Acórdão nº 73/08.8TTBGC.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Fevereiro de 2013

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução19 de Fevereiro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 25 de Fevereiro de 2008, no Tribunal do Trabalho de Bragança, AA intentou acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato de trabalho contra BB, Lda., EMPRESA ..., Lda., e CC, Lda., pedindo que se reconhecesse que a conduta das rés foi de manifesta fraude à lei, condenando-as, solidariamente, a reconhecerem a nulidade dos termos apostos nos sucessivos contratos de trabalho firmados, com as consequências legais, que fosse declarado ilícito o despedimento e as rés condenadas a pagar-lhe as quantias indicadas na petição inicial, entretanto, corrigida, a título de diferenças salariais, vencimentos, diuturnidades, refeições fora do local do trabalho, dormidas, trabalho suplementar, subsídio de agente único, indemnização e diferenças salariais «devidas nos termos do disposto no art. 437.º do Código do Trabalho».

Alegou, em suma, que firmou, com a 1.ª ré, um contrato de trabalho a termo, em 1 de Maio de 2000, para desempenhar as funções de motorista de pesados de passageiros, contrato renovado por duas vezes, até que, em 1 de Abril de 2003, lhe foi comunicada a intenção de não renovar o contrato, tendo, de imediato, celebrado com a 2.ª ré um contrato de trabalho a termo para prestar serviços como motorista de pesado de passageiros, contrato que vigorou pelo período de um ano, e, em seguida, ajustou com a 3.ª ré um novo contrato de trabalho a termo, pelo período de um ano, para prestar serviços de motorista de pesado de passageiros, contrato que se renovou por três vezes, até que lhe foi comunicada a intenção de não renovação do contrato, sendo que a celebração dos referidos contratos é ilegal, porquanto visou impedir a sua progressão na carreira, o pagamento de diuturnidades e a obtenção de vínculo, e operar a prescrição de créditos laborais, já que todas as empresas são geridas pela mesma pessoa, DD, sob cujas ordens, direcção e fiscalização trabalhou, conduzindo principalmente um veículo pertencente à 2.ª ré e efectuando as mesmas rotas ao serviço das rés, rotas essas tituladas em conjunto pelas rés.

Sustentou, ainda: que as rés lhe pagaram vencimentos mensais inferiores aos previstos nas tabelas salariais aprovadas pelas sucessivas convenções colectivas em vigor para o sector; nunca lhe pagaram as diuturnidades devidas desde Maio de 2003; não lhe pagaram o vencimento relativo aos meses em que era despedido e ficava sem trabalhar, a gozar férias, como lhe era dito; por se encontrar deslocado, tinha direito ao reembolso das despesas com as refeições e dormidas, nos termos da convenção colectiva de trabalho aplicável, quantias que as rés nunca pagaram; prestou trabalho extraordinário que as rés nunca lhe remuneraram, designadamente na preparação da viagem e no final desta e nas deslocações desde o seu local de trabalho até ao local de início da carreira ou expresso e vice-versa e muitas foram as semanas em que esteve ao serviço das rés mais de 40 horas semanais; desde Junho de 2003, tem direito a dois dias de descanso semanal, mas muitas foram as vezes em que só teve um dia de descanso semanal, não lhe tendo sido concedido um dia de descanso complementar; tem direito ao subsídio de agente único previsto no CCT, pois exercia funções inerentes a tal função; as rés agiram em comunhão de esforços, com o único objectivo de lesarem os trabalhadores nos seus direitos laborais, configurando a sua conduta uma situação de fraude à lei, pelo que mantém, na íntegra, o direito sobre os créditos laborais vencidos desde 1 de Maio de 2000, sendo o despedimento ilícito.

As rés contestaram, impugnando, no essencial, os factos alegados pelo autor e excepcionando a prescrição de créditos relativamente às rés BB, Lda., e Empresa ..., Lda.

O autor não respondeu.

Após julgamento, foi proferida sentença, que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a CC, Lda., a pagar ao autor € 2.306,52, a título de subsídio especial de agente único, absolvendo esta ré dos demais pedidos e as restantes rés da totalidade do pedido formulado pelo autor.

  1. Inconformado, o autor apelou para o Tribunal da Relação do Porto, o qual deliberou conceder provimento parcial ao recurso de apelação, revogar a sentença recorrida, no segmento «em que absolveu as Rés BB, Lda., e Empresa ..., S. A., da totalidade dos pedidos e em que absolveu a Ré CC, Lda., dos demais pedidos», declarar ilícito o despedimento do autor e condenar as rés a reconhecer a nulidade do termo aposto nos contratos celebrados com o autor, por fraude à lei, e a pagarem-lhe, solidariamente: (i) € 1.092,45, a título de vencimentos relativos a Maio de 2003 e Junho de 2004; (ii) € 912,93, a título de diuturnidades; (iii) € 7.900,49, a título de indemnização de antiguidade, sem prejuízo da antiguidade que se vencer até ao trânsito em julgado da decisão; (iv) as retribuições que o autor deixou de auferir, desde 25 de Janeiro de 2008 e até ao trânsito em julgado da decisão, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 437.º do Código do Trabalho de 2003, a determinar em posterior liquidação; (v) a quantia de € 2.306,52, indicada na sentença recorrida.

    É contra esta deliberação que a ré CC, Lda., se insurge, mediante recurso de revista, aduzindo as conclusões seguintes: «1.ª A intenção de fraude à lei carece de ser provada por quem a alega.

    2.ª No caso dos autos, esse facto foi julgado não provado.

    3.ª A existência de exploração conjunta de um serviço por empresas distintas, autónomas, com sócios distintos, administrações diversas e sem participações recíprocas não configura grupo empresarial.

    4.ª Em caso de despedimento ilícito, o trabalhador tem de optar pela reintegração ou pela indemnização em substituição da reintegração.

    5.ª Tendo o A., na petição inicial, pedido indemnização em substituição do despedimento e não requerendo a reintegração, não é devido o pagamento de retribuições vincendas até ao trânsito em julgado.

    6.ª O douto acórdão fez, pois, errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 130.º, n.º 2, 437.º, 438.º e 439.º do Código de Trabalho/2003.» Termina afirmando que «deve ser concedida a revista, revogando-se o douto acórdão recorrido, com o que [se] fará Justiça!» Os recorridos não contra-alegaram.

    Neste Supremo Tribunal, a Ex.

    ma Procuradora-Geral-Adjunta concluiu que a revista devia ser negada, defendendo, quanto à questão nuclear posta no recurso, que se devia considerar «ilícito o despedimento de que foi alvo, o A., face à utilização abusiva da personalidade colectiva que, como tal deve ser, in casu, desconsiderada», parecer que, notificado às partes, não foi objecto de qualquer resposta.

  2. No caso vertente, as questões suscitadas são as que se passam a enunciar: – Se não ocorreu uma utilização abusiva da personalização das sociedades envolvidas na sucessão dos contratos de trabalho celebrados (conclusões 1.ª a 3.ª e 6.ª, na parte atinente, da alegação do recurso de revista); – Caso se configure o despedimento ilícito do autor, se não lhe é devido o pagamento das retribuições intercalares (conclusões 4.ª a 6.ª, na parte atinente, da alegação do recurso de revista).

    Corridos os «vistos», cumpre decidir.

    II 1.

    O tribunal recorrido deu como provada a seguinte matéria de facto: 1) O A. celebrou, de forma escrita, um contrato de trabalho a termo com a R. BB, com início em 1 de Maio de 2000, pelo qual se obrigou a prestar os serviços da sua profissão, como motorista de pesados de passageiros, a tempo inteiro, contrato esse cuja cópia se mostra junta aos autos a fls. 9 e cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido; 2) Contrato que se renovou por duas vezes; 3) No dia 1 de Abril de 2003, foi comunicada ao A., pelo gerente da R. BB, Lda., a intenção de não renovar o contrato de trabalho celebrado três anos antes, conforme documento que se mostra junto aos autos a fls. 10 e cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido; 4) Em 01/06/2003, o A. celebrou com a R. Empresa ..., Lda., por escrito, novo contrato de trabalho a termo, pelo qual se obrigou a prestar os serviços da sua profissão, como motorista de pesados de passageiros, a tempo inteiro, contrato esse cuja cópia se mostra junta aos autos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT