Acórdão nº 904/06.7BSSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelGABRIEL CATARINO
Data da Resolução24 de Abril de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. - RELATÓRIO.

    Irresignados com o julgado na apelação interposta pelo demandante, CC, que na respectiva procedência, revogou a decisão proferida na 1.ª instância que havia julgado improcedentes os pedidos formulados pelo demandante, recorrem, de revista, os demandados, AAe BB, havendo a considerar, os sequentes I.1. – Antecedentes Processuais.

    Mediante escritura pública, celebrada no 3º Cartório Notarial de Lisboa, no dia 19 de Novembro de 2004, o Autor, CC, declarou comprar e os RR., AAe mulher BB, declararam vender, o prédio urbano denominado lote …, sito em ..., composto de rés-do-chão, primeiro andar e logradouro, na freguesia de S... (C...), concelho de S..., descrito na Conservatória de Registo Predial de S..., sob a ficha n.º …. Após a data referida no parágrafo anterior, o A. pretendeu contratar o fornecimento de energia eléctrica, tendo sido informado que seria necessária a apresentação de um certificado da DD, a comprovar que a instalação eléctrica estava devidamente executada e de acordo com as normas legais. Após insistências junto do Réu marido este não tinha entregue até ao momento da propositura da acção o referido certificado.

    Do mesmo passo a moradia apresenta defeitos de construção, que discrimina de artigos 14.º a 30.º, tendo o Autor solicitado, através de carta endereçada pelo mandatário do A., a sua reparação, não obteve satisfação.

    Estas situações têm provocado incómodos e mal estar pessoal, pela impossibilidade de habitação da moradia, por estar cerceado de convidar os amigos e poder ver cortada a energia eléctrica, que se traduzem em danos não patrimoniais ressarcíveis.

    Pede que os réus sejam condenados a reparar os defeitos no prazo de 30 dias após o trânsito desta sentença, sob pena de o autor contratar a reparação por terceiros e de os réus suportarem esses custos; a entregarem no mesmo prazo o certificado que permita a celebração do contrato de fornecimento de energia eléctrica, sob pena de pagarem os custos que o autor tenha de suportar para esse efeito; e a pagarem uma indemnização de € 15.000,00, acrescida de juros de mora desde a citação.

    Os réus contestaram alegando, em resumo, que a moradia não foi construída por eles, que desconheciam a existência de defeitos, que tentaram em vão que a construtora os resolvesse e que os defeitos poderão ter sido casados pela construção, pelo autor, de uma piscina que não estava prevista no projecto.

    Após a realização da audiência de julgamento, foi proferida decisão quanto à matéria de facto que havia sido fixada como controvertida, tendo na sentença prolatada, o tribunal de 1.ª instância julgado a acção improcedente absolvendo os RR dos pedidos, por considerar que os RR. não tinham sido os construtores e desconheciam, sem culpa, os defeitos de que a moradia era portadora.

    Em contramão com o decidido, foi interposto recurso de apelação pelo Autor, tendo, na respectiva procedência, sido decidido (sic): “Condenam-se os RR AAe BB a procederem às obras necessárias com vista à reparação dos defeitos enumerados no nº 2 da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida.

    Condenam-se os mesmos Réus a entregarem ao A, no prazo de 30 dias, o certificado da DD sob pena de, não o fazendo, serem obrigados a pagar ao A todos os gastos que este tenha de realizar para obter tal certificado.

    Absolvem-se os Réus do pedido de indemnização por danos morais.” E do assim decidido que trazem os demandados a presente revista para o que alinham o sequente, I.2. - Quadro Conclusivo.

    “1.º O acórdão da Relação baseou a sua convicção na Ficha Técnica da Habitação, para assim condenar os Recorrentes na reparação dos defeitos apresentados no imóvel.

    1. A ficha técnica foi elaborada e assinada pela Técnico Responsável da Obra, conforme melhor se alcança pela análise de todo o documento.

    2. Não foi lavrada nem assinada por nenhum dos Recorrentes.

    3. Não houve prestação de garantia no sentido explanado no artigo 921.º do C.C.

    4. Foi o Técnico Responsável da Obra, que lavrou na ficha técnica da habitação a menção descrita no ponto 29.

    5. Pois, o imóvel destinava-se a habitação própria e permanente dos Recorrentes e não à venda.

      7.

      0 Não houve, assim, qualquer declaração dos RR. e dirigida ao A., no sentido de prestar garantia do imóvel.

    6. E sempre se dirá que, tal menção pode ser interpretada no sentido de encaminhar as eventuais reclamações para quem de direito, in casu, o construtor da moradia em causa.

    7. A menção inscrita na ficha técnica da habitação não é, nem pode ser, interpretada como garantia nos termos e para os efeitos descritos no artigo 921.º CC.

    8. Os Recorrentes, sempre, agiram de boa fé e sem culpa.

    9. A questão latente é a da responsabilidade decorrente de venda de coisa defeituosa, prevista nos artigos 913.

      0 e seguintes do Código Civil, a qual não se verifica in casu.

    10. A Decisão recorrida condena ainda os Recorrentes a entregar o certificado da DD.

    11. Os Recorrentes não dispõem de meios para obter tal documento, uma vez que, a intervenção da firma construtora é essencial para a obtenção do mesmo.

    12. Sendo certo que, os Recorrentes diligenciaram nesse sentido conforme resulta dos factos provados.

    13. Sempre se dirá que tal parte da decisão se encontra prejudicada uma vez que o A. já obteve tal certificação conforme documento que juntou em sede de audiência de discussão e julgamento.” Repontou o demandante/recorrido, tendo concluído com o epítome conclusivo que a seguir queda extractado. “1. A norma do artigo 921.º do CC não exige forma especial para constituição de garantia de bom funcionamento da coisa vendida; 2. Mais, a ficha técnica dos autos preenche os requisitos do Decreto-Lei n.º 68/2004, de 25 de Março; 3. Neste sentido, veja-se que o R. marido, na qualidade de promotor imobiliário, para efeitos do disposto no artigo 3.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 68/2004, de 25 de Março, entregou nos serviços da Câmara Municipal de S... a Ficha Técnica da Habitação vendida, na qual se encontram descritas as características técnicas e funcionais da mesma, em cumprimento do disposto no artigo 4.º do mesmo diploma; 4. Carecem, assim, os Recorrentes de razoabilidade quando se desresponsabiliza pelos elementos constantes da ficha técnica de habitação, já que foi o próprio Recorrente marido quem procedeu à entrega da aludida ficha técnica nos serviços camarários, através de requerimento dirigido ao Presidente da Câmara Municipal de S..., por si assinado, datado de 18 de Outubro de 2004, onde se lê que" AA (. . .) vem solicitar (. . .) a junção de ficha técnica de habitação ao processo de obras … ", tal como se extrai do doc. de fls. ... , junto aos autos pelo A., durante a discussão da causa, através do requerimento de fls. ... , datado de 29 de Junho de 2009; 5. Em consequência, afigura-se irrelevante a afirmação de que a elaboração e assinatura da ficha técnica tenham sido concretizadas pelo Técnico Responsável da Obra; 6. Sendo que nenhuma prova foi feita pelos Recorrentes quanto a este facto nem o mesmo foi invocado quando foi junto aos autos a ficha técnica de habitação; 7. Nos termos do n.º 6, alínea a), do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 68/2004, o documento em causa contém expressamente o modo como o accionamento da garantia deveria ser operado em caso de detecção de defeitos quando dispõe no seu ponto n.º 29 que " em caso de defeitos: Contactar Directamente o Sr. AA "; 8. Pelo que, os RR. garantiram o bom funcionamento da coisa vendida por um prazo de 5 anos, independentemente de culpa, através da menção inserta no item 29 da Ficha Técnica da Habitação; 9. De todo o modo, ainda que assim não se entendesse, considerando-se não verificada qualquer garantia do bom funcionamento da coisa vendida, sempre se dirá que os Recorrentes não elidiram a sua presunção de culpa; 10. Com efeito, face à dimensão dos defeitos verificados, e tendo-se em conta o teor descritivo da Ficha Técnica da Habitação – entregue pelo R. marido, na qualidade de promotor imobiliário, nos serviços da Câmara Municipal de S... –, que contém a descrição das características técnicas e funcionais da mesma, os RR. poderiam ou deveriam ter conhecimento da possibilidade da verificação dos vícios; 11. Veja-se a este respeito que a Ficha Técnica da Habitação promotor imobiliário pelas características da habitação; 12. Logo, os Recorrentes, enquanto promotores imobiliários, saberiam, ou deveriam saber, de antemão, as técnicas e os materiais de construção utilizados na edificação da moradia dos autos; 13. Assim, atendendo-se ao facto de os vícios verificados terem resultado de omissão de iniciativa para obter o certificado da DD ou de instalação em condições técnicas erradas que o impediram de ser emitido, sendo que os demais vícios resultaram de uma construção deficiente ou com materiais errados, conclui-se que, face à natureza dos vícios, os Recorrentes, enquanto promotores imobiliários da moradia dos autos, poderiam e/ou deveriam ter conhecimento de que os mesmos poderiam ocorrer tal como ocorreram; 14. Pelo que, no caso de se entender não prestada qualquer garantia do bom funcionamento da coisa vendida, sempre deverá considerar-se que o desconhecimento dos vícios por parte dos RR. é culposo, nomeadamente a título de negligência; 15. Ademais, o certificado DD foi, de facto, obtido a expensas do A., uma vez que o mesmo não conseguiu contratar com a EDP o fornecimento de electricidade enquanto não obtivesse o referido certificado e a EDP por falta de certificação da instalação cortou o fornecimento de electricidade ao imóvel; 16. Pelo exposto, face aos gastos em que incorreu o Recorrido para obtenção do certificado DD, e atendendo-se ao dispositivo do douto Acórdão, será, assim, deduzido incidente de liquidação de sentença após o seu trânsito em julgado, para condenação dos RR., ora Recorrentes, no pagamento das quantias despendidas pelo A. para obtenção do sobredito certificado; 17. Ainda, avulta que os Recorrentes afirmam nas suas alegações que a Ficha Técnica da Habitação foi...

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