Acórdão nº 289/09.0TTSTB.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelSAMPAIO GOMES
Data da Resolução29 de Março de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça.

  1. 1.

    AA, por si e em representação do seu filho menor BB, intentou, com o patrocínio do Ministério Público e no Tribunal do Trabalho de Setúbal, a presente acção especial, emergente de acidente de trabalho, contra “CC – Companhia de Seguros, S.A.” e “DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A.” pedindo a condenação da 2.ª ré a pagar à autora: (i) a pensão anual e vitalícia no montante de € 12.720,71, até perfazer a idade da reforma, devida desde o dia seguinte à morte de EE; (ii) o subsídio por morte no valor de € 2.700,00; (iii) o subsídio para despesas de funeral no montante de € 3.600,00, dado que houve trasladação; (iv) os juros de mora sobre as importâncias em dívida, à taxa legal, desde o respectivo vencimento até integral pagamento; e a pagar ao seu filho menor BB: (i) a pensão anual e temporária de € 8.480,47, até aos 18, 22 anos ou até aos 25 anos, enquanto se verificarem as condições a que se refere o artigo 20.º, alínea c), da Lei n.º 100/97, de 13-09, devida desde o dia seguinte à morte de EE; (ii) o subsídio por morte no valor de € 2.700,00; (iii) os juros de mora sobre as importâncias em dívida, à taxa legal, desde o respectivo vencimento até integral pagamento.

    Alegou para o efeito, e em síntese, que vivia em união de facto com o referido EE, sendo o menor filho de ambos. O sinistrado era trabalhador da segunda ré, pois que com a mesma havia celebrado um contrato de trabalho temporário. A 2.ª ré havia transferido a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho para a 1.ª ré, sendo que o sinistrado, no dia 23 de Março de 2009, quando se encontrava a desempenhar as suas funções de serralheiro construtor de estruturas metálicas de 3.ª, a mando da 2.ª Ré, não obstante ao serviço de uma empresa utilizadora, nas instalações da nova fábrica da P..., em Setúbal, foi vítima de um acidente de trabalho que lhe provocou, como causa directa e necessária, a morte.

    Aduziu, ainda, que o referido acidente ficou a dever-se à violação de regras de segurança, pelo que pela sua reparação deve a ré empregadora responder a título principal e a ré seguradora a título subsidiário.

    Para o caso de se entender que o acidente não ficou a dever-se a violação de regras de segurança, pede, a título subsidiário, a condenação da ré seguradora no pagamento das prestações normais emergentes do acidente de trabalho que vitimou o sinistrado.

    Mais peticionou a fixação de pensão provisória.

    Contestou a 2.ª ré, alegando, resumidamente, que, sendo uma empresa de trabalho temporário, tinha cedido o trabalhador sinistrado a uma outra empresa, pelo que não tinha sobre o mesmo qualquer poder de facto ou autoridade, sendo certo que cumpriu as obrigações que sobre ela impendiam em matéria de segurança e saúde.

    Pugna, por consequência e quanto a si, pela improcedência da acção.

    Por sua vez, a ré seguradora contestou, sustentando, em síntese, que o acidente se ficou a dever a violação de regras de segurança, pelo que deverá a empregadora responder pela reparação do mesmo a título principal, e ela, contestante, a título subsidiário.

    Foi fixada à autora e ao seu filho menor pensão provisória, cujo pagamento ficou a cargo da ré seguradora.

    Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença, cuja parte decisória é do seguinte teor: «Em face do acima exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, absolvo a R. DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., dos pedidos e condeno a R. CC - Companhia de Seguros, S.A., a pagar: a) à A. AA a pensão anual e vitalícia devida desde 24/03/2009, no valor anual € 6.360,35, até perfazer a idade de reforma por velhice, e de € 8.480,47 a partir dessa data; b) à A. AA uma prestação única a título de subsídio por morte, no valor de € 2.700; c) à A. AA as despesas de funeral no montante de € 3.600; d) ao A. menor BB, uma pensão anual de € 4.240,24, devida desde 24/03/2009 e até perfazer 18, 22 ou 25 anos de idade, enquanto frequentar, respectivamente, o ensino secundário ou curso equiparado ou o ensino superior; e) ao A. menor BB, uma prestação única a título de subsídio por morte, no valor de € 2.700; f) a ambos os AA., por todas as prestações supra referidas, os juros de mora, à taxa a que se refere o art. 559.º n.º 1 do Código Civil, vencidos desde 24/03/2009 e até integral pagamento, com ressalva das pensões referidas em a) e d), em que tais juros se contarão sobre os momentos temporais referidos no art. 51.º n.ºs 1 e 2 do Decreto-lei n.º 143/99».

    2.

    Inconformada com a decisão, a ré seguradora dela interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Évora que, concedendo provimento ao recurso, revogou a sentença recorrida e decidiu como segue: 1.«[C]ondena-se a Ré DD – Empresa de Trabalho temporário, S.A., a pagar: a) à Autora AA: (i) a pensão anual e vitalícia no montante de € 12.720,71, devida desde o dia 24 de Março de 2009; (ii) a quantia de € 2.700,00 a título de subsídio por morte; (iii) a quantia de € 3.600,00 a título de despesas de funeral; b) ao Autor BB: (i) a pensão anual e temporária de € 8.480,47, devida desde 24 de Março de 2009 e até perfazer 18, 22 ou 25 anos de idade, enquanto frequentar, respectivamente, o ensino secundário ou curso equiparado ou o ensino superior; (ii) a quantia de € 2.700,00 a título de subsídio por morte.

    Sobre as referidas importâncias são devidos juros de mora, à taxa legal, desde o respectivo vencimento e até integral pagamento.

    1. [C]ondena-se a Ré CC – Companhia de Seguros, a título subsidiário, a pagar: a) à Autora AA: (ii) a pensão anual e vitalícia de € 6.360,35 até perfazer a idade da reforma por velhice, e de € 8.480,47 a partir dessa idade; (ii) a quantia de € 2.700,00 a título de subsídio por morte; (iii) a quantia de € 3.600,00 a título de subsídio de funeral; b) ao Autor BB: (i) uma pensão anual de € 4.240,24 até perfazer 18, 22 ou 25 anos, enquanto frequentar, respectivamente, o ensino secundário ou curso equiparado ou o ensino superior; (ii) a quantia de € 2.700,00 a título de subsídio por morte.

      No valor a pagar aos Autores será deduzido o já pago pela Ré seguradora a título de pensões e indemnizações provisórias, devendo, por sua vez, a Ré DD, S.A., indemnizar a Ré seguradora das pensões e indemnizações que suportou (artigo 123.º, n.º 2, do Código de Processo do Trabalho)».

    2. É contra esta decisão que se insurge a ré “DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A.”, mediante recurso de revista, em que alinha as seguintes conclusões: A. Por Acórdão de 08/11/2011, o Douto Tribunal “a quo” decidiu revogar a decisão recorrida, proferida pelo Tribunal do Trabalho de Setúbal a 18/05/2011 e, em consequência, atribuir à ora Recorrente a responsabilidade pela reparação agravada do acidente sofrido pelo sinistrado EE, condenando a R. CC - Companhia de Seguros, S.A. a responder subsidiariamente pelas prestações normais previstas na lei.

  2. Fê-lo partindo do pressuposto de que o acidente que vitimou o sinistrado EE proveio da inobservância de regras de segurança, higiene e saúde no trabalho por parte de terceiros e considerando que, dado o «risco de autoridade» que sobre a ora Recorrente impende, na qualidade de entidade empregadora, sobre ela deve recair, para efeitos do n.° 1 do artigo 18.° e do n.° 2 do artigo 37.°, ambos da LAT, a responsabilidade pela reparação de acidente causado pela falta de observação de regras de segurança por parte daquela empresa utilizadora.

  3. Salvo o devido respeito, não colhe a argumentação utilizada pelo Tribunal a quo e que conduziu à condenação da ora Recorrente, pois que se encontra eivada de erros ou vazios de raciocínio e de suporte factual e legal.

  4. Houve efectivamente um acidente, qualificável como de trabalho, e pelas consequências desse acidente responde, em primeira linha, mas não a título principal, a ETT, entidade empregadora, ora Recorrente - isto é, face à verificação da ocorrência de um acidente de trabalho, a responsabilidade, objectiva, pelo seu ressarcimento, é, efectivamente, do empregador.

  5. Porém, o que a ora Recorrente não aceita, porque injusto e ilegal, é a transformação dessa responsabilidade objectiva/pelo risco numa responsabilidade agravada, em que passa a responder a título principal, ficando a seguradora, ora Recorrida, a responder apenas subsidiariamente.

  6. Na verdade, o n.° 1 do artigo 37.° da LAT instituiu para as entidades empregadoras a obrigatoriedade legal da transferência da responsabilidade pelo risco de acidentes de trabalho para entidades legalmente autorizadas, visando assegurar aos trabalhadores por conta de outrem e seus familiares condições adequadas de reparação dos danos decorrentes de acidentes de trabalho.

  7. Por seu lado, o artigo 5.° da Apólice Uniforme do Seguro de Acidentes de Trabalho para Trabalhadores por Conta de Outrem, aprovada pela Norma Regulamentar n.° 12/99-R, de 8 de Novembro, exclui do contrato de seguro os acidentes que, por sua vez, são excluídos pela legislação aplicável, os quais, à data do acidente, se encontravam dispostos nos artigos 18.°, n.° 1, e 37.°, n.° 2, da LAT.

  8. O que resulta da leitura dos citados preceitos - e que é aceite pelo Douto Tribunal a quo - é que deve recair sobre a entidade empregadora (no caso, a ora Recorrente) a responsabilidade por uma reparação agravada apenas nas situações em que essa entidade empregadora ou seu representante (i) ajam culposamente ou (ii) não observem as regras de segurança, higiene e saúde no trabalho que sobre eles impendem.

    I. Trata-se de situações em que, pelo facto dos acidentes não decorrerem dos riscos normais inerentes à actividade da empregadora, mas de um comportamento censurável da sua parte (actuação culposa ou inobservância de regras de segurança), o legislador entendeu devolver-‑lhe a responsabilidade pela reparação que havia sido transferida para a seguradora.

  9. Essa interpretação é reforçada pela leitura do n.° 1 do artigo 295.° do CT de 2003 (o qual, no entanto, não chegou a entrar em vigor)...

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