Acórdão nº 08S145 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução23 de Abril de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 19 de Julho de 2005, no Tribunal do Trabalho de Lisboa (4.º Juízo), AA intentou acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra BB - COMPANHIA DE SEGURANÇA, L.da, pedindo a condenação da ré: (i) a reintegrá-lo no seu posto de trabalho, sem prejuízo da opção pela indemnização por despedimento; (ii) a pagar-lhe todas as remunerações já vencidas no montante de € 36.762,00, acrescidas das que se vencerem até decisão final e de juros à taxa legal de 4% ao ano até integral pagamento; (iii) caso opte pela cessação do contrato de trabalho, a pagar-lhe a correspondente indemnização, acrescida dos direitos a férias, subsídio de férias e de Natal, nos termos dos artigos 221.º e 254.º do Código do Trabalho.

A acção, contestada pela ré, foi julgada totalmente improcedente, tendo a sentença da primeira instância absolvido a ré de todos os pedidos contra si deduzidos.

  1. Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação, que a Relação julgou improcedente, confirmando a sentença recorrida, sendo contra esta decisão que o autor se insurge, mediante recurso de revista, repetindo as conclusões já submetidas à apreciação daquele tribunal superior, em sede de recurso de apelação: «1. O A. intentou acção contra a R. alegando, em suma: - Que trabalhou sob as ordens, direcção e fiscalização da R. desde 11 de Novembro de 1996 até 2 de Dezembro de 2004, no âmbito de um contrato de trabalho, com a categoria profissional de vigilante, e auferia, ultimamente, a remuneração mensal de € 575,00, acrescida de € 92,12, a título de trabalho nocturno, e de € 91,80, a título de subsídio de alimentação, perfazendo o montante de € 758,92, para um horário de trabalho a tempo completo; - Por carta datada de 2 de Dezembro de 2004, a R. despediu-o alegando que o fazia com justa causa por considerar provados os factos que constavam da nota de culpa, ou seja, que na noite de 31 de Outubro para 1 de Novembro de 2004, durante o seu turno de serviço, permitiu a presença de um indivíduo estranho, quer ao cliente, [quer] à BB, no interior das instalações do cliente, durante cerca de 40 minutos (entre as 0 horas e as 1 horas), após o que, abandonou as instalações na sua viatura particular que se encontrava estacionada no parque do cliente, na companhia do referido indivíduo, tendo regressado sozinho por volta das 3 horas, e não comunicou, quer ao colega, quer a qualquer superior, a sua ausência, violando o ponto 1.8 das Normas de Conduta e Disciplina Interna da Empresa, as quais tomou conhecimento e assinou em 11/11/1996; - [É] uma pessoa cumpridora das suas obrigações profissionais, executa a sua tarefa rotineira com zelo e urbanidade, seu comportamento foi sempre pautado pelo respeito, zelo e urbanidade com que desempenha as suas funções e trata os seus superiores hierárquicos e, embora tenha praticado os factos que lhe são imputados, a R. não invocou quaisquer consequências desses factos decorrentes que legitimasse a aplicação da sanção de despedimento, o que considera fundamental para que existisse justa causa de despedimento, razão pela qual considera ilícito o despedimento, totalizando as remunerações já vencidas, desde Dezembro de 2004 a Junho de 2005, a quantia de € 5.312,44; - [E]m conformidade com o disposto no art. 3.º da Lei 21/96, o horário normal de trabalho diário, é de 8 horas e, segundo a cláusula 23.ª do CCT aplicável, o trabalho suplementar prestado dá direito a um acréscimo de 50%, na 1.ª hora, e de 75% nas horas subsequentes, se for diurno, e de 100% se for nocturno; - [E]nquanto ao serviço da R., o horário de trabalho do A. variava de acordo com as escalas estabelecidas por aquela, sendo-lhe exigida a prestação de trabalho para além do limite de 8 horas diárias e mensal de 173,33 horas, o qual foi pago em singelo, ou seja, sem os acréscimos previstos nas cláusulas 23.ª, 24.ª e 25.ª do CCT aplicável.

  2. Pedia por isso a condenação da R. na quantia total de € 36.762,00, sem prejuízo de vir a exercer o direito de opção pela indemnização por despedimento, caso em que deve a R. ser condenada a pagar-lhe a respectiva indemnização, acrescida da retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal decorrentes dessa cessação, nos termos dos arts. 221.º e 254.º do Código de Trabalho.

  3. O douto acórdão recorrido considerou que havia justa causa de despedimento porque o comportamento do A. assumido na noite de 31 de Outubro para 1 de Novembro de 2004, durante o respectivo turno de serviço, ter permitido a presença de um indivíduo estranho, quer ao Cliente, quer à BB, no interior das instalações do Cliente, durante cerca de 40 minutos (entre as 0 horas e as 1 horas), e, após, sem comunicar, quer ao colega, quer a qualquer superior, ter abandonado as instalações, regressando por volta das 3 horas, violando o ponto 1.8 das Normas de Conduta e Disciplina Interna da Empresa, as quais tomou conhecimento e assinou em 11/11/1996.

  4. O comportamento do A. violara o dever de obedecer à entidade patronal em tudo o que respeite à execução e disciplina do trabalho, salvo na medida em que as ordens e instruções daquele se mostrem contrárias aos seus direitos e garantias, integrando por isso a justa causa de despedimento, nos termos previstos no art. 396.º do Código do Trabalho.

  5. Entende, no entanto, o A. que, no caso dos autos, não só não existe desobediência legítima como considerou a sentença recorrida, mas também a R. não alegou ou provou no processo disciplinar a existência de prejuízos que pela sua gravidade e consequências determinassem a necessidade de pôr termo ao contrato de trabalho.

  6. E ainda que assim fosse, a sanção de despedimento era desproporcionada em relação ao comportamento dado por verificado.

  7. No caso dos autos, ficou provado, que o A. na noite de 31 de Outubro para 1 de Novembro de 2004, durante o respectivo turno de serviço, [t]er permitido a presença de um indivíduo estranho, quer ao Cliente, quer à BB, no interior das instalações do Cliente, durante cerca de 40 minutos (entre as 0 horas e as 1 horas), e, após, sem comunicar, quer ao colega, quer a qualquer superior, ter abandonado as instalações, regressando por volta das 3 horas, violando o ponto 1.8 das Normas de Conduta e Disciplina Interna da Empresa, as quais tomou conhecimento e assinou em 11/11/1996.

  8. Na verdade, nem no processo disciplinar, nem nos factos provados resultou a prova de que dos actos imputados ao A. tenham resultado consequências que, pela gravidade, determinassem a necessidade de pôr termo ao contrato de trabalho.

  9. E a desobediência do A. não integra só por si o conceito de justa causa de despedimento, por não virem invocadas na nota de culpa consequências decorrentes do comportamento do [A.] que pela sua gravidade pudessem determinar a necessidade imediata de pôr termo ao contrato de trabalho - art. 396.º do Código do Trabalho e acórdãos do STJ [d]e 15/05/87, BMJ, 3767, 411 do STJ de 26/05788, BMJ, 377, 411 do STJ de 13/01/92, BMJ, 383, 462, da Relação de Coimbra de 14/3/89, CJ, 1989, 2, 98, da Relação de Coimbra, de 6/6/91, CJ; 1991, 3, 120, do STJ de 9/2/93, CJ, 1993, 1, 249, e da Relação de Coimbra 7/7/94, CJ, 1994, IV, pág. 163.

  10. Os factos provados não são só por si susceptíveis de integrar o conceito de justa causa de despedimento atento o princípio da proporcionalidade da sanção em relação à gravidade da infracção.

  11. O douto acórdão recorrido violou, por isso, o art. 396.º do Código do Trabalho.

  12. Como se lê no Acórdão do STJ, de 22/11/1995, "Deve ainda atender-se ao quadro da gestão da relação da empresa, ao grau de lesão dos interesses da entidade empregadora, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes, ao princípio da proporcionalidade da sanção em relação à gravidade da infracção e à culpabilidade do infractor.

  13. E, ainda, como se lê no Acórdão do STJ, de 31/10/1990, "A sanção disciplinar deve ser adequada ao facto praticado e circunstâncias envolventes, isto é deve ser proporcional à gravidade da infracção e à culpa do agente".

  14. Deste modo, admitindo-se embora que [a] desobediência do [A.] possa integrar uma infracção disciplinar, não se alcança que a valoração desse comportamento possa ser graduado de tal modo que o trabalhador tenha de ser despedido.

  15. Assim, tem de [se] concluir que o despedimento do [A.], efectuado pela R., é ilícito.

  16. O douto acórdão recorrido veio a considerar, no entanto, ter ficado provado nos autos que a R. efectuara o pagamento do trabalho suplementar, tendo efectuado sob a rubrica "ajudas de custo" e "horas extras".

  17. Nos termos do art. 267.º do Código do Trabalho, no pagamento da retribuição, o empregador deve emitir recibo onde conste para além de outros elementos, o período a que a retribuição respeita, a discriminação das importâncias relativas a trabalho extraordinário e a trabalho em dias de descanso semanal ou feriado.

  18. E, por isso, documento emitido obrigatoriamente pelo empregador, de onde tem que constar a discriminação das diversas rubricas dos diferentes pagamentos efectuados.

  19. Nos termos do art. 376.º do C.C., se o empregador que tem a obrigação de discriminar no recibo o pagamento do trabalho extraordinário, não o tiver feito, tem que forçosamente, entender-se do recibo emitido que o trabalho extraordinário não foi pago.

  20. E também por força do mesmo art. 376.º do C.C., se do recibo o empregador fez constar o pagamento de determinadas quantias a título de "Prémio de Instalação", só a esse título pode o pagamento vir a ser considerado.

  21. É verdade que pode o empregador preencher através...

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