Acórdão nº 3855/05.9TVLSB.L1.S1. de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelGRANJA DA FONSECA
Data da Resolução17 de Maio de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

AA, SA demandou BB, L.

da, pedindo que seja declarado resolvido o contrato dos autos por incumprimento da ré, desde pelo menos 12/02/2004, sendo condenada a ré a pagar à autora a quantia de 14.564,90 €, devida pelo incumprimento do contrato, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da resolução do contrato, vencidos no valor de 1.618,50 € e dos vincendos até integral pagamento.

Fundamentando a sua pretensão, alega, em síntese, que prossegue a actividade antes desenvolvida pela sociedade incorporada CC, SA, tendo esta celebrado com a ré, em 21/04/1995, um contrato que teve a sua vigência nessa data, respeitante ao estabelecimentos denominado “O D...... A.......” de que a ré era titular, e onde esta se dedicava à venda de bebidas ao público.

Por força desse contrato, a ré obrigou-se a comprar a qualquer que fosse o fornecedor, para revenda, os produtos relacionados no anexo, fabricados ou comercializados na CC, não adquirindo, nem pondo à venda no mencionado estabelecimento produtos similares ao produto objecto do contrato, nem permitindo que terceiros o fizessem, nem fazendo publicidade aos mesmos e, em caso de trespasse ou cessão de exploração, inserindo uma cláusula no contrato obrigando o trespassário ou cessionário, nos mesmos termos, obrigando-se, por sua vez, a CC a entregar-lhe a quantia de 1.460.000$00, acrescida de IVA, e ainda, gratuitamente, 24 barris de cerveja por ano, à razão de 2 por mês.

A CC cumpriu o acordado, ficando estabelecido que o acordo vigoraria até que a ré adquirisse 100.000 litros dos produtos acordados, estimando-se que tal se verificasse no prazo de três anos.

A ré deixou, contudo, desde Setembro de 2003, de adquirir os produtos da CC, e agora da autora, passando a comercializar produtos similares aos contratados, comercializados por empresas concorrentes, e até essa data adquiriu apenas 68.396 litros dos 100.000 litros que haviam sido contratados.

A autora, após prévia interpelação, enviou à ré, em Fevereiro de 2004, uma carta registada com aviso de recepção em que declarava resolvido o contrato.

A ré contestou, invocando a extemporaneidade da acção por caducidade dos contratos, mais alegando que só deixou de adquirir a cerveja fornecida em barril pela autora, a partir de finais de Agosto de 2003, quando deixou de ter meios necessários para fornecer aos seus clientes cerveja a copo por causa de uma avaria do equipamento não resolvida por aquela, continuando a vender os restantes produtos da mesma, pedindo ainda a condenação da autora, como litigante de má-fé, em multa e numa indemnização a pagar-lhe, que não deverá ser inferior à importância que a autora reclama de 32.366 euros, bem como no pagamento dos encargos do processo, incluindo os honorários do advogado.

A autora veio responder, concluindo que as excepções deduzidas pela ré devem ser julgadas improcedentes, devendo esta ser condenada, nos termos formulados na petição inicial, sendo ainda a autora absolvida do pedido de condenação como litigante de má-fé, contra si formulado.

No despacho saneador, foi afastada a excepção da caducidade invocada. Oportunamente, foi proferida sentença que julgou a acção procedente por provada, declarando resolvido o contrato dos autos por incumprimento da ré, desde 12/02/2004 e condenando-a a pagar à autora a indemnização contratual penal prevista na cláusula 5a, n.º 1, do contrato dos autos, no valor de 14.564,90 €, acrescida de juros de mora à taxa legal, contados do dia 22/02/2004, até integral pagamento, absolvendo a autora do pedido de condenação como litigante de má-fé.

Inconformada, apelou a ré para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão de 24/01/2012, confirmou a sentença.

De novo inconformada, recorreu a ré para o Supremo Tribunal de Justiça e, alegando, formulou as seguintes conclusões: 1ª - O litígio em causa coloca a questão da interpretação e da aplicação do artigo 85º do Tratado (que passou depois a artigo 81º CE e, actualmente 101º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia - TFUE), e igualmente a questão da interpretação e da aplicação dos artigos 6º a 8º do Regulamento (CEE) n.º 1984/83 da Comissão, de 22 de Junho de 1983, relativo à aplicação do nº 3 do artigo 81º CE a certas categorias de acordos de compra exclusiva, e os artigos , e 12º° do Regulamento (CE) n.º 2790/1999 da Comissão, de 22 de Dezembro de 1999.

  1. - Pois o que está fundamentalmente em causa é a conformidade do prazo de duração da cláusula de venda em exclusivo de cerveja em barril fixada no contrato de fornecimento em exclusividade de venda de cervejas e outras bebidas celebrado, em 21/04/1995, entre a ora recorrente e a AA (CC), em que o fornecedor (AA) pagou à ré a quantia de 1.460.000$00 como contrapartida de esta se comprometer a vender em regime de exclusividade no seu estabelecimento cerveja em barril e outras bebidas produzidas e fornecidas pela AA. Este contrato de fornecimento em exclusividade era “válido até à compra pela ré de 100.000 litros de cerveja e refrigerantes que se estima serem consumidos durante 3 anos a contar da data da sua assinatura” (cláusula 6ª).

  2. - Em todo o processo, incluindo no recurso de apelação, a recorrente sustentou que o contrato tinha como limite máximo de duração cinco anos e que, por isso, independentemente de ela ter continuado a adquirir os produtos da autora para além de 21/04/2010, essas aquisições já nada tinham a ver com o contrato em causa, pois a cláusula de exclusividade, essa, extinguiu-se nessa data, por força do disposto nos artigos e do Regulamento (CEE) n.º 1984/83 de 22 de Junho de 1983, que enumera as cláusulas e os compromissos contratuais que impedem a aplicação do seu artigo 6º, entre os quais figura a condição de o contrato não poder ser celebrado por tempo indeterminado ou por mais de cinco anos, na medida em que a obrigação de compra exclusiva respeitava à venda de cerveja em barril, a certas cervejas e outras bebidas determinadas, no anexo I ao contrato.

  3. – O que é o caso, pois o contrato em questão respeitava à compra pela ré, para revenda no seu estabelecimento, dos produtos fabricados ou comercializados pela AA a que alude a cláusula 1ª do contrato, e o ANEXO I, ao mesmo contrato, seguintes: Cervejas: SAGRES - 0,20 Ret., 0,3, 3 Ret., LATA, O.W., LATA, 0,50 LATA, 1,00 Ret., BARRIL, EUROPA - 0,33 Ret., O.W., LATA, 0,50, LATA BARRIL, GOLDEN BEER - 0,33 Ret., LATA, O.W., BARRIL JANSAN S/ALCOOL - 0,33 Ret., LATA, O.W, e refrigerantes: JOI - 019, 0,25 O.W./TB, 1,00 TB, 1,50 PET; STAR - 0,25, TÓNICA/G. ALLE 0,25, 1,00,TANQ. COLA PRÉ-MIX, e TANQ. LIMÃO PRÉ-MIX (Contrato páginas 99 a 104 dos autos).

  4. - Ou seja, respeitando o contrato à venda em exclusividade de cervejas e outras bebidas, esse contrato não podia ter uma duração superiora cinco anos, sob pena de nulidade da cláusula, por violação do nº 1 do artigo 81º (CE).

  5. - Sendo que, se outro entendimento se perfilhasse quanto ao entendimento de duração do prazo do contrato, então o contrato era nulo por violação do artigo 8º, nº 1, alínea c), do Regulamento (CEE) nº 1984/83 de 22 de Junho de 1983, que estabelece que “o disposto no artigo 6º não é aplicável quando o acordo é celebrado por tempo indeterminado ou por um período que exceda cinco anos, na medida em que a obrigação de compra exclusiva diga respeito a certas cervejas e outras bebidas determinadas”.

  6. - Daí que, como se disse na contestação e no recurso de apelação, o contrato não pudesse ter uma duração, (com ou sem prorrogações), superior a cinco anos, sob pena de nulidade.

  7. - Tal prazo peremptório de 5 anos era o prazo limite de duração que podia ser estabelecido no contrato, celebrado na vigência do Regulamento (CEE) nº 1984/83 de 22 de Junho de 1983 e que foi mantido no artigo 5º Regulamento (CE) nº 2790/1999 da Comissão, de 22 de Dezembro de 1999.

  8. - Assim, tendo-se fixado no contrato uma duração de três anos, mesmo admitindo que estaria implícita a sua prorrogação, a mesma nunca podia exceder o cômputo dos cinco anos sob pena de nulidade, porquanto a isenção de não concorrência directa ou indirecta não só não era indefinida, como não podia mesmo ultrapassar o prazo de 5 anos, que é peremptório, ou seja subtraído à vontade das partes.

  9. - Concorre que, embora a cláusula 7ª/2 do contrato previsse a possibilidade de alterar o contrato, caso se verificasse alteração da legislação da concorrência, as partes não o alteraram ou modificaram e, sendo assim, nunca seria possível derrogar contratualmente uma norma de direito comunitário que fixava como prazo limite de vinculação em 5 anos.

  10. - Mas, além da questão do prazo, que era impeditiva da manutenção do contrato, acresce que o Regulamento (CEE) 2790/1999 veio alterar os pressupostos em que assentava a derrogação do n.º 1 do artigo 81º do Tratado (CEE), ao impedir a AA de poder celebrar acordos de exclusividade, pois detinha já uma quota de mercado de mais de 40% do mercado relevante.

  11. - Com efeito, o artigo 2º, n.º 1, do Regulamento nº 2790/1999 passou a dispor que, «nos termos do nº 3 do artigo 81º do Tratado e no presente Regulamento, o n.º 1 do artigo 81º não se aplica aos acordos ou práticas concertadas em que participam duas ou mais empresas cada uma delas operando, para efeitos do acordo, a um nível diferente da produção ou da cadeia de distribuição e que digam respeito às condições em que as partes podem adquirir, vender ou revender certos bens ou serviços (denominados acordos verticais).

  12. - Finalmente, decorre do artigo 12º do Regulamento (CEE) nº 2790/1999 que a proibição enunciada no artigo 81º, n.º 1, (CE) não é aplicável durante o período compreendido entre 1 de Junho de 2000 e 31 de Dezembro de 2001 relativamente a acordos já em vigor em 31 de Maio de 2000 que não preencham os requisitos de isenção previstos no presente Regulamento, mas que preencham os previstos, designadamente, no Regulamento nº 1984/83.

  13. - Daí que a autora, a provar-se que celebrou o...

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