Acórdão nº 08B1716 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Junho de 2008

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução26 de Junho de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA e BB, CC e DD, EE e FF, GG e HH, II e JJ, intentaram, no dia 24 de Novembro de 1998, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra LL e MM, pedindo a declaração de serem titulares do direito de propriedade sobre identificado prédio e do direito de servidão de vistas e a condenação deles a demolir determinado muro e a indemnizá-los pelo valor do prejuízo que se liquidasse em execução de sentença.

Motivaram a sua pretensão na circunstância de serem donos dos referidos prédios, em cujo rés-do-chão, nas traseiras do lado nascente, têm duas janelas que permitem a entrada de ar e luz e a devassa dos prédios dos réus, construídas em 1975, que deitam para o prédio deles, e de estes haverem construído um muro junto à parede, a cerca de quinze centímetros, tapando as janelas, favorecendo a acumulação de águas pluviais e resíduos que nelas se infiltram.

Os réus, em contestação, afirmaram a contradição entre pedido e causa de pedir, terem reconstruído o muro, não terem consentido nas ditas janelas, meras aberturas de ar e luz, não permitindo o devassamento, e pediram a condenação dos autores em multa por litigância de má fé, e, em reconvenção, a condenação daqueles no tapamento daquelas abertura no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da sentença.

Os autores replicaram, negando a excepção e o fundamento do pedido reconvencional e da condenação por litigância de má fé, e, no despacho pré-saneador, foram os autores convidados a aperfeiçoar a petição inicial, os quais apresentaram nova petição, a que os réus responderam, mantendo as posições antes assumidas.

No despacho saneador foi considerada a regularidade da instância, seleccionada a matéria de facto assente e controvertida, e, realizado o julgamento, foi proferida sentença, no dia 7 de Dezembro de 2006, por via da qual foi declarado o direito de propriedade dos autores sobre os prédios, condenados os réus a absterem-se de o violar e julgado improcedente o pedido reconvencional.

Apelaram os autores a título principal, e os réus subordinadamente, impugnando os primeiros também a decisão da matéria de facto, e a Relação, por acórdão proferido no dia 13 de Dezembro de 2007, negou-lhes provimento ao recurso.

Interpuseram os apelantes principais recurso de revista, formulando, em síntese útil, as seguintes conclusões de alegação: - tudo o que, nos termos do artigo 1363.°, n.º 2 do Código Civil, não for fresta, seteira ou óculos para luz, é janela, podendo as primeiras ser tapadas a qualquer altura, pela construção de muro ou casa pelo vizinho, e não as últimas, devendo o vizinho deixar uma distância mínima de um metro e meio entre elas e a construção; - os factos provados revelam que as aberturas existentes nas casas dos recorrentes são janelas, tanto mais que o acórdão recorrido considera que elas permitem a devassa do prédio recorridos;.

- mesmo que assim não se entenda, tais "aberturas" devem ser consideradas janelas, dada a sua configuração, modo e tempo de constituição e exercício do direito; - o acórdão recorrido, ao considerar as aberturas como frestas irregulares, interpretou e aplicou erradamente os artigos 1360º, nº 1, e 1363º do Código Civil; - o decurso do tempo e demais circunstâncias implica, nos termos dos artigos 1543º e 1548º do Código Civil, a constituição de servidão por usucapião; - a posse do anterior proprietário, AS, exercida por intermédio dos recorrentes, resulta de ter sido aquele quem solicitou e obteve a autorização do proprietário do prédio vizinho para levar a cabo as ditas aberturas; - o animus dos recorrentes resulta igualmente da construção, manutenção e conservação das aberturas; - construídas as janelas com consentimento expresso, do qual resultou situação que se manteve pacífica e conhecida de todos durante cerca de 22 anos, data em que os recorridos adquiriram o prédio, não se pode concluir que as aberturas se mantiveram por mera tolerância e assim excluir a aquisição da servidão por usucapião; - adquiridos pelos recorrentes, por compra, os prédios em causa, juntaram à sua posse a do seu antecessor, pelo que, tendo as aberturas sido realizadas há pelo menos vinte anos à data da acção, decorreu o tempo suficiente para se constituir a servidão de vistas por usucapião; - as aberturas foram construídas com o consentimento, sem que se alcance ter sido pressuposto da autorização a futura eliminação das obras; - o acórdão recorrido fez errada interpretação dos artigos 1252º, 1253º, 1256, 1360.° a 1364.°, 1543º, 1547º e 1548º , do Código Civil; - impõe-se a proibição aos recorridos de edificar a menos de um metro e meio dos prédios dos recorrentes e a demolição do muro que construíram.

Responderam os recorridos, em síntese de conclusão: - a restrição prevista no artigo 1363º, nº 2, do Código Civil apenas ocorre quando se mostre constituída servidão de vistas por existência de janelas; - janelas são aberturas de maiores dimensões que proporcionam vistas sobre o prédio vizinho e permitem a sua devassa, ou seja, através das quais possa projectar-se a parte superior do corpo e em cujo parapeito as pessoas possam apoiar-se ou debruçar-se para descansar, conversar com alguém que esteja do lado de fora ou para desfrutar as vistas; - frestas são aberturas de pequenas dimensões com a finalidade de permitir a entrada de ar e luz, sendo regulares as que obedecem ao artigo 1363º, nº 2, do Código Civil, e irregulares as aberturas com dimensões superiores àquelas ou situadas a uma altura inferior à referida; - as aberturas em causa são frestas irregulares, porque só permitem a entrada de ar e luz e não a devassa do prédio alheio, pelo que não podem os recorrentes arrogar-se o direito de servidão de vistas...

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