Acórdão nº 1557/05.5TBPTL.L1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelMARTINS DE SOUSA
Data da Resolução20 de Março de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: I.

AA intentou acção declarativa com forma ordinária de processo contra Automóveis ..., Comércio de Automóveis, Lda. e Banco ..., SA., e, alegando ter adquirido um automóvel no stand da 1ª R., recorrendo a um empréstimo bancário concedido pela 2ª R., cujos documentos nunca lhe foram entregues; em consequência, ficou impossibilitado de celebrar seguro automóvel e de o levar à inspecção, não podendo, por conseguinte, utilizá-lo, durante o tempo em que o teve consigo, carência que, além do mais, lhe determinou incómodos severos que não teria tido se tivesse à disposição um automóvel circulante. Concluiu, pedindo a resolução do contrato de compra e venda e do contrato de mútuo por conexo incumprimento da parte contrária; e a condenação solidária do RR. a indemnizarem o A. pelo montante de € 9,059.88, das despesas que suportou com o automóvel objecto dos negócios, acrescida dos juros contados desde a data da citação, a pagarem ao A. a quantia de € 10,880.00, pela privação de uso automóvel, derivada do incumprimento referido, também acrescida de juros a contar desde a citação e a pagarem a compensação no montante de € 2.500,00, referente aos prejuízos derivados dos danos morais sofridos neste contexto, e acrescida de juros a contar desde a citação.

O R. Banco ..., S.A. contestou, por impugnação, excepcionou a incompetência em razão do território, formulou pedido reconvencional e solicitou a intervenção principal provocada de BB, fiador no contrato de mútuo, para ser solidariamente condenado neste último pedido que tem por fundamento a falta de pagamento parcial das prestações o mútuo.

Também contestou a Automóveis ... – Comércio de Automóveis, Lda., pugnando, nomeadamente, pela sua absolvição.

Ainda replicou o A., defendendo a competência territorial do Tribunal de Ponte de Lima e a interdependência entre os dois contratos, pelo que a resolução de um leva à resolução do outro e, consequentemente determina a improcedência do pedido reconvencional. E ampliou o pedido, estendendo-o aos juros de mora contados, desde logo e até integral pagamento, sobre os montantes que despendeu na data de celebração do contrato.

Solicitou, ainda, a condenação de ambos os RR. como litigantes de má fé.

Treplicou o R. Banco ..., mantendo a posição assumida.

Devolvida a competência às Varas Cíveis de Lisboa foi, aí, admitida a intervenção principal provocada de BB que, citado, nada disse.

E, proferido despacho saneador, apesar de algumas vicissitudes que, ora não relevam, veio a ter lugar a audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, absolvendo os RR. do pedido, e o pedido reconvencional, parcialmente procedente, condenando o A. e o interveniente BB a pagarem solidariamente ao R. Reconvinte, Banco ..., S.A, uma quantia a liquidar em execução de sentença, correspondente aos prémios de seguro devidos entre 20/06/2004 até 21/11/2005, às prestações de capital não pagas, acrescidas de juros desde 6 de Fevereiro de 2006 à taxa de 23,46%, a que acresce o imposto de selo respectivo, até integral pagamento.

Inconformado com a decisão, recorreu de Apelação o A. AA que viu seu recurso obter parcial provimento, decidindo a Relação alterar a sentença impugnada, declarando resolvido o contrato de compra e venda celebrado em 05.04.2004, entre o A. e a 1ª R., tendo por objecto um automóvel de marca Audi, modelo A3, (8L), de cor vermelha, com a matrícula ...-IR e condenando essa mesma R., a pagar ao A. a importância de € 9.059,88, bem como nos juros à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento.

De novo inconformado, recorreu o mesmo A., pedindo revista e no termo de sua alegação, deixou expressas as seguintes conclusões: 1º- Vem o presente recurso do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, que apenas julgou o recurso parcialmente procedente, declarando que o Recorrente está em mora no pagamento das suas prestações para com o 2º Recorrido, Banco ... S.A., e determinando que este terá igualmente que pagar ao 2º Recorrido a taxa de juro penal de 23,46% ao ano.

  1. - Alegou o Recorrente, em síntese, que adquiriu um automóvel no stand da 1ª Recorrida, acudindo a um mútuo concedido pelo 2º Recorrido. Sucede que o 1º Recorrido nunca entregou ao Recorrente os documentos do automóvel, limitando-se a entregar-lhe uma guia de substituição. Uma vez que os documentos jamais lhe eram entregues, interpelou a 1ª Recorrida para o fazer num prazo máximo, sob pena de resolução. Na falta dessa entrega, comunicou a resolução a ambos os Recorridos.

  2. - Foi dado como assente nos presentes autos, entre outros factos que, "O 1º recorrido apresentou ao recorrente uma proposta de financiamento no Banco ..., que o Autor aceitou e assinou", e que "A quantia emprestada foi transferida directamente do 2º R. para o 1º R." 4º- Foi decidido, e sem merecer qualquer censura, pelos Exmos. Senhores Doutores juízes desembargadores do Tribunal da Relação de Lisboa que se verificou incumprimento por parte do 1º recorrido desde o início da vigência do contrato até ao momento da propositura da acção.

  3. - Assim, tendo o 1º R. não cumprido com parte da sua prestação, encontrou-se, por isso, em situação de cumprimento defeituoso, o qual, por sua vez, equivale ao não cumprimento, pois no caso em concreto, o não cumprimento cabal de toda a prestação inviabiliza de todo, a fruição das utilidades inerentes ao bem.

  4. - Como consequência condenou-se o 1º R. "a reconhecer e aceitar a resolução do contrato de compra e venda do veículo automóvel com as legais consequências de restituição do preço percebido e retoma do veículo." 7º- Quanto ao crédito para compra do veículo contratado com o 2º Recorrido Banco ..., S.A., consideraram os Mmos. Senhores Juízes desembargadores do Tribunal da Relação de Lisboa que o contrato de mútuo é autónomo e independente do contrato de compra e venda celebrado entre o Recorrido e o 1º Recorrente, e como tal considerou não ser válida a resolução feita pelo Recorrente.

  5. - Ora, não partilha o Recorrente dessa opinião. O contrato de mútuo em questão identifica a designação finalística do crédito na parte dedicada às condições específicas indicando igualmente o fornecedor: Audi A3 de matrícula ...-IR, fornecido por automóveis ... Lda., Sta Comba, Ponte de Lima. Claramente temos um contrato descrito como contrato de crédito ao consumo. A correlação e a unidade económica dos contratos é clara: o contrato a crédito foi constituído exclusivamente para a compra do veículo automóvel.

  6. - A colaboração entre o vendedor Recorrido e o recorrido Banco ... é manifesta, em última instância pela admissibilidade do banco na concessão do crédito exclusivamente para a compra do veículo. Ainda mais flagrante sinal dessa colaboração é dado pelos factos assentes: "o 1º R. apresentou ao Autor uma proposta de financiamento no Banco ... que o A. aceitou e assinou", "A quantia emprestada referida no contrato a que respeita a alínea B), foi transferida directamente do 2º R. para o l° R".

  7. - Se não houvesse acordo prévio entre credor e vendedor para concessão de crédito de bens fornecidos pelo vendedor em primeiro plano o recorrido vendedor não teria tão prontamente disponíveis as propostas de financiamento do Banco ..., por outro lado não seria o mesmo a receber a quantia directamente do Recorrido Banco .... Enquadramos portanto este regime no artº12º,2 do DL 359/91.

  8. - Considerando a maior entrave à correlação entre o contrato de compra e venda e o contrato de mútuo a prova da exclusividade, devemos atentar a provas indiciárias: foi o 1º R. quem apresentou a proposta ao Recorrente e foi o vendedor quem recebeu directamente a quantia emprestada. Estamos assim perante o caso típico de acordo de exclusividade entre credor e vendedor.

  9. - É esta a posição deste Tribunal demonstrada em Acórdão de 5.12.2006, quando refere que a "exclusividade" deve ser determinada através de prova indiciária, nomeadamente pelo preenchimento do contrato a crédito ser feito nas instalações do vendedor.

  10. - Mesmo alheando-nos ao citado Decreto-Lei, o Acórdão do STJ de 5.12.2006 estende a resolução por incumprimento do devedor ao contrato a crédito, em razão da estrita dependência do pagamento das prestações do empréstimo à entrega do objecto financiado; 14º- Conclui-se nestes moldes, que o recorrente tem fundamentos para resolver o contrato celebrado com o Banco ..., como aliás o fez. Por outro lado, não resulta da matéria dada como provada que o Recorrido não aceitasse a resolução.

  11. - Assim, não incorreu o Recorrente em mora atento o incumprimento por parte do 1º Recorrido.

  12. - No que diz respeito aos juros, matéria que releva...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
8 temas prácticos
8 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT