Acórdão nº 718/06.4TVPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Abril de 2012
Magistrado Responsável | PAULO SÁ |
Data da Resolução | 24 de Abril de 2012 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.
No Tribunal da Comarca do Porto (1.ª Vara Cível), AA e BB intentaram acção declarativa de condenação, com processo comum na forma ordinária contra CC – Companhia de Seguros, SA, pedindo a condenação da ré a pagar-lhes a quantia de € 37.409,84, a título de indemnização por morte de DD, montante esse correspondente ao capital seguro nos termos da apólice ..., acrescido de juros vincendos até efectivo e integral pagamento.
Para tanto, alegaram, em síntese: Em 16.04.1993, o pai de ambos, DD, celebrou com a ré um contrato de seguro, denominado “Seguro de Saúde/Doença – Individual/Familiar”, titulado pela apólice n.º ..., nos termos do qual esta passou, para além do mais, a garantir, em caso de morte do tomador/segurado, aos herdeiros deste, o pagamento do correspondente capital seguro, no montante de 7.5000.000$00; Em 20-01-2005, na cidade de Luanda, o seu pai faleceu, vítima de homicídio, assistindo-lhes, por isso, o direito a receber o montante correspondente ao capital seguro.
Citada devidamente, a ré contestou, alegando, fundamentalmente, que: – o pai dos autores encontrava-se radicado em Angola, há mais de 12 anos e tinha ao seu serviço vários seguranças; – para além dos seguranças, o próprio pai dos autores tinha em seu poder, pelo menos, duas metralhadoras e uma AK 47 para seu uso pessoal; – após ter sido assassinado, o pai dos autores manteve-se alguns dias em sua casa, local do crime, até ser encontrado; – após ter sido encontrado, um dos seus seguranças, de nome EE que se encontrava em sua casa, onde se refugiara, declarou ter sido ele a matar o pai dos autores, morte que, de harmonia com a notícia dada pelos jornais, terá sido em legítima defesa, do segurança que o matou; – o contrato de seguro, para além de ser principalmente um seguro de saúde, dá também cobertura a morte por doença natural e por acidente; – a morte do pai dos autores, conforme resulta do que se alegou, não só não resulta de um caso fortuito, súbito e anormal, como resulta de acto praticado pelo próprio falecido, por virtude do qual o agente agiu em legítima defesa; – a contestante, na sua actividade de seguradora, não se encontra impedida de efectuar seguros com alguém que, temporariamente, se demore em Angola, ou aí esteja, temporariamente, a exercer a sua profissão a título provisório e por tempo delimitado; – por isso, qualquer contrato de seguro que a contestante celebre com alguém que se desloque para Angola, cobrindo riscos que venham a ocorrer nesse país, terá tal facto contemplado nas suas condições particulares; – na proposta que subscreveu para o contrato celebrado em 1998, o pai dos autores declarou que a sua morada era na Rua …, … – Vila Nova de Gaia; – o pai dos autores nunca comunicou à ré que residisse fora de Portugal e, não o tendo feito, não comunicou factos essenciais para a formação da vontade da ora contestante; – não obstante a ré poder celebrar seguros com o risco a correr em Angola, nas condições em que já alegou, no contrato que aqui se discute, eram permitidas à pessoa, ou pessoas seguras, deslocações ao estrangeiro por período não superior a 45 dias, mediante a apresentação dos comprovativos de viagem; – o pai dos autores não comunicou nem comprovou que lá se estivesse deslocado pelo período de 45 dias.
Conclui pela improcedência da acção.
Na réplica, os autores vieram dizer que o falecido DD fazia constantes visitas a Angola e que tinha viajado para Luanda no dia 4 de Janeiro de 2005 e regressaria no dia 21 do mesmo mês, o que não aconteceu, por ter sido assassinado no dia 20 de Janeiro de 2005.
Proferiu-se despacho saneador em termos tabelares, fixou-se a matéria de facto assente e organizou-se a base instrutória. A fls. 477 a ré deduziu incidente de intervenção principal provocada de FF, o qual foi admitido – cfr. fls. 489.
Citado o interveniente, veio declarar fazer seus os articulados dos autores.
Teve lugar a audiência de julgamento, no termo da qual, após produção de prova foi fixada a matéria de facto e, de seguida, foi proferida sentença que julgou “procedente a presente acção em consequência do que se condena a ré a pagar aos autores AA e BB a quantia de € 37.409,84 (trinta e sete mil quatrocentos e nove euros e oitenta e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento”.
Inconformada, apelou a Ré, tendo a Relação do Porto vindo a julgar improcedente a apelação, e, em consequência, a manter a decisão recorrida.
Desta decisão recorre a R, de revista, para este STJ.
A R. conclui as suas alegações do seguinte modo: 1.ª O PRESENTE RECURSO VEM INTERPOSTO DA SENTENÇA, QUE CONDENOU A RECORRENTE CC A PAGAR AOS AA/RECORRIDOS A QUANTIA DE € 37.409.94, ACRESCIDA DE JUROS DE MORA, À TAXA LEGAL, DESDE A CITAÇÃO ATÉ INTEGRAL PAGAMENTO, POR SE ENTENDER QUE, FACE À FACTUALIDADE DADA COMO PROVADA, A RÉ/RECORRENTE NADA TEM A PAGAR; 2.ª DÃO-SE AQUI POR REPRODUZIDOS TODOS OS FACTOS PROVADOS E QUE ACIMA FICARAM TRANSCRITOS; 3.ª RESULTA DOS PRIMEIRO E SEGUNDO FACTOS PROVADOS QUE O TOMADOR DO SEGURO, DD, CELEBROU COM A ORA RECORRENTE, NÃO UM SEGURO DE VIDA, MAS SIM UM SEGURO DE SAÚDE INDIVIDUAL QUE INCLUÍA A COBERTURA DE “MORTE OU INVALIDEZ PERMANENTE” (CONDIÇÃO ESPECIAL 002); 4.ª POR ISSO, O PRESENTE CONTRATO NÃO TINHA POR FINALIDADE PRIMORDIAL GARANTIR O PAGAMENTO DE UMA INDEMNIZAÇÃO A TERCEIROS NO CASO DE MORTE, MUITO MENOS QUANDO ESTA ADVIESSE, NÃO COMO DECORRÊNCIA DE UMA DOENÇA, MAS ANTES DE UM SINISTRO; 5.ª O QUE SIGNIFICA QUE SÓ HAVERIA LUGAR AO PAGAMENTO DO CAPITAL SEGURO, EM CASO DE MORTE OU INVALIDEZ PERMANENTE, NÃO EM TODO E QUALQUER CASO EM QUE UMA DESTAS SITUAÇÕES VIESSEM A OCORRER, MAS APENAS E TÃO SÓ NAS SITUAÇÕES QUE SE MOSTRASSEM INCLUÍDAS NAS CONDIÇÕES DA APÓLICE DE SEGURO A QUE OS PRESENTES AUTOS SE REPORTAM; 6.ª O QUE NÃO É O CASO DE HOMICÍDIO, QUE A APÓLICE DE SEGURO NÃO COBRE; 7.ª TAL SITUAÇÃO MOSTRAVA-SE, DESDE LOGO, EXCLUÍDA, NO “PRIMEIRO” CONTRATO DE SEGURO A QUE ALUDE O PONTO 10 DOS FACTOS PROVADOS, QUE EXCLUÍA DA GARANTIA DO SEGURO OS “ACTOS CRIMINOSOS”, CONTRATO ESTE QUE APENAS FOI RESOLVIDO POR FALTA DE PAGAMENTO DO PRÉMIO; 8.ª COMO, IGUALMENTE, SE MOSTRA EXCLUÍDO NO “NOVO” SEGURO ORA EM APREÇO NOS AUTOS, MAIS CONCRETAMENTE NO CAPÍTULO III, ART. 50, N. 1, AL. R), QUE EXPRESSAMENTE EXCLUI DA...
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