Acórdão nº 08B1745 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Junho de 2008
Magistrado Responsável | SALVADOR DA COSTA |
Data da Resolução | 19 de Junho de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA, BB e CC intentaram, no dia 24 de Maio de 2001, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra a Companhia de Seguros DD SA - a que sucedeu a Companhia de Seguros EE, SA, a FF - Instituição Financeira de Crédito, SA, a GG - Indústria Extractiva de Areias, Ldª, e HH, pedindo a sua condenação solidária a pagarem-lhes a quantia de 29 000 000$ acrescida dos juros legais a contar da citação.
Motivaram a sua pretensão em danos patrimoniais e não patrimoniais derivados da morte de II, de quem são herdeiros, em acidente ocorrido no dia 6 de Julho de 1996, em Mendrica, com a máquina escavadora rotativa caterpilar, conduzida pelo réu HH, locada financeiramente pela ré FF, SA à ré GG, Ldª e em contrato de seguro dito celebrado com a ré Companhia de Seguros DD SA.
Na contestação, a ré Companhia de Seguros DD SA afirmou que pelo contrato de seguro invocado pelas autoras apenas assumiu a responsabilidade civil que pudesse ser imputada à ré FF, SA e estivesse relacionada com a referida máquina, e que não podia ser responsabilizada pelos danos em causa.
Os réus GG, Ldª e HH afirmaram estar prescrito o direito de indemnização pretendido pelas autoras, serem partes ilegítimas na acção por virtude a primeira ter transferido para a Companhia de Seguros DD SA a responsabilidade civil emergente de danos causados a terceiros, ter o acidente ocorrido em circunstâncias e por causas diversas das descritas na petição inicial, não poder o último ser subjectivamente responsabilizado pela eclosão do acidente, e serem exageradas as quantias indemnizatórias peticionadas.
FF SA afirmou ser parte ilegítima, por não ter à data do acidente a direcção efectiva e interessada da máquina, estar esta sujeita a seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel a celebrar pela ré GG, Ldª enquanto sua locatária financeira, que estava efectivamente transferida para uma seguradora a responsabilidade civil decorrente de danos causados a terceiros por aquele veículo, estar o pedido nos limites do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel vigentes à data do acidente, não terem sido alegados factos demonstrativos da existência de uma relação de comissão entre a ré e o condutor da máquina na altura em que ele ocorreu o acidente.
As autoras replicaram, afirmando a improcedência das excepções dilatórias e peremptórias arguidas pelos réus, e o Instituto de Solidariedade e Segurança Social pediu o reembolso de € 138,37 pela EE, SA, correspondente ao subsídio de funeral pago em consequência do óbito de II, e, subsidiariamente, a condenação dos demais réus no seu pagamento, o que foi contestado pelas rés FF, SA e EE, SA.
No despacho saneador foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade passiva arguida pelos réus HH, GG, Ldª e FF, SA e relegou-se para a sentença final a decisão sobre a excepção de prescrição arguida pelos dois primeiros.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença, no dia 31 de Maio de 2006, por via da qual a ré GG, Ldª foi condenada a pagar às autoras as quantias de € 49 879,79 e de € 52 373,77, a AA € 17 457,93 e a BB e a CC € 12.469,95 a cada uma, e ao Instituto de Solidariedade e Segurança Social € 138,37, da qual a primeira apelou, e a Relação, por acórdão proferido no dia 11 de Dezembro de 2007, negou-lhe provimento ao recurso.
Interpôs a referida apelante recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - o documento de folhas 629 revela que o contrato de seguro também foi subscrito pelo seu sócio-gerente, na qualidade de representante da locatária, devendo ser admitido, contrariamente ao decidido pelo tribunal recorrido, nos termos do artigo 524, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, pelo que necessariamente se concluirá que à data do sinistro existia seguro válido e eficaz que cobria também a responsabilidade civil que para a recorrente emergisse da utilização da máquina; - a sentença recorrida é igualmente nula por omissão de fundamentação da decisão quanto à matéria de facto, nos termos do artigo 668°, nº 1, alínea b), e 712º, nº 5, do Código de Processo Civil; - a sentença do tribunal da primeira instância é nula, nos termos do artigo 668°, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil, por omissão de pronúncia relativamente à questão da não junção aos autos de cópia do contrato de seguro; - a referida omissão também viola o disposto nos artigos 264°, nº 3, e 265°, nº 3, do Código de Processo Civil, e a Relação, ao sufragar essa conduta, violou essas normas e apropriou-se do vício da sentença; - as instâncias incorreram na violação dos artigos 519º, nº 2, 529° e 530°, nº 2, do Código de Processo Civil e 244°, nº 2, do Código Civil por não ter considerado invertido o ónus da prova relativamente à seguradora no que se refere ao âmbito do contrato de seguro; - o tribunal da primeira instância estava impedido de aditar à matéria de facto provada os factos que aditou, face ao disposto nos artigos .3º, nº 3, e 264, nº 3, do Código de Processo Civil, incorrendo, por isso, na nulidade prevista no artigo 668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil; - a primeira instância não podia fazer o uso que fez do depoimento de parte prestado pelo recorrido HH, pois que os factos dados como provados com base em tal depoimento são desfavoráveis à recorrente e não a ele, o que contraria o espírito e a razão de ser dos artigos 552° do Código de Processo Civil e 352° e 353º, nº 1, do Código Civil.; - o tribunal a quo interpretou incorrectamente o disposto no nº 3 do artigo 265º do Código Civil ao considerar que ele permite postergar as regras consignadas nos artigos 554º e 617º do mesmo diploma; - o direito indemnizatório invocado pelas recorridas já se encontrava prescrito aquando da propositura da presente acção, de harmonia com o disposto no artigo 498, nº 1, do Código Civil; - a factualidade dada como provada na alínea D) dos factos assentes não exclui que a ré seguradora tivesse também assumido a responsabilidade pelas lesões causadas pela utilização do equipamento objecto do contrato de locação financeira celebrado entre a recorrente e FF, SA nem exclui a possibilidade de tal contrato de seguro cobrir também a responsabilidade da locatária; - o documento n° 1 junto com a contestação apresentada pela Companhia de Seguros DD SA continha lapsos de escrita que não permitiam a sua interpretação no sentido apontado na sentença recorrida, nem se encontrando também assinado, como é exigido pelo artigo 426º, § único, do Código Comercial; - FF, SA não ilidiu a presunção que sobre si recaía de ter a direcção efectiva e interessada da máquina em questão, na sua qualidade de proprietária, sendo que a direcção efectiva e interessada do veículo, no caso de locação, pertence ao locador e ao locatário, respondendo ambos solidariamente pelo risco emergente da utilização do bem locado, pelo que não podia o tribunal a quo afastar a responsabilidade de GG Ldª na qualidade de proprietária do equipamento locado, nem a da Companhia de Seguros EE SA, por efeito do contrato de seguro celebrado; - o facto determinante do sinistro em causa - cedência inesperada e imprevisível do solo - não constitui risco próprio do veículo, mas caso de força maior estranho ao seu funcionamento, pelo que a responsabilidade da recorrente estaria arredada, por força do artigo 505° do Código Civil; - a sentença recorrida, ao fixar os montantes indemnizatórios, não teve em consideração os critérios previstos nos artigos 494º e 496º, nº 3, do Código Civil; - no cálculo da indemnização por danos futuros, devia a sentença recorrida ter considerado o limite médio da vida activa do lesado e não o limite médio de vida dos portugueses, sendo também infundamentada a conclusão de que a vitima destinaria um terço do seu vencimento às suas despesas pessoais; - o tribunal recorrido violou o disposto nos artigos 244º, nº 2, 306°, nº 1, 352º, 353º, nº 1, 494º, 496º, nº 1, 498º, nº 1, 503°, nº 1, e 505º, do Código Civil, 72º e 77º do Código de Processo Penal, 3º,nº 3, 264º, nº 3, 265º, nº 3, 519º, nº 2, 529°, 530º, nº 2, 537º, 552º, nº 1, 553º, nº 1, e 554º, nº 1, 668º, nº 1, alíneas b) e d), e 712º, nº 5, do Código de Processo Civil e 40º e 426º, § único, do Código Comercial, pelo que deve ser absolvida do pedido.
Respondeu FF, SA, em síntese de conclusão de alegação: - celebrou um contrato de locação financeira com a recorrente relativo à máquina, ficando aquela com o seu gozo e fruição, exercendo o poder de facto sobre ela; - enquanto locadora, não estava obrigada a celebrar contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel, conforme resulta do artigo 2º, nº 1, do Decreto-Lei nº 522/85, de 31 de Dezembro, porque no caso de locação financeira a obrigação de segurar recai sobre o locatário; - não tem legitimidade para a causa, por não ser responsável pelo acidente, existia seguro válido e o valor do pedido contém-se nos limites do seguro obrigatório, devendo manter-se o acórdão recorrido no que lhe respeita.
II É a seguinte a factualidade considerada provada no acórdão recorrido, inserida por ordem lógica e cronológica: 1. No dia 31 de Janeiro de 1974, II e AA contraíram matrimónio entre si, e BB, nascida no dia 15 de Julho de 1974, e CC, nascida no dia 18 de Agosto de 1975, são filhas deles.
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Representantes da ré FF, SA, na qualidade de locadora, por um lado, e de GG, Ldª, na posição de locatária, por outro, declararam por escrito, no dia 18 de Janeiro de 1994, a primeira ceder à última a utilização, mediante 12 rendas com vencimento trimestral, e venda a esta caso o pretendesse findo o período da locação, de uma escavadora rotativa, usada, da marca Caterpillar, modelo 219.
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Representantes de FF, SA e da Companhia de Seguros DD SA declararam por escrito, consubstanciado na apólice nº 8 244 000, a segunda assumir, mediante prémio a pagar pela primeira, até ao limite de 50 000 000$, a responsabilidade civil por danos corporais e/ou materiais por sinistro, e de 50...
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