Acórdão nº 2839/08.0YXLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Fevereiro de 2013
Magistrado Responsável | JOÃO BERNARDO |
Data da Resolução | 21 de Fevereiro de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – Nos Juízos Cíveis de Lisboa, o M.ºP.º intentou a presente ação declarativa sumária contra: O Banco AA S.A.
Sustentou serem nulas as cláusulas contratuais gerais (doravante ccg) que refere, abaixo precisadas, integrantes dos contratos entre a ré e seus clientes.
Pediu, em conformidade: Que se declarem nulas tais cláusulas; Que se condene a ré a: Abster-se de as utilizar em contratos que de futuro venha a celebrar, especificando-se na sentença o âmbito de tal proibição Dar publicidade à decisão e a comprovar nos autos essa publicidade, em prazo a determinar na sentença, sugerindo-se que a mesma seja efetuada em anúncio a publicar em dois dos jornais diários de maior tiragem editados em Lisboa e no Porto, de tamanho não inferior a ¼ de página.
Contestou a ré, sustentando não se verificar a pretendida nulidade.
II – Na devida oportunidade, foi proferida sentença em que se declararam nulas, em parte, três cláusulas contratuais gerais usadas pelo Banco, se condenou este a abster-se de utilizá-las nos contratos atualmente e no futuro celebrados com os clientes, nos termos referidos naquela decisão, em contratos como os em apreço, se condenou ainda o mesmo Banco a publicitar a decisão nos dois jornais de maior tiragem de Lisboa e Porto, e se determinou a comunicação da decisão ao Gabinete do Direito Europeu.
III – Apelou a ré e o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu: “Assim, e pelo exposto, acordamos em julgar parcialmente procedente o recurso e, em consequência: (
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Alteramos a redação da alínea a) da sentença recorrida, que passa a ser a seguinte: a) Declarar nulas nas cláusulas contratuais gerais seguintes: a. No contrato denominado: "Contrato de Aluguer de Veículo Automóvel sem Condutor" (Doc. n° 2, fls. 27), a seguinte parte do terceiro período do ponto 4-i: "sendo o seu resultado arredondado para 1/4 de ponto percentual superior".
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No contrato denominado "Contrato de Locação Financeira" (Doc. n° 3, fls. 32), a seguinte parte do terceiro período do ponto 2-k: "sendo o seu resultado arredondado para 1/4 de ponto percentual superior".
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No contrato denominado "Contrato de Financiamento para Aquisição a Crédito" (Doc. n° 4, fls. 39), o n° 3 da cláusula 4.ª", com a seguinte redação: "3. A taxa atualizada será arredondada ao 1/4 de ponto percentual igual ou superior".
(b) No mais, confirmamos a decisão recorrida” IV – Pediu revista excecional a ré.
V – A formação a que alude o artigo 721.º- A, n.º3 do Código de Processo Civil entendeu que não estávamos perante um caso de dupla conforme, pelo que decidiu não admitir a revista excecional, sem prejuízo de os autos serem sujeitos a distribuição como revista normal.
VI – Ultrapassada, pela formação, esta questão de saber se estamos perante um caso de dupla conforme, foi decidido pelo Relator nada obstar ao conhecimento como revista normal.
VII – A ré sugerira nas alegações que que fosse proferida revista alargada nos termos do artigo 732.º - A do mesmo código, não tendo tal sugestão sido acolhida pelo Ex.mo Presidente deste Tribunal.
VIII – Conclui ela as alegações do seguinte modo: A. O presente recurso de revista excepcional é interposto numa acção proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO contra o ora Recorrente, "ao abrigo do disposto nos artigos 24.º e seguintes da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais (Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro com as alterações introduzidas pelo DL n.º 220/95 e 249/99 e 323/2001, de 17.12) e art. 13.º, n.º 1, al. c) da Lei de Defesa do Consumidor (Lei n.º 24/96 de 31.7. com as alterações introduzidas pelo DL n.º 67/2003, na qual peticionou a declaração de nulidade de três cláusulas de arredondamento em alta predispostas nas minutas do Banco ora Recorrente (minutas dos Contratos de Aluguer de Veículos Automóveis sem Condutor; de Locação Financeira; de Financiamento para Aquisição a Crédito) e também a condenação na abstenção por parte do ora Recorrente de utilizar tal cláusula em contratos que de futuro venha a celebrar, pedindo a condenação do Banco Recorrente a dar publicidade à decisão, e a comprovar nos autos essa publicidade.
B. A partir da Reforma dos Recursos Cíveis de 2007 (Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto) passou a existir o recurso de revista excepcional quando existe coincidência de decisões entre a primeira instância e a Relação (esta sem voto de vencido), o que constitui desvio ao princípio da dupla conforme; C. No caso sub judicio, o acórdão da Relação confirmou a decisão do Tribunal de primeira instância, sem voto de vencido, sendo aplicável ao processo o Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, que aditou o art. 721.º-A do CPC; D. Diferentemente do que se passa com o comum das acções cíveis que versam sobre puros interesses patrimoniais das partes, num plano eminentemente individual, as acções inibitórias têm incidência sobre a entidade predisponente e um número indeterminado de pessoas, nomeadamente os destinatários das cláusulas e as entidades e pessoas que integram certo "mercado", pelo que se tem de entender que em tais acções estão em causa "interesses de particular relevância social" (alínea b) do n.º 1 do art. 721.º - A do CPC); E. De facto, as acções de inibição de cláusulas contratuais gerais têm indesmentível relevância social, razão pela qual o legislador de 1985 lhes atribuiu um valor superior à alçada da Relação, para permitir sempre o recurso ao Supremo Tribunal de Justiça.
F. Acresce que nesta concreta acção inibitória está em causa a aplicação no tempo do art. 4.° do Decreto-Lei n.º 240/2006, de 22 de Dezembro (aplicável por força da remissão do art.1.° do Decreto-Lei n.º 171/2007, de 8 de Maio) quanto à matéria do arredondamento da taxa de juro contratual nos contratos de concessão de crédito bancário, existindo pelo menos dois Acórdãos sobre a mesma questão, um que considerou que o Ministério Público carecia de interesse em agir para continuar a impulsionar a acção, visto o Banco ter alterado as suas minutas na sequência da publicação dos Decretos-Leis n.ºs 240/2006 e 171/2007, e outro que considerou nula a cláusula de arredondamento em alta predisposta por outro Banco recorrente, no que toca ao crédito hipotecário; G. De facto, está em causa nos autos a interpretação do sentido preceptivo da uniformização do modo de arredondar a taxa de juros calculada a partir de um indexante relativamente aos contratos de concessão de crédito a consumidores, seja no âmbito do crédito à habitação, seja no âmbito do crédito ao consumo em geral, constante dos Decretos-Lei n.º 240/2006 e 171/2007, nomeadamente o juízo sobre se a proibição de certas cláusulas contratuais para o futuro implica ou não um juízo sobre a sua nulidade para o passado, por alegadamente revestirem carácter abusivo; H. Esta questão tem óbvia relevância por afectar um número indeterminado de sujeitos de direito (instituições de crédito e, sobretudo, os consumidores que recorrem ao crédito) e a sua elucidação jurídica pela mais Alta Instância Judicial do Pais contribuirá seguramente para se firmar uma jurisprudência consolidada "claramente necessária para uma melhor aplicação do direito".
I. É, pois, admissível o presente recurso de revista excepcional ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art. 721.º - A do CPC ou, a título subsidiário, ao abrigo da alínea a) do mesmo número e artigo; J. Acresce que, tendo o douto Acórdão recorrido expressamente afirmado que o Ministério Público tinha interesse em agir e que acção não se tinha tornado supervenientemente inútil, está o mesmo em contradição com o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Maio de 2011, transitado em julgado e em que este Banco foi também parte (Proc. n.º 1593/08.0T JLSB.L 1), sobre a mesma questão de direito e no domínio da mesma legislação (Decreto-Lei n.º 446/85, versão em vigor), razão por que este recurso de revista excepcional é também admissível ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do art. 721.º - A do CPC, devendo mesmo ser julgado em plenário de secções cíveis (ex vi, art. 732.º - A do CPC); K. As cláusulas contratuais postas em crise pelo Ministério Público previam que a taxa de juros nominal, determinada a partir de um indexante (taxa Euribor) em certo período temporal de vigência do contrato de concessão de crédito seria "arredondada ao % de ponto percentual igualou superior" (cláusula 4.ª, n.º 3), acolhendo um método de "arredondamento em alta"; L. Numa dessas minutas contratuais, estava claramente explicitado que a "Taxa Anual de Encargos Efectiva Global - TAEG" era calculada com a fórmula matemática constante do Decreto-Lei n.º 359/91, de 21 de Dezembro (disciplina de crédito ao consumo) - diploma em vigor até 2009 - que tal taxa era variável, tendo a variação por indexante a referida taxa Eurib a 12 meses e que era arredondada pelo modo indicado; M. Importa chamar a atenção que em qualquer das minutas contratuais impugnadas existe uma cláusula também de contrapartida na medida em que só autoriza a revisão dos alugueres, rendas ou taxas de juro quando a média de variação...
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