Acórdão nº 1767/08.3TTLSB.L1S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelMARIA CLARA SOTTOMAYOR
Data da Resolução16 de Janeiro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I - Relatório 1.

  1. AA intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum contra BB - Serviços e Gestão, S.A.

    pedindo que: 1) Seja anulada a sanção disciplinar de suspensão por 50 dias, com perda de retribuição, que lhe foi aplicada pela Ré; 2) Seja a Ré condenada a pagar ao A. as quantias que abaixo se discriminam: a) € 10.636,00, a título de quantia indevidamente descontada, acrescida de juros legais desde a data da respectiva retenção até efectivo e integral pagamento; b) € 106.360,00, a título de indemnização face ao carácter abusivo da sanção aplicada, acrescida de juros legais; c) € 5.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros legais.

    Em fundamento da sua pretensão, alegou, em síntese: que foi admitido, em 5 de Fevereiro de 2005, com a categoria profissional de Chefe de Serviço de Sistemas e Suporte a Utilizadores; que a actividade de Chefe de Serviço desenvolvida pelo Autor estava hierárquica e directamente subordinada a um Director de Sistemas de Informação; que, no decurso da relação laboral, após a saída do referido Director de Sistemas de Informação, em Dezembro de 2003, o Autor começou a exercer as funções que até então aquele exercia e que decorrem da atribuição de poderes inerentes à categoria profissional de Director, o que fez ao longo de cerca de 4 anos, criando no Autor a expectativa de reconhecimento dessa categoria; que foi informado, em Novembro de 2007, de que ia ser contratada outra pessoa para o cargo de Director, tendo o Autor manifestado ao Administrador da Ré as suas legítimas expectativas a esse cargo; que na sequência de tal contratação, os advogados do Autor enviaram uma carta à Ré, reclamando a referida categoria de Director e as diferenças salariais retroactivas a Janeiro de 2004, carta que o Autor entregou em mão ao Administrador da Ré, em 23 de Janeiro de 2008; que na sequência dessa carta, em 25 de Janeiro de 2008, ao Autor foi instaurado processo disciplinar com suspensão preventiva; que só foi notificado da nota de culpa, em 27 de Fevereiro de 2008, para além do prazo previsto no art. 417.º, n.º 2 do CT, pelo que a Ré violou o dever de ocupação efectiva; que veio a ser-lhe aplicada sanção disciplinar de suspensão da prestação de trabalho com perda de retribuição e antiguidade, pelo período de 50 dias úteis e que tal sanção é abusiva por ser clara decorrência da invocação das suas legítimas expectativas de lhe ser formalmente reconhecida a categoria profissional de Director de Sistemas de Informação, e demais direitos e regalias daí decorrentes.

    Com base no exposto, o Autor reclama a retribuição devida pelo período de suspensão, bem como a indemnização devida pela aplicação de sanção disciplinar abusiva e indemnização por danos morais que alega ter sofrido.

    Antes ainda de ordenada a citação da Ré, o Autor veio a fls. 133 e ss. aditar novo pedido, porquanto a Ré lhe descontou a quantia de € 598,48 na retribuição de Março de 2008, relativa a despesas de telefone durante o período em que esteve preventivamente suspenso, o que não aceita, porquanto a utilização, pelo Autor, de um telemóvel propriedade da Ré, tanto para fins profissionais como para fins pessoais, faz parte integrante da sua remuneração e, além disso, não lhe pagou os três primeiros dias de Abril, sendo-lhe devida a quantia de € 638,16, tendo em conta que só começou a cumprir a sanção em 4 de Abril de 2008, peticionando estes valores, bem como juros de mora desde a data da sua retenção ou vencimento.

    Realizada a audiência de partes, a Ré apresentou contestação, defendendo, em suma, que o Autor quis fazer crer que o procedimento disciplinar, bem como a respectiva sanção, foram motivados pela reivindicação de uma categoria profissional, cujas funções aliás nunca exerceu (estando a questão da categoria profissional a ser discutida numa outra acção com o n.º 1085/08.7TTLSB). Contudo, alega a Ré que a razão de tal procedimento disciplinar foi a contestação aberta e desproporcionada à contratação do novo Director e a recusa de colaboração com ele, bem como o facto de o Autor ter tentado aceder a informação confidencial relativa a salários e exibido a folha de vencimento do ex-Director, sem para tal estar autorizado, para além de ter comparecido alcoolizado ao serviço, tendo violado os deveres de obediência, de respeito, urbanidade e probidade, de lealdade e de realizar o trabalho com zelo e diligência, o que fez de forma dolosa, sendo a sanção disciplinar adequada.

    O Autor respondeu à contestação nos termos de fls. 229 e ss., sustentando a improcedência da excepção e impugnando um documento junto.

    Admitida a cumulação de pedidos de fls. 133 (fls. 242), foi fixado o valor da acção em € 121.996,00 (fls. 245) e dispensada a fixação de matéria de facto assente, bem como a organização de base instrutória e proferido despacho saneador (fls. 248‑249).

    A fls. 252 e ss. veio, ainda, o Autor formular um novo pedido de pagamento de ajudas de custo de Abril e Junho de 2009, que contabiliza em € 1.500,00, acrescidas de juros, pedido que a Ré contestou a fls. 270-271, por entender não serem devidas ajudas de custo ao Autor.

    Foi admitido tal novo pedido por despacho proferido a fls. 334.

    Realizado o julgamento (fls. 383 e ss.), veio a ser proferida decisão sobre a matéria de facto em litígio (fls. 392 e ss.), a qual não foi objecto de reclamação e foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo: «Face ao exposto julgo a ação parcialmente procedente, por provada, e consequentemente: a. Declaro anuladas, por falta de prova dos factos que as fundamentam, as seguintes sanções aplicadas por BB - SERVIÇOS E GESTÃO, S.A. ao seu trabalhador AA: i. pela violação do dever de lealdade para com a sua entidade patronal - 22 dias úteis; ii. pela falta de interesse pelo cumprimento, com o zelo e a diligência devidos, das obrigações inerentes às suas funções - 8 dias úteis.

    1. Condeno a R. a pagar ao A. a quantia € 6.285 (seis mil duzentos e oitenta e cinco euros), relativa à restituição da retribuição dos 30 dias úteis de suspensão anulados.

    2. Condeno a R. a pagar ao A. a quantia de € 628,50 (seiscentos e vinte e oito euros e cinquenta cêntimos), relativa à retribuição de 1 a 3 de Abril de 2008; d. Condeno a R. a pagar ao A. a quantia de € 1.500 (mil e quinhentos euros) a título de ajudas de custo relativas aos meses de abril e junho de 2009; e. Condeno a R. a devolver ao A. a quantia de €598,48 (quinhentos e noventa e oito euros e quarenta e oito cêntimos) relativos a despesas efetuadas pelo A. com telefone durante o período em que esteve preventivamente suspenso.

    3. Todas as mencionadas quantias vencem juros civis à taxa legal desde a data em que deviam ter sido pagas, data do seu vencimento, até pagamento integral e efetivo.

    4. Absolvo a R. dos demais pedidos formulados pelo A.» O Autor, inconformado, interpôs recurso desta decisão para o Tribunal da Relação de Lisboa, que decidiu o seguinte: «Em face do exposto, julga-se o presente recurso parcialmente procedente e, por força da anulação global a que se procede da sanção disciplinar de 50 dias de suspensão da prestação de trabalho com perda de retribuição, revoga-se a sentença recorrida na parte em que absolveu a R. BB-Serviços e Gestão, S.A. dos demais pedidos formulados na petição inicial e condena-se a mesma, ainda: 4.1.

    A pagar ao recorrente a quantia € 4.190,00 (quatro mil sento e noventa euros), relativa à restituição da retribuição dos 20 dias úteis de suspensão da prestação de trabalho, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data do seu vencimento até integral pagamento; 4.2.

    A pagar ao recorrente a quantia de € 1.000,00 (mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação até integral pagamento; no mais se absolvendo do peticionado.» 1.2.

    Inconformado, o Autor recorreu para este Supremo Tribunal, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: «I. O Tribunal da Relação de Lisboa entendeu, e bem, anular a sanção disciplinar unitária de suspensão da prestação de trabalho com perda de retribuição e de antiguidade, pelo período de 50 dias úteis, aplicada pela Recorrida ao Recorrente, condenando-a no pagamento das retribuições correspondentes e outras quantias peticionadas, tudo acrescido de juros moratórios, II. Uma vez considerando tal sanção disciplinar de suspensão por 50 dias úteis um gravame absolutamente injustificado/ excessiva/ desproporcional, tanto pela falta de prova de comportamentos que a sustentem como pelo facto de as circunstâncias temporais e exteriores mitigarem a culpa do trabalhador e aconselharem um menor rigor punitivo.

    1. Porém, apesar de considerar preenchido o elemento objectivo, previsto no n.º 2 do artigo 374.º do CT de 2003, que faz operar a presunção de abusividade daquela sanção disciplinar aplicada pela Recorrida ao Recorrente, decidiu o Tribunal recorrido que tal presunção deveria ter-se por afastada pelo facto de se terem apurado nestes autos condutas do recorrente que alegadamente consubstanciam infracções disciplinares susceptíveis de fundamentar a instauração de um procedimento disciplinar e a aplicação no mesmo de uma sanção, não havendo, por essa via, lugar ao pagamento da indemnização prevista no nº 3 do artigo 375.° do citado Diploma.

      Ora, IV. Atendendo-se aos comportamentos descritos nos pontos 50. a 55. da factualidade provada, jamais dos mesmos, por si, pode concluir-se pela prática pelo Recorrente de qualquer infracção disciplinar, porquanto, V. Embora a lei não dê directamente uma definição de infracção disciplinar, ela está indissociavelmente ligada à ideia de comportamento ilícito e culposo do trabalhador, violador de algum dos seus deveres contratuais ou legais, acrescendo que para haver infracção disciplinar, tem de resultar provado qualquer circunstancialismo que permita entender e concluir, sem mais, que ao...

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