Acórdão nº 3247/06.2TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Março de 2013

Magistrado ResponsávelGONÇALVES ROCHA
Data da Resolução05 de Março de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1--- AA, intentou uma acção com processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra BB Portugal, Lda, com sede em Lisboa, pedindo que a Ré seja condenada: - A reconhecer que o contrato que vigorava entre ambos constitui um contrato de trabalho, devendo, em consequência, observar os regimes fiscal e de segurança social que lhe corresponde; -A efectuar os descontos para a Segurança Social desde a data da sua admissão; - A atribuir-lhe a antiguidade e categoria que lhe pertenciam caso tivesse sido contratado nos termos legais e a pagar-lhe as seguintes quantias:

  1. O valor de € 24.682,86 (vinte e quatro mil seiscentos e oitenta e dois euros e oitenta e seis cêntimos) a título de compensação devida pela falta de gozo de férias; b) O valor de € 6.196,10 (seis mil, cento e noventa e seis euros e dez cêntimos) a título de subsídio de férias; c) O valor de € 12.835,53 (doze mil, oitocentos e trinta e cinco euros e cinquenta e três cêntimos) a título de subsídio de Natal; d) O valor de € 39.749,25 (trinta e nove mil, setecentos e quarenta e nove euros e vinte e cinco cêntimos) a título de prejuízo sofrido pelo pagamento das despesas de deslocação abaixo do valor legal e pela falta de atribuição de veículo automóvel; e) € 2.000 (dois mil euros) a título de prejuízo sofrido por falta de pagamento de chamadas telefónicas; f) O valor de € 6.600 (seis mil e seiscentos euros) a título de comparticipação para estudos; g) O valor de € 5.391,34 (cinco mil trezentos e noventa e um euros e trinta e quatro cêntimos) a título de despesas de saúde por falta de atribuição do direito ao subsídio de doença; h) O valor de € 3.983,65 (três mil novecentos e oitenta e três euros e sessenta e cinco cêntimos) a título de juros vencidos por falta de pagamento atempado de subsídios de férias e de Natal; i) Juros vincendos até efectivo e integral pagamento.

    Alegou para tanto que começou a trabalhar para a Ré em 1998 através de um contrato que esta denominou de “prestação de serviços”, para prestar assistência técnica aos seus clientes, indicando-lhe a R os equipamentos para prestar a sua actividade, designando-lhe o local de trabalho, e obrigando-o a exercer a actividade dentro de um horário de trabalho, com formação e ferramentas dadas pela R, e em regime de exclusividade, concluindo assim que esteve sujeito a um contrato de trabalho, tendo, como tal, direito a receber os créditos peticionados.

    A Ré contestou invocando a incompetência material do Tribunal e a prescrição dos créditos devidos à Segurança Social; e impugnando os factos alegados pelo A, bem como a conclusão de que se está perante um contrato de trabalho, termina sustentando que se tratava de um contrato de prestação de serviço, pugnando por isso, pela sua absolvição.

    O A. respondeu à matéria das excepções, conforme consta de fls. 358.

    Foi proferido despacho saneador, que julgou o tribunal materialmente incompetente para conhecer do pedido de condenação da Ré a efectuar os descontos para a Segurança Social.

    E designada data para audiência de discussão e julgamento, veio no seu decurso o A. apresentar articulado superveniente, onde refere que a Ré fez cessar, unilateralmente, o seu contrato a partir de 01.03.2007, pelo que termina pedindo a declaração da ilicitude do seu despedimento e a sua condenação a pagar-lhe:

  2. O valor das retribuições vencidas e vincendas que deixou de auferir, até à data do trânsito em julgado da sentença; b) Todos os danos patrimoniais causados ao A; c) A reintegrá-lo no seu posto de trabalho com respeito pela sua categoria e antiguidade, e sem prejuízo da sua opção, em substituição desta reintegração, por uma indemnização, a fixar em montante não inferior a 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, ou fracção.

    d) Juros vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento.

    A Ré respondeu conforme consta de fls. 645, pugnando pela prescrição dos pedidos do A.

    Por despacho de fls. 680 foi admitido o aditamento do pedido e da causa de pedir.

    Terminado o julgamento e tendo sido proferida a decisão da matéria de facto, foi seguidamente prolatada a sentença, na qual foi exarada a seguinte decisão: Pelo exposto, julgo a acção parcialmente procedente e em consequência: Declaro que entre A. e R. foi celebrado um contrato de trabalho a 01.06.1998 e, em consequência, condeno a Ré a pagar ao A.: - Os valores dos subsídios de férias e subsídios de Natal vencidos durante a vigência do contrato, no valor da remuneração mensal correspondente à média auferida nos 12 meses anteriores ao vencimento da respectiva prestação (e proporcional quanto primeiro subsídio de férias e de Natal).

    - Uma compensação por violação do direito do A. às férias, correspondente ao triplo da retribuição (encontrada nos termos referidos no item anterior) correspondente ao período em falta, isto é, desde 01.06.1998 até 01.03.2007 e - Absolvo a Ré do demais peticionado.

    Inconformados, apelaram o A e a R, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa acordado em: 1.Alterar a matéria de facto nos termos supra referidos; 2. Julgar procedente a apelação da Ré, pelo que se revoga a sentença recorrida, absolvendo-se a Ré dos pedidos formulados pelo Autor; 3. Julgar prejudicado o conhecimento do objecto do recurso interposto pelo Autor.

    É agora o A que nos traz a presente revista, rematando a sua alegação com as seguintes conclusões: 1- A douta decisão está ferida de nulidade, por falta de fundamentação e excesso de pronúncia, como facilmente pode verificar-se pela sua simples leitura e como adiante se demonstrará.

    2- A Ré, aqui Recorrida, no recurso de apelação apresentado, impugnou a matéria de facto dada como assente nas alíneas F), Ai) e Ao); solicitando ainda o aditamento à matéria, do facto da propriedade do automóvel e do telemóvel ser do A.

    3- O douto acórdão veio a alterar os pontos A), AI), AP) e aditou a alínea AT).

    4- O tribunal a quo aditou à matéria de facto a alínea AT), fazendo constar, sem quaisquer justificação ou fundamentação, o seguinte: "Quanto à propriedade do telemóvel determina-se o aditamento do seguinte ponto: AT) O telemóvel usado pelo Autor nas chamadas efectuadas ao serviço da Ré pertencia ao primeiro".

    5 - Sem, no entanto, ter apresentado qualquer justificação ou fundamento que suporte a decisão de inclusão de tal facto na matéria assente.

    6- Mas o acórdão em crise vai mais longe e em manifesto excesso de pronúncia, alterou a redacção do facto "AP", facto que não foi posto em causa, nem se encontra delimitado nas conclusões de recurso.

    7- Era a seguinte a redacção anterior: "AP) Dão-se como reproduzidos os docs. de fls. 305 e 306: atribuição de €50 euros pelo papel decisivo do A. na venda de cada máquina." 8- Senda a actual redacção: "AP) A Ré atribuiu ao Autor a quantia de 100 euros pelo papel decisivo deste na venda de equipamento, nos termos que constam dos docs. de fls.305 e 306 dos autos." 9- O acórdão dá uma redacção ao facto da alínea AP) que desvirtua a realidade, o contexto e a prova produzida.

    10- Esta versão põe à margem tudo o que ficou provado em audiência sobre este facto e desvirtua a realidade, uma vez que a R. atribuía 50€ de incentivo pela troca de cada equipamento, o que fazia parte de um sistema de incentivos instituído na empresa e atribuído a todos os trabalhadores.

    11- A redacção actual do facto traduz algo bem diferente, pois a interpretação que agora se retira é que houve um pagamento pontual de 100€ pelo papel que o A. teve na venda de equipamento.

    12- A actual redacção, ao eliminar o facto provado que a R. pagava o valor de 50€ pela troca de cada equipamento, não esclarece se o pagamento de 100€ foi pago por cada equipamento trocado, ou pelos dois.

    13- Conforme resultou da prova produzida, tal facto resultava de um sistema de incentivos instituído pela R. em que esta premiava todos os trabalhadores pela troca de equipamentos, mediante o pagamento do valor de €50 pela troca de cada equipamento (factos AO e AP).

    14- Portanto não é verdade que "a R. tenha atribuído ao A. a quantia de 100€ pelo papel decisivo deste na venda de equipamento", pois de acordo com o sistema de incentivos implementado pela R., ao qual esta atribuiu o nome de “leads", o A. recebia o valor de 50€ pela troca de cada equipamento que tivesse aconselhado, sendo exemplo disso as fls.305 e 306.

    15- Este sistema de incentivos é referido e admitido pela R., até nas suas conclusões de recurso (vide ponto 14 das conclusões, que apesar de não concordarmos com todo o teor, a R. admite existir este sistema de incentivos).

    16- Ao proceder de tal forma o douto acórdão em crise é ferido de nulidade, pois pronunciou-se sobre questões não suscitadas na matéria de recurso interposto pela R., conhecendo de questões que não podia tomar conhecimento ao abrigo do disposto no art. 668°, n°l, alínea d) CPC.

    17- O douto acórdão em crise, não observou as regras de direito material probatório, violando a lei substantiva, 18- Violando as leis de processo, entre outras, as previstas no art. 264° n°3, 659° n°3, CPC (art. 722° n° 2).

    19- Ademais, existem contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizam a solução jurídica do pleito, o que deverá ser resolvido nos termos e ao abrigo do disposto nos art. 729°, n°3 e 730° do CPC, revogando-se a decisão recorrida, que desatendeu as correspondentes pretensões do A, desaplicando, como devia, o art. 712° do mesmo Código.

    20- Sem prejuízo do supra referido, atendendo à matéria de facto considerada provada, são de maior relevância os indícios da existência de uma relação laboral.

    21- Evidenciando claramente uma relação laboral, existem os seguintes factos: - O A. exercia as funções em local determinado pela R; - Sujeição a um horário de trabalho; - O pagamento de uma contrapartida monetária mensal, independentemente do número de equipamentos assistidos, e pagamento à hora das intervenções em equipamentos sem contratos de assistência técnica...

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