Acórdão nº 5356/07.1TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Outubro de 2011
Magistrado Responsável | SERRA BAPTISTA |
Data da Resolução | 13 de Outubro de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA e BB vieram intentar acção, com processo ordinário, contra SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES L...,A... & C..., LDA e CC pedindo: a) a condenação destes a reconhecerem o falecido DD como titular dos créditos e depósitos saídos das suas contas bancárias, do BES, MILLENIUM BCP, CAIXA GALICIA e BANCO SANTANDER usados para pagamentos de despesas da responsabilidade da sociedade ré, no montante de € 1 056 928,31, bem como a condenação solidária de ambos a pagarem os suprimentos concedidos à ré no mesmo montante; b) a condenação da ré CC a reconhecer o falecido DD como titular único do saldo existente no BES, na conta DO ..., no montante de € 136 068,21 e a restituir à herança a quantia de € 82 773,70 (52 773,70 + 30 000), com juros, à taxa legal, desde a citação.
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e, se assim não se entender, a condenação das rés a pagarem aos autores, na proporção das suas quotas (16% + 16%) a quantia de € 362 704,63 (338 217,05 + 24 487,58), com juros, à taxa legal, desde a citação.
Alegando, para tanto, e em suma: São legatários do falecido DD, na proporção de 16%, cada um, da venda de bens da herança deste, melhor referenciados em “dez”, no seu testamento, junto de fls 14 a 20.
O falecido DD era sócio da sociedade ré “Sociedade de Construções, L...,A... & C..., Lda.”.
Integravam a gerência e o capital social, para além do falecido, CC e EE.
O falecido DD concedeu suprimentos à sociedade ré que ascendiam, em 2005, a € 1.056.928,21.
Estes suprimentos foram solicitados às rés após o falecimento do DD.
A ré sociedade efectuou a venda de uma moradia e de um lote para construção por € 190 000 (património da sociedade), tendo recusado entregar as quantias recebidas para parcial reembolso dos suprimentos.
A gerente CC aquiesceu em entregar apenas metade das quantias recebidas, alegando que os suprimentos foram efectuados com dinheiro de uma conta conjunta/solidária sua e do falecido DD, pelo que metade dessa quantia lhe pertence.
Mas a conta era conjunta apenas para mais facilmente permitir à ré CC o pagamento das despesas do DD atentas as dificuldades de escrita que o mesmo sentia, sendo certo que todas as quantias nelas depositadas tinham origem em rendimentos pessoais do mesmo.
A mesma ré liquidou a conta bancária junto do BES com saldo negativo de € 202 620,92, por resgate de € 338 717,33, de títulos de “Fundos G...”, subscrito pelo falecido DD, ficando a final com um saldo positivo de € 136 096,41, tendo sido entregue a FF a quantia de € 30 000, ficando a ré com € 52 773,70, entregando aos testamenteiros igual quantia de € 52 773,70.
Tais quantias pertenciam na totalidade ao DD, tendo a ré CC recebido quantia a que não tinha qualquer direito.
Sem que houvesse qualquer justificação para o pagamento feito a FF.
Citadas as rés, vieram contestar, alegando a incompetência absoluta do Tribunal e impugnando os factos alegados pelos autores. Mais pedindo a sua condenação como litigantes de má fé.
Replicaram os autores, pugnando pela improcedência da excepção.
Foi elaborado o despacho saneador, que, alem do mais, julgou improcedente a excepção dilatória da incompetência material do Tribunal. Foram fixados os factos tidos por assentes e organizada a base instrutória.
Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho de fls 412 a 416 junto aos autos consta.
Foi proferida a sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a ré CC a reconhecer o falecido DD como único titular do saldo existente no BES, na conta DO... no montante de € 136 068,21 e a restituir à herança aberta por óbito do mesmo DD a quantia de € 82 773,70, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa anual de 4%, devidos desde 10/12/07 até integral pagamento. Absolvendo a ré do demais contra ela peticionado e a ré sociedade dos pedidos.
Inconformados, vieram os autores interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, onde, por acórdão de fls 503 a 537, na sua parcial procedência, foi revogada a sentença recorrida, com a condenação das rés a reconhecerem o falecido DD como titular dos créditos e depósitos saídos das suas contas bancárias, do BES, Millenium BCP e Banco Santander, usados para pagamento de despesas da responsabilidade da ré sociedade, no montante de € 1 056 928,21, condenando-se a sociedade a pagar à herança, o montante dos empréstimos concedidos pelo DD, no referido valor de € 1 056 928,21, acrescido dos juros, à taxa comercial, desde a citação. Absolvendo-se a ré CC no demais[1].
Agora irresignadas, vieram as rés SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES L...,A... & C..., LDA e CC pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça, tendo os autores interposto recurso subordinado, na parte que lhes é desfavorável.
Formulando as rés, na sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª - Os Venerandos Desembargadores ao condenarem as RR nos termos constantes do douto acórdão recorrido, não fizeram uma escorreita aplicação do direito.
2ª - O douto acórdão recorrido ao condenar as RR. naqueles termos e por tais fundamentos, proferiu uma decisão que não corresponde à prova produzida em juízo.
3ª - A alteração da resposta ao art. 2 e 3 da BI não deverá acontecer, sendo de manter como resposta: "Provado que o falecido Sr. DD aplicou na ré "Sociedade L...,A... & C..., Lda", quantia não concretamente apurada".
4ª - Da audição integral dos depoimentos das testemunhas e dos documentos juntos aos autos não pode resultar tal alteração.
5ª - Dos depoimentos das várias testemunhas, não se pode afirmar os montantes exactos que deram entrada na sociedade Ré pela mão do falecido DD, nem a que título.
6ª - A inscrição dos apelidados suprimentos nas contas de 2005 foi efectuada em 2006, ou seja, após o óbito do Senhor DD.
7ª - Também aqui não se pode ter como provado quais os exactos montantes que o falecido fez entrar na sociedade, nem a que título.
8ª - O falecido Senhor DD nunca pensou em ser reembolsado de qualquer quantia colocada à disposição da Sociedade R., mas antes proceder à venda das construções efectuadas pela R. Sociedade.
9ª - Tal conclusão resulta clara dos depoimentos prestados por FF e pela testemunha M...P... (também herdeira), quer dos documentos juntos aos autos.
10ª- O falecido Senhor DD ao deixar a sua quota à R. CC pretendia deixar-lhe o activo existente na sociedade, sendo que tal resulta do próprio testamento de DD junto aos autos.
11ª- Não pode este sempre doutíssimo Tribunal extrapolar a prova apresentada em audiência e nos autos.
12ª- Está pois provada a data de inscrição dos suprimentos (2006) que foi após a data do falecimento de DD, não se podendo determinar qual o valor que aquele terá colocado ao dispor da Sociedade Ré.
13ª- Ficou provado por documentos e por prova testemunhal que o falecido Senhor DD colocou dinheiro na Sociedade R., mas não qual o montante, nem a que título.
14ª- Não se logrou provar de que contas bancárias saiu o dinheiro com que o falecido DD efectuou os pagamentos em nome da Sociedade R., não tendo sido junto qualquer documento idóneo para o efeito.
15ª- Houve erro na reapreciação das provas dos autos, pelo que deverá ser mantida a resposta aos artigos 2.° e 3.° da BI.
16ª- Deve ser mantida a resposta ao art. 14 da BI constando que os suprimentos estavam inscritos em nome do falecido senhor DD e outros credores e com o esclarecimento de que tal montante não constou dos exercícios anteriores.
17ª- Não ficou provado de onde saiu o dinheiro utilizado pelo falecido DD para pagamentos em nome da Sociedade R., nem em que montante e a que título.
18ª- Os AA. subsumiram o investimento feito pelo falecido senhor DD à figura de suprimentos.
19ª- A R. CC nunca aceitou a existência de suprimentos alegando e provando que o dinheiro colocado à disposição da R. Sociedade o foi a título gratuito.
20ª- O falecido DD pretendia deixar a maior parte dos bens à R. CC, incluindo o activo da Sociedade R., o que se encontra provado através do testamento junto aos autos, bem como dos depoimentos de M...P... e de FF.
21ª- A causa de pedir dos AA consubstanciou-se na qualificação do investimento do falecido DD como suprimentos.
22ª- Não pode haver alteração ou substituição da causa de pedir porque tal não resulta claro do alegado pelos AA.
23ª- Os AA. nunca interpretaram a questão dos autos como mútuo.
24ª- Na esteira dos Ac. ST J, de 20.2.1991: Acórd. Doutrin., 355.°-934; Ac. ST J, de 1.7.2004: Proc. 04B2214.dgsi.Net; Ac. RE, de 14.7.2004: Proc. 164/04-3.dgsi.Net); não pode o douto Tribunal recorrido fazer nova qualificação jurídica para os factos em questão.
25ª- O Tribunal recorrido violou a aI. d), do n.º 1, do artigo 668.° do CPC. XXV - 26ª- A existir outra qualificação jurídica, a mesma deve ser de contrato de doação.
27ª- Tal qualificação resulta clara do testamento e dos depoimentos das testemunhas juntas pelos AA. que dizem que o falecido DD apenas tinha colocado outros dois sócios consigo por questões formais, para não ficar sozinho na sociedade.
28ª- Todos os actos do falecido senhor DD, seriam tendentes não a encetar quaisquer suprimentos ou mútuos, mas sim a efectuar doações.
29ª- O doutro Tribunal “a quo" errou também na determinação da norma aplicável ao caso dos autos.
30ª- O falecido Senhor DD não contratou qualquer mútuo, tão pouco mercantil, antes sim doou à Sociedade R. o dinheiro que esta necessitou.
31ª- O dinheiro cedido à Sociedade R. não foi necessariamente destinado a actos comerciais e como tal a existir mútuo o mesmo não é mercantil.
32ª- Não se qualificando o contrato existente como de doação, sempre se terá de manter a qualificação de suprimentos, na esteira aliás do acórdão constante na Colectânea de Jurisprudência, Acórdãos do STJ, Ano XVII, Tomo III, 2009 e em www.dqsi.pt - Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul; processo 05097/01 .
33ª- Não havendo dinheiro na Sociedade R. para cumprir o seu objecto social, os valores entrados na mesma tiveram uma função...
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