Acórdão nº 07B1296 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Novembro de 2007

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES BELEZA
Data da Resolução15 de Novembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. Em 3 de Novembro de 1997, AA instaurou no Tribunal Judicial da Comarca de Loures uma acção de regresso contra Empresa-A, Importação e Comércio de Produtos Alimentares, Lda, BB, CC e mulher, DD, e EE e marido, FF, pedindo a sua condenação no pagamento de 10.845.833$00, acrescida de juros vincendos contados desde a data da propositura da acção até integral pagamento.

Para o efeito, alegou serem os segundo réu e os réus seguintes sócios da primeira ré, ter cedido aos últimos, em Outubro de 1992, as quotas que detinha na sociedade Empresa-A, a cuja gerência então renunciou, e ter pago em Maio de 1996 ao Banco Espírito Santo, na sua qualidade de avalista - tal como eram os actuais sócios, sendo essa a razão pela qual vem exercer o seu direito de regresso através desta acção -, a quantia de 9.500.000$00, à qual se devem desde logo somar os juros até então vencidos, no montante de 1.345.833$00.

Conforme explicou, em Maio de 1991 foi concedida "pelo Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa, agência de ..." à Empresa-A, Lda, "uma linha de crédito até 15.000.000$00"; esse crédito foi caucionado, tendo sido igualmente prestada "uma garantia bancária no valor de 10.532.581$00, recorrendo-se a livranças", avalizadas pelo autor e pelo segundo réu (junta fotocópias de duas livranças, uma emitida em 22 de Maio de 1991, relativa a uma "operação de facilidade de crédito em conta corrente caucionada de esc. 15.000$00" e outra, emitida em 24 de Fevereiro de 1993, correspondente a uma "garantia bancária nº 202142 de esc. 10.532.581$00"); e disse ainda que "complementarmente, na caução do crédito concedido de 15.000.000$00, foram os sócios da Empresa-A, Lda., ora RR, avalistas do mesmo" (junta fotocópia de uma livrança emitida também em 24 de Fevereiro de 1003 "para caução de facilidade de crédito em c/ corrente caucionada esc 15.000.000$00".

Diz ainda que, após a cessação da sua gerência, a sociedade deixou de cumprir os compromissos assumidos com o Banco, motivo que o levou a chamar "o A. (...), na sua qualidade de avalista", e a desembolsar, "em Maio de 1996, (...) a quantia de 9.5000.000$00 que agora pretende reaver dos RR.".

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Em 27 de Fevereiro de 1998, veio contestar o réu BB. Em primeiro lugar, sustentou que a petição inicial era inepta, por ininteligibilidade da causa de pedir, razão que deveria conduzir à sua absolvição da instância; em segundo lugar, e para o caso de assim se não entender, defendeu que a acção deveria ser julgada apenas parcialmente procedente, porque, caso o autor viesse a demonstrar ser titular do direito de regresso que invocava, nos termos que delimitou, apenas lhe poderia ser exigido o pagamento de 1/5 de 4.450.757$00 (890.151$40), por ser esse o montante que restava pagar da "linha de crédito referida no artigo 3º da douta p. i.", tendo aliás sido emitida uma segunda livrança nesse valor, datada de 24 de Fevereiro de 1993, para substituir a primeira (a que foi emitida em 22 de Maio de 1991), que já não subsistia.

Em 4 de Junho de 1998, contestou a ré DD. Sustentou igualmente a ineptidão da petição inicial, por ininteligibilidade da causa de pedir, e disse ainda: nunca ter sido sócia da Empresa-A, a cuja actividade sempre foi alheia, mas ser apenas casada com o sócio CC, de quem se encontrava separada de facto; nunca ter intervindo, juntamente com o marido, em nenhuma das livranças indicadas pelo autor na petição inicial; apenas ter prestado aval, com seu marido, relativamente a uma dada livrança, subscrita em 24 de Fevereiro de 1993, mas ter negociado com o Banco credor a extinção da sua responsabilidade, mediante o pagamento de 500.000$00, em 24 de Julho de 1997. Concluiu pedindo a sua absolvição da instância e do pedido.

A 9 de Fevereiro de 2000, a fls. 127, o autor, invocando "os prejuízos da morosidade na citação de todos os RR", e o aumento do risco de não vir a ser ressarcido em virtude do decurso do tempo, veio desistir da instância relativamente aos réus ainda não citados: Empresa-A, Importação e Comércio de Produtos Alimentares, Lda., CC e EE e marido, FF. A desistência foi homologada a fls. 129, e a instância foi julgada extinta quanto a estes quatro réus.

Em 22 de Março de 2000, a fls. 132, o réu BB requereu a intervenção principal provocada destes mesmos quatro réus, intervenção que veio a ser admitida pelo despacho de fls. 152, apesar da oposição do autor (a fls. 141, juntamente com a réplica oposta à contestação de BB).

A fls. 147, o autor replicou quanto à contestação de DD.

A fls. 231, contestaram os réus EE e FF. Igualmente afirmaram ser a petição inicial inepta por ininteligibilidade da causa de pedir e concluíram que, a não serem absolvidos da instância, deveriam ser absolvidos do pedido, "já que nem o A. é avalista de qualquer livrança subscrita pelos ora contestantes, nem estes são avalistas ou subscritores de qualquer livrança subscrita ou avalizada pelo A.".

A fls. 253, o autor apresentou a correspondente réplica.

  1. A 12 de Março de 2002, a fls. 262, foi proferido despacho saneador, que absolveu os réus da instância, com o fundamento de que "tal como o autor estrutura a sua petição inicial, resulta, a nosso ver, ininteligível a indicação da causa de pedir da presente acção".

    Inconformado, o autor interpôs recurso, que foi recebido como agravo com subida imediata e efeito suspensivo, e que veio a ser julgado pelo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11 de Fevereiro de 2003, de fls. 324, que lhe concedeu provimento e determinou a substituição do "despacho recorrido (...) por outro que ordene o normal prosseguimento da acção." Para o efeito, o acórdão da Relação de Lisboa, considerando que "a circunstância de a causa de pedir não ser bastante para fundamentar o pedido não gera necessariamente a ineptidão da petição, conduzindo antes à improcedência da acção", e aplicando o nº 3 do artigo 193º do Código de Processo Civil, considerou que das contestações apresentadas se verifica "claramente que os RR sabem o que o autor pretende e quais os fundamentos invocados, embora com eles não concordem".

    Esta decisão foi confirmada pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de Outubro de 2003, de fls. 352, que, citando o Assento do mesmo Supremo Tribunal de 26 de Maio de 1995 e o nº 2 do artigo 193º do Código de Processo Civil, bem como o poder-dever conferido ao juiz pelo artigo 508º, nº 1, b) e c) do mesmo diploma, considerou, não só que os réus haviam entendido "o que o autor pretende e quais os fundamentos invocados", mas também que o autor tinha replicado, "esclarecendo o que alegara na petição inicial, em ampliação fáctica da causa de pedir".

  2. Prosseguindo a acção, foi elaborado o despacho saneador, com a lista de factos assentes e a base instrutória (cfr. fls. 363); produzida a prova, procedeu-se ao julgamento da matéria de facto, constante de fls. 440 e segs.

    A 15 de Setembro de 2005, a fls. 470, foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré Empresa-A a pagar ao autor a quantia, em euros, correspondente a 9.500.000$00, acrescida de juros, e "cada um dos réus BB, CC e mulher e EE e marido a pagar ao autor (...) a quarta parte de 9.500.000$00", e os correspondentes juros, "pagamento que o autor poderá exigir uma vez excutidos os bens da ré ‘Empresa-A, L.da' sem que obtenha a integral satisfação do seu crédito".

    Recorreram para o Tribunal da Relação de Lisboa BB e DD, em recursos autónomos. Igualmente recorreram EE e marido, mas o seu recurso não foi admitido, por extemporaneidade (despacho de fls. 514).

    Por acórdão de 17 de Junho de 2006, de fls. 577, o Tribunal da Relação de Lisboa julgou improcedente a apelação interposta por BB, condenando-o a pagar ao autor a quantia de 4.500.000$00, "acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento, sem prejuízo do demais decidido na sentença da 1ª Instância", e procedente a apelação interposta por DD, que foi absolvida do pedido.

    Para o efeito, a Relação entendeu que ocorria "uma manifesta confusão na interpretação da matéria de facto dada como provada, sendo que esta constitui um dos fundamentos em que se baseiam os dois recursos interpostos.

    Com efeito, contrariamente ao afirmado por ambos os Apelantes, não há qualquer dúvida sobre a origem dos montantes liquidados pelo Autor/Apelado junto do BESCL, e/ou em que qualidade aquele os satisfez.

    Em 22 de Maio de 1991 o Autor/Apelado, na qualidade de sócio-gerente da 1ª Ré, Empresa-A - Importação e Comércio de Produtos Alimentares, Lda, deu o seu aval àquela firma numa livrança, em que a data de vencimento e o respectivo montante se encontravam em branco, para garantia do crédito em conta corrente até ao montante de Pte. 15.000.000$00, concedido por aquela entidade bancária à 1ª Ré. Neste mesmo título também o 2° Réu/Apelante, BB, deu o seu aval à 1ª Ré, Empresa-A, Lda (Pontos 4 e 5 dos Factos Provados).

    O Autor/Apelado, bem como o 2° Réu/Apelante, deram ainda os seus avales à 1ª Ré Empresa-A, Lda, numa outra livrança, em que foi aposto o dia 24 de Fevereiro de 1993, como data de emissão, tendo a data de vencimento e quantia em dívida ficado em branco, respeitante à garantia bancária nº 202142, prestada pelo BESCL, por conta da 1ª Ré, e a favor da Alfândega do Porto, no montante de Pte. 10.532.581$00 (Ponto 6 dos Factos Provados e documento junto a fls. 144 dos autos).

    Em Outubro de 1995 o...

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