Acórdão nº 91/09.9T2AVR-A.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução12 de Janeiro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

Por apenso aos autos de falência de AA – Indústria de Madeiras, S.A., vários dos seus ex-trabalhadores, entre outros credores, vieram reclamar os seus créditos emergentes do contrato de trabalho celebrado com a ora falida.

Na sentença proferida, o crédito de todos eles, no tocante ao produto da venda dos bens imóveis da falida, foi graduado em último lugar, depois dos créditos preferenciais reclamados, respectivamente, pela Caixa Geral de Depósitos; pela Segurança Social; e pelas autarquias, por débitos emergentes de contribuição predial.

Inconformadas, as trabalhadoras BB e CC interpuseram apelação, sustentando, nomeadamente, que lhes seria já aplicável o regime de garantia real dos créditos laborais emergente do CT de 2003 – pelo que gozariam de privilégio imobiliário especial 000/00000 os imóveis da entidade patronal em que laboravam.

Ao recurso vieram aderir, nos termos do art.º 683º nº 3 do C. P. Civil, primeiramente, o também trabalhador DD, através do requerimento de fls 1928, e posteriormente EE e outros trabalhadores, subscritores do requerimento de fls 1955 dos autos. A Relação, no acórdão ora recorrido, julgou a apelação parcialmente procedente, definindo nos seguintes termos o objecto da controvérsia: As questões suscitadas pelos apelantes nas conclusões do recurso, todos ex-trabalhadores da falida, consistem em saber se os seus créditos laborais reclamados nos autos beneficiam de privilégio imobiliário geral ou de privilégio imobiliário especial, e se o privilégio de que beneficiam deve ou não prevalecer, nomeadamente 000/00000re hipoteca anteriormente registada pela qual se encontram garantidos os créditos da Caixa Geral de Depósitos.

Começando por analisar tal questão à luz do quadro normativo que antecedia a vigência do C Trabalho, concluiu a Relação que o privilégio imobiliário geral que era outorgado aos trabalhadores pela Lei 96/01 não podia legitimar a prioridade pretendida, afirmando: Acontece que, já antes da alteração introduzida ao art.º 751º do C. Civil, pelo Dec. Lei n.º 38/2003, de 08/3, a jurisprudência dos nossos tribunais, nomeadamente do Supremo, se começou a orientar no sentido da não aplicação da disciplina desta citada norma aos privilégios imobiliários gerais criados por legislação avulsa posterior à publicação do Código Civil, aos quais entendia dever ser antes aplicado o regime do art.º 749º do mesmo Código Civil (vide, entre outros, Ac. STJ de 24-9-2002, in Col. Jur/STJ, ano X, tomo III , pag 55). Consumada tal alteração, não pode agora haver dúvidas, a nosso ver, que os privilégios imobiliários gerais estão explicitamente excluídos do âmbito de aplicação do art.º 751º do C. Civil, não beneficiando, consequente, de prioridade, nomeadamente 000/00000re a hipoteca. Por tal razão, afigura-se-nos que, relativamente aos imóveis hipotecados a favor da recorrida Caixa Geral de Depósitos, os créditos dos trabalhadores reclamados nos autos não poderiam ser graduados à sua frente (por dispor de garantia hipotecária anterior), com fundamento na citada Lei n.º 96/2001 e no art.º 751º do C. Civil.

E, de seguida, passou o acórdão a analisar a eventual aplicabilidade ao caso dos autos do novo regime, constante do art.377º do C.Trabalho, afirmando: Os créditos dos trabalhadores passaram, assim, com o novo Código do Trabalho, a gozar, ao invés do que antes sucedia, de privilégio imobiliário especial, tendo ficado, dessa forma, claramente abrangidos pela letra do art.º 751º do C. Civil, na redacção saída do Dec. Lei n.º 38/2003, de 08/3, quando estatui que: «Os privilégios imobiliários especiais são oponíveis a terceiros que adquiriram o prédio ou um direito real 000/00000re ele, e preferem à consignação de rendimentos, à hipoteca ou ao direito de retenção, ainda que estas garantias sejam anteriores». É certo que a sentença declaratória de falência de AA, Indústria de Madeiras, S.A. foi proferida em 10/11/03, tendo transitado em julgado antes, portanto, da entrada em vigor da acima mencionada Lei Regulamentar nº 35/2004, que só se verificou no dia 28 de Agosto de 2004. Porém, entendemos que a lei que regula em novos termos a garantia patrimonial de determinados créditos, criando a seu favor um privilégio creditório, deve aplicar-se retroactivamente, de acordo com o disposto na 2ª parte do n.º 2 do art.º 12º do C. Civil (neste sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, in C. Civil Anotado, 4ª ed. revista e actualizada, vol. I pag 62, e Ac. STJ de 29-5-80, in BMJ 297º, 278), sendo, por isso, de aplicar o regime decorrente daquele art.º 377º do Código do Trabalho aos direitos de crédito laborais ainda que constituídos antes da referida data de 28 de Agosto de 2004.

De modo que, sendo os privilégios creditórios imobiliários especiais garantia mais forte do que a hipoteca, os créditos dos trabalhadores reclamantes nos autos deviam ser, em nosso entender, graduados à frente de todos os demais créditos, concretamente da Caixa ora apelada, apesar destes se mostrarem garantidos por hipoteca voluntária anteriormente constituída, no que diz respeito aos imóveis descritos na CRP de Águeda 000/00000 n.º 0/00000, inscrito na matriz 000/00000 art.º 596.º, e descrito na CRP de Águeda 000/00000 n.º 000/00000, inscrito na matriz 000/00000 os art.ºs 381, 418, 429 e 473; o mesmo devendo acontecer relativamente ao prédio descrito na CRP de Águeda 000/00000 n.º 000/00000, inscrito na matriz 000/00000 art.º 1205, 000/00000re o qual incide uma hipoteca legal do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social.

E isto porque, ao invés do que sustenta a apelada Caixa Geral de Depósitos, decorre dos autos, nomeadamente das certidões de ónus ou encargos de fls 2016 e segs do presente apenso, que o prédio descrito na CRP de Águeda 000/00000 n.º 0/00000, inscrito na matriz 000/00000 art.º 596.º, e o prédio descrito na CRP de Águeda 000/00000 n.º 000/00000, inscrito na matriz 000/00000 art.ºs 381, 418, 429 e 473, 000/00000re que incidem as hipotecas constituídas a seu favor, são, respectivamente: «um edifício de rés-do-chão amplo com um salão amplo, destinado à indústria …»; e «uma casa de rés-do-chão, com quatro divisões, destinada a indústria de moagem...

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