Acórdão nº 3557/07.1TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Fevereiro de 2013

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA, BB e CC propuseram uma acção contra a Companhia de DD, SA, o Fundo de Garantia Automóvel e EE, pedindo a condenação “do R. ou RR. responsáveis” no pagamento: – aos dois primeiros autores, de “a. € 10.000,00 relativos aos danos próprios sofridos pela sua falecida filha; b. € 130.000,00 relativos a danos morais próprios dos AA.; c. € 120.000,00 relativos ao dano de perda do direito à vida; d. € 1.494,50 relativo a danos patrimoniais”, “no total de € 261.494,50”; – à terceira autora, de “a. € 250.000,00 relativos a danos morais; b. No pagamento de todas as despesas de transporte, médicas, medicamentosas e hospitalares que a mesma venha a carecer no futuro e que sejam relacionadas com as sequelas do acidente; c. € 1.938,00 a título de despesas de transporte efectuadas; d. € 335,00 a título de roupa danificada; e. € 8.691,37 a título de vencimentos perdidos; f. € 280.000,00 a título de perda de capacidade aquisitiva. Subsidiariamente (…)” o que “em execução de sentença (…) vier a ser devido a este título (…)”,“no total de € 539.226,10”, “em primeira linha”, da ré DD; se vier a demonstrar-se a nulidade do contrato de seguro, do réu Fundo de Garantia Automóvel.

Para o efeito, e em síntese, alegaram ter ocorrido um acidente de viação, causado por culpa exclusiva do réu EE, consistente no atropelamento de FF, filha dos dois primeiros autores, que faleceu, e da autora CC, que sofreu ferimentos graves. Em seu entender, o acidente ficou a dever-se ao excesso de velocidade com que o veículo seguia, que passou um sinal vermelho e veio a colher as duas vítimas que, com sinal verde, atravessavam a rua na passagem de peões.

Invocaram ainda o contrato de seguro obrigatório de responsabilidade civil celebrado com a ré DD e a circunstância de esta Companhia ter oposto a respectiva nulidade, razão pela qual demandaram também o Fundo de Garantia Automóvel e o condutor, em litisconsórcio necessário por imposição legal.

Contestaram a Companhia de DD e o réu EE.

A ré DD invocou a nulidade do contrato de seguro e, consequentemente, a sua ilegitimidade, impugnou diversos factos alegados pelos autores, sustentou que o acidente foi provocado por culpa das vítimas, que “atravessaram a passadeira com luz vermelha” e discordou dos montantes indemnizatórios pretendidos, por serem excessivos. Requereu ainda que fosse notificada a Segurança Social “para vir aos autos reclamar o pagamento das quantias que eventualmente haja pago, quer a título de subsídio de doença à A. CC, quer a título de subsídio de funeral aos A.A. AA e mulher”.

EE impugnou diversos factos e descreveu o acidente de forma diversa da que foi relatada pelos autores. Por entre o mais, recordou que ocorreu numa zona na qual, de madrugada, há frequentemente acidentes, nomeadamente atropelamentos, e onde se concentra um grande número de jovens, que costumam ocupar parte da faixa de rodagem; alegou ter o sinal verde aberto, ir em velocidade moderada, tendo “acabado de arrancar de um outro sinal luminoso, mais atrás”, a menos de 400m do local do acidente; disse que o embate não se verificou com a parte da frente, mas “numa zona lateral do veículo”, o que revela que “as duas jovens se precipitaram para a passadeira e, não se apercebendo da aproximação do veículo, foram embater no mesmo”, que atravessaram a correr, após hesitação, com sinal vermelho; e sustentou a validade do contrato de seguro, no momento do acidente.

Os autores replicaram, designadamente invocando abuso de direito da ré Seguradora.

O Instituto da Segurança Social, IP veio pedir o reembolso de € 3.411,22.

O Centro Hospitalar de Lisboa Central, E.P.E. interveio a fls. 458, como associado dos autores, na sequência de requerimento do Fundo de Garantia Automóvel, de fls. 343, deferido pelo despacho de fls. 450, pedindo a condenação da ré DD no pagamento de € 31.095,73, com juros legais.

Entretanto, a fls. 362, o Fundo de Garantia Automóvel requerera a apensação do proc. nº 182/09.6TVLSB, instaurado pelo Centro Hospitalar de Lisboa Central, EPE, contra o próprio Fundo e o réu EE, pedindo a sua condenação no pagamento dos mesmos € 31.095,73, correspondentes à assistência prestada à autora CC. A apensação foi determinada pelo despacho de fls. 435.

No referido processo, ambos os réus haviam contestado. O Fundo de Garantia Automóvel, impugnando o que o Centro Hospitalar alegara; EE sustentando a sua ilegitimidade, requerendo a suspensão da instância por estar pendente a acção a que este recurso respeita ou a improcedência da acção. O autor replicara.

  1. Pela sentença de fls. 752, a acção foi julgada parcialmente procedente, sendo a ré DD condenada a pagar: 1. Aos AA. AA e BB as seguintes quantias: a) A quantia de € 10.000,00 respeitante aos danos próprios sofridos por sua filha FF antes de falecer.

    b) A quantia de € 50.000,00 (€ 25.000,00 para cada um dos AA.) relativos aos danos morais próprios destes.

    c) A quantia de € 100.000,00 relativos ao dano perda do direito à vida.

    d) A quantia de € 1.494,50 relativo a danos patrimoniais.

  2. À A.CC as seguintes quantias: a) A quantia de € 50.000,00 relativo a danos morais, b) A quantia de € 1.938,00 a título de despesas de transporte efectuadas, c) A quantia de € 180.000,00 a título de perda de capacidade aquisitiva.

  3. Ao Centro Hospitalar de Lisboa Central – EPE a quantia de € 31.095,73 relativos à prestação de cuidados de saúde, acrescido de juros de mora à taxa legal de 4%.

  4. Ao Instituto de Segurança Social, que deduziu pedido de reembolso contra os RR. no valor de € 3.411,22 referente a prestações pecuniárias pagas à A. CC, acrescida de juros de mora, à taxa legal desde a citação.” EE e o Fundo de Garantia Automóvel foram absolvidos dos pedidos contra eles formulados.

    Em síntese, entendeu-se na sentença: – Que a ré DD respondia “perante os Autores pelos danos emergentes do acidente, a provar-se que os mesmos foram causados pelo veículo seguro”; – Que “não se apurou que o condutor do veículo ou as sinistradas tenham desrespeitado o respectivo sinal luminoso”; – Mas que o réu EE circulava a velocidade superior a 50 km/h, apesar de ser esta a velocidade máxima permitida, ou, em todo o caso, “excessiva para as condições do trânsito na zona do acidente”e que “por essa razão não conseguiu diminuir a velocidade e parar no espaço livre e visível à sua frente de modo a evitar o embate”, – violando desta forma normas do Código da Estrada (artigos 24º, nº 1, 25º, nº 1, a) e c) e 27º), constituindo-se na obrigação de indemnizar os lesados (artigo 483º do Código Civil); – Que a ré Seguradora é, portanto, responsável; – Que os danos sofridos justificam a condenação no pagamento das indemnizações referidas.

    A ré recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa; pelo acórdão de fls. 879, foi concedido provimento parcial ao recurso, ficando a ré condenada a pagar “a) aos 1o e 2o AA./Apelados: - € 7.000,00, respeitantes aos danos próprios sofridos por sua filha FF antes de falecer.

    - A quantia de € 75.000,00, relativa ao dano perda do direito á vida.

    b) à 3aA./Apelada - € 40.000,00, relativos a danos morais, - € 160.000,00 a título de perda de capacidade aquisitiva”, mantendo-se, quanto ao mais, a sentença recorrida.

  5. A ré DD e os autores recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça; os recursos, aos quais não são aplicáveis as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, foram recebidos como revista, com efeito devolutivo.

    Os réus vieram posteriormente desistir do recurso; pelo despacho de fls. 1002, foi julgada válida a desistência.

    Nas alegações que apresentou, a recorrente formulou as seguintes conclusões: «1ª - Os depoimentos das testemunhas ouvidas em julgamento não são coincidentes quanto à cor que os semáforos apresentavam no momento do acidente e não se afigurou ao Tribunal que alguma delas estivesse a faltar à verdade, pelo que ficou sem se saber se no momento do embate a luz estava verde para os peões e vermelho para os veículos e vice-versa.

    1. - Daí resultou a atribuição da culpa exclusiva ao condutor do automóvel, quer pelo Tribunal da 1ª. Instância quer pela Relação, com fundamento no facto de conduzir a mais de 70 Kms/hora, apesar de no local a velocidade máxima permitida ser de 50 Kms/hora.

    2. - Porém, da conjugação dos factos dados como provados, com a participação do acidente elaborada pela PSP e com as fotos do local, forçoso é concluir que também as vítimas contribuíram para a eclosão do acidente e agiram com culpa, que deve ser graduada em 50% porquanto violaram o disposto no nº. 1 do art°. 101 do Código da Estrada – o que não foi tomado em consideração pelas Instâncias.

    3. - Na verdade, a Avª. 24 de Julho tinha 5 filas de trânsito (3 no sentido Nascente/Poente e 2 no sentido Poente/Nascente), o veículo atropelante seguia na fila da esquerda no sentido Poente/Nascente, as vítimas atravessavam a passadeira da esquerda para a direita, considerando o sentido de marcha do automóvel e o local formava uma extensa recta.

    4. - O condutor do automóvel circulava na fila esquerda e reparou que as vítimas se encontravam a atravessar a passadeira numa das 3 filas da semi-faixa de rodagem contrária, pelo que também estas avistaram (ou poderiam avistar) o veículo circulando em aproximação à passadeira e na semi-faixa de rodagem contrária, tendo a obrigação de não continuar a andar e de não cortar a linha de marcha do automóvel.

    5. - Menosprezando a aproximação do veículo na semi-faixa de rodagem contrária, as vítimas continuaram a percorrer a passadeira, obrigaram a que o condutor fizesse uma travagem brusca quando se encontrava a 14,80 metros dessa passadeira e guinasse para a fila mais à direita para evitar o embate e acabaram por ser atropeladas nessa fila mais à direita (e não o teriam sido se tivessem parado na 4ª fila, onde se encontravam quando o condutor travou e guinou para a direita).

    6. - Se as vítimas tivessem cumprido o que dispõe o nº. 1 do art°. 101 do Código da Estrada, como estavam obrigadas...

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