Acórdão nº 805/07.1TTBCL.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução25 de Janeiro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 16 de Novembro de 2007, no Tribunal do Trabalho de Barcelos, Secção Única, AA intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra SANTA CASA DA MISERICÓRDIA BB– HOSPITAL [E LAR] …, pedindo que a ré fosse condenada a reconhecer a ilicitude do seu despedimento e a pagar-lhe € 15.750, a título de indemnização por antiguidade, € 9.000, referentes a subsídios de Natal não pagos, € 9.000, relativos a subsídios de férias não pagos, € 4.500, correspondentes a férias não gozadas, «a quantia de € 1.500 de retribuição referente aos 30 dias anteriores à propositura da presente acção, bem como as que se vencerem até ao trânsito em julgado da presente acção», juros legais e € 13.500, respeitantes à compensação pela violação do direito a férias.

Alegou, em resumo, ter sido admitido pela ré, em 5 de Novembro de 2001, como terapeuta, funções que desempenhou até 15 de Janeiro de 2007, data em que a ré prescindiu dos seus serviços, sem prévia instauração de processo disciplinar e sem causa justificativa, sendo que, apesar de emitir recibo verde referente à remuneração auferida, na realidade, estava integrado na estrutura organizativa e funcional da ré, existindo entre ambos um verdadeiro contrato de trabalho.

Mais aduziu nunca lhe terem sido pagos subsídios de férias e de Natal, que apenas lhe era permitido gozar duas semanas de férias por ano e que se configurava um despedimento ilícito, tendo direito ao pagamento das quantias acima indicadas.

A ré apresentou contestação, alegando que sempre o autor trabalhou como profissional liberal, sendo pago à hora, contra recibo verde, aliás, propôs-lhe exercer as respectivas funções em regime de subordinação jurídica, o que este recusou.

Acrescentou que as férias eram gozadas de acordo com as conveniências do autor, que prescindiu dos serviços do autor face à diminuição do número de doentes no departamento de fisioterapia, que a presente acção constitui um verdadeiro abuso de direito, agindo o autor com evidente má-fé, e que sempre o direito à acção e aos créditos reclamados se acham já caducados e prescritos, respectivamente.

O autor respondeu, refutando a existência das aludidas excepções, mantendo a posição defendida na petição inicial.

Subsequentemente, foi exarado despacho saneador, em que se consignou não existirem nulidades, excepções, questões prévias ou incidentais de que cumprisse conhecer e que obstassem ao conhecimento do mérito da causa.

Realizado o julgamento, foi proferido despacho a fixar a matéria de facto provada e não provada (fls. 170-178), após o que se exarou a decisão seguinte: «Pelo exposto, e sem necessidade de maiores considerações, decide-se julgar a presente acção parcialmente procedente, por provada, e consequentemente: 1. Declara-se ilícito o despedimento do autor perpetrado pela ré a 15/01/07; 2. Condena-se a ré a pagar ao autor os seguintes montantes: a) 11.700 € de indemnização por antiguidade, sem prejuízo da que resultar à data do trânsito da presente decisão; b) 8.450 € de retribuições que deixou de auferir; c) 20.289,09 € de férias, subsídio de férias e de Natal referentes ao tempo que durou o vínculo laboral; d) Os legais juros de mora; 3. Absolve-se a ré dos demais pedidos contra a mesma formulados.» 2.

Inconformada, a ré apelou para o Tribunal da Relação do Porto, o qual julgou improcedente o recurso de apelação, sendo contra esta decisão que a ré agora se insurge, mediante recurso de revista, ao abrigo das conclusões seguintes: «1 – A inexistência de subordinação jurídica ou de autonomia por parte do Recorrido leva a que se classifique o contrato como sendo de prestação de serviços[;] 2 – Por outro lado, para determinar a natureza e conteúdo das relações estabelecidas entre as partes, há que averiguar qual a vontade revelada pelas partes e jamais (rectius: até à petição inicial...) o recorrido concebeu estar vinculado por contrato de trabalho; 3 – O recorrido tinha total autonomia, não tinha salário fixo, não recebia férias e/ou subsídios de férias, não fazia parte do quadro de pessoal da instituição, não lhe eram feitos descontos salariais, emitindo este os conhecidos “recibos verdes” e a sua nota de “retenção na fonte”, por si sempre assinada, dizia claramente rendimentos de “Trabalho Independente”; 4 – Portanto, o A./recorrido não demonstrou que na relação entre si e Recorrente, estivesse subordinado a esta e cabia a ele o ónus da prova da existência de tal contrato[;] 5 – O recorrido não beneficia da presunção do art. 12.º do CT já que o contrato tem data anterior à entrada em vigor desse normativo[;] 6 – O Recorrido não foi recrutado pelo carácter específico e pessoal, enquanto profissional concreto, mas sim enquanto prestador de serviços de fisioterapia: na verdade, a Recorrente nunca quis que o Recorrido prestasse os seus serviços... a Recorrente queria aqueles serviços que ele, ou qualquer outro, prestassem; 7 – Posto isto, haverá que relevar algo que está inerente a todo o caso sub judice: o Recorrido prestou a sua colaboração, ao longo de mais de cinco anos, ininterruptamente — sem notícia de qualquer desacordo sobre o seu estatuto de prestador de serviços; 8 – Sobre este período não alegou — porque não podia — um facto sequer, demonstrativo de que não se conformava com uma situação em que não lhe eram pagos os seus alegados direitos de trabalhador, ou seja, remuneração de férias, subsídio de férias, de Natal ou descontos na Segurança Social e sempre aceitou esta situação; 9 – E o seu comportamento só se alterou quando a Recorrente prescindiu dos seus serviços, aí sim, a sua situação jurídica careceu de nova qualificação, pois a liberdade a autonomia, a independência de que sempre dispôs não foram suficientes para aplacar a vontade de dar azo a uma pequena vendetta pessoal, o que deverá ser considerado uma nítida e concreta situação de abuso d[o] direito, art. 334.º do C.Civil; 10 – Posto isto, a douta decisão violou o disposto no art.s 11.º, 12.º do Cód. do Trabalho e 1152.º e 1155.º do C.Civil, por considerar por verificados os requisitos da existência de uma relação laboral, invocad[a] com claro abuso d[o] direito (art. 334.º do C.Civil) quando, na verdade, estamos perante uma prestação de serviços.» Termina concluindo que o presente recurso deve ser...

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