Acórdão nº 1622/04.6TBEVR.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelSALAZAR CASANOVA
Data da Resolução11 de Setembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

N.º 1622/04.6TBEVR.E1.S1[1] Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA, residente na ..., ... intentou no dia 14-9-2004 ação declarativa com processo ordinário contra BB, residente na Rua de ..., n.º…, Évora pedindo o seguinte: - Que se declare cessada a obrigação alimentar que incumbia ao A. a favor da ré na decorrência do acordo homologado e descrito nos itens 8, 9 e 10 da petição no âmbito do acordo de divórcio decretado entre os mesmos autor e ré.

- Que se condene a ré a assim o reconhecer.

  1. O pedido veio a ser objeto de ampliação (ver fls. 766) nos seguintes termos: - Que se reconheça e condene e ré a reconhecer que cessa para o autor a obrigação de manutenção em vigor do contrato de seguro referido no artigo 3.º desta peça onde se refere o seguinte: " ora, ocorreu que na sentença proferida pelo Tribunal Civil do Distrito de Lausanne, revista com êxito no âmbito dos autos que sob o n.º 6713 correu termos pela sexta secção do Tribunal da Relação de Lisboa, ficou estabelecido que o aqui autor condenado a celebrar contrato de seguro no montante de 85.000 francos suíços em ordem a, no plano de vida, assegurar os rendimentos alimentícios da ré na hipótese de decesso".

  2. Nos supra mencionados artigos 8-9-10-11 da petição referiu o autor: 8- Atualmente a pensão alimentar que vem sendo paga pelo autor é equivalente a 2398€ (dois mil trezentos e noventa e oito euros mensais) 9- Para além da indicada pensão alimentar mensal (1856€) o autor também despende anualmente em impostos cantonal e comunal a quantia de 3450€ (três mil quatrocentos e cinquenta euros) anual, relativos aos imóveis adjudicados à ré, bem como a contribuição autárquica anual no montante de 260€ (duzentos e sessenta euros) e ainda o imposto federal direto com a mesma incidência imobiliária no montante anual de 220€ (duzentos e vinte euros) 10- Acresce ainda a quantia de 2573€ (dois mil quinhentos e setenta e três euros) anuais que a título de despesas de condomínio paga o autor pela ré em razão dos imóveis que lhe foram adjudicados e já acima referidos.

    11- Deste modo, a responsabilidade global do autor a favor da ré atinge o montante de 28.775€ (vinte e oito mil setecentos e setenta e cinco euros) por ano e que se objetivam em prestação alimentar que incumbe ao autor pagar.

  3. Alegou o A. que o seu casamento contraído com a ré em 20-10-1965 foi dissolvido por divórcio por sentença de 24-6-1993 proferida pelo Tribunal Civil de Lausanne, sentença revista e confirmada em 3-3-1994, transitada em julgado em 17-3-1994.

  4. Por sentença de 24-6-1993, transitada em julgado em 13-7-1993 proferida pelo Tribunal Cível do Distrito de Lausanne, revista e confirmada por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa transitado em julgado em 17-3-1994, foi homologado o acordo assinado pelas partes no dia 31-3-1993 segundo o qual " a partir do trânsito em julgado da sentença, AA contribuirá para o sustento de CC através de uma renda vitalícia mensal, de acordo com o artigo 153.º/1, alínea 1 do Código Civil, de 2850 francos. Correspondendo ao índice suíço de preços ao consumo do mês em curso em que a sentença transitar em julgado, o montante da renda supracitada será adaptado ao dito índice a 1 de janeiro de cada ano, tendo por base o índice em 30 de novembro precedente, desde 1 de janeiro de 1994,inclusive; e na medida em que os rendimentos de AA se adaptem também às variações do custo de vida".

    6.

    Consta ainda da sentença homologatória que AA " contratará, o mais tardar até ao dia do trânsito em julgado da sentença, uma apólice de seguro contra todos os riscos num montante de 85.000 francos (oitenta e cinco mil) que será também garantia junto da Union des Banques Suisses em garantia do saldo da dívida hipotecária supracitada" (fls. 38).

  5. Refere o autor que essa pensão alimentar é equivalente a 2387€ mensais.

  6. Considera o autor que houve uma alteração subsequente das condições existentes quando do divórcio que justificam, face ao disposto no artigo 2013.º, n.º1, alínea b) do Código Civil, a cessação da obrigação alimentar.

  7. As condições invocadas são as seguintes:

    1. Ter o autor deixado de ser administrador do Grupo ....

    2. Estar o autor confinado em matéria de rendimentos às senhas de presença de vereador da Câmara Municipal de ... na ordem mensal média de 200€.

    3. Ter a ré sucedido, por morte dos pais, em património hereditário de montante nunca inferior a 5 milhões de euros.

    4. Produzir tal património rendimentos mensais de vários milhares de euros.

    5. Ter o autor contraído casamento com mulher que é doméstica e não dispõe de quaisquer rendimentos tendo nascido um filho desse casamento. 10.

    Foi proferida sentença ( ver fls. 1154 e segs) que decidiu o seguinte: "1º- Julgo parcialmente procedente o pedido do autor e, em consequência, declaro cessada a obrigação deste de prestar alimentos à ré, mantendo-se a obrigação de proceder ao pagamento de impostos, contribuição autárquica e despesas com o condomínio relativos aos prédios adjudicados a esta na sequência do divórcio.

    1. - Absolvo o autor do pedido de condenação como litigante de má fé.

  8. Interposto recurso para o Tribunal da Relação, a apelação foi julgada improcedente.

  9. A ré recorre, de revista, para o Supremo Tribunal, concluindo a sua minuta de recurso nos seguintes termos: 1.º- A recorrente apenas pede a regular observância das regras legais aplicáveis ao caso em análise.

    1. - Trata-se aqui tão somente avaliar se a prestação do recorrido tinha ou não a natureza de renda vitalícia e não constituía uma obrigação alimentícia a favor da recorrente.

    2. - E mesmo que na remota eventualidade de existir essa dita prestação com caráter alimentício, a qualidade de vida da recorrente não conheceu qualquer incremento significativo diferente do estatuto socioeconómico de que sempre beneficiou e que presentemente não detém qualquer tipo de fortuna de cinco milhões de euros.

    3. - Pelas avaliações constantes dos autos, esse tal património que, na prática, sempre envolveu a vida da recorrente e do recorrido, não se encontra em estado de liquidez pecuniária.

    4. - No âmbito da maior crise financeira de que há memória coletiva, a pedra e a terra dos imóveis da recorrente não se transformaram em somas monetárias, através de qualquer tipo de transação comercial, que lhe permitisse a sobrevivência económica condigna com a sua posição Nesse sentido 6.º- Estamos perante uma 'renda vitalícia' imposta ao recorrido por condenação pela justiça suíça e confirmada pelas instâncias judiciais nacionais competentes no âmbito dos processos nºs 6713 da 6.ª secção do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa e 596/05 da 3.ª secção do Venerando Tribunal da Relação de Évora 7.º- Em todos e sem exceção supra citados autos judiciais o recorrido está obrigado a pagar à recorrente uma indemnização traduzida numa renda vitalícia com sustentação legal no então aplicável artigo 151.º/1 do Código Civil Suíço e com correspondência similar no artigo 1792.º do Código Civil.

    5. -O dispositivo legal em questão assume uma natureza de uma indemnização por perdas e danos em virtude da dissolução do casamento entre o recorrido e a recorrente, estando a dita pensão vitalícia sujeita às regras das obrigações - vide Castro Mendes, teoria Geral do Direito Civil, 1968, 2.º, 77.

    6. - Esta obrigação que o recorrido tem imposta foi determinada independentemente do horizonte hereditário do qual já era previsível a recorrente vir a ser beneficiária e que sempre envolveu o estatuto social , patrimonial e económico em que o casal estava estruturado até ao momento da sua dissolução.

    7. - O regime judicialmente aplicável na Suíça ao recorrido e à recorrente exclui as disposições dos alimentos, previstos, aliás, em disposição normativa civil própria.

      Salienta-se que 11.º- Está determinada uma contrapartida de uma deixa testamentária da recorrente a favor do recorrido, assim como constituiu aquele um fundo que assegurará a continuação do pagamento devido à recorrente em caso da sua morte 12.º- Estamos, assim ,perante o afastamento da norma em termos de alimentos da alínea a) do n.º1 do artigo 2013.º do Código Civil Português 13.º -Nas decisões judiciais suíças invocadas nos presentes autos o valor a pagar pelo recorrido à recorrente não se sustentou numa análise das suas necessidades de sustento, habitação e vestuário, cf. artigo 2003.º do Código Civil.

    8. -A justiça suíça condenou e a justiça portuguesa confirmou uma indemnização pelo termo da união conjugal permanecendo a obrigação para além da morte do recorrido.

    9. - Não existe nenhuma exceção para o caso em concreto de cessar a imposição , caso a recorrente contraísse novo casamento ou se tornasse indigna do benefício pelo seu comportamento moral, cf. artigo 2019.º do Código Civil.

    10. - Com relevância para a decisão a formular, estão violados pela sua indevida apreciação o teor dos artigos 1792.º, 2003.º, alínea a) do n.º1 do artigo 2013.º, 2019.º todos do Código Civil e artigo 151.º, n.º1 do Código Suíço confirmada a sua aplicação pelos Procs nºs 6713 da 6.ª secção do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa e 596/05 -3 da 3.ª secção do Venerando Tribunal da Relação de Évora.

  10. Factos provados: 1º- Autor e ré foram casados um com o outro e acham-se hoje divorciados.

    1. - Celebraram casamento na Sé de Évora no dia 20 de outubro de 1965.

    2. - O casamento de ambos foi dissolvido por divórcio decretado por sentença de 24 de junho de 1993, transitada em julgado, proferida pelo Tribunal Civil de Lausanne, Suíça.

    3. - Aquela sentença foi revista e confirmada pelo douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 03 de março de 1994, transitado em julgado em 17 de março de 1994.

    4. - No âmbito do processo de divórcio, e que igualmente integrou a sentença, foi estabelecido acordo entre o autor e a ré, devida e definitivamente homologado por sentença transitada em julgado, com incidência nas obrigações alimentares que ficaram a cargo do autor em benefício da ré, nos seguintes termos: a) A partir do trânsito em julgado da...

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