a medida das penas, leva a que seja atingido um grau de certeza de uma boa decisão da causa impedindo a um segundo e novo recurso para ser tentada uma outra solução”.
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O acórdão da Relação de que foi interposto o presente recurso é, pelo exposto, irrecorrível, pelo que não devia ter sido admitido, (art.º 414.º n.º 2 do CPP), o que conduz à sua rejeição nos termos do art.º 420.º n.º 1 alínea b) do CPP.
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Apesar de ter sido admitido o recurso, a decisão que admita o recurso ou que determine o efeito que lhe cabe ou o regime de subida não vincula o tribunal superior (n.º 3 do art.º 414.º do CPP).
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Sendo irrecorrível o acórdão condenatório proferido pelo Tribunal da Relação de Évora, todas as questões colocadas pelo recorrente nas conclusões que delimitam o conhecimento do seu recurso, sejam elas de constitucionalidade, processuais e substantivas, sejam interlocutórias, ou finais, enfim das questões referentes às razões de facto e direito da condenação em termos penais, não poderá o Supremo conhecer, por não se situarem no círculo jurídico-penal legal do conhecimento processualmente admissível, delimitado pelos poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça.
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O recurso é improcedente, porquanto por Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora, em recurso, foi dada como provada a matéria de facto constante da decisão do Tribunal de Primeira Instância, que é de ter-se por imodificável e definitivamente assente, e deste não emerge a ocorrência de qualquer vício ou nulidade de conhecimento oficioso.
I. Na motivação do recurso, o Recorrente, partindo do facto de o acórdão de primeira Instância ter mandado eliminar dos factos provados as expressões "meio particularmente perigoso" e "frieza de ânimo", defende o que a factualidade dada como provada implica a direta desqualificação do homicídio, dado que aquela eliminação arreda a possibilidade de descortinar perversidade e censurabilidade na conduta, devendo ser o arguido condenado pela prática de homicídio simples, na forma tentada.
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Esta objeção constante do recurso, obviamente não colhe, porquanto tanto o Tribunal de Primeira Instância como o Tribunal da Relação fizeram idêntico enquadramento jurídico da prova produzida e correta subsunção...
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