Acórdão nº 3375/09.2TBMTS.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelTAVARES DE PAIVA
Data da Resolução27 de Setembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, residente na Rua ................, n° ..., ....ndar Centro, 4490-489 Póvoa do Varzim, propôs contra BB e cônjuge, CC, residentes na Travessa d........., n° ...., 4460 ... Matosinhos; DD, também residente na Travessa .........., n° ....., 4460 C......, Matosinhos; e, “EE, SA” a presente acção com processo comum na forma ordinária, pedindo:

  1. Seja anulado o contrato de compra e venda do imóvel celebrado entre os Primeiros e Terceira Réus, descrito no artigo 3.° da P.I. e constante da escritura publica de compra e venda, exarada de fls. 1 a 3 do Livro de Escrituras n° 68 D, do 2.° Cartório Notarial de Matosinhos.

  2. Se declare a nulidade do Registo Predial de aquisição pela 3.° Ré de tal imóvel.

  3. Se declare a nulidade da constituição da hipoteca sobre o mesmo prédio para garantia da quantia mutuada peio 4.° Réu à 3.° Ré; quantia hipotecária.

  4. Se ordene o cancelamento na Conservatória do registo Predial de Matosinhos dos registos que incidem sobre o prédio relativos à aquisição pela 3.° Ré, à hipoteca e à assunção da quantia hipotecária pela 3.° Ré, feitos pelas apresentações 00 de 1997/10/20 e n.° 00 de 1997/10/20, respectivamente.

  5. Se ordene que, nas inscrições matriciais relativas ao prédio deixe de figurar como proprietária a 3.ª Ré e passem a constar como tal os Primeiro e Segunda Réus.

    Para tanto alega, em síntese que, sendo os dois primeiros RR, pais do Autor e da Terceira Ré, por escritura pública de compra e venda aludida em a), os primeiros Réus venderam à terceira Ré, pelo preço de catorze milhões de escudos, equivalente a € 69.831,70 um imóvel que identificam. Nessa escritura, a 3.a Ré celebrou com o 4.o Réu, então denominado Banco Nacional de Crédito, SA - contrato de Mútuo com Hipoteca, mediante o qual o 4.º R. concedeu à 3.a Ré um empréstimo no valor de vinte e oito milhões e trezentos e cinquenta mil escudos, garantindo o pontual pagamento mediante a constituição de hipoteca sobre o referido imóvel, a favor do mesmo. Os 1.ºs e 3.ª R.R celebraram o referido contrato, com o total desconhecimento do Autor, que só dele veio a ter conhecimento no decorrer de uma reunião familiar realizada em 7 de Setembro de 2008, sendo que jamais consentiria na compra e venda realizada. O Banco Réu sabia que a 3.a Ré era filha dos Primeiros Réus e que tinha irmãos, tanto mais que um deles representou os Pais na escritura, e sabia também que os Primeiros Réus precisavam do consentimento de todos os seus filhos para a celebração do negócio e que não o tinham.

    Citados os RR., apenas o Réu EE, S.A. contestou, no essencial impugnando, por desconhecimento, os factos pessoais do A. e alegando nunca a 3.a Ré lhe referiu que os vendedores eram seus pais. Aquando do preenchimento da proposta de crédito à habitação, a 3.a Ré indicou um terceiro como pessoa a contactar, pelo que o Banco Réu desconhecia as circunstâncias de toda a matéria de facto alegada pelo Autor, bem como a existência de vínculos familiares entre os vendedores e a ré DD. Porque actuou com boa-fé e a diligencia devida, a nulidade invocada pelo Autor não poderá prejudicar a hipoteca constituída a favor do Réu para garantia do empréstimo constituído a favor da 3.a Ré, dado que beneficia da protecção que lhe é conferida pelo art. 291° do C.C. e pelo art. 7° do Código de Registo Predial. Conclui pela sua absolvição do pedido, e consequente improcedência dos pedidos constantes das alíneas c) e d) no que à hipoteca concerne, com as demais consequências legais.

    O A. apresentou réplica o A., mantendo a sua versão constante da petição inicial e concluindo como naquele articulado.

    No saneador foi o processo julgado isento de nulidades e excepções, prosseguindo com a selecção da matéria assente e organização de base instrutória.

    Realizada a audiência de julgamento, foi a final proferida sentença julgando a acção procedente, por provada, e decidindo: a) anular o contrato de compra e venda do imóvel celebrado entre os Primeiros e Terceira Réus, descrito no artigo 3.° desta PI e constante da escritura publica de compra e venda, exarada de fls. 1 a 3 do Livro de Escrituras n° 68 D, do 2.° Cartório Notarial de Matosinhos.

  6. declarar a nulidade do Registo Predial de aquisição pela 3.° Ré de tal imóvel.

  7. declarar a nulidade da constituição da hipoteca sobre o mesmo prédio para garantia da quantia mutuada pelo 4.° Réu à 3.° Ré; .

    d) ordenar o cancelamento na Conservatória do registo Predial de Matosinhos dos registos que incidem sobre o prédio relativos à aquisição pela 3.° Ré, à hipoteca e à assunção da quantia hipotecária pela 3.° Ré, feitos pelas apresentações 54 de 1997/10/20 e n.° 55 de 1997/10/20, respectivamente.

  8. ordenar que, nas inscrições matriciais relativas ao prédio deixe de figurar como proprietária a 3.ª Ré e passem a constar como tal os Primeiros Réus.

    Inconformado, interpôs o Réu EE, SA recurso de apelação, para o Tribunal da Relação do Porto, que pelo Acórdão inserido a fls. 274 a 290 com voto de vencido, revogou aquela decisão da 1ª instância.

    O A não se conformando interpôs recurso de revista para este Tribunal, formulando nas suas alegações de recurso as seguintes conclusões: 1. Entendeu o Tribunal Recorrido no Acórdão proferido, alterar as respostas do Tribunal de Primeira Instância aos quesitos I9t° e 20.° da BI, respectivamente de parcialmente provado e de não provado, para totalmente provado, fundamentando-se, para tanto, em presunções judiciais retiradas dos factos instrumentais provados nos Autos.

    1. É da competência do Supremo Tribunal de Justiça "verificar da correcção do método discursivo de raciocínio", ou seja, decidir se, no caso concreto, ora ou não permitido o uso da presunção judicial (cfr, Acs. de 31.3.93, CJSTJ, I-II-54; de 20.1.99, Revista 1003/98-1; 18.1.01, Revista 3516/00-2; de 13,3.01, Revista 278/01, in "Sumários", 20,42 e 95).

    2. As ilações que o julgador retira de um facto conhecido (facto base da presunção) para afirmar um facto desconhecido (facto presumido), estão limitadas pelas regras da experiência da vida, da normalidade, dos conhecimentos das várias disciplinas científicas ou da lógica.

    3. No caso em concreto e na fundamentação da alteração das respostas aos quesitos 19° e 20.° da BI, o Tribunal da Relação foi muito além das regras da experiência de vida e da normalidade, nos comentários, afirmações e conclusões com que fundamentou as presunções que efectuou, sendo certo que, em nenhum momento invocou especiais conhecimentos de ciência ou estatística que sustentassem tais conclusões. NA VERDADE, 5. Não se vislumbram quais as razões especiais de ciência que permitiram ao Tribunal da Relação ter uma percepção próxima e exacta do que poderá ser a esmagadora maioria das transacções bancárias, da percentagem da compradores filhos de vendedores, do que é normal na perspectiva das instituições de crédito, de quais são os objectivos centrais das operações comerciais de crédito imobiliário do que é possível àquelas instituições constatar e detectar. (Cfr página 12, 2º parágrafo do Acórdão recorrido) ACRESCE QUE, 6. Presumiu o Tribunal que nunca a Ré DD disse ao Réu Banco ser filha dos vendedores, por presumir que não existia outra possibilidade de o Banco Réu tomar conhecimento que não fosse a comunicação da Ré DD exclusivamente aos dois funcionários do réu ouvidos como testemunhas, que afirmaram n3o ser do seu conhecimento pessoal e não terem eles próprios analisado os documentos de identificação.

    4. Todavia existe um cem número de possibilidades de o Banco Réu ter tomado conhecimento do vício do negócio, designadamente, através de outros funcionários que tiveram acesso aos documentos de identificação, através do angariador de clientes do Banco junto da Repilar, Sr. L.... - a quem a Ré DD disse expressamente ser filha dos vendedores - ou através do funcionário que representou o Banco na escritura, o qual esteve na presença da Ré DD e do próprio irmão da Ré, na qualidade de Procurador dos pais, vendedores.

    5. Na verdade o raciocínio do Tribunal da Relação é manifestamente tautológico, já que para perceber se o Banco Réu desconhecia o vicio, o Tribunal Recorrido partiu do pressuposto que se dois funcionários do Réu Banco n5o sabiam, então o Banco não sabia, por isso, se o Banco não sabia, então a Ré DD nunca o disse. ORA, 9. Sendo, in casu, inadmissíveis as presunções judiciais, não podem ser alteradas as respostas aos quesitos 19.° e 20° da BI. POR SUA VEZ, 10. O regime geral da declaração da nulidade encontra-se previsto no artigo 289° do CC: a declaração da nulidade tem efeitos retroactivos, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado, não se limitando esses efeitos às partes mas estendendo-se a todos os que, entretanto» hajam adquirido direitos na sequência do negócio invalidado.

    6. Por sua vez, o regime previsto no artigo 291° do CC é um regime do excepção à regra geral prevista no artigo 289.° do CC: os direitos adquiridos por terceiros de boa-fé - que, entre outros pressupostos cumulativos, desconhece sem culpa os vícios do negócio «não são prejudicados pela declaração de nulidade.

    7. In casu, o banco Réu alega estar abrangido pela hipótese prevista no artigo 291.° do CC e, em consequência, pretende não ser abrangido pelos efeitos da declaração da nulidade do contrato de compra e venda celebrado entre os Primeiro Réu, a Segunda e a Terceira Rés* pelo que lhe cabia alegar e provar os pressupostos da excepção material prevista no artigo 291»° do CC, ou seja, cabia lhe provar o seu desconhecimento não culposo doa vícios do negócio, 13. É juridicamente insustentável a divisão do pressuposto desconhecimento sem cuba previsto no artigo 291.° do CC em desconhecimento e culpa e considerar que o ónus da alegação B prova do primeiro cabe ao Réu Banco e o de alegação e prova da segunda cabe ao Autor, como faz o Tribunal da Relação do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT