Acórdão nº 08A784 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução22 de Abril de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Associação Para o S..... dos P.... de S.....

(Cinfães) intentou, em 10.1.2003, pelas Varas Cíveis da Comarca de Lisboa, com distribuição à 1ª Vara, acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária, contra: AA e marido BB, CC, DD e mulher EE, FF, GG e mulher HH, II e mulher JJ.

J.C.J., C......., Ldª, Pedindo que: - se declare propriedade de LL, à data da sua morte, os bens mencionados no artigo 19° da petição inicial e se declare a falecida então como sua única e exclusiva titular; - que seja cumprida a disposição testamentária exarada no testamento deixado pela finada LL; - que a Autora seja reconhecida como herdeira/legatária testamentária da falecida LL, sendo habilitada como tal e restituídos à herança todos os bens alienados; - que a testamenteira CC seja obrigada a cumprir o testamento e a bem desempenhar a sua função; - que seja declarada nula a escritura de habilitação exarada no 17° Cartório Notarial de Lisboa; - que sejam declarados nulos os actos de disposição patrimonial efectuados pelos 1°s Réus e as consequentes aquisições.

A Autora, invocou, em resumo, ter sido contemplada no testamento de LL com uma deixa relativa a uma instituição, fundação ou criação de uma Sopa para Pobres, o que não aconteceu por não ter sido respeitada a vontade da testadora. Esta pretensão foi contestada pelos 2°s, 3°s, 4°s, 5°s e 6°s réus, por excepção e por impugnação, tendo a Autora replicado e concluído como na petição inicial.

*** Prosseguindo o processo a sua regular tramitação, veio a ser proferida sentença que: Julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, decidiu: a) - Reconhecer LL, em 11.02.1993, como a única proprietária do prédio urbano sito na Rua Machado de Castro, nº 11, Cacém de Cima, Agualva Cacém, concelho de Sintra, descrito na CRP de Agualva Cacém sob o nº 03613/151193, actualmente inscrito na respectiva matriz predial sob o art. 2769º, se encontrava registada unicamente a favor da falecida LL; e b) - Declarar nula a escritura de habilitação celebrada a 31 de Março de 1993 no 17° Cartório Notarial de Lisboa, exarada a fls. 79 a 80 do Livro de notas para escrituras diversas nº 185 C; c) - Absolver integralmente os Réus, AA e marido BB, CC, DD e mulher EE, FF, GG e mulher HH, II e mulher JJ e J.C.J., C......., Lda, dos demais pedidos contra eles formulados pela Autora, Associação para o Sustento dos Pobres de Souselo.

*** Inconformada, a Autora recorreu para a Relação de Lisboa, que, por Acórdão de 30.10.2007 - fls. 606 a 617 - julgou o recurso improcedente e confirmou a sentença apelada.

*** De novo inconformada, a Autora recorreu para este Supremo Tribunal e, alegando, formulou as seguintes conclusões: 1. O facto de ter sido dado como provado que a autora não distribui alimentos pelos pobres nem ajuda a sustentar os mais carenciados, por ora, não quer dizer que não prossiga esses objectivos sociais, nem que os não venha a desenvolver plenamente quando provida dos meios necessários e suficientes para o fazer.

Uma via para o provimento de tais meios será a restituição à herança dos bens alienados para que pelo produto da venda dos mesmos se possa destinar à Autora os meios adequados à prossecução dos fins sociais a que se propôs e que a testadora queria ver concretizados.

A autora é uma associação surgida ex novo e que carece de meios para cumprimento dos fins - do objecto estatutário - a que se propõe, coincidentes com a vontade da testadora.

Interpretando o texto do testamento de modo a entender-se o espírito e vontade da testadora crê a Autora seria intenção daquela beneficiar a Associação para o sustento dos Pobres de Souselo se, ao tempo, dela tivesse conhecimento tal como ora existe.

  1. A Autora é beneficiária do testamento deixado por LL já que foi essa também a sua vontade de instituir ou criar "uma sopa para pobres" na freguesia de Souselo, concelho de Cinfães, onde sua mãe nasceu, sendo que na interpretação da sua vontade, e com arrimo na letra do testamento, sempre se concluiria ser sua intenção beneficiar uma associação já legalmente constituída e a carecer de meios para a prossecução do seu objecto social que é o da vontade da testadora traduzida no auxílio alimentar aos pobres de Souselo com o património deixado.

    Esta interpretação encontra suporte legal na norma do artigo 2187° do Código Civil e na prova complementar fornecida pelas testemunhas em audiência só reforça tal entendimento e percepção.

    Ao não entender assim, violou a decisão recorrida o preceituado neste artigo.

  2. Não serão pois os pobres de Souselo, todos ou cada um de per si, os que podem exigir o cumprimento do testamento, pois que a autora pugna pelo auxílio alimentar e o seu objecto social vai de encontro ao interesse dos pobres e desfavorecidos de Souselo, pelo que a autora representa, deste modo, o seu interesse, tendo esta o direito de exigir da testamenteira o cumprimento do legado.

  3. A renúncia da testamenteira ocorreu posteriormente à instauração da acção, sendo a ela naquele momento a cabeça-de-casal, nos termos do artigo 2080º, nº1, b) do Código Civil, a quem incumbia o cumprimento do testamento.

  4. Assiste o direito à autora de ver restituídos à herança os bens alienados, porquanto, sendo beneficiária, é herdeira, nos termos dos artigos 2075° e 2076° do Código Civil, sendo que o produto da venda não foi entregue para cumprimento da vontade da testadora.

  5. Os adquirentes dos imóveis vendidos pertencentes à testadora - ora recorridos - não beneficiam da protecção do artigo 291º do Código Civil, pois que sabiam, já à data da propositura da acção do testamento e do conteúdo do mesmo.

    Termos em que, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se o douto acórdão da Relação.

    Os recorridos FF e GG e mulher HH contra-alegaram, batendo-se pela confirmação do Julgado.

    *** Colhidos os vistos legais cumpre decidir, tendo em conta que as Instâncias consideraram provada a seguinte matéria de facto: 1) - A Autora é uma associação de solidariedade social que tem por objecto social o auxílio alimentar aos pobres de Souselo, a fundação ou criação de uma sopa para os pobres de Souselo, a distribuição alimentar pelos pobres de Souselo e prover ao sustento dos pobres de Souselo, nos termos que constam do doc. n°1 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido.

    (alínea A) dos factos assentes) 2) - A Autora constituiu-se por escritura pública outorgada no Cartório Notarial de Marco de Canavezes, em 5.12.2002. (alínea B) dos factos assentes) 3) - Para desenvolver os fins a que se propôs a Autora conta com a jóia e quota dos associados e quaisquer donativos ou subsídios que lhe sejam entregues.

    (alínea C) dos factos assentes) 4) - LL faleceu em 11 de Fevereiro de 1993, no Concelho de Lisboa, tendo outorgado o testamento cuja cópia certificada consta de fls. 11 a 16, que se dá por reproduzida.

    (alínea D) dos factos assentes) 5) - O teor deste testamento, único que a falecida deixou, foi conhecido em Agosto de 1994.

    (alínea E) dos factos assentes) 6) - No testamento refere-se a vontade da falecida em fazer instituir ou ajudar a fundação de uma obra social e de solidariedade social na freguesia de Souselo.

    (alínea F) dos factos assentes) 7) -...

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