Acórdão nº 1026/07.9TBVFX.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução13 de Setembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA, menor, representado pela sua mãe, BB, instaurou acção de condenação, com a forma de processo ordinário, contra a “Companhia de Seguros ..., SA.”, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia total de €328.500,00, acrescida de juros de mora vincendos, desde a citação até integral pagamento.

Para fundamentar a sua pretensão, o A. alega, em síntese, que, no dia 30/6/2006, na EN nº 10, km 126,9, concelho de Vila Franca de Xira, ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes o veículo automóvel de matrícula ...-JQ, conduzido por motorista ao serviço da respectiva proprietária e segurado na R., e o motociclo de matrícula ...-UU, conduzido pelo seu falecido pai, CC, cuja eclosão imputa a culpa exclusiva do condutor do ...-JQ que, quando circulando em sentido oposto ao do motociclo ...-UU, iniciou a execução da manobra de mudança de direcção à esquerda, atento o respectivo sentido de marcha, sem previamente imobilizar o veículo e sinalizar essa intenção, invadindo a hemi-faixa de rodagem pelo qual circulava o motociclo ...-UU, o qual embateu na frente esquerda daquele, sofrendo em consequência desse embate lesões que lhe determinaram a morte, com os consequentes danos.

A R. contestou, defendendo-se por excepção e por impugnação.

Em primeiro lugar, excepcionou a violação do princípio da adesão do pedido de indemnização civil ao processo criminal e requereu a suspensão da instância na pendência do processo criminal relativo ao acidente dos autos. Excepcionou ainda a ilegitimidade do A., por não ser o único herdeiro do falecido CC.

Em sede de impugnação refere, em resumo, que a culpa do acidente dos autos é de imputar antes ao falecido condutor do motociclo ...-UU, por circular a mais de 100 km/hora e a ultrapassar uma fila de veículos pelo seu lado direito, atento o seu sentido de marcha, referindo também desconhecer os danos resultantes do sinistro.

O Instituto de Segurança Social, I.P., deduziu contra a R. pedido de reembolso de prestações por morte de CC (subsídio por morte e pensões de sobrevivência), no montante global de 3.651,97 €.

Notificada deste pedido, a R. apresentou contestação, na qual defende a improcedência de tal pretensão.

Ulteriormente, porém, o Instituto de Segurança Social, I.P., desistiu do pedido de reembolso deduzido contra a R., sendo tal desistência homologada, por despacho de fls. 131.

A R. deduziu a intervenção principal activa da filha de CC, DD, que foi admitida.

E a interveniente menor - representada pela sua mãe EE - apresentou petição na qual, em síntese, reproduz o alegado pelo A. na petição inicial quanto ao circunstancialismo, responsabilidade e consequências do acidente.

Invoca os danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu, peticionando a condenação da R. no pagamento da quantia global de €267.500,00, acrescida de juros de mora vincendos, desde a citação até integral pagamento.

A R. apresentou contestação na qual, em síntese, deu por reproduzida a sua contestação ao pedido inicial, salientando que o falecido CC não mantinha relacionamento com a interveniente nem contribuía para os seus alimentos.

Foi homologada transacção celebrada entre a interveniente menor, a referida DD, e a R., na qual aquela se declarou ressarcida de todos os danos sofridos em consequência do acidente e por si reclamados com o pagamento da quantia global de €75.000,00, da qual € 25.000,00 se referem à indemnização do dano morte.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi a acção julgada parcialmente procedente, nos seguintes termos “Com os fundamentos expostos, decide-se julgar a presente acção parcialmente procedente por provada, e, consequentemente, absolvendo-a do demais peticionado, condena-se a ré Companhia de Seguros ..., SA., a pagar ao autor AA : 1.1. A título de indemnização por danos patrimoniais emergentes, a quantia de 2.750,00€ (dois mil setecentos e cinquenta euros), acrescida dos correspondentes juros de mora, calculados à taxa legal de 4%, vencidos desde 28/02/2007 e vincendos até integral e efectivo pagamento ; 1.2. A título de indemnização por danos patrimoniais futuros, a quantia de 190,000,00€ (cento e noventa mil euros), acrescida dos correspondentes juros de mora, calculados à taxa legal de 4%, vencidos desde 28/02/2007 e vincendos até integral e efectivo pagamento; 1.3. A título de indemnização por danos não patrimoniais, a quantia global de 77.500,00€ (setenta e sete mil e quinhentos euros), acrescida dos correspondentes juros de mora, calculados à taxa legal de 4%, vencidos desde a presente sentença e vincendos até integral e efectivo pagamento.

2. Inconformada, interpôs a R. recurso de apelação, no julgamento do qual veio a ser proferida a seguinte decisão: a) Revoga-se a decisão recorrida na parte em que condenou a R. a pagar ao A. a quantia de 40.000 € a título de dano moral próprio atribuído a este, fixando-se essa indemnização no valor de 30.000 €, a que acrescerão juros de mora.

b) Em face da alteração referida em a), fica a R. condenada a pagar ao A., a título de indemnização por danos não patrimoniais, a quantia global de 67.500 € (sessenta e sete mil e quinhentos euros), acrescida dos correspondentes juros de mora, calculados à taxa legal de 4%, vencidos desde a data da sentença de 1ª instância e vincendos até integral e efectivo pagamento.

c) No mais, condenatório e absolutório, mantém-se a decisão recorrida.

Após julgar improcedente a impugnação deduzida contra a matéria de facto, passou a Relação a apreciar a questão da determinação do valor da indemnização dos danos patrimoniais futuros ou lucros cessantes, fazendo-o nos seguintes termos: A este título fixou o Tribunal “a quo” uma indemnização de 190.000 €.

Entende a recorrente que esse montante não deve ultrapassar os 26.192,19 €.

Vejamos : Os Tribunais lançam mão, cada vez com mais frequência, de vários critérios, radicados uns em tabelas financeiras, outros em complexas fórmulas matemáticas, outros em simples regras de três, etc.

Todos eles, afinal, “com o objectivo de tornar o mais possível justas, actuais e minimamente discrepantes as indemnizações” (cf. Sousa Dinis in “Dano corporal em acidentes de viação, cálculo da indemnização”, Col. Jur. Ac. STJ, 2/1997, pgs. 11 e ss.).

Em Espanha e França, por exemplo, os Tribunais lançam mão de tabelas com pontuações atribuídas pelos médicos legistas às várias lesões, com base nas quais o Juiz fixa a indemnização. Verifica-se, também, uma tendência, a nível da União Europeia, para estabelecer uma base comum para o cálculo da indemnização, deixando, depois, para cada país, uma certa margem de manobra (cf. Acórdão da Relação de Lisboa de 21/6/2011, consultado na “internet” em www.dgsi.pt).

Entre nós, o recurso a tabelas matemáticas, que envolvem o salário, a idade e a incapacidade do sujeito, é o que rege em sede de acidentes de trabalho, mas não, como já vimos, em acidentes de viação.

Ora, para além da consagração da teoria da diferença e da equidade, a lei não fixa critérios para o cálculo da indemnização dos danos patrimoniais futuros, correspondentes a perda de capacidade de trabalho (cf. artº 564º do Código Civil).

Não se confundindo a equidade com a mera arbitrariedade, não está arredado o recurso a determinados elementos objectivos que permitam efectivamente a obtenção de um resultado justo.

Uma das soluções que tem sido apontada parte das tabelas legalmente fixadas para a regularização de sinistros no foro laboral (cf. Antunes Varela in “Código Civil Anotado”, Vol. I, 4ª ed., pg. 583).

Outro método mais complexo assenta numa equação numérica, descrita no Acórdão do S.T.J., de 6/7/2000, in Col. Jur. Ac. STJ, 1/2000, pg. 144.

O método descrito num Estudo de Sousa Dinis, publicado na Col. Jur. Ac. STJ, 1/2001, pg. 5 e ss. constitui um bom ponto de partida.

Mais do que utilizar artificialmente um critério aritmético que não foi consagrado na lei, pede-se ao Tribunal que retire da factualidade provada a conjugação dos diversos elementos. O uso da aritmética revelar-se-á útil para impedir resultados excessivos ou que fiquem aquém do que se revela ajustado.

Note-se, ainda, que, após o acidente, entrou em vigor a Portaria nº 377/2008, de 26/5, que veio estabelecer critérios para procedimentos de proposta razoável quanto à valorização do dano morte e do dano corporal.

A Portaria em causa não é aplicável ao caso dos autos e limita-se a regular propostas de indemnização, pelo que se pode continuar a recorrer, como sempre, a critérios de equidade na fixação das indemnizações civis.

Revertendo tais considerações ao caso concreto, há que tomar em consideração os seguintes parâmetros e regras da experiência comum : -A idade da vítima, à data do acidente, era de 34 anos, pelo que há que ponderar que a sua vida activa (tal como o cidadão médio nacional) terminaria aos 65 anos.

-A indemnização arbitrada, representando a entrega imediata de um determinado capital, é também susceptível de produzir rendimentos de que imediatamente se pode usufruir.

-Há a ponderar a variabilidade das taxas de capitalização que têm sido usadas na Jurisprudência, parecendo-nos curial admitir uma taxa de 5%, por ser aquela que melhor reflecte a actual conjuntura e a que pode prever-se.

Seguindo de perto o citado estudo de Sousa Dinis, teremos de apurar o capital necessário que, a determinada taxa de juro, produza o rendimento anual de CC à data da sua morte. Tal rendimento perfazia o montante de 16.800 € (1.400 € x 12).

A este valor anual há que abater 1/3, montante que se presume que CC disporia para os seus gastos pessoais, num total de 5.600 €.

Ficamos, assim, com o valor de 11.200 € (16.800 € - 5.600 €).

A taxa com que iremos fazer a “projecção” será a de 5%, sendo que, quanto à inflação, ela será um factor correctivo a intervir no acerto final.

Então, teremos : 100 – 5 x – 11.200 €.

Deste modo, x será igual a 224.000 € (11.200 € x 100 / 5).

Mas o cálculo ainda não está completo. O A. vai receber de uma só vez o...

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