Acórdão nº 660/07.1YXLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Setembro de 2011
Magistrado Responsável | GABRIEL CATARINO |
Data da Resolução | 06 de Setembro de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Recorrente:AA Recorrido: BB I. – RELATÓRIO.
Desavindo com a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa que, no julgamento do agravo interposto do saneador/sentença proferida na 1.ª instância tinha considerado não ter o Autor interesse em agir para o impulso processual que promoveu, recorre, novamente, para este Supremo Tribunal, tendo dessumido a sua argumentação com o sequente quadro conclusivo: “1. As considerações de Direito do Tribunal a quo são exactas.
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Mas o objecto do presente recurso incide sobre a aferição lógica, ou seja o “Julgamento" que foi feito dos factos apresentados.
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O A. tem interesse processual, porque alegou factos bastantes, ao invés do que o Tribunal decidiu.
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Bastantes, porque alguém que teve a infelicidade de ter uma incapacidade de 80%, seguramente que ao longo da sua vida, já precisou de documentar essa situação.
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E a primeira vez que precisa desse documento, será sempre para uma situação profissional, nunca para manutenção de um contrato de arrendamento dois meses após falecimento do anterior arrendatário.
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Pelo menos assim aponta um espírito atento, em face das regras da experiência.
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Se a R. apenas o faz dois meses depois da morte da mãe, isso sugere que o atestado surge para o efeito único de "beneficiar" dessa situação, ao abrigo do contrato de arrendamento.
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E isso porque à data do falecimento da mãe, pelos vistos, não tinha esse documento e nunca dele tinha precisado.
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A não ser que, claro, a incapacidade tenha surgido naquele momento, o que naturalmente não sucedeu.
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E se não dispunha previamente desse documento, foi por nunca precisou de documentar essa situação (facto da incapacidade de 80%), o que suscita desconfiança sobre o facto supostamente "atestado".
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E este juízo sobre os factos que foram alegados (maxime os constantes dos artigos 5.°, 7.° e 8.°) é um passo delicado que passa pela profundidade da interpretação do Julgador.
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Sendo que, neste aspecto, consideramos que a Relação deveria atender que apenas diante a ausência manifesta de factos, seria possível à primeira instância terminar o processo antes da audiência, pois, muitas vezes, apenas com o julgamento é que os factos saltam do papel dos articulados, com a imediação da prova.
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E nesta matéria deveria a Relação entender que os factos estão alegados e são suficientes para os autos avançarem para a audiência de discussão e julgamento, o que se requer.
” Na reacção ao recurso, a Ré rematou o razoamento argumentativo com o sequente epítome conclusivo: “1. Estando em presença de uma acção de simples apreciação negativa, a incerteza contra a qual se pretende reagir terá de ser objectiva e grave (art. 4º n92 a) do CPC).
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A Ré enviou ao Autor um atestado de incapacidade multiuso emitido ao abrigo do D.L.174/97 de 19 de Julho por uma Junta Médica constituída em consonância com o disposto no D.L. 202/96 de 23.10 e que efectuou o cálculo da avaliação da incapacidade da Ré de acordo com a TNI, definindo-a como uma incapacidade permanente global de 80% desde 2004 (antes do falecimento da mãe da Ré) .
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O atestado médico emitido a coberto da TNI é um documento autêntico que faz prova plena da avaliação nele certificada e da percentagem de incapacidade atribuída (neste sentido, Acórdão do STA de 16.1.2002, ReI. Conselheiro Benjamim Rodrigues, in Base de dados do ITU).
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Os documentos autênticos fazem prova, por si mesmo, da sua proveniência ou paternidade, e prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles estão atestados, de acordo com o disposto pelo artigo 371º, nº 1, do Código Civil .
5.0 Autor, ao contrário do que agora invoca, não alega na petição inicial um único facto susceptível de contrariar a força probatória do atestado de incapacidade multiuso e consequentemente de justificar a propositura da acção de simples apreciação negativa.
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Consequentemente e porque o interesse em agir se traduz na necessidade, objectiva e séria, de recorrer à acção judicial, fenecendo tal pressuposto processual no caso em apreço, deverá manter-se a decisão, duplamente confirmada, de absolvição da Ré da instância.” I.1. – Antecedentes úteis para a decisão a proferir.
Pela incerteza que lhe causa a incapacidade de que é portadora a locatária da fracção autónoma designada pela letra “E” do prédio urbano descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 121/19950627-E, freguesia de Alvalade, e inscrito a favor do demandante, AA, BB, o demandante pediu que o tribunal proferisse “(…) declaração judicial consistente na apreciação da situação jurídica supra aludida, mis concretamente do direito a que a demandada se arroga (permanecer no locado por morte da anterior locatária, Alice dos Santos Fernandes, dado ser portadora de uma incapacidade de 80%, o que a confere a qualidade de deficiente, para os efeitos do artigo 85.º do RAU); - Na contestação, a demandada suscitou a excepção da nulidade de todo o processo, por ineptidão da petição inicial – falta da indicação do pedido –, falta de interesse em agir e impugnou os factos que sustentaram a petição inicial, acabando por suscitar o incidente do valor da causa, dado em seu entender estarem em causa interesses imateriais; - Na resposta o demandante tentou revidar a argumentação expendida pela demandada, procurando esclarecer o pedido (ou a ausência dele) no sentido de que fosse entendido como na “não manutenção do contrato de arrendamento, por existência do direito à denúncia do A., porquanto a Ré não é portadora de deficiência que legitime a invocação e aplicação do regime do art. 87.º, n.º 4, al. a) do RAU”; - Procurou contraminar a demais matéria exceptiva, tendo rematado pela improcedência das excepções arguidas; - Depois de decidido o incidente do valor da causa que determinou a transferência do processo dos Juízos Cíveis para as Varas Cíveis do Tribunal Cível da comarca de Lisboa e após a realização da audiência preliminar, foi proferido despacho saneador em que se decidiu que “considerando a falta de interesse em agir, que constitui excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, este tribunal decide absolver a Ré, BB, da instância – cfr. artigos 288.º, n.º 1, al. e) e 493.º, n.º 2, do CPC”. - Depois de vicissitudes incidentais ocorridas pela não observância das regras de notificação interpartes, que determinou a nulidade de todo o processado após a notificação de fls. 126 – cfr. despacho de fls. 158 a 161 – viria o recurso interposto pelo Autor, a obter julgamento, em que foi decidido negar provimento. I.2. – Questão a merecer apreciação.
Em face do quadro conclusivo alinhado pelo recorrente colima-se como questão axial a merecer apreciação: - Interesse em agir do Autor.
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– FUNDAMENTAÇÃO.
II.1. – DE DIREITO.
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