Acórdão nº 3371/08.7TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Fevereiro de 2013

Magistrado ResponsávelSALRETA PEREIRA
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA AA - …, S.A. instaurou acção com processo ordinário contra BB - …, UNIPESSOAL, LDª., e CC, pedindo que se condenem solidariamente os Réus a pagarem-lhe as quantias de: a) € 100.000,00 (cem mil euros) a título de cláusula penal pela violação da obrigação de não concorrência na pendência do Contrato, nos termos da Cláusula 16ª do Contrato de Licença; b) € 100.000,00 (cem mil euros) a título de cláusula penal pela violação da obrigação de não concorrência após a cessação do contrato pela violação da Cláusula Oitava do Acordo de Revogação do Contrato de Licença; c) € 3.444,78 (três mil quatrocentos e quarenta e quatro euros e setenta e oito cêntimos) a título de dívida capital ao qual acrescem juros legais vencidos e vincendos e juros contratuais calculados em dobro sobre a taxa legal, que até à presente data ascendem ao montante de € 957,96 (novecentos cinquenta e sete euros e noventa e seis cêntimos); d) € 200.000,00 (duzentos mil euros) a título de danos não patrimoniais; e) Juros vencidos e vincendos calculados à taxa legal.

Contestaram as Rés e deduziram reconvenção, na qual pediram a condenação da Autora a pagar à Ré BB a quantia de € 127.891,69, a título de danos patrimoniais causados pelo não cumprimento do contrato de licença.

Foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou solidariamente os Réus a pagarem à Autora as quantias de € 3.444,78, acrescida de € 957,96 de juros moratórios vencidos e nos vincendos, à taxa contratual correspondente ao dobro dos juros legais, e ainda o montante de € 100.000,00, acrescidos de juros de mora, desde a citação, à taxa supletiva dos juros comerciais dos créditos das empresas comerciais, absolvendo-se os Réus do demais peticionado e a Autora do pedido reconvencional.

Inconformados, os Réus recorreram para o Tribunal da Relação de Lisboa, que proferiu acórdão a julgar improcedente a apelação e a confirmar a sentença.

De novo inconformados, os RR interpuseram revista excepcional para este Supremo Tribunal de Justiça, que foi admitida por acórdão de fls. 1366 a 1379.

Alegaram com as seguintes conclusões: 1ª. O acórdão recorrido, apesar de julgar nula a cláusula 8ª do contrato de revogação, em virtude do seu carácter anticoncorrencial, condenou os recorrentes pelo respectivo incumprimento.

  1. Para o efeito, o Tribunal aplicou o regime da nulidade parcial e da redução, nos termos do disposto no artº. 292º do CC.

  2. À luz da jurisprudência estabelecida dos tribunais europeus a nulidade absoluta impede que se leve a cabo uma redução, conversão ou qualquer outra forma de modificação de uma obrigação de uma obrigação ou cláusula anticoncorrencial em si mesma, que tenha por resultado a inerente produção de efeitos jurídicos retroactivos.

  3. O Tribunal recorrido não reduziu aquela cláusula, antes a converteu numa cláusula com objecto diverso, atribuindo-lhe um conteúdo material que o seu texto, objectivamente interpretado, não comportava.

  4. Para além da violação do artº. 101º nº 2 TFUE e 4º nº 2 da LdC, tal conversão demonstra que – mesmo do ponto de vista meramente civil – não podia estar em causa uma nulidade parcial, mas integral.

  5. Em caso de dúvida sobre a interpretação proposta pelos recorrentes deve o Tribunal ordenar a suspensão da instância a fim de colocar as pertinentes questões prejudiciais ao TJUE.

  6. O contrato de licença incluía disposições contratuais que conjugadamente incentivavam o licenciado a cumprir a política de preços de venda da rede, já que estes eram definidos pelo licenciador, tratando-se de preços âncora ou mínimos.

  7. Tais cláusulas infringiam, pois, o artº. 101º nº 1 al. a) TFUE e 4º nº 1 al. a) da LdC, sendo igualmente nulas por força do nº 2 dos mesmos preceitos.

  8. A relação de concorrência potencial entre as partes, aquando da celebração do Contrato de Revogação proibia que estas convencionassem entre si qualquer tipo de pacto de não concorrência.

  9. O Regulamento de Isenção relativo a categorias de acordos verticais apenas se aplica, por definição, a acordos verticais, a acordos entre empresas não concorrentes.

  10. A imposição in casu aos recorrentes de qualquer obrigação de não concorrência, ainda que semelhante cláusula se houvesse teoricamente conformado com as condições materiais, territoriais e temporais decorrentes do artº. 5º al. b) do Regulamento de Isenção seria sempre proibida.

  11. A prática decisória da Comissão Europeia e a doutrina mais autorizada ensinam que a possibilidade excepcional e restritiva de imposição das obrigações de não concorrência pós contratuais se limita às relações contratuais de franquia propriamente ditas, enquanto que o contrato em análise era uma mera licença de uso de marca, já que se não conformava com as exigências típicas de cooperação comercial impostas pela franquia.

  12. A A não aduziu qualquer prova a respeito do excepcional cumprimento daquela condição relativa à transmissão contínua de saber fazer substancial, pelo que semelhante restrição pós contratual estaria longe de ser essencial ao equilíbrio das prestações do negócio jurídico em causa.

A recorrida contra alegou, pugnando pela negação da revista e confirmação do acórdão recorrido.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

O Tribunal da Relação de Lisboa julgou provados os seguintes factos: 1. A rede de clínicas DD está instalada em Espanha e Itália (alínea AG da especificação).

  1. A autora explora directamente ou concede, através da celebração de contratos de licença, a exploração de Clínicas Dentárias DD no território nacional (alínea A da especificação).

  2. O réu detém uma participação de 100% no capital da ré (alínea B da especificação).

  3. No dia 30.3.2001, a sociedade "EE, Lda", na qualidade de franqueador, e a ré, na qualidade de franqueado, celebraram o acordo escrito junto aos autos a fls. 37-37, denominado "contrato de franquia", mediante o qual aquela concedeu a esta o direito de explorar uma Clínica DD, mediante o seu sistema de franquia (alínea C da especificação).

  4. Da cláusula 3.1 do “contrato de franquia" consta nomeadamente o seguinte: “Durante a vigência do contrato o Franqueador atribui ao Franqueado uma zona geográfica exclusiva para a exploração da franquia, correspondente ao actual concelho de Coimbra e Condeixa-a-Nova" (alínea D da especificação).

  5. A cláusula 4.1 do 'contrato de franquia" tem a seguinte redacção: "O presente contrato entrará em vigor na data da sua assinatura pelas partes e terminará depois de decorridos 10 anos, contados desde o dia de abertura da clínica ao público" (alínea D da especificação).

  6. A cláusula 12 do" contrato de franquia' tem a seguinte redacção: " 12.1. O Franqueado obriga-se a utilizar o programa informático cedido pelo Franqueador e cuja propriedade pertence a este último.

    Este programa informático é composto não apenas por ficheiros, mas também por dados nele armazenados, na medida em que tais dados não sejam do domínio público nem facilmente acessíveis ou conhecidos pelo público em geral. A cessão é feita de um modo pessoal, exclusivamente ao Franqueado, ficando expressamente vedada a sua transferência a favor de terceiros sem o consentimento do Franqueador.

    12.2. A fim de conseguir a máxima uniformidade possível na gestão de todas as clínicas da rede e em benefício de todas elas, o Franqueado obriga-se a utilizar o programa para a gestão da sua clínica.

    12.3. O programa é cedido pelo Franqueador ao Franqueado para a sua utilização na clínica franqueada, estando totalmente vedada a sua utilização uma vez resolvido o contrato de franquia, por qualquer causa. O Franqueado fica assim obrigado a devolver o programa ao Franqueador, comprometendo-se a não o utilizar a partir do momento em que o presente contrato seja resolvido” (alínea F da especificação).

  7. A cláusula 17 do "contrato de franquia tem a seguinte redacção: "17.1. Durante a vigência do presente contrato, o Franqueado compromete-se...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT