Acórdão nº 509/05.0TTFUN.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelGONÇALVES ROCHA
Data da Resolução20 de Outubro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1--- AA, BB e CC instauraram, em 28 de Setembro de 2005, uma acção com processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra DD, SA, pedindo que se declare que os autores têm direito a antecipar a reforma, ao abrigo do art. 20.º do Estatuto Unificado do Pessoal (EUP); que durante a reforma antecipada permaneçam equiparados aos trabalhadores no activo; e que a ré seja condenada a conceder-lhes a reforma já solicitada e a pagar-lhes a remuneração prevista no EUP.

Para fundamentar a sua pretensão, alegaram, em síntese, que: - foram admitidos ao serviço da ré em 30.07.69, 22.07.69 e 30.07.69, respectivamente; - ao atingirem 36 anos de serviço comunicaram com doze meses de antecedência que pretendiam passar à situação de reforma antecipada a partir de 01.01.05, ao abrigo do disposto no art. 20.º do Estatuto Unificado do Pessoal; - até ao momento a ré não deu qualquer andamento à pretensão dos autores.

Atribuíram à causa o valor de € 15 020,00.

Realizada a audiência de partes e não tendo havido conciliação foi ordenada a notificação da ré para contestar, o que fez vindo desde logo impugnar o valor da causa, sustentando que lhe deve ser atribuído o valor de € 858 772,05; por outro lado, veio invocar a excepção de ilegitimidade passiva e sustentar a improcedência da pretensão dos autores nos seguintes termos: - a reforma prevista no art. 20.º do EUP traduz-se numa forma de caducidade do contrato atípica e contrária ao tipificado no Código do Trabalho; - poder-se-ia entender o regime previsto naquele artigo como uma situação de pré-‑reforma, mas de qualquer modo o pedido dos autores é juridicamente inviável por a sua concessão implicar o reconhecimento judicial de uma nova forma de cessação do contrato não prevista no art. 356.º e seguintes do Código do Trabalho; - por força do art. 6.º, nº1, alínea e) do Decreto-Lei nº 519-C1/79, de 29 de Dezembro, em vigor à data da negociação do EUP, a cláusula do art. 20.º do EUP é nula; - entendimento diverso, contenderia com o disposto no art. 63.º, nº 2 da Constituição da República Portuguesa, ferindo-o de inconstitucionalidade; - atento o respectivo enquadramento a nível da génese do EUP, deve considerar-se que a retribuição a abonar no caso de reforma antecipada, a que têm direito os antigos trabalhadores da CAAHM, terá de ser calculada de acordo com o regime fixado pelas Instituições Oficiais de Previdência que no caso concreto lhes seja mais favorável. No entanto, em circunstância alguma, poderá ultrapassar os montantes que lhe seriam pagos por aquelas, pelo que os trabalhadores que a partir de 2005, pretendam passar à situação de reforma antecipada, não podem deixar de ver reduzidos os montantes a receber em função do número de anos de antecipação face à idade mínima de reforma da Caixa Geral de Aposentações; - a ré só não deu andamento à pretensão dos autores de passar à situação de reforma antecipada porquanto os mesmos não aceitam o valor da pensão decorrente da aplicação do art. 37.º-A do Estatuto da Aposentação.

Concluiu assim pela procedência das excepções da nulidade e ilegitimidade com a consequente absolvição da instância; caso assim se não entenda, pede a improcedência da acção, com a consequente absolvição do pedido.

Os autores vieram apresentar a sua resposta impugnando o valor da causa atribuído pela ré e sustentando ainda que o seu pedido não implica a cessação do contrato de trabalho, mas antes o cumprimento do art. 20.º do EUP e que a alínea e) do nº 1 do art. 6.º do Decreto-Lei nº 519-C1/79, de 29 de Dezembro, se encontra ferida de inconstitucionalidade tal como já julgado pelo Tribunal Constitucional.

No final, requereram a notificação da ré para juntar aos autos o número de todos os trabalhadores que vêm usufruindo da reforma antecipada prevista no art. 20.º do EUP, assim como as datas da concessão da mesma e se alguma vez foi indeferido o pedido de reforma antecipada formulado por qualquer trabalhador ao abrigo do art. 20.º do EUP.

Posteriormente, requereram ainda que a ré fosse notificada para juntar aos autos cópia do requerimento dos autores solicitando a reforma antecipada ao abrigo do art. 20.º do EUP (fls. 381), pretensões que repetiram a fls. 418.

Foi decidido o incidente do valor da causa, que por despacho de fls. 200 a 202, foi fixado em € 828 844,15.

Inconformados, os autores interpuseram recurso desta decisão, que foi admitido no regime de subida diferida.

Foi designada data para uma audiência preliminar no decurso da qual foi proferido despacho saneador que considerou improcedente a excepção de ilegitimidade invocada pela R, fixando-se de seguida a matéria de facto assente e organizando-se a base instrutória.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, vieram os autores, no seu decurso, apresentar requerimento através do qual pretendiam que se solicitasse à Ré informação sobre “o número de todos os trabalhadores que vêm usufruindo ou já usufruíram da reforma antecipada prevista no art° 20° do EUP, assim como as datas da concessão da mesma, e se alguma vez foi indeferido o pedido de reforma antecipada formulado por qualquer trabalhador da R. ao abrigo do art° 20° do EUP”, requerimento que foi indeferido.

Inconformados, os autores interpuseram recurso deste despacho, que foi admitido com subida diferida.

E proferido despacho com a resposta aos artigos da base instrutória, foi proferida sentença que, julgando a acção improcedente absolveu a ré dos pedidos.

Novamente irresignados, interpuseram os autores recurso de apelação, mas o Tribunal da Relação negou provimento ao agravo através do qual se impugnava o valor da causa que fora fixado em € 813 880,20; negou provimento ao agravo interposto do despacho que indeferiu o requerimento apresentado na audiência de julgamento e através do qual pretendiam os autores que se solicitasse à Ré informação sobre “o número de todos os trabalhadores que vêm usufruindo ou já usufruíram da reforma antecipada prevista no art° 20° do EUP, assim como as datas da concessão da mesma, e se alguma vez foi indeferido o pedido de reforma antecipada, formulado por qualquer trabalhador da R. ao abrigo do art° 20° do EUP”; e julgou a apelação improcedente, confirmando a sentença recorrida.

Ainda inconformados, trazem-nos os autores a presente revista, tendo rematado a sua alegação com as seguintes conclusões: 1º - O art.º 24º, n°1 do Estatuto Unificado do Pessoal determina que o trabalhador, na situação que aí se acha denominada como «reforma antecipada», tem direito a uma remuneração igual a 14 vezes a que serviria de base de cálculo da sua pensão de reforma; 2º - O Acórdão recorrido entendeu ser inaplicável essa disposição, por força do disposto no n°3 do art° 1º do aludido EUP.

  1. - Para tal, desvalorizou total e completamente qualquer interpretação literal das normas que estavam em causa, sustentando que a interpretação "sistemática", "histórica" e "teleológica" a ser aplicada ao art. 20° do mesmo EUP imporia conclusão radicalmente diversa daquela que resultava da sua letra.

  2. - Está pacificamente aceite que o aludido EUP constitui um autêntico instrumento de Regulamentação Colectiva de Trabalho e que às suas normas se aplicam as regras constantes do art. 9º do Código Civil.

  3. -Sendo, desde logo, forçoso sublinhar que o disposto no invocado art. 1º, n°3 do EUP, apenas se aplica "aos limites estabelecidos pelas instituições oficiais de previdência a que o trabalhador esteja, tenha estado, ou continuasse adstrito" relativamente aos "benefícios concedidos pelas instituições oficiais de previdência".

  4. - A nível das instituições de previdência não existe a figura de «reforma antecipada» e, consequentemente, não existe qualquer benefício que "seja concedido a esse respeito"; donde decorre, inelutavelmente, que não se colocaram "limites" para algo que não existe.

  5. - Independentemente desse aspecto, uma interpretação sistemática relativamente ao conteúdo do art. 20° do EUP não poderia levar ao resultado que foi adoptado pelo Acórdão recorrido.

  6. - Sendo escassa a fundamentação que, a este respeito, se detecta no dito Acórdão, sempre se dirá que, apesar do art. 20° se encontrar intercalado entre as normas respeitantes aos complementos dos benefícios estabelecidos pela previdência, tal como não o transforma, só por isso, num "complemento", situação que sempre se afiguraria inviável, por inexistência do regime que, alegadamente, seria objecto de "complemento" por parte do EUP.

  7. - Por outro lado, as normas dos já citados artigos 20° a 24° encontram-se "arrumadas" sob uma designação própria, intitulada "Capítulo II (reforma antecipada)" e, por isso, não pode ser ignorada essa realidade transformando-se esse capítulo numa subsecção do capítulo I.

  8. - Aliás, no capítulo I, art. 2º, estão enumerados todos os complementos aos benefícios concedidos pela previdência e dessa enumeração não consta a «reforma antecipada».

  9. — Não sendo aceitável a invocação do elemento sistemático, o mesmo se dirá do elemento histórico.

  10. — Pois, impensável seria que em 1983 as partes quisessem restringir "a melhoria das condições de vida das classes trabalhadoras".

  11. - Assim como seria lógico a não indexação do regime previsto no EUP aos sistemas da Função Pública, face aos sucessivos benefícios que, nessa época, eram estabelecidos a favor dos respectivos funcionários.

  12. -Cabendo referir que o regime estatuído pelo EUP em 1985 era substancialmente diferente daquele que então se achava previsto a nível da Caixa Geral de Aposentações, diferença que, aliás, o Acórdão recorrido reconhece, apesar de não retirar qualquer conclusão desse facto.

  13. - Sendo forçoso entender que essas diferenças desde logo desautorizam qualquer parificação entre os dois regimes.

  14. - Não sendo demais repetir que a passagem à «reforma antecipada» instituída na EEM constitui um direito potestativo do trabalhador que não está dependente de qualquer condição, também não será demais...

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