Acórdão nº 2233/07.0TBCBR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Fevereiro de 2012

Magistrado ResponsávelHELDER ROQUE
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA[1]: AA, viúva, residente em …, Cantanhede, propôs a presente acção de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra BB, divorciado, residente em …, Cantanhede, CC, divorciada, residente em …, e DD, solteiro, residente em …, pedindo que, na sua procedência, se declare que a autora é credora do primeiro réu, no montante de €43.383,52, anteriormente à partilha efectuada entre os réus BB e CC [a], se declarem nulos, por serem simulados, os actos praticados na referida partilha, e na venda de um veículo, de matrícula OH-, do réu BB ao réu DD, por não terem correspondido, intencionalmente, à vontade real dos réus intervenientes, mas apenas terem sido celebrados com o intuito de prejudicar a autora [b] e, subsidiariamente, em relação a este ponto, por força da impugnação pauliana, se declare a ineficácia da mencionada partilha e da descrita venda, declarando-se que os bens transmitidos por aqueles actos sejam restituídos ao património do réu BB, de forma a que nele fiquem os necessários para a satisfação do crédito da autora [c] e, em consequência, que se ordene o cancelamento de todos os registos que hajam sido feitos ou que venham a fazer-se sobre os bens objecto da partilha e sobre o veículo vendido [d].

Alega, para tanto, em suma, que, por sentença proferida em 21 de Abril de 2005, no Processo Comum nº 174/04.1TTFIG, do Tribunal de Trabalho da Figueira da Foz, o réu BB foi condenado a pagar à autora a quantia de €43.383,52, mas como nada pagou, voluntariamente, o processo prosseguiu para a fase executiva, tendo a autora indicado à penhora o prédio urbano, não descrito na Conservatória do Registo Predial de Cantanhede, e inscrito na respectiva matriz, sob o artigo 568.º, bem como o veículo automóvel, de matrícula OH-, sendo aquele a casa de habitação em que o réu BB sempre habitou e esta a carrinha que o mesmo sempre conduziu.

Porém, em 14 de Setembro de 2006, veio a descobrir que a casa estava registada, em nome da ré CC, por partilha subsequente a divórcio, que correu termos, no Tribunal de Família e Menores de Coimbra, de acordo com um contrato-promessa celebrado em 30 de Janeiro de 2005, tendo a ré ficado com a maior parte dos imóveis, subavaliados, e o réu BB com bens onerados com usufruto e dois prédios de valor diminuto, sobreavaliados.

A isto acresce que a carrinha Mitsubishi está registada, em nome do réu DD, filho único dos restantes réus, tendo o registo sido efectuado, em Outubro de 2005, ocorrendo a transmissão dos bens depois de todos saberem da dívida do réu BB para com a autora, assim visando impedir que esta recebesse o valor do crédito que lhe foi reconhecido pelo Tribunal de Trabalho.

Posteriormente, devido a descuido na salvaguarda dos bens da ré CC, mas indiciando o carácter fictício da partilha, houve ainda necessidade de proceder à sua emenda.

O inventário entrou em juízo, em 16 de Setembro de 2005, porque os réus BB e CC já sabiam que a acção do Tribunal de Trabalho estava perdida, em virtude daquele não ter pago a taxa de justiça da contestação.

A partilha não teve consequências na situação de facto dos bens, já que a ré CC nunca viveu na casa, mas apenas o réu BB, sendo este quem tomava conta de todos os bens, tendo sido desactivada a suinicultura, a qual tinha sido partilhada como se estivesse em funcionamento, enquanto que a venda do veículo ocorreu sem que o réu DD tenha tomado a direcção efectiva da carrinha, sendo sempre o réu BB quem a conduziu, não tendo aquele pago qualquer preço por ela.

Todos os actos são nulos, por simulados, e, caso assim se não entenda, sendo o crédito da autora anterior aos actos já mencionados, e do conhecimento de todos os réus, estes agiram com consciência e intenção de prejudicarem a autora, por direito, judicialmente, reconhecido, devendo ser decretada a impugnação pauliana.

Na contestação, os réus concluem pela improcedência da simulação e da impugnação pauliana, alegando a ré CC que desconhece, em absoluto, os factos relativos à acção do Tribunal de Trabalho, e o réu DD que os desconhecia, até Maio de 2006, data em que o réu BB mandatou o escritório de advogados para analisar o processo em causa, e em que já estava findo o processo de inventário.

A data do contrato promessa de 30 de Janeiro de 2005 deriva de lapso, já que se tratou de um Domingo, e que o contrato em causa foi assinado, em 30 de Janeiro de 2006.

Os réus BB e CC encontravam-se separados, há cerca de vinte anos, sendo essa situação do conhecimento público da vila de O..., já que aquele se referia à ré CC sempre de forma odiosa, mais sendo do conhecimento público a personalidade e temperamento do mesmo, a quem veio a ser diagnosticada doença do foro psiquiátrico, como perturbação delirante paranóide/esquizofrenia, o que levava a que adoptasse comportamentos que geravam angústia e vergonha na ré CC e no réu DD, que acabaram por afastar-se do mesmo.

As relações entre eles nunca foram boas, e, entre pai e filho, nunca foram íntimas, mas tensas, vivendo este no dilema de não abandonar o pai e na impossibilidade de com ele manter uma relação amistosa, limitando-se o contacto a uma visita dominical, espaçada por largos meses, apenas à hora de almoço.

Em 1994, para fins de separação, foi elaborado um mapa de partilhas, que não se logrou fazer, havendo nova tentativa, em 1998, tendo sido requerido o divórcio, em 1999, pela ré CC, que foi convolado em mútuo consentimento, mas sem acordo quanto à partilha, tendo sido tentada nova partilha, em momento posterior ao divórcio, assinando ambos um mapa em que a casa ficaria para o réu DD, por doação.

Tal partilha acabou por ser requerida, judicialmente, pela ré CC, em 1 de Julho de 2005, porque, em Maio de 2005, foi citada, no âmbito de um processo executivo, para cortar ramos e troncos num prédio, no prazo de 15 dias, sob pena de pagar €25,00 diários, a título de sanção pecuniária compulsória, e o réu BB não permitia o corte das ditas árvores, o que tornou imperativa a partilha.

Quanto aos bens partilhados, referem que a suinicultura era um negócio rentável, de onde o réu BB sempre retirou proventos, encontrando-se em pleno funcionamento, ainda em Maio de 2006, sendo que a sua desactivação ocorreu por total incapacidade de aquele a prosseguir, dado que a doença de que padecia se agravou, culminando no acidente vascular cerebral que o que acometeu, em Novembro de 2006.

Que o valor dos bens teve em consideração que foi o réu BB que sempre deles usufruiu, durante os vinte anos da separação, justificando os cálculos.

O réu BB ficou com prédios em usufruto, já extinto, e a ré CC com usufruto em vigor, daí que houvesse necessidade de rectificação, saindo aquele favorecido.

Em Maio/Junho de 2005, o réu BB manifestou vontade de vender a carrinha, por pretender um carro ligeiro, mais pequeno e económico e, como o réu DD tinha uma propriedade com pomar, horta e videiras, e um VW comercial, acordaram em trocar este pela carrinha, pelo que, em Julho de 2005, este adquiriu um veículo novo sem dar aquele à troca, tendo sido assinadas as declarações de venda, ficando a carrinha de seu pai registada em seu nome, o que não ocorreu com o VW, mas viria a acontecer, em Novembro de 2006, por iniciativa do réu DD, em virtude de temer problemas futuros, sendo certo que, alternadamente, ambos usaram os dois veículos.

Na réplica, a autora impugna os documentos e os demais factos alegados, por não serem do seu conhecimento pessoal ou serem falsos, mantendo o já referido na petição inicial.

A sentença julgou a acção, improcedente por não provada, e, em consequência, absolveu os réus do pedido.

Desta sentença, a autora interpôs recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado improcedente a apelação e, em consequência, confirmou a decisão impugnada.

Do acórdão da Relação de Coimbra, a autora interpôs agora recurso de revista, terminando as alegações com o pedido da sua revogação e substituição por outro em que, dando-se provimento ao recurso, se julgue procedente e provado o pedido subsidiário, por força da impugnação pauliana e da declaração de ineficácia da partilha e da venda, declarando-se que os bens transmitidos por aqueles actos sejam restituídos ao património do réu BB, de forma a que nele fiquem os necessários com vista à satisfação do crédito da autora, formulando as seguintes conclusões, que, integralmente, se transcrevem: 1ª - Na presente acção tem de ser julgada procedente e provada a impugnação pauliana por deduzida pela autora contra a partilha dos bens do casal do réu BB e mulher a ora também ré CC.

  1. - Como reconhece a sentença recorrida "a autora demonstrou ter um crédito sobre o primeiro réu de data anterior aos negócios celebrados", mas acrescenta que, no caso em apreço, lograram os réus provar, como lhes cabia, que apesar dos actos praticados e em tais datas, continuou o primeiro réu a dispor de bens (resposta art. 12° da base instrutória).

  2. - Só que não basta ter bens, sendo necessário que disponha de bens suficientes para pagar ao credor e como se alcança da resposta dada ao quesito 5o., que ora se requer e do resultado das perícias juntas aos autos, esses bens são de valor reduzido - cerca de 12.000 Euros - e o crédito da autora é de mais de 42.000 Euros, pelo que não fica afastada a questão da necessidade da impugnação pauliana, pois os bens que couberam ao réu BB são insuficientes para satisfação do crédito da autora.

  3. - Quanto ao requisito da má fé, ela conclui-se com evidência palmar dos seguintes factos provados.

  4. - A ré CC esteve separada do réu BB, sensivelmente desde 1990 – resposta ao quesito 6º - veio a requerer o divórcio em 1999, que foi decretado nesse ano. - Cfr. Certidão junta aos autos e subitamente após a sentença que condenou o réu em 2005 - facto assente sob a al. A).

  5. - Foi requerido inventário para separação de meações, o qual foi resolvido por acordo - alínea G) dos factos assentes, mas a conferência de interessados, mesmo existindo esse acordo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
5 temas prácticos
5 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT