Acórdão nº 259/06.0TBMAC.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelHÉLDER ROQUE
Data da Resolução23 de Novembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA[1]: AA e mulher, BB, propuseram a presente acção declarativa, com processo comum, sob a forma ordinária, contra CC e mulher, DD, EE e marido, FF, e o Município de Mação, todos, suficientemente, identificados nos autos, pedindo que, na sua procedência, os réus sejam condenados a retirar os dois pilares construídos no meio da garagem [a], a modificar o portão da garagem, para que o mesmo passe a ter a largura de três metros [b], a repor a letra “E”, no local que foi vendido aos autores, ou seja, em frente ao portão [c], a pagar aos autores a indemnização, a título de danos morais, no valor de €7.500,00 [d], a pagar aos autores uma indemnização mensal de €75,00, pelo não uso da garagem, desde o dia da escritura de compra e venda até ao dia em que os autores reocupem o espaço da garagem, em frente ao portão [e], a reparar os azulejos, espelho, parede, porta principal e móvel, referidos nos artigos 29º a 34º da petição inicial [f], e a pagar aos autores a desvalorização anual do seu carro, no quantitativo de €1.500,00, desde o dia da escritura de compra e venda até ao dia da recuperação do lugar [g], alegando, para tanto, e, em síntese, que os réus construíram vários prédios, em Mação, licenciados pelo réu Município, sendo que os autores compraram a fracção, denominada pela letra “E”, correspondente ao 2.º andar esquerdo, para habitação, com parqueamento na garagem, assinalada pela letra “E”, do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Mação, sob o n.º 3940, da freguesia de Mação, situando-se o lugar de estacionamento dos autores, imediatamente, à frente do portão da garagem.

Sucede que os autores não podem, até hoje, guardar a sua viatura nesse local, porque, no dia da escritura, os réus EE e FF mudaram a letra “E” de lugar, retirando-a da frente do portão e colocando-a ao meio da parede frontal ao portão das garagens, de modo que aqueles não conseguem manobrar o carro até esse local.

O projecto aprovado pelo réu Município previa quatro lugares para parqueamento de viaturas, mas este réu autorizou a constituição da propriedade horizontal de cinco fracções e os réus venderam as cinco fracções com parqueamento na garagem.

Construíram dois pilares no espaço destinado a parqueamento e o portão de entrada ficou com menos 60 cm. de largura do que estava projectado, não podendo aí ser parquedas mais de duas viaturas, sendo certo que o espaço que os réus reservaram aos autores só é utilizável, após o alargamento do portão de entrada e a eliminação dos pilares da garagem.

Acresce que os autores tiveram danos morais devidos ao sofrimento e incómodos causados por esta situação e com a desvalorização acentuada do seu veículo.

Além disso, o apartamento dos autores evidencia alguns defeitos, como sejam, os azulejos partidos, o móvel da cozinha estalado, o espelho da casa de banho riscado e a porta principal descaída.

Na contestação, os réus concluem pela improcedência do pedido, mas com a condenação dos autores como litigantes de má fé e, na parte que ainda interessa considerar, impugnam a matéria alegada por estes, designadamente, que lhes tivessem sido prometidos o lugar de estacionamento, em frente do portão, sendo certo que residem em França, apenas se deslocando a Portugal, em período de férias, não superior a trinta dias, pelo que podem estacionar o seu veículo no lugar que lhes pertence.

Que os primeiros réus promoveram a alteração da propriedade horizontal, com o acordo dos outros proprietários, ficando a garagem apenas dotada de três lugares de estacionamento, sem possibilidade de ampliar o portão de entrada na garagem, tendo os pilares sido implantados para aumentar o pé direito da garagem, mas sem que estorvem a entrada e saída dos veículos.

Na réplica, os autores alegam que os réus agiram com dolo, peticionando a sua condenação como litigantes de má fé.

Posteriormente, os autores desistiram dos pedidos formulados, sob as alíneas a) e b), e ampliaram o pedido no sentido de ficar a constar que os réus sejam obrigados a repor a garagem, com a área e composição do projecto aprovado pela Câmara Municipal de Mação, e a restituir aos autores o espaço da garagem, em frente ao portão desta, designado pela letra “E”, o que foi admitido por despacho, objecto de agravo interposto pelos réus, por considerarem que a ampliação do pedido constitui um mecanismo artificial, sem base legal, criado pelos autores.

A sentença julgou a acção, parcialmente, procedente e, em consequência, declarou improcedente a arguida excepção da caducidade [A], condenou os réus CC e mulher, DD, a repararem os seguintes defeitos existentes na fracção que venderam aos autores AA e mulher, BB: - O espelho da casa de banho que apresenta resíduos de silicone; - Os dois azulejos existentes entre o bidé e a banheira que estão estalados e - A parede da sala que ficou irregular no redondo da escada [B], absolvendo os réus do demais peticionado [C].

Desta sentença, os autores interpuseram recurso, tendo o Tribunal da Relação, nos termos, pelas razões e fundamentos explanados, e atento o artigo 713º, nº 5, do Código de Processo Civil, acordado em julgar improcedente o recurso de apelação e, por via disso, em confirmar, inteiramente, a sentença proferida pelo Tribunal “a quo”.

Deste acórdão da Relação de Évora, os autores interpuseram agora recurso de revista, terminando as alegações com o pedido da sua revogação, julgando-se a acção, procedente por provada, formulando as seguintes conclusões que, integralmente, se transcrevem: 1ª - O Ass do STJ de 10-5-89, in DR, IP S nº 141, de 22-6-89, pag 6127, interpreta o prescrito nos artºs 1414° e 1416° do C. Civil, 59º e 60º do Cod. do Notariado e 15º do DL 445/91, de 20/11, daí derivando a nulidade parcial do título constitutivo de propriedade horizontal desde que e na parte em que o mesmo contrarie e não siga o projecto aprovado e licenciado pela edilidade competente; 2ª - Atento, desde logo, o disposto no artº 294° do C. Civil, sendo tal nulidade do conhecimento oficioso e susceptível de declaração independentemente da invocação das partes, por atingir normas imperativas; 3ª - O Tribunal a quo, seguindo a doutrina harmonizadora do Assento acima referido devia ter considerado nulo o titulo constitutivo da propriedade horizontal, na parte em desconformidade com o projecto, nomeadamente na existência de dois pilares na cave, bem como de cinco lugares de estacionamento, repondo a garagem com as áreas e composição aprovadas; 4ª - Está compreendido nos poderes do Juiz, mesmo que não requerido pelas partes, mas assente na matéria dada como provada, contraditória entre si, na parte em que a propriedade horizontal e o projecto estão desconformes entre si proferir sentença conforme, nos termos do art.

º 664 C.P.C.

  1. - Não obstante, ao dar como assentes que "Em virtude do atrás referido, na garagem desse prédio não podem ser parqueadas mais de duas viaturas" e "O estacionamento referido em 2 apenas pode ser utilizado após o alargamento do portão e eliminação dos pilares da garagem", bem como "sendo que a ocupação do lugar designado pela letra A torna impossível o acesso a todos os lugares à excepção do designado pela letra D" o Tribunal a quo dá como certo que os autores não podem utilizar o espaço que adquiriram, o espaço designado pela letra E...

  2. - Provados todos os factos, a alteração do lugar de garagem, a desconformidade da propriedade horizontal com o projecto aprovado, a não utilização da mesma pelos autores, deve ser proferida sentença diversa e a acção ser julgada procedente.

  3. - Motivo pelo qual o Tribunal ao decidir como decidiu violou o disposto nos art.

º 294º, 1416º, 1418º Código Civil, bem como o disposto no art.

s 668° nº 1, al) C e D do Código de Proc. Civil.

Nas suas contra-alegações, os réus CC e mulher concluem no sentido de que o presente recurso deve ter como objectivo a reapreciação do enquadramento jurídico dado pelo Tribunal da Relação à matéria de facto apurada nos autos [1], que os recorrentes olvidam tudo o que peticionaram nos autos, pugnando por uma nulidade parcial do título constitutivo de propriedade horizontal nunca invocada, em primeira instância, e que não constituiu o cerne, nem a essência do processo dos autos; [2], que não tem cabimento legal, no contexto em que foi desenhada a causa ao pedir e o pedido, o ora peticionado...

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