Acórdão nº 5253/04.2TBVNG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 31 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelSERRA BAPTISTA
Data da Resolução31 de Janeiro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: E.P. – ESTRADAS DE PORTUGAL, S.A. procedeu à expropriação das parcelas de terreno necessárias à execução da obra da concessão “Costa da Prata” – ER 1.18 –Sublanço IC1 – IP1 (quilómetro 2,000 ao quilómetro 4,700), nas quais se incluem as parcelas, propriedade da expropriada AA – SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES, LDA, a que se referem os autos, às quais foram atribuídos os nºs .... e ..../D.

Tendo-se procedido às respectivas arbitragens, conforme consta dos respectivos acórdãos, foi atribuído à parcela nº .... o valor de € 32 897,27, correspondente ao valor do terreno (€ 27 346,54), à desvalorização da parte sobrante (€ 4 470,73) e ao valor das benfeitorias (€ 1 080,00), tendo sido atribuído à parcela ..../D o valor de € 56 074,20, correspondente ao valor do terreno (€ 33 766,20) e ao valor da depreciação da parte sobrante (€ 22 308,00).

Notificados da decisão arbitral, veio a expropriada AA – SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES, LDA dela interpor recurso, reclamando, quanto à parcela nº ..., uma indemnização no valor de € 316 581,39 e, quanto à parcela nº ..../D, uma indemnização total de € 208.421,32.

Mais requerendo a expropriação total, ou seja, a do acréscimo da área de terreno (172 m2) remanescente do prédio donde haviam sido destacadas as parcelas nºs .... e ..../D, a primeira com a área de 562 m2 e a segunda com a área de 666 m2, tudo a implicar a expropriação da área de 1 400 m2.

Quanto à parcela nº ..../D veio, também, a expropriante interpor recurso, discordando da atribuição, no acórdão arbitral, da indemnização de € 22 308,00, a título da desvalorização da parte sobrante.

Deferida a expropriação do remanescente, em relação à parcela nº ..../D, passou o respectivo processo expropriativo a considerar a expropriação do acréscimo de 172 m2, importando numa área global de 838 m2 (666 + 172).

Realizadas as competentes avaliações, fixaram os senhores peritos, quanto à parcela nº ...., a indemnização global de € 29 983,66 e, quanto à parcela nº ..../D, a indemnização global de € 50 574,40 (€ 49 274,40 em relação ao valor da parcela e € 1 300,00 em relação ao valor das benfeitorias).

Foi proferida sentença, que, quanto à parcela nº ...., fixou o valor da indemnização em € 28 426,54 (perda da parcela e benfeitorias) e, quanto à parcela nº ..../D, fixou o valor da indemnização em € 43 486,60 (perda da propriedade da parcela e da parte sobrante e benfeitorias), tudo a actualizar, de harmonia com os índices de preços no consumidor, com exclusão da habitação, publicados pelo INE, relativamente ao local da situação do bem ou da sua maior extensão.

Inconformada, veio a expropriada interpor recurso de apelação, para o Tribunal da Relação do Porto, julgado parcialmente procedente, com a alteração da sentença recorrida, fixando-se a indemnização relativa à expropriação da área de terreno (838 m2) da parcela nº ..../D em € 50 574,40, a actualizar nos termos fixados na sentença.

Ainda irresignada, veio a expropriada pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª - A aqui Recorrente discorda totalmente do douto Acórdão de que se recorre, uma vez que o mesmo, salvo o sempre mui devido respeito, além de não se encontrar devidamente fundamentado não analisa correctamente as questões que lhe foram colocadas, fazendo com que, em virtude disso, a recorrente esteja a sofrer uma privação, a qual raia foros de inconstitucionalidade.

  1. - Com efeito, de acordo com a nossa doutrina mais considerada, justa indemnização é aquela que tem por bitola o valor praticado no mercado, tomando-se este conceito como aquele valor que seria oferecido por um cidadão medianamente esclarecido e conhecedor pela compra livre e directa no mercado numa perspectiva de rentabilidade/lucro.

  2. - Assim, há que concluir com o devido e sempre ressalvado respeito que a indemnização atribuída às parcelas expropriadas mais se assemelha ao parente pobre da justa indemnização.

  3. - Tudo quanto aqui foi por nós alegado nos autos é, assim mais uma vez reiterado, mas sem nunca prescindir do facto de que os artigos 13° e 61° da nossa Lei Fundamental salvaguardam as garantias dos cidadão entre si e perante o Estado, nomeadamente a direito à igualdade, bem como estabelece que a propriedade privada é um bem Jurídico com valor constitucional que não deverá sofrer limitações desnecessárias.

  4. - Por isso mesmo, valerá aqui reforçar a ideia de que nenhum cidadão poderá validamente ser expropriado dos seus bens, sem por isso ser devidamente compensado. E é precisamente de compensar que se trata no caso, pois, o que se pretende é a reposição da aqui Apelante no "status quo ante" à expropriação.

  5. - Com efeito, pese embora toda a factualidade supra dada como provada, sempre entende a aqui Recorrente que, ainda assim, na douta decisão ora recorrida não foram respeitados todos os critérios determinativos da justa indemnização a fixar pela expropriação do prédio aqui em causa (entenda-se o prédio como um todo, porquanto, foi determinada a expropriação total do mesmo).

  6. - É que, na verdade, sempre deveria o Digno Tribunal recorrido ter atendido a todos os encargos suportados pela Expropriada, aqui Recorrente, para efeitos de cômputo da justa indemnização a fixar, pois que, na esteira dos factos dados como provados e supra melhor transcritos (destacados a negrito e sublinhado), tais factos consubstanciam também encargos por conta da Recorrente, que não teria, caso não fosse alvo do acto expropriativo em causa, o que importa fixar.

  7. - É, assim, ponto de discordância, que não podemos deixar de vincar, ponto essencial pelo qual nos debatemos, o facto de a indemnização por expropriação ter, necessariamente, como desiderato ressarcir o expropriado pelo prejuízo efectivamente sofrido, o que, sempre com o devido e merecido respeito, se julga não observado "in casu".

  8. - Com efeito, desde logo, permite-se a Expropriada, aqui Recorrente, discordar do facto de não se ter considerado o projecto de construção que estava previsto para aquela parcela de terreno, pois que, conforme melhor resultou provado nos presentes autos, certo é que aquele pedido de aprovação de projecto de arquitectura foi indeferido apenas e só pela circunstância da servidão "non aedificandi" resultante da perspectivada execução do traçado da ER 1-18; assim, não fosse a circunstância adveniente referente a tal execução de traçado, o referido projecto de licenciamento, que se apresentava em termos sólidos e coincidentes quer com a realidade envolvente àquela parcela de terreno quer com o PDM e as condicionantes topográficas, não tinha porque ser indeferido.

  9. - Seja, com a expropriação que teve lugar nos presentes autos, a aqui Expropriada ficou claramente numa posição de desigualdade perante os restantes cidadãos, porque viu a sua pretensão indeferida, certo que, caso não fosse a expropriação, não o seria. No fundo, conforme vertido, tem que se colocar a tónica na função compensatória da indemnização, que teria que traduzir uma compensação integral do dano sofrido pelo particular, isto é, a indemnização justa será aquela que «segundo a observância do principio da igualdade violado com a expropriação, compense plenamente o sacrifício especial suportado pelo expropriado, de tal modo que a perda patrimonial que lhe foi imposta seja equitativamente repartida entre os cidadãos».

  10. - Portanto, a Expropriada, aqui Recorrente, tem direito a ser ressarcida, não só (tal qual considerado na douta sentença recorrida), pelo facto de ter perdido o seu direito de propriedade sobre o prédio expropriado, mas, antes sim, pelos prejuízos e lucros cessantes advenientes da não concretização do empreendimento que tencionava levar a cabo naquele prédio.

  11. - Malogradamente, veio a Veneranda Relação do Porto, no douto Acórdão ora recorrido, a considerar que, tanto a sub-questão relativa a despesas por si suportadas com o “IMT", com encargos inerentes à contracção de dois financiamentos e juros inerentes a tais empréstimos e com o projecto de construção para o aludido prédio, bem como, a sub-questão atinente à contabilização duma parcela indemnizatória referente aos lucros cessantes, não seriam de atender.

  12. - Isto porque, foi aí entendido que «a compensação por expropriação envolve essencialmente a restituição pela perda de direitos sobre o bem objecto daquela, não necessariamente a totalidade dos prejuízos que para o expropriado decorrem do acto expropriativo.» O que, na verdade, não se pode aceitar, até porque, conforme já referido, tal entendimento encontra-se em contradição com a decisão perfilhada pelo mesmo Venerando Tribunal, no âmbito do douto Acórdão proferido nos autos de recurso de apelação com o nº 5159/03.2TBSTS.P1, da 3ª Secção, em 25-03-2010 (publicado em www. dgsi. pt).

  13. - Com efeito, defende-se no douto acórdão-fundamento supra mencionado que «1- O acto administrativo de licenciamento é um acto constitutivo de direitos, pelo que, à data do início do processo expropriativo, tinham os expropriados direito de propriedade sobre o imóvel expropriado e direito de edificação do que constava do projecto de arquitectura que fora objecto de licenciamento camarário, isto é, de autorização de construção. II - Ou seja, os expropriados tinham o direito fundamental de propriedade do imóvel objecto do dito projecto de arquitectura e eram já titulares do direito de urbanizar, lotear e edificar nesse imóvel, direito este modelado pelo ordenamento jurídico urbanístico e não incluído no direito de propriedade privada, a que se refere o art. 62° da CRP, porque resultado de uma atribuição jurídica pública. III - Tendo a expropriação impedido a construção que os expropriados tinham direito de efectuar, o que lhes causou prejuízos, verifica-se que foram expropriados de dois direitos, o que tem pleno cabimento na previsão constante do art. 29° do Cod. Exp./99.» (negrito e sublinhado nosso).

  14. - Assim, e por referência à apontada razão de...

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