Acórdão nº 429/09.9TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelGONÇALVES ROCHA
Data da Resolução29 de Março de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1---- AA intentou uma acção com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra “C… – Caixa BB, S. A.”, com sede em Lisboa, alegando que foi admitido ao serviço do B… – Banco CC - em 19.01.1987, tendo em Fevereiro de 1989 integrado a carreira técnica, em Fevereiro de 1997 sido reclassificado para a categoria profissional de Técnico de grau III, depois de, em 1996, ter concluído a licenciatura em Gestão de Empresas, vindo a ser promovido por mérito para o nível 11, em 1/1/97.

Em 07.2001, por força da fusão entre o B CC e a R, passou a integrar os quadros desta, no Núcleo de Apoio da Direcção Geral de Risco. Nos primeiros dois anos de integração o A viveu na R uma grande fase de instabilidade, quer ao nível emocional (porque, como os restantes trabalhadores do ex-B CC, sentiu o estigma de ser parte integrante de uma fusão) quer ao nível profissional (porque existiam várias diferenças entre o B CC e a CBB ao nível dos procedimentos e ao nível do modo de actuação no mercado bancário).

Neste período viu eliminadas as suas perspectivas e ambições de carreira profissional, porquanto não foi correctamente integrado no que respeita à categoria/nível.

Com efeito, foi integrado numa estrutura (Núcleo de Apoio) onde não existe enquadramento funcional para integrar um Técnico Grau III; além disso, o autor viu o seu anterior subsídio de desempenho e disponibilidade ser convertido em remuneração de desempenho e o valor que auferia convertido numa percentagem que não perfaz os valores mínimos estabelecidos.

E apesar de cumprir de forma responsável e diligente os trabalhos que lhe foram sendo propostos, desenvolvendo programas de extrema importância para a R, nunca foi promovido nem contemplado com qualquer incentivo salarial, nem teve formação profissional sobre qualquer matéria tecnicamente qualificante.

Iniciou, por isso, processos de reclamação que tiveram diversas peripécias e se revelaram desgastantes, humilhantes e desmotivadores, pois a sua situação nunca foi regularizada.

Não foi autorizado a participar num grupo de trabalho que estava a ser constituído para a informação “Bens e Garantias”, o que lhe causou forte instabilidade e perturbação.

Tem vindo a ser reiteradamente discriminado, ignorado e prejudicado, tendo pedido transferência para outra Direcção, sem qualquer resposta até ao momento. Não tem objectivos atribuídos, pelo que desconhece como pode ser avaliado, para poder reverter a sua situação profissional.

Por toda esta actuação da R, está triste, desgostoso, indignado, desmotivado e sente-se humilhado e desprestigiado, sem quaisquer perspectivas de futuro.

Concluiu pedindo que a ré seja condenada a integrá-lo no nível retributivo 13 desde a data da fusão e a restituir-lhe todas as diferenças salariais daí resultantes e, ainda, a atribuir-lhe um novo nível e isenção de horário de trabalho parcial, colocando-o na situação em que se encontraria se não fosse a conduta ilícita da ré e, pelo menos, correspondente à média dos níveis que usufruem outros técnicos da ré com a sua experiência profissional e qualificações, com o consequente pagamento do diferencial nas retribuições que deveria ter auferido até efectivo pagamento, a liquidar em execução de sentença e a atribuir-lhe imediatamente funções adequadas à sua categoria, qualificações e perfil e a indemnizá-lo pelos danos não patrimoniais sofridos, de valor nunca inferior a € 100.000,00.

Regularmente citada, veio a R contestar, e impugnando a factualidade alegada pelo A, concluiu pela improcedência da acção, com a sua consequente absolvição dos pedidos.

Após audiência de julgamento foi proferida a sentença, que julgando a acção improcedente, absolveu a R. dos pedidos.

Inconformado, apelou o A, tendo o Tribunal da Relação julgado a apelação parcialmente procedente, vindo a condenar a R. a pagar ao A., a título de indemnização por danos não patrimoniais, a quantia de € 25.000, confirmando a sentença recorrida no demais.

Irresignadas, recorreram ambas as partes de revista, tendo a R rematado a sua alegação com as seguintes conclusões: 1. O douto Acórdão recorrido, após exaustiva e detalhada análise da prova produzida nos presentes autos, decidiu alterar a matéria de facto provada, alterando a redacção dos pontos 90., 92., 106., 107. e 108 e aditando os pontos 13-A., 15-A., 20-A., 33-A., 66-A., 87-A, 89-A. e 90-A., dos factos provados.

  1. Não obstante as alterações da matéria de facto, o douto Acórdão recorrido entendeu - e bem! - que não houve da parte da ora Recorrente qualquer discriminação do Autor. Concretamente, decidiu não haver discriminação quanto à categoria profissional atribuída aquando da fusão do ex-B CC; quanto à integração no Núcleo de Apoio da DGR; quanto ao tipo de horário de trabalho atribuído; quanto à formação profissional prestada; e ainda, quanto à progressão salarial prosseguida pelo Autor, designadamente quanto ao nível retributivo, à retribuição por isenção de horário de trabalho e ao complemento retributivo.

  2. Surpreendentemente, o douto Acórdão recorrido entendeu verificar-se uma situação de assédio moral de que o Recorrido teria sido vítima, e estribado nas considerações que teceu, conclui condenado a Recorrente no pagamento ao Recorrido de uma indemnização por danos não patrimoniais no montante de 25.000,00 Euros.

  3. A Recorrente, que é uma prestigiada instituição de crédito e pessoa de bem, não pode conformar-se com tal decisão, e daí a presente Revista.

  4. O douto Acórdão recorrido, depois de descrever o que, modernamente, se entende por assédio moral ou mobbing - descrição, aliás, com a qual a Recorrente concorda inteiramente - avança que no caso dos autos "há diversos aspectos na conduta da R, através do superior hierárquico do A. (o Director Central da DGR) para com o recorrente, que, apesar de não serem, quando analisados isoladamente, ilícitos, quando globalmente considerados, no seu conjunto e dado o seu prolongamento no tempo, são aptos a criar no trabalhador um desconforto e mal estar no trabalho que ferem a sua dignidade profissional, a sua integridade moral e psíquica, a tal ponto que acabaram por ter reflexos na sua prestação laboral, com a desmotivação que causam e também na saúde, levando-o a entrar numa situação de acompanhamento psiquiátrico, a conselho da própria médica do trabalho da R. e recorrida".

  5. Ter-se-ia por saudável que o douto Acórdão, após julgar que não estavam verificadas as diversas, muitas, discriminações invocadas pelo Recorrido, daí extraísse algum ensinamento para a apreciação do alegado assédio. É que parece óbvio o descontentamento do Recorrido - também a Recorrente o não nega - mas, como se decidiu nas instâncias, tal descontentamento, ao contrário do que entendia o Recorrido, não tem qualquer base de sustentação em incumprimento contratual da Recorrente.

  6. Demonstrada a falta de fundamento da pretensão do Recorrido - no que respeita às alegadas discriminações - pensa-se que deveria o douto Acórdão recorrido ter em conta que a relação laboral vigente entre a Recorrente e o Recorrido, se marcava, pela parte deste último, por uma perspectiva errada quanto aos direitos que lhe assistiam, facto que, naturalmente, seria gerador de tensões e desgastes, sempre não fundamentados, como se viu.

  7. O douto Acórdão recorrido, na apreciação que fez, poderia - deveria - ter-se rodeado das maiores cautelas o que, salvo o devido respeito, não fez.

  8. Pelo contrário, o douto Acórdão recorrido valorizou, de forma errada, alguns dos factos provados e considerou outros factos que não estão sequer provados, extraindo conclusões que, salvo o devido respeito, não resultam da prova produzida.

  9. Primeiro, refere-se ao facto de, desde a fusão, o Recorrido ser identificado como um caso especial. E, "eventualmente", por esse motivo foi-lhe atribuído um horário diferente.

  10. Tal fundamento não tem qualquer sustentação na prova produzida pois não consta da matéria que facto, nem após as alterações que foram introduzidas pelo douto Acórdão recorrido, que o Recorrido fosse visto como um "caso especial".

  11. Mais: ainda que o Recorrido fosse visto como um "caso especial", sempre ficaria por saber em que consistiria essa especialidade, já que a matéria de facto é, também quanto a esse aspecto, absolutamente omissa! 13. Mais ainda: o douto Acórdão recorrido, sustentando-se num facto não provado avança, precipitadamente, para uma "eventualidade" afirmando: "E, eventualmente, por esse motivo foi-lhe atribuído um horário diferente." 14. E é assim, salvo o devido respeito, suportado em facto nenhum, que o douto Acórdão em crise dá como assente a primeira situação que reputa integrar a prática de assédio moral.

  12. Segundo, o douto Acórdão recorrido avança que a manutenção do Recorrido a fazer o reporte diário das situações devedoras de incumprimento é também uma situação de molde a sustentar o pretenso assédio moral.

  13. Também sobre as funções atribuídas ao Recorrido ficou claro não haver qualquer discriminação.

  14. Mais: ficou evidenciado pelo próprio douto Acórdão recorrido que as funções que agora condenada por terem sido mantidas ao Recorrido, eram funções técnicas que na expressão do douto Acórdão em crise se afigura: "indiscutivelmente configurarem funções técnicas que se enquadram no descritivo funcional do técnico de Grau III (...)".

  15. É certo que o Recorrido poderia ambicionar que lhe fossem atribuídas outras funções ou mesmo que fosse colocado noutra estrutura da organização da Recorrente, mas a falta de satisfação dessa ambição do Recorrido não pode ter a leitura que o douto Acórdão recorrido dela faz, mormente, ao considerar que a actuação da Recorrente ou do superior hierárquico do Recorrido integra, por esse facto, a prática de assédio moral.

  16. Terceiro, o douto Acórdão recorrido refere-se ao facto de ter sido obstada a participação do Recorrido no grupo de trabalho para a informação Bens e Garantias, apesar da nota positiva dada à...

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