Acórdão nº 08S1428 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Julho de 2008

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução02 de Julho de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

No dia 16 de Junho de 2004, no Tribunal do Trabalho de Vila Real, EE, por si e representando seu filho menor, BB, intentou acção, com processo especial, emergente de acidente de trabalho, contra CC - COMPANHIA DE SEGUROS, S. A., e DD, Lda., pedindo a condenação das rés, conforme a sua responsabilidade, no pagamento das pensões e demais prestações atinentes à morte de EE, seu marido e pai do referido menor, em 5 de Janeiro de 2004, resultante de acidente de trabalho, quando trabalhava como manobrador de porta-paletes em favor da segunda ré, cuja responsabilidade infortunística estava transferida para a antedita seguradora.

A empregadora contestou, por excepção, alegando a sua ilegitimidade, e por impugnação, sustentando que o acidente ocorreu por o sinistrado não ter observado as normas e condições de segurança por si impostas; a seguradora também contestou, defendendo que o acidente ocorreu por negligência grosseira da vítima.

Entretanto, a seguradora e os autores responderam à excepção deduzida pela empregadora, e a seguradora apresentou articulado superveniente, aduzindo, face ao «teor do Inquérito e Relatório elaborado pelo IDICT ao acidente de trabalho a que os autos se reportam», que a empregadora tinha violado de forma grave e indesculpável as condições de segurança a que estava obrigada, pelo que a sua responsabilidade era meramente subsidiária da responsabilidade da entidade empregadora.

A empregadora e os autores responderam, sendo aquele articulado admitido.

Realizado julgamento, foi exarada sentença que, entendendo que o acidente resultou da falta de observação, por parte da empregadora, de preceitos legais sobre a segurança no trabalho, julgou a acção parcialmente procedente, condenando a dita ré (a) «a pagar, a cada um dos autores, a pensão anual de € 6.045,64, sendo vitalícia para a demandante e temporária para o autor menor, desde 6 de Janeiro de 2004, que é o dia seguinte ao do acidente mortal» (b) «a pagar, aos impetrantes, o montante de € 1.462,40, a título de despesas de funeral e, também, a cada um deles, o valor de € 2.193,60, a propósito de subsídio por morte (cfr. alínea a) do n.º 1 e n.º 3 do artigo 22.º da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro)», (c) a pagar aos autores a quantia de € 80,00, relativa a despesas de deslocação a tribunal, (d) a pagar juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação, e decidindo «[d]eclarar a responsabilidade subsidiária da ré seguradora, ao abrigo do n.º 2 do artigo 37.º da L.A.T.».

  1. Inconformada, a ré empregadora apelou, tendo o Tribunal da Relação do Porto julgado o recurso parcialmente procedente, revogando a sentença recorrida e condenando as rés a pagar aos autores, na proporção das suas responsabilidades, as pensões devidas, e respectivas actualizações, despesas de funeral, subsídio por morte e despesas de deslocação a tribunal, acrescidas de juros de mora, que discriminou.

    É contra esta decisão que a ré seguradora agora se insurge, mediante recurso de revista, em que formula as seguintes conclusões: «1ª- A recorrente entende que, salvo o devido respeito, atendendo à matéria de facto provada, o Venerando Tribunal da Relação do Porto deveria ter considerado, tal como o Tribunal de 1.ª instância, que se verificou a inobservância da parte da entidade empregadora das condições de segurança previstas na lei; 2ª- Para que tenha aplicação o disposto no art. 37.º, n.º 2, conjugado com o art. 18.º, n.º 1, da LAT, é necessário que exista violação das regras de segurança e que essa violação seja causal do acidente e imputável à entidade patronal a título de culpa, bastando a mera culpa; 3ª- O Tribunal a quo deu como provado que o sinistro ocorreu porque o sinistrado entrou na máquina descascadeira para a desencravar e quando entrou ficou com a roupa que trazia vestida presa, sendo sugado para o seu interior e trucidado; 4ª- Na máquina não existia vedação que impedisse o acesso ou a passagem ao espaço ou abertura existente entre ela e o início do tapete transportador de troncos, bem como faltava protecção que impedisse que o trabalhador ficasse em contacto directo com a máquina ou que evitasse que a roupa pudesse ser agarrada pelo respectivo mecanismo; 5ª- Face aos factos provados, salvo o devido respeito, o Tribunal deveria considerar que foram violadas as regras gerais e especiais sobre segurança no trabalho; 6ª- Assim, sem dúvida que [a] entidade empregadora não dotou a máquina de equipamento de protecção colectiva e não forneceu o equipamento de protecção individual - fato-macaco - para evitar que ficasse preso e fosse sugado; 7ª- Pois, a entidade patronal encarregou a infeliz vítima para trabalhar naquelas condições sem plano e meios de segurança, pondo em risco, como efectivamente pôs, a sua integridade física; 8ª- "Ora, in casu, se a máquina em menção estivesse dotada de equipamento de protecção colectiva e tivesse sido imposta à vítima a utilização de equipamento de protecção individual, maxime o chamado ‘fato-macaco', ter-se-ia evitado o trágico acidente"; 9ª- A insegurança no local era, assim, [i]minente: - [N]ão existia vedação que impedisse o acesso ou a passagem ao espaço ou abertura existente entre a máquina e o início do tapete transportador de troncos, - [F]altava protecção que impedisse que o sinistrado ficasse em contacto directo com a máquina ou que evitasse que a roupa pudesse ser agarrada pelo respectivo mecanismo; 10ª- Tanto mais que trabalhar com máquinas deste tipo e nesta especial actividade "implica nítida perigosidade", como é público e notório; 11ª- Não tendo assim procedido, a entidade patronal violou não só o dever geral de cuidado a que estava obrigada nos termos do DL 441/91, mas também o dever especial de cuidado a que estava obrigada por força no disposto na Portaria 53/71, de 03.0[2], e Portaria 702/80, de 22.09 - art. 40.º e art. 44.º -, no DL 82/99, de 16.03 - art. 18.º -, no DL 348/93, de 01.10 - art. 6.º - e Portaria [9]88/93, de 06.10 - Anexo II; Acresce que, 12ª- Tendo a recorrente alegado na sua contestação e articulado superveniente factos extintivos e modificativos do direito e contra a ora recorrida entidade patronal, era [a] esta que incumbia alegar e provar factos em sentido contrário, nos termos do art. 342.º, n.º 2, do CC; 13ª- Pelo que teria de ser a entidade patronal a provar: que implementou uma acção preventiva, que tinha plano de segurança, que deu instruções e formação aos seus trabalhadores e que forneceu os equipamentos de protecção individual, sob pena da chamada "prova diabólica"; 14ª- De igual modo se verifica o nexo de causalidade entre a falta de condições de segurança no trabalho e o acidente e as lesões que causaram a morte ao sinistrado em consequência do acidente; 15ª- Pois a existência de uma simples vedação e até o fornecimento de um simples fato--macaco tinham evitado o acidente e as suas consequências trágicas; 16ª- O Tribunal pode e deve, segundo as regras da experiência comum, socorrer-se de presunções judiciais para de um facto conhecido concluir a verificação de um facto desconhecido; 17ª- Face aos factos provados a única conclusão possível é que só a violação das regras de segurança no trabalho provocaram o acidente; 18ª- Uma vez que ficou provado que o sinistrado cumpria ordens da sua entidade patronal na execução do trabalho, só poderá concluir-se pela existência de culpa da mesma; 19ª- É que as necessidades de prevenção da ocorrência de acidentes de trabalho são gerais e especiais, e não se pode concluir que, em relação ao autor, em concreto, tenha a entidade patronal levado a cabo as diligências necessárias de prevenção especial, antes pelo contrário; 20ª- Assim, a responsabilidade da Recorrente é apenas e meramente subsidiária da responsabilidade da entidade empregadora, conforme o disposto nos art.s 37.º, n.º 2, e 18.º, n.º 1, da LAT; 21ª- Nestes termos e melhores de direito que V. Ex.as doutamente suprirão, o douto acórdão recorrido fez errada interpretação do disposto no[s] [artigos] 37.º e 18.º da LAT, do artigo 342.º, n.º 2, do [Código Civil] e legislação especial supra identificada e aplicação da mesma aos factos provados.» Termina pedindo a revogação da decisão recorrida e a sua substituição «por outra que condene a recorrente a título meramente subsidiário».

    A ré empregadora contra-alegou, defendendo a confirmação do julgado.

    Neste Supremo Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral-Adjunta concluiu que a revista devia ser negada, parecer que, notificado às partes, não suscitou resposta.

  2. No caso vertente, as questões suscitadas são as que se passam a enunciar: - Se havia que extrair presunção judicial da matéria de facto dada como provada...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT