Acórdão nº 1470/09.7TBPTM.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelGRANJA DA FONSECA
Data da Resolução29 de Março de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

AA, L.

da, instaurou, em 17/04/2009, no Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Portimão, contra BB e mulher CC, a acção declarativa de condenação, com a forma de processo ordinário, pedindo: a) - A resolução do negócio de compra e venda entre autora e réus sobre o imóvel identificado nos artigos 1º e 2º da petição inicial, nos termos dos artigos 432º e seguintes do C.C.

  1. – A condenação dos réus na entrega à autora do imóvel devoluto de pessoas e bens e nas mesmas condições em que o receberam.

  2. – A condenação dos réus no pagamento de uma renda mensal de 550 euros por cada mês de ocupação da fracção, desde a data da sua ocupação até à sua restituição.

  3. – A condenação dos réus no pagamento das custas e honorários forenses do advogado da parte contrária, tudo com as legais consequências.

    Fundamentando a sua pretensão, alega, em síntese, que, por escritura pública celebrada no dia 13/06/2008, vendeu aos réus a fracção autónoma designada pelas letras “AB”, correspondente ao... andar B do prédio sito no “........”, Portimão, descrita na Conservatória Registo Predial de Portimão sob o nº 0000 da Freguesia de Portimão, e inscrita na matriz predial urbana sob o artigo 00000, pelo preço de 155.000 euros, do qual foi dado como “sinal” e princípio de pagamento a quantia de 50.000 euros, tendo acordado que o restante valor (105.000 euros) seria liquidado através do cheque número 00000000, sacado ao BANCO SANTANDER TOTTA, passado á ordem da autora.

    Acordaram nessa escritura pública que o contrato de compra e venda seria resolvido, se o cheque entregue para pagamento da quantia de 105.000 euros não tivesse, como veio a acontecer, boa cobrança, sendo certo que, apesar das diversas interpelações levadas a cabo pela autora, o valor não foi pago.

    Contestaram os réus, invocando a ilegitimidade passiva e a ineptidão da petição inicial, alegaram o pagamento total do preço acordado e impugnaram os factos, acrescentando que incidem duas hipotecas sobre a fracção autónoma, cujos registos a autora ainda não cancelou, e, em reconvenção, pediu a condenação da autora a proceder ao respectivo cancelamento.

    Segundo eles, a autora vendeu-lhes a aludida fracção, pelo preço de 155.000 euros, tendo a predita escritura de compra e venda como outorgantes DD, na qualidade de legal representante da autora e DD, na qualidade de gestor de negócios dos réus. A aludida escritura foi ratificada pelo réu BB.

    Para além do valor de 50.000 euros, entregues pelos réus, a título de sinal e princípio de pagamento do preço, existiram outros pagamentos efectuados a esse mesmo título, tendo a totalidade do preço sido paga antes da outorga da escritura pública.

    A autora replicou, respondendo às excepções e contestando a reconvenção.

    Teve lugar uma audiência preliminar.

    Foi proferido o despacho saneador, julgando improcedentes as excepções da ilegitimidade e da nulidade do processo por ineptidão da petição inicial, e admitiu a reconvenção.

    Instruído e julgado o processo, foi proferida sentença que, na parcial procedência da acção: a) – Declarou resolvido o contrato de compra e venda celebrado entre a autora e os réus, cuja cópia da escritura consta a fls. 8 e seguintes dos autos e, em consequência, condenou os réus a restituírem à autora, livre e devoluta, a fracção autónoma objecto de tal contrato; b) – Condenou os réus a pagarem à autora, a quantia de 500 euros por cada mês que, após o trânsito em julgado da sentença, se mantenham a ocupar tal fracção autónoma (até a restituírem à autora); c) – Julgou, na parte restante, improcedente a presente acção e, em consequência, absolveu os réus do restante pedido; d) – Na improcedência da reconvenção, absolveu a autora do pedido reconvencional.

    Inconformados, apelaram os réus para o Tribunal da Relação de Évora que, por acórdão de 6/10/2011, na procedência da apelação, julgou a acção improcedente, absolvendo os réus/recorrentes dos pedidos, assim revogando a sentença que julgara esses pedidos procedentes.

    Inconformada, recorreu agora a autora para o Supremo Tribunal de Justiça, pretendendo a revogação do acórdão recorrido e, desse modo, a confirmação da sentença que determinou a resolução do contrato de compra e venda celebrado entre autora e réus e consequente destruição de todos os efeitos produzidos pelo aludido contrato.

    Mais requer que o pagamento da indemnização no valor da renda fixada na sentença, por cada mês de ocupação abusiva do imóvel, seja fixado, desde a data da citação da competente acção e não desde a data do trânsito em julgado da decisão.

    Alegando, formulou as seguintes conclusões: 1ª - A sentença do Tribunal de Portimão não padece de qualquer vício. A fundamentação é expressa, clara, coerente e suficiente para nos fazer acreditar e aceitar a justiça da decisão; O imperativo constitucional que impõe o dever dos Magistrados fundamentarem os actos foi cumprido.

    1. - A decisão cumpre a sua dupla função pois permitiu o exercício do direito de recurso às partes e permitiu esclarecê-las quanto as razões de facto e de direito que justificaram a decisão e permitem concluir pela sua justiça.

    2. – Daí que a autora/recorrente propugne a “repristinação” da sentença do Tribunal de Portimão e a “revogação” do Acórdão do Tribunal da Relação.

    3. - O acórdão recorrido, ao revogar a sentença, tomou como ponto de partida pressupostos errados e inexistentes, in casu, a existência de um contrato de mediação entre a autora/vendedora e o Sr. EE e a imputação de intenções obscuras à estipulação da cláusula resolutiva.

    4. – O acórdão recorrido ignorou as evidências objectivas, in casu, tituladas por documentos.

    5. - O acórdão recorrido faz tábua rasa de princípios tão elementares como o princípio da liberdade contratual, princípio da pontualidade, e o desvio ao princípio da consensualidade ou liberdade da forma, imposto em nome da segurança e protecção dos intervenientes no tráfego jurídico.

    6. – O acórdão recorrido, ao revogar a sentença, não se limita a negar eficácia à cláusula resolutiva estipulada, isto porque, em simultâneo, nega os efeitos do exercício da liberdade contratual e o sinalagma entre as obrigações principais que oneram compradora e vendedora.

    7. - O Tribunal a quo reconhece que o contrato de compra e venda é um contrato real quanto aos efeitos, mas ignora que é igualmente um contrato com efeitos obrigacionais e com estrutura sinalagmática.

    8. - Ao fazermos uma síntese dos factos dados como provados no tribunal da 1.ª Instância e confirmados pelo tribunal ad quem resulta o seguinte quadro: a) - Entre a autora/vendedora e réus/compradores foi celebrado um contrato de compra e venda de imóvel.

  4. - O contrato de compra e venda foi outorgado através de escritura pública em 13 de Junho de 2008.

  5. - Na aludida escritura, foram intervenientes, o senhor DD, na qualidade de legal representante da autora/vendedora e o senhor DD, que declarou actuar como gestor de negócios dos réus/compradores.

  6. - Na escritura ficou estipulado que a falta de liquidação do preço em falta determinava a resolução do contrato.

  7. - Os réus/compradores não pagaram à recorrida/vendedora o preço global do imóvel.

  8. - A autora/vendedora só recebeu e deu quitação de € 50.000 (cinquenta mil euros); este valor foi entregue a título de sinal e princípio de pagamento.

  9. - Os réus entregaram quantias ao senhor EE/terceiro que não era o credor, nem seu representante.

  10. - O pagamento efectuado pelos réus não tem eficácia liberatória.

  11. – Os réus ocupam abusivamente o imóvel objecto do presente pleito desde a data da citação.

    Contra – alegaram os réus/recorridos, formulando as seguintes conclusões: 1ª – O acórdão deverá ser confirmado, porquanto não existiu prova factual produzida em juízo que sustente entendimento diverso.

    1. - Bem pelo contrário, já que os pontos 15, 17 e 18 da fundamentação de facto da sentença alicerçam o decisório do Tribunal da Relação de Évora.

    2. - O Acórdão sindicado entendeu ser ineficaz perante os réus a condição resolutiva inclusa na escritura de compra e venda do imóvel, ao abrigo dos artigos 275º, n.º 2 e 464º do Código Civil.

    3. – Reitera-se que a autora/recorrente recebeu e aceitou como bom o primeiro pagamento de € 50.000 (cinquenta mil euros), entregue pelo EE.

    4. – Mais. O Tribunal da 1ª Instância deu como provado que os réus entregaram ao EE a restante quantia do pagamento do preço.

    5. – Como estabelece o artigo 464º C.C., um dos pressupostos para fazer funcionar o instituto da gestão de negócios é a direcção do negócio ter sido realizada “no interesse e por conta do respectivo dono”.

    6. - Ora, a condição resolutiva jamais foi estabelecida no interesse dos réus, pelo que não é oponível a estes.

    7. - Conforme dado como provado, os réus já tinham pago o preço, pelo que não faz sentido que estabeleçam uma cláusula na qual se prevê a resolução do contrato, em caso de não pagamento (a escritura pública data de 2008/06/13 e o último pagamento foi feito em 2007/05/25), pelo que o preço do imóvel já estava integralmente pago há mais de um ano, quando se realizou a escritura pública).

    8. - Nos termos do disposto no artigo 275º, n.º 2 do CC, como bem salienta o acórdão recorrido, a condição resolutiva sub judice ter-se-á por não verificada.

    9. - Paralelamente, o facto de a autora ter concordado (pelo menos confirmado) e aceite um primeiro pagamento, entregue pelo EE, feito a estes pelos réus, incute nestes últimos a legítima convicção de que o EE era pessoa “habilitada” para receber tais montantes.

    10. - Ora, esta situação encontra abrigo legal na figura do mandato sem representação, prevista legalmente no artigo 1180º, sendo um negócio consensual: artigo 219º do CC.

    11. - O efeito translativo da transmissão do direito de propriedade verificou-se, tendo sido entregues as chaves do imóvel e pago o preço atinente.

    12. - Se o mandatário - EE - não entregou tais quantias à autora é questão a dirimir entre estes e à qual os réus são completamente alheios.

    13. - Sempre se dirá que face à...

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