Acórdão nº 6152/03.0TVLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelGREGÓRIO SILVA JESUS
Data da Resolução10 de Novembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Revista nº 6152/03.0TVLSB.S1[1] Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I— RELATÓRIO A...H..., Limited, com sede em ..., Grã Bretanha, intentou acção declarativa, com processo ordinário, contra A.A. S... - Imóveis, Comércio e Indústria, S.A., com sede na Estrada ..., Oeiras, P... - Sociedade Imobiliária de Paço De Arcos, Lda., com sede em Tagus Park, Edifício Um, Piso 0, Ala A, Oeiras, Banco Comercial Português, S.A., com sede na Praça D. João I, nº 28, Porto, Banco BPI, S.A., com sede na Rua Tenente Valadim, nº 284, Porto, Banco Espírito Santo, S.A., com sede na Avenida da Liberdade, nº 195, Lisboa, Banco Santander Portugal, S.A., com sede na Praça Marquês de Pombal, nº 2, Lisboa, Banco Totta e Açores, S.A., com sede na Rua do Ouro, nº 88, Lisboa, Banco Finantia, S.A., com sede na Rua General Firmino Miguel, nº 5, 1º, Lisboa, e Caixa Central - Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo, C.R.L., com sede na Rua Castilho, nº 233, Lisboa, pedindo: A – A condenação da 1.ª R. e, solidariamente com ela, dos restantes RR. a pagarem à A: a) – A quantia de 15.462.734,81€, a título de preço em dívida das acções que por esta última lhe foram vendidas, responsabilizando por tal todo o património da mesma R., sem qualquer limitação no que respeita aos respectivos bens; b) – A quantia de 81.125,66€, a título de reembolso de 50% das quantias despendidas pela mesma A. no pagamento dos serviços prestados pelo Banco Finantia como depositário das acções vendidas; c) – A quantia de 1.555,85€, a título de juros vencidos contados sobre a quantia indicada na alínea b), à taxa legal, desde 03/03/03, bem como os juros vincendos, até integral e efectivo pagamento; d) – Uma quantia a liquidar em execução de sentença, estimada em 62.000.000,00€, correspondente aos ganhos frustrados que resultaram para a A. do incumprimento do contrato de compra e venda de acções e/ou da prática de um ilícito civil; e) – Subsidiariamente ao pedido enunciado em d), a quantia de 296.603,07€, a título de juros vencidos contados sobre o preço da compra e venda de acções em dívida, à taxa legal, desde 03/03/03, bem como nos juros vincendos, até efectivo e integral pagamento; B – Que seja dado provimento à acção de impugnação pauliana deduzida e declarada ineficaz, em relação à A., a dação em cumprimento formalizada pela escritura de 08/04/2003; C – Que seja ordenado o cancelamento das hipotecas inscritas a favor das 8.ª e 9.ª RR. por se manifestarem extintos os créditos por elas garantidos (inscrições C1, Ap. 43 de 1998/04/27 e C2 Ap. 9 de 1999/01/26) que incidem sobre o prédio urbano sito em Terrugem, Paço de Arcos, descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial de Oeiras, sob o n.° 2881, freguesia de Paço de Arcos.

Alega a autora, no essencial, que: - Em 07/03/1997, vendeu à 1.ª R. 836.957 acções, de que era titular no capital da sociedade Acumuladores A..., S.A., pelo preço de 3.200.000.000$00, a pagar em duas prestações, uma de 100.000.000$00 e outra de 3.100.000.000$00, esta última a efectuar em 03/03/2003 (cf. fls. 65 e segs.); - Com a compra dessas acções, a 1.ª R. passou a deter 55,56% daquele capital; - A par disso, foi celebrado entre a A., a 1.ª R. e o Banco Finantia um contrato, denominado “Acordo de Depósito Fiduciário”, nos termos do qual o referido Banco constituiu-se depositário das acções vendidas, a ser remunerado pela A. (cf. fls. 81 e segs.); - Por sua vez, a 1.ª R. comprometeu-se, nos termos do n.° 1 da cláusula 8.ª do sobredito contrato de compra e venda, a reembolsar a A. de metade dos encargos que por esta fossem suportados no âmbito do contrato de depósito das acções, cujo valor ascende a 81.125,66€; - Nos termos dos n.°s 1 e 3 da cláusula 10.ª do contrato de compra e venda, as partes limitaram a garantia da 1.ª R. pelo pagamento do preço das acções ao património por elas próprias constituído, excluindo de tal limitação a obrigação do reembolso de 50% da remuneração devida ao depositário Banco Finantia; - Desde 07/03/1997, aquele património social acabou por ficar reduzido a nada, tendo a sociedade Acumuladores A..., S.A. ficado em situação de insolvência, sem que a 1.ª R. tivesse procedido, como devia, em função da obrigação de resultado assumida, por forma a evitar o esvaziamento do valor das acções, violando assim o contrato celebrado com a A. e defraudando as legítimas expectativas desta; - Em 30/09/2002, a sociedade Acumuladores A..., S.A., a 1.ª R. e os Bancos RR. celebraram um contrato denominado “Contrato Promessa de Dação em Cumprimento e Financiamento”, (cf. fls. 142 e segs.), nos termos do qual a 1.ª R. prometeu dar em cumprimento aos referidos Bancos, ou a sociedade a ser por eles constituída sob a firma P..., um prédio urbano de que era proprietária, sito na Estrada de Paço de Arcos, para extinção de dívidas suas e da A..., S.A.; - Ainda em 30/09/2002, a 1.ª R. e a Acumuladores A..., S.A., celebraram um contrato denominado “Contrato de Transmissão de Estabelecimento Comercial com Opção de Recompra” (cf. fls. 112 e segs.), nos termos do qual, após reconhecerem reciprocamente que a Acumuladores A..., S.A., se encontrava numa situação de insolvência, transferiram todo o estabelecimento comercial desta sociedade para a 1.ª R., passando esta a exercer a integralidade da actividade económica daquela, cujo património ficou assim esvaziado de activos rentáveis e sobrecarregado de passivo; - Por carta de 01/10/2002, a 1.ª R. declarou-se perante a A. impossibilitada de pagar a última prestação do preço de venda das acções, correspondente a 15.462.734,81€, o que equivale a recusa antecipada de cumprir; - Por escritura pública de 08/04/2003, foi constituída a P..., ora 2.ª R., tendo como sócios fundadores os Bancos RR.; - Na mesma data e cartório, foi outorgada escritura pública, entre a 1.ª R. e a 2.ª R., denominada “Dação em Cumprimento” (cf. fls. 128 e segs.), nos termos da qual a 1.ª transmitiu à 2.ª o imóvel sito na Estrada de Paço de Arcos, com o valor de mercado aproximadamente de 45.000.000,00€, para extinção dos créditos dos Bancos, relativos a dívidas contraídas junto desses Bancos pela A..., S.A., no montante de 28.104.317,89€, e pela 1.ª R., no montante de 1.834.650,20€, na cifra total de 29.938.975,09€, créditos estes cedidos por aqueles Bancos à R. P..., na mesma data (08-04-2003) (cf. fls. 134 e segs.); - O referido imóvel encontrava-se já onerado com duas hipotecas a favor dos Bancos, a primeira constituída em 22/04/1998 e a segunda em 26/06/2001, para garantia de créditos contraídos pela 1.ª R. e pela A..., S.A.; - Os créditos garantidos pela 1.ª hipoteca (de 22/04/1998) respeitavam a dívidas da A..., S.A., no valor de 5.705.040,27€, e a dívidas da 1.ª R., no valor de 1.834.657,20€, no total de 7.539.697,47€, contraídas no âmbito do Contrato de Financiamento, de 23/04/1998, constante do documento de fls. 185 e segs.; - Por sua vez, os créditos garantidos pela 2.ª hipoteca (de 26/06/2001), reportados ao contrato de financiamento referido na respectiva escritura de constituição reproduzida a fls. 205 e segs., respeitavam a dívidas da A..., S.A., no valor de 1.981.209,66€; - Os créditos garantidos pelas duas hipotecas, que totalizam a cifra 29.938.975,09€, correspondem exactamente ao montante dos créditos cedidos pelos Bancos à P... e que foram satisfeitos pela sobredita dação em cumprimento, extinguindo assim as mencionadas hipotecas, não obstante ainda não terem sido canceladas; - Dos eventos descritos decorre que os Bancos RR., com a conivência da administração da 1.ª R., dominada por AA, têm vindo a realizar uma estratégia progressiva de reforço, ao longo dos anos, das garantias dos seus créditos sobre o universo empresarial da A..., S.A., e da 1.ª R., o que culminou com o completo esvaziamento da A..., S.A., através do sobredito contrato de trespasse, e da 1.ª R., com a dação em cumprimento do imóvel já referido, beneficiando tanto os administradores da 1.ª R., ao se libertarem das garantias pessoais que tinham prestado, como os Bancos que viram plenamente satisfeitos os seus créditos; - Desse modo, através do contrato de financiamento, de 23/04/1998, compreendendo um mútuo hipotecário (doc. de fls. 176 e segs.), um contrato de abertura de crédito (doc. de fls. 185 e segs, art. 2.º, al. b)) e um contrato de empréstimo a médio prazo (doc. fls. 185, art. 2.º, al. c)), bem como um outro contrato de financiamento, de 26/06/2001, os Bancos, ali designados por SINDICATO, refinanciaram a A..., S.A., e a 1.ª R. para pagamento de créditos pré-existentes deles próprios, conforme se alcança da cláusula 1.ª do contrato de financiamento de fls. 185, no montante total de 29.938.975,09€; - Por fim, através do Contrato de Moratória, celebrado em 15/01/2002 (cf. fls. 215 e segs.), os Bancos reforçaram, ainda mais uma vez, as suas garantias; - Assim, os Bancos RR., simultaneamente ao reforço das garantias dos seus créditos, passaram a controlar de perto a actividade da A..., S.A., com crescente influência na respectiva gestão; - Com tais comportamentos os RR. violaram o princípio do tratamento igual de todos os credores contido no art. 604.°, n.° 1, do CC, ao terem constituído preferências de pagamento arbitrárias, e esvaziaram, com má fé, os patrimónios da A..., S.A., e da 1.ª R., que serviam de garantia ao crédito da A., mormente através da dação em cumprimento; - A responsabilidade da 1.ª R. emerge tanto da violação das obrigações contratuais para com a A. como também da violação da lei, em sede pré-contratual e por violação do tratamento igual dos credores, enquanto que a responsabilidade dos demais RR. é exclusivamente de natureza extracontratual.

● A 1.ª R. contestou, por impugnação (fls. 269-326), sustentando que: - Pela falta do pagamento da parte do preço de venda das acções aqui em causa responde exclusivamente o património constituído pelas referidas acções depositadas no Banco Finantia, conforme o estipulado no n.° 1 da cláusula 10.ª do respectivo contrato; - A R. comunicou à A. e ao Banco depositário que...

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