Acórdão nº 07S3904 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 10 de Novembro de 2005, no Tribunal do Trabalho de Águeda, AA intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra Empresa-A, L.da, pedindo se declarasse ilícito o seu despedimento e se condenasse a ré a pagar-lhe a quantia de € 17.315,05, com juros à taxa legal.

Alegou, em síntese, que foi admitido ao serviço da ré, em 12 de Março de 2002, para exercer as funções de motorista de transportes internacionais rodoviários de mercadorias e que, em 22 de Novembro de 2004, a ré lhe aplicou a sanção de despedimento, que é ilícita, porque sem justa causa, acrescentando que a ré não lhe pagou o trabalho prestado em dias de descanso semanal, feriados e dias de descanso complementar não gozados e outras quantias que discrimina.

A ré contestou, por impugnação, invocando também a compensação com valores relativos a diversos prejuízos alegadamente provocados pelo autor.

Realizado julgamento, exarou-se sentença que julgou a acção parcialmente procedente e também parcialmente procedente a excepção de compensação invocada, e decidiu: A) declarar ilícito o despedimento do autor pela ré; B) condenar a ré a pagar ao autor a quantia global de € 22.296,70, assim discriminada: (a) € 500,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais; (b) € 8.450,25, a título de retribuições compensatórias vencidas até à data da sentença, previstas no artigo 437.º do Código do Trabalho; (c) € 1.768,66, a título de indemnização substitutiva da reintegração; (d) € 2.282,34, a título de montantes atinentes aos subsídios de férias e de Natal correspondentes à parte da retribuição respeitante à cláusula 74.ª, n.º 7 do CCT; (e) € 9.295,45, a título de remuneração do trabalho prestado em fins-de-semana e feriados, bem como dos descansos compensatórios respectivos, durante os anos de 2002, 2003 e 2004; C) condenar o autor a pagar à ré as despesas realizadas por esta, quando a sua legal representante se deslocou de França a Barcouço para vir buscar o veículo normalmente conduzido pelo autor, bem como os prejuízos causados à ré pela paragem do camião afecto ao autor, durante não mais de 4 dias e pela paragem, durante 3 dias, do camião afecto ao segundo motorista que acompanhou a gerente da ré, despesas e prejuízos estes (com o limite global máximo de € 3.912,20) a liquidar em execução de sentença; D) determinar a compensação entre os créditos referidos em B) - apenas nas suas alíneas c) e d) - e C) da parte decisória; E) condenar a ré a pagar ao autor juros moratórios, à taxa legal, sobre as quantias acima fixadas em B), desde o seu vencimento.

  1. Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação, que a Relação julgou parcialmente procedente e, em consequência, revogou a sentença recorrida, «na parte em que condenou a R. no pagamento ao A. da quantia de € 9.295,45 relativa ao trabalho suplementar e respectivos descansos compensatórios, de cujo pedido vai por isso absolvida», confirmando, quanto ao mais, a decisão recorrida.

    É contra esta decisão da Relação que o autor e a ré agora se insurgem, mediante recursos de revista, ao abrigo das seguintes conclusões: RECURSO DO AUTOR: «I - A douta decisão ora posta em causa pela Recorrente interpretou e aplicou erroneamente o disposto no artigo 781 [deve ler-se 712.º], n.º 1, alínea a), do Código do Processo Civil ao conhecer de matéria de facto quando a então recorrente, ora recorrida, não recorreu da matéria de facto e nem deu cumprimento a tal normativo legal, violando assim a lei; II - Do mesmo modo, a douta decisão ora posta em causa pela Recorrente viola a lei substantiva ao interpretar e aplicar erroneamente o disposto no artigo 258.º, n.º 5, do Código do Trabalho porquanto não considerou que a ora recorrida tinha conhecimento da prestação de trabalho suplementar por parte do trabalhador, ora recorrente, nem que era previsível a sua não oposição a tal prestação, quando ela própria o confessa; III - Atenta tal confissão, nos termos da alínea b) do n.º 1 do supra citado artigo 712.º, a mesma deveria ter sido considerada por constar do próprio processo; IV - Pelo exposto, deve ser proferido douto acórdão que revogue a decisão ora recorrida, dando-se total provimento ao presente recurso, decidindo nos precisos termos em que o foi pelo Tribunal de l.ª instância, tudo com as legais consequências.» A ré não contra-alegou.

    RECURSO DA RÉ: «1. A desobediência do Autor, que consistiu em ir para férias em período durante o qual tinha serviço distribuído, traduzindo-se ainda em faltas injustificadas e em prejuízos para a Ré, no pagamento dos quais foi condenado, constitui justa causa para despedimento; 2. O douto acórdão recorrido violou o disposto no artigo 396.º, n.º 1 e n.º 3, alíneas a), e), e g) do Código do Trabalho.» O autor contra-alegou, defendendo a confirmação do julgado, na parte objecto de impugnação no recurso de revista interposto pela ré.

    Neste Supremo Tribunal, o Ex.mo Procurador-Geral-Adjunto sustentou que ambos os recursos devem improceder, não tendo qualquer das partes respondido.

  2. No caso vertente, as questões suscitadas são as que se passam a enunciar: - Se o acórdão recorrido interpretou e aplicou erroneamente o disposto no artigo 712.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil [conclusão I da alegação do recurso de revista do autor]; - Se o acórdão recorrido violou o disposto no artigo 712.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil [conclusões II, na parte atinente, e III da alegação do recurso de revista do autor]; -Se o acórdão recorrido violou o disposto no artigo 258.º, n.º 5, do Código do Trabalho [conclusões II, na parte atinente, e IV da alegação do recurso de revista do autor]; - Se ocorre justa causa para o despedimento do autor [conclusões 1) e 2) da alegação do recurso de revista do réu].

    Corridos os vistos, cumpre decidir.

    II 1.

    As instâncias deram como provada a seguinte matéria de facto: 1) A R. dedica-se à actividade de comércio de transportes internacionais de mercadorias; 2) O A. foi admitido ao serviço da R. em 12 de Março de 2002; 3) O A., no exercício da sua profissão, enquadrava-se na categoria de motorista de transportes pesados internacionais, sob autoridade, direcção e fiscalização da R., auferindo o vencimento mensal base de € 489,82, acrescido das restantes retribuições mensais previstas no CCTV; 4) O A. encontrava-se filiado no Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos do Centro, o qual, por sua vez, se encontra filiado na Federação dos Sindicatos de Transportes Rodoviários e Urbanos; 5) Por sua vez, a R. encontra-se filiada na ANTRAM - Associação Nacional de Transportes Públicos Rodoviários de Mercadorias; 6) Em Outubro de 2004, a R. enviou ao A. uma nota de culpa em que acusava o A. de desobedecer a ordens emanadas da entidade empregadora no dia 24 de Setembro de 2004; 7) Com a nota de culpa veio também a suspensão preventiva do A., bem como a intenção, por parte da R., de proceder ao seu despedimento, findo o procedimento disciplinar; 8) Em 29 de Outubro de 2004, o A. respondeu à nota de culpa através de carta que se anexa e se dá por integralmente reproduzida; 9) Finalmente, em 22 de Novembro de 2004, o A. tomou conhecimento das conclusões e decisão final do procedimento disciplinar, aplicando ao A. a sanção de despedimento; 10) Em 24 de Setembro de 2004, a R. comunicou ao A. que não poderia gozar férias a partir do dia seguinte, já que precisava dele ao serviço; 11) Sucede, porém, que não obstante a Lei exigir a elaboração do mapa de férias até 15 de Abril, sempre o trabalhador as marcou por acordo com a empresa; 12) O trabalhador gozou parte das suas férias de 5 a 25 de Agosto de 2004 (pois chegou de viagem no dia 4 e começou a trabalhar no dia 26 de Agosto); 13) Cerca de duas semanas antes de 25 de Setembro, o A. comunicou à gerente, Sr.ª D. BB, que pretendia entrar de férias durante uma semana a partir do referido dia 25 de Setembro; 14) Ora, para o gozo deste período de férias, havia já o A. organizado a sua vida, tendo inclusivamente adquirido bilhete de avião; 15) O A. tinha proposto à D. BB que o seu cunhado, Sr. CC, poderia fazer a semana em que aquele estaria de férias, tendo inclusivamente o referido cunhado ido com o A. a França para conversar com o gerente da R.; 16) No dia 24 de Setembro, o A. recebeu ordens da R. para se dirigir, na segunda-feira seguinte, dia 27, ao Porto, Avintes, logo de manhã, para carregar garrafas vazias e levá-las a Marmande, em França, onde um cliente da empresa as aguardava; 17) O A. disse à entidade empregadora que só deixaria de ir de férias se esta o reembolsasse das despesas já feitas com a viagem de avião e a semana de férias, o que a R. recusou; 18) O trabalhador A. tem família; 19) A R. não pagou ao A. os proporcionais de férias e subsídio de férias do ano de 2004; 20) Nos proporcionais de subsídio de Natal pagos, a R. só pagou ao A. o correspondente à retribuição base; 21) Em nenhum subsídio de férias ou de Natal a R. pagou ao A. a retribuição correspondente à Cl.ª 74.ª; 22) O A. trabalhou nos seguintes dias de descanso e feriados do ano de 2002: Março - sábado...

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