Acórdão nº 875/07.2TTVIS.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução23 de Novembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 14 de Dezembro de 2007, no Tribunal do Trabalho de Viseu, AA – …, LDA., instaurou a presente acção, com processo comum, emergente de contrato de trabalho contra BB, pedindo que (i) o réu seja declarado seu trabalhador, desde o dia 15 de Janeiro de 2001, (ii) se declare «a inexistência de justa causa na carta enviada pelo Réu à Autora, no dia 18 de Dezembro de 2006, junta como Doc. 2, declarando-a assim ilícita», (iii) se declare que tal carta «teve por efeito a denúncia do contrato de trabalho que vinculava o Réu à Autora e que produziu os seus efeitos no dia 19 de Dezembro de 2006», (iv) se declare «a validade da compensação operada pela Autora na carta junta como Doc. 9, que enviou ao Réu», e que, em consequência, (v) se condene o réu a pagar-lhe: a) € 20.925,87, pelas mercadorias que estavam confiadas à sua guarda; b) € 368,12, a título das máquinas que recebeu de clientes e que nunca devolveu; c) € 4.611,11, a título do remanescente da factura junta como Doc. 52; d) € 99,49, pela reparação do veículo automóvel que lhe estava atribuído; e) juros de mora, à taxa legal, sobre as indicadas quantias, desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Alegou, em suma, que o réu foi admitido ao seu serviço, por contrato verbal, no dia 15 de Janeiro de 2001, tendo trabalhado sob as suas ordens e direcção até ao dia 19 de Dezembro de 2006, exercendo as funções de distribuidor, e que, por carta de 18 de Dezembro de 2006, que a autora recebeu em 19 de Dezembro de 2006, o réu lhe comunicou a resolução do contrato de trabalho invocando justa causa, não correspondendo à verdade os factos ali invocados, pelo que deve considerar-se tal resolução ilícita, valendo como denúncia do contrato, sem pré-aviso; assim, deverá o réu pagar-lhe indemnização correspondente às retribuições no período do pré-aviso em falta, no montante de € 840, porquanto a sua última retribuição base ascendia a € 420, sendo certo que compensou tal valor com créditos sobre o réu, facto que lhe comunicou por carta remetida em 27 de Dezembro de 2006, anexando-lhe um cheque de € 115,58, que o réu lhe devolveu, mas que a autora manteve ao seu dispor.

Aduziu, também, que o réu tinha em seu poder material pertencente à autora com valor que, em 12 de Dezembro de 2006, ascendia a € 28.146,93, o que consta de inventário que o réu aceitou e rubricou; porém, entretanto, o réu entregou-lhe parte desse material, no valor de € 4.387,43, comprovou o paradeiro de outro, no valor de € 1.704,50, e procedeu à venda de diversas mercadorias que lhe estavam entregues, no valor de € 1.129,13, pelo que, abatidas as aludidas verbas, o valor das mercadorias entregues ao réu ascendia a € 20.925,87, mercadorias que não devolveu, nem pagou.

Invocou, ainda, que o réu não devolveu máquinas a clientes, pelo que teve que entregar a tais clientes outras máquinas, o que lhe causou o prejuízo de € 368,12, que, no ano de 2004, o réu entregou a vários clientes, gratuitamente, diverso material por si comercializado, sem que estivesse autorizado, no valor de € 7.744,57, pelo que facturou tal material ao réu, que assumiu o seu pagamento, e que pagou parcialmente, mantendo-se em dívida o montante de € 4.611,11, e que o réu danificou a viatura automóvel que lhe estava atribuída, em cuja reparação a autora despendeu € 99,49.

O réu contestou, confirmando a existência de um contrato de trabalho entre as partes, mas apenas com início em 1 de Setembro de 1999, afirmando a veracidade dos factos que invocou para resolver o contrato com justa causa e negando ter na sua posse material da autora ou qualquer dívida para com esta, tendo pugnado pela improcedência da acção e pela condenação da autora como litigante de má fé.

A autora respondeu, impugnando os factos alegados pelo réu e referindo que o mesmo aceitou o inventário elaborado e o pagamento da factura, concluindo como na petição inicial e defendendo a improcedência do pedido de litigância de má fé.

Após o julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando o réu — na sequência da declaração de que o mesmo foi trabalhador da autora desde, pelo menos, 9 de Setembro 1999, de que inexistiu justa causa para a resolução do contrato por si efectuada, de que a carta enviada pelo réu à autora, em 18 de Dezembro de 2006, teve por efeito a denúncia do contrato que os vinculava, a partir de 19 de Dezembro 2006, e de que a compensação operada pela autora foi válida — no pagamento à autora de € 19.797,83, pelas mercadorias desta que estavam confiadas à sua guarda, de € 4.611,11, a título do remanescente da factura de fls. 85 a 88 dos autos e de juros de mora, à taxa legal, sobre as indicadas quantias, desde a citação até efectivo e integral pagamento, tendo, ainda, julgado improcedente o pedido de condenação da autora como litigante de má fé.

  1. Inconformado, o réu apelou para o Tribunal da Relação de Coimbra, que decidiu julgar improcedente o recurso de apelação e confirmar a sentença recorrida, com a rectificação do valor da condenação relativa às mercadorias confiadas à guarda do réu, que fixou em € 19.587,83, sendo contra esta decisão da Relação que o réu se insurge, mediante recurso de revista, em que formula as conclusões seguintes: «1.ª Provado que o réu subscreveu um documento — o “print” de um conjunto de bens — que não elaborou e que, quando o subscreveu, logo disse que não concordava com os movimentos dele constantes, nem tinha consigo os bens nele descritos, foi afastada a presunção de que quem subscreve um documento já elaborado adere ao seu conteúdo.

    2.ª Afastada essa presunção tal subscrição só pode ser entendida — e sê-lo-ia para qualquer declaratário normal investido na posição da autora — que o réu confirmava que o “print” foi feito à sua frente, mas não assumia ter na sua posse aqueles artigos, não podendo extrair-se outro sentido do seu comportamento.

    3.ª Por isso, não poderia o réu ter sido condenado na restituição do valor dos bens que constavam do “print”, mas apenas no valor dos bens que se apurasse estarem na sua posse àquela data, ou na sentença, ou em liquidação.

    4.ª Se se expurgou da redacção do n.º 12 a expressão de que ao assiná-lo o réu confirmou os valores respeitantes a cada uma das parcelas é evidente que, também no que toca ao valor dos bens, a ser condenado o réu só poderia sê-lo num valor a liquidar, depois de fixado que material tinha consigo e não entregue à A.

    5.ª Na interpretação que fez do sentido a atribuir à subscrição do inventário, nas circunstâncias em que ocorreu, violou a Relação o disposto no art. 236.º/1, e 376.º/2 do C. Civil.» Conclui pela procedência do recurso, propugnando que seja exarado acórdão «que o absolva do pedido do pagamento das mercadorias a ele confiadas».

    A autora contra-alegou, defendendo a confirmação do julgado.

    Neste Supremo Tribunal, a Ex.

    ma Procuradora-Geral-Adjunta concluiu que a revista devia improceder, parecer que, notificado às partes, não suscitou resposta.

  2. No caso, a única questão posta é a de saber se, atenta a matéria de facto dada como provada, existe fundamento legal para condenar o réu a pagar à autora uma indemnização em dinheiro relativa ao valor...

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